Duarte Alvarenga
Ele tinha sido solto… solto! Tinha sido solto 20 anos depois de o juiz o ter considerado culpado! Ainda me lembro de ver a loucura e desespero em seu rosto enquanto insistia e gritava com a polícia que estava inocente e que não tinha tido nada a ver com o ocorrido. Várias vezes o fui visitar á polícia para implorar por informações, mas tudo o que ele dizia era que não tinha sido ele e que eu tinha acabado com a sua vida sem razão nenhuma. Acabou por ser transferido para uma prisão no Porto e desde aí nunca mais lhe pus os olhos em cima. Agora… 20 anos após a sua prisão iria voltar a ver o seu rosto que me trazia horríveis e angustiosas memórias.
Quando propus um encontro com ele, a minha mulher disse que era loucura, que não devia ir. Disse que era irracional da minha parte encontrar-me com um criminoso e ex-prisioneiro, ela sempre foi muito dada aos dramas e pessimista, faz um filme de tudo. Secalhar ela até tinha razão, já se tinham passado 20 anos desde o ocorrido, e ele nunca me dissera nada durante as minhas visitas á prisão. Mas eu não podia desistir, ele era a minha única hipótese de a encontrar e por ela iria até ao fim do mundo, mesmo não conhecendo o seu atual rosto.
Desci na estação de comboios junto ás docas, onde sabia que o encontraria. Pelo que diziam por aí ele sempre andava por esta zona, junto ao seu antigo barco que lhe fora oferecido pelo pai quando jovem. Lá estava ele, encostado á proa do navio, apenas a olhar o rio. Uma raiva súbita nasce dentro de mim, e a sensação de ódio começa a crescer. Ele não devia estar aqui, ele devia estar preso junto dos criminosos como ele, porque graças a ele, eu perdi o meu bem mais precioso. Aproximo-me dele e ao sentir a presença de alguém o homem olha para mim. Parece assustado e ainda bem que sim, pois eu com certeza não seria brando com ele.
- Estava mesmo a ver que vinha atrás de mim… - ele sussurra, não acreditando que era mesmo eu que me encontrava ali.
- Ótimo! – digo com raiva óbvia na minha voz. – Então sabe exatamente o que eu quero!
- Já não lhe chegou atirar com um inocente para a cadeia? – ele diz, com o mesmo olhar que tinha quando eu o ia visitar á cadeia. Um olhar que agora me estava a fazer perder a paciência. – Eu não raptei a sua filha Sr. Alvarenga!
- Você pode dizer isso a quem quiser mas não a mim está a perceber?! NÃO A MIM! – Grito descontrolado agarrando no colarinho do seu casaco e deixando-o assustado. – Onde é que está a Aurora?! O que é que lhe fez?!
- Calma! Largue-me! – ele diz soltando-se e indo com a mão em direção ao casaco. Por momentos ainda pensei que ele fosse sacar de uma arma, mas segundos depois mostra-me uma fotografia de uma rapariga loira de aproximadamente 30 anos. Não podia ser! Era igual! A rapariga da foto era igual ou muito parecida á Maria Luísa a minha ex-mulher que tinha morrido num acidente de viação. – Quer saber o que aconteceu? Procure no México por esta rapariga. Ela trabalha numa ONG lá. Pode saber onde está a sua filha.
- Esta rapariga… Como é que ela se chama?!
- Com calma. – ele diz com um sorriso sacana no rosto irritando-me mais.
- Como é que ela se chama?!
- Calma, já disse amigo.
- Ouça eu preciso de um nome, preciso do nome da cidade onde ela está, precis…
- E eu preciso primeiro de saber, quanto vale este nome aqui. – ele diz apontando para a foto . – Quanto vale a sua filha senhor Alvarenga? – e depois disso foi tudo muito rápido. Ouve-se o som de um tiro e por reflexo abaixo-me assustado, olhando ao redor para saber se tinha sido por acaso ou direcionado a mim. Não vejo nada, mas quando volto a olhar para o infeliz do homem á minha frente ele já se encontrava deitado no chão com a mão no lugar onde a bala lhe tinha atingido. Não podia ser. O único homem que tinha informações encontrava-se a morrer á minha frente.
- Não… não! Diga-me o nome dela! Um nome! A cidade! Qualquer coisa! – grito desesperado, mas tarde demais. Ele já se encontrava morto, para meu azar. Não que eu me importasse com o homem, o que eu queria era a informação mas nem isso consegui. Tinha novamente voltado á estaca zero.
