Algum tempo antes …
— E desde quando um bastardo pode dividir a mesa com os filhos legítimos de um Senhor tão importante como Lorde Ollimpus? - segredou Tritão ao irmão do meio.
— Cale a boca Tritão. Quer que o pai venha nos silenciar? Hoje é o dia dele, até um bastardo tem isso.
— Por que o chamam de bastardo? Ele é nosso irmão, não é? Eu gosto dele.
— No meu dia de homem, vou querer ele a milhas daqui. E falta pouco, menos de um ano, bem menos que isso. - disse ignorando o irmão mais novo, Sonnen.
— Calem os três, não ouvem o discurso de Asa Negra? - brigou com os irmãos o governante do pai.
Perseu estava sentado algumas cadeiras adiante dos meio-irmãos. O coração estava a mil. Era a primeira vez que aparecia a vista de todos os vassalos do pai, mais de mil homens sentados no gigantesco salão. O seu dia de homem coincidira com o início do outono, quando todos reuniam para discutir as colheitas e dar o grande último banquete do ano. Mesmo de longe, podia ouvi os irmãos sussurrando sobre sua presença na mesa. Estava tão incomodado quanto eles: o gibão branco que usava estava desajeitado no corpo, e o penteado mais ainda, seu cabelo era feito para estar bagunçado. O cinto com a bainha que segurava o calção era uniforme e ficar sentado em um banco com mil olhos em você, era o pior.
Muitos diziam que era mais filho de Poseidon do que qualquer um dos três, era ele mais jovem em pessoa, dos cabelos aos pés. Tritão, Calleb e Sonnen haviam puxado tudo de Anfitrite. Os olhos verde-claros, os cabelos de areia e a pele pálida. Perseu sabia que bastardos não tinham futuro, todos seus meio-irmãos já estavam prometidos à donzelas, até mesmo o pequeno Sonnen. Mas o pior de tudo, era não saber o seu passado, quem foi sua mãe, provavelmente uma prostituta qualquer ou uma camponesa. Nunca havia conversado muito com seu pai, e nas vezes que lhe dirigiu a palavra, nem sequer tocou no assunto.
O banquete durou tanto tempo quanto merecia. Foram incontáveis horas pensando em como seria bom estar lá fora. Foi interrompido dos pensamentos pelo governante, que chamou-lhe discretamente. Já era quase o próximo dia quando encontrou seu pai. Ele estava com a mesma roupa do banquete em sua enorme sala. Aproximou-se olhando para o chão.
— Se.. Senhor?
— Chegou rápido. Venha e beba uma taça comigo - disse Poseidon apontando com a cabeça um jarro.
O vinho era adocicado e não era o melhor que já tinha experimentado. Ele tomou tudo em poucos goles, provavelmente estava nervoso demais para apreciar a bebida.
— Me lembro de quando tinha sua idade. Ganhei muito menos de que meus irmãos. Sabe, filho, quando se é o mais novo, as expectativas são grandes, querem que faça tudo e muito mais do que já fizeram, mas nunca se é possível. Se meus irmão não estivessem mortos, com certeza, eu seria quase um bastardo. Vem comigo, tenho algo para você.
Seguiram atravessando a sala, para uma pequena porta de madeira rústica. Ele retirou do candelabro pendurado uma chave e a destrancou, fazendo um som estrépito. Pegou de dentro um pano que encobria algo comprido. Depositou-o nas mão trêmulas do rapaz.
— Isso é ... uma ? - Perseu tentou inutilmente falar a palavra.
— Sim, rapaz, é uma espada - completou com uma gargalhada - Ganhei-a desonestamente, assim como você. Nada mais digno do que dá-la, não?
— Obrigado.. acho - disse-lhe ainda admirando a espada.
— Olhe para mim quando me dirigir a palavra - Poseidon levantou-lhe o rosto bruscamente - Agora vá, e crie suas próprias aventuras com ela. - Aproximando-se do menino, disse em um segredo sussurrado – Às vezes nossos maiores tesouros são aqueles proibidos.
— Obrigado, pai! - disse novamente, mas desta vez sem desviar nem por um segundo dos olhos verde-mar do mais velho.
— Você tem sorte, garoto. Enquanto todos seus irmão têm um destino já escrito, você possui tudo que precisa para trilhar seu próprio caminho, viver todas as histórias que sonhar, derrotar e conquistar quem quiser.
Depois de um rápido abraço ao garoto, o dispensou e sentou-se a mesa de carvalho, onde despiu sua capa e as luvas. Com as mão trêmulas, pegou o envelope muito bem escondido. Mesmo em sua própria sala não confiava o desleixo. A folha por dentro estava amassada e manchada com lágrimas – com as suas lágrimas. Mesmo hoje, com anos de sua morte, ver sua caligrafia ainda doía como o inferno.
Ainda conseguia sentir seu cheiro quando a deixou e sentiu uma pontada de inveja pelo futuro incerto do filho bastardo. Ele poderia ter a escolha de seguir o seu coração se precisasse, o que Poseidon não pôde ter.
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