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História A Missão - De Volta No Caso


Escrita por: jaimencanto

Capítulo 4 - De Volta No Caso


Fernando

 

 

               Há muito tempo eu não acordava depois das dez. Na verdade, há muito tempo eu não dormia tão bem. Embora ainda estivesse preocupado com a situação de Omar, eu estava cansado o suficiente para deitar a cabeça no travesseiro e apagar. Assim que despertei, olhei para o lado e Letícia ainda estava dormindo. Pelo visto estava tão cansada quanto eu. Me levantei com cuidado para não acordá-la e fui até o banheiro. O peso de tudo o que aconteceu no dia anterior caiu sobre mim assim que acordei, mas eu já não estava tão desanimado como antes. Ter Letícia ao meu lado me ajudou muito, e talvez de fato não fosse tão ruim assim ter um tempo de “folga”. Provavelmente eu tinha perdido a confiança de Rodriguez, mas isso eu poderia recuperar com o tempo. Ele sabia o quanto eu trabalhava duro e o quanto eu me dedicava ao trabalho.

               Assim que saí do banheiro, deixei Letícia dormindo e saí do quarto, caminhando até a cozinha. Resolvi preparar um café da manhã, já que não fazia isso há um tempo. Eu costumava preparar