Hermione Granger
Acordo com os olhos a arderem graças ao Sol abrasador. Tinha dormido que nem uma pedra, mesmo na companhia de mais pessoas no topo de um camião que tinha como destino a Cidade do México. Não tínhamos dinheiro para autocarros, ou um carro próprio, portanto a minha gente tinha conseguido falar com o condutor de um camião de mercadorias para me darem uma boleia até á Cidade do México. Páramos várias vezes no caminho, para receber várias pessoas, ainda bem que assim eu já não me sentia tão sozinha. Eles tinham ficado para trás no acampamento, e eu agora viajava sozinha para ir ter com o meu pai que trabalhava agora na capital. Também não me importei muito, por muito simpáticos que eles fossem lá no acampamento eles não eram a minha verdadeira família, o meu lugar sempre seria junto do meu pai. Bebo o resto da água que tenho na minha pequena garrafa, não é muita mas dá para molhar os lábios, e ao se aperceber disso, um rapazinho mexicano aprontasse a oferecer a sua garrafa de 1,5 litros para eu beber.
- Obrigado. – agradeço-lhe com um sorriso que ele retribui. Penso que ele me entendeu pela sua resposta. – O meu pai está á minha espera na cidade do México. – falo para ele. – Conheço lá uma pessoa de uma ONG que nos vai ajudar a entrar nos Estados Unidos. – digo feliz ao relembrar a conversa entre mim e o meu pai sobre o nosso próximo destino onde ficar. – Depois vamos para Nova York, Manhattan ahah, sempre quero ver se os prédios são tão altos como dizem. – O menino olha para mim e entende-me. Ele diz que quer ver a neve que nunca a viu e por isso ia sozinho concretizar esse sonho. Sinto orgulho dele mesmo não o conhecendo, eu com a idade dele só viajava com o meu pai. Volta a encarar o deserto á nossa volta e calasse, a viagem corre tranquilamente até o camião passar por um solavanco na estrada fazendo com que o menino que queria ver a neve e que se encontrava perigosamente junto berma escorregasse para trás. Inconscientemente atiro-me atrás dele e ainda consigo agarrá-lo com uma mão impedindo que ele seja esmagado pelo automóvel.
- Ajuda-me! Vou cair! – ele grita aflito. Nunca fui muito forte portanto não o consigo puxar pra cima, por muito que me esforçasse.
- NÃO LARGUES! – grito aflita ao ver que ele estava a escorregar. – NÃO! – Mas já era tarde, o menino escorrega e é engolido pelo camião. Salto até ao próximo vagão para ver se ele tinha conseguido escapar ileso, e ao chegar ao final do camião o que eu vejo na estrada é o corpo inerte do menino que tinha o sonho de ver a neve.
Eva Alvarenga
A polícia já se encontrava em nossa casa. O inspetor Harry Potter um jovem de 20 e poucos anos, mas pelo que diziam um ótimo inspetor, seria agora o agente que iria tomar conta do caso da morte do Arrebenta o homem que foi acusado de raptar a filha do Duarte. Eu ainda estava nervosa, eu tinha-o avisado para não ir atrás daquele homem, podia ser perigoso foi o que eu lhe disse, mas para variar ele não me ouviu. Sempre que o assunto era a Aurora ele nunca ouvia ninguém, ele ainda continuava com a falsa esperança de encontrar a filha desaparecida, mas á muito tempo que eu não acreditava nisso.
- Pelo que me descreveu, tudo indica que tenha sido um trabalho feito por profissionais. – diz o filho do inspetor Potter que fora o que tinha sido responsável pelo caso de Aurora á 20 anos atrás. Infelizmente ele morrera durante um assalto de um banco na cidade e agora o caso da morte do Arrebenta tinha passado para o seu filho, Harry Potter.
- Sim provavelmente inimizades que o homem fez lá na cadeia. – comento, cogitando uma hipótese.
- Não. – diz Duarte seguro de si. – Não foi isso que aconteceu.
- Como é que sabe? – pergunta Maria do Carmo a condensa viúva mãe do Duarte.
- O Arrebenta morreu porque não podia falar. Antes de ser atingido ele disse que se quisesse encontrar a minha filha, que procurasse por esta mulher no México. – explica Duarte tirando uma fotografia de um mulher loira muito parecida com Maria Luísa, a ex-mulher do meu marido e que diariamente me infernizava a vida, só de ver o seu retrato pendurado na parede bem no meio da nossa sala.
- Esta foto é muito semelhante á sua falecida mulher. – afirma o rapaz Potter, pegando na fotografia na mão de Duarte, comparando-a com o retrato enorme na sala.
- Desculpe… - Maria do Carmo que se encontrava chocada tanto quanto eu e mais os meus dois filhos que se encontravam presentes, tira a fotografia da mão do inspetor e compara-a com o retrato percebendo finalmente as evidentes semelhanças entre as duas mulheres.
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- É impossível Duarte! – digo frustada sendo seguida pelo meu marido que ainda se encontrava atordoado com o acontecimento. – Ou a fotografia foi muito mal tirada ou esta mulher tem pelo menos uns 30 anos, a Aurora teria 20 se estivesse viva.
- A Aurora está viva! – interrompe Duarte. – E agora tenho mais uma pista para a procurar. – ele diz esperançoso.
- Hum no México. – digo séptica.
- Sim no México! E segundo o Arrebenta esta mulher trabalha lá numa ONG.
- Mas isso não faz sentido! – digo exaltada e já cansada deste assunto. – Meu amor… quantas vezes é que já passamos por isto? – digo beijando-lhe a bochecha. – São pistas falsas atrás de pistas falsas, desilusões atrás d…
- Queres que eu desista? É isso que tu sugeres, que eu desista da minha filha?
- Tu não ouviste o que a polícia disse?
- Oh Eva, a polícia… Nós andamos nisto há anos! – ele diz cansado e afastando-se de mim.
- O Arrebenta nunca confessou o crime porque senão teria de admitir q… Teria de admitir que matou a tua filha. – digo direta magoando o Duarte. – E agora que saiu da prisão lançou pistas falsas para limpar o nome dele, é isto!
- E porque é que o mataram então?! Eva tu não estás a perceber! O Arrebenta foi impedido de falar! Ele ia-me dizer o nome desta mulher quando morreu á minha frente percebes!
- Pois ok! Então vamos agora os dois a correr para o México de fotografia na mão é isso?! – grito impaciente por ele continuar a insistir no assunto.
- Nós não vamos a correr nós já íamos ao México! Simplesmente é óbvio que eu vou aproveitar esta viagem para…
- Nós íamos ao México para tratar de um assunto importante! – interrompo. – Ou já te esqueceste?!
- Eva eu não vou desistir de localizar esta mulher! A minha filha está viva! E eu sempre soube! E agora acabou este assunto! – Duarte grita, saindo do quarto furioso após a nossa discussão.
Eu sentia-me nervosa e insegura. Insegura por causa da mulher da foto que era tão parecida com Maria Luísa, insegura pela distância de Duarte em relação á nossa família, e principalmente insegura em relação aos segredos no meu passado e aos meus erros. O Duarte não podia descobrir nada, nada mesmo, senão esse seria o meu fim. Dirijo-me á casa de banho para me refrescar um pouco, os últimos acontecimentos foram muito intensos para mim e trouxeram de volta memórias de erros que eu cometi. Ainda me lembro quando eu ainda era a assistente pessoal do Duarte, ainda me lembro de como o consolei quando a sua mulher morreu por causa do acidente. Ainda me lembro nitidamente daquela noite, de como enrolei a bebé numa manta em meus braços e a levei para o carro ainda a dormir, de como a meio do caminho ela acordou e não parou de chorar, fazendo-me sentir a pior pessoa daquele mundo, ainda me lembro de como peguei na cesta e a coloquei dentro do rio a chorar por ver a sua carinha vermelha devido ao choro, como se percebesse o que estava a acontecer, ainda me lembro quando momentos depois tentei salva-la, arrependendo-me da minha decisão de fazer a criança desaparecer, e lembro-me ainda mais de a ver morrer ao ver a cesta cair sobre uma pequena cascata que poderia perfeitamente ter deitado aquele pequeno casulo abaixo. Nesse momento senti-me a pior pessoa do mundo e desde essa altura que sinto uma autêntica sensação de culpa. Eu sabia que ela tinha morrido, tinha sido minha culpa e eu teria que viver com isso até ao fim da minha vida. Se o Duarte descobrisse ele nunca me perdoaria e esse seria o meu fim. Este segredo iria comigo para o túmulo.
Hermione Granger
Mais horas de viagem se passaram e para confessar eu já estava exausta, além de estar a torrar ao Sol eu só conseguia pensar no menino morto que tentei salvar mas que não fui capaz de o fazer. Ele tinha tantos sonhos, tantos objetivos, uma vida inteira pela frente e tinha vivido tão pouco. O camião começa a abrandar e todas as pessoas a bordo olham para a estrada. A polícia encontrava-se a bloquear a estrada causando o pânico geral naquele camião. Era proibido viajar assim, não podíamos simplesmente estar umas 20 pessoas no topo de um camião a viajar sem qualquer tipo de proteção ou permissão, se fossemos apanhados seríamos presos. Pego em minha mochila e apressadamente desço do camião assim como as restantes pessoas desesperadas, no meio da confusão perco a minha mochila e é quando vejo um monte de oficiais a virem na nossa direção com armas de fogo é que tenho a louca ideia de me aventurar no meio do deserto mexicano.
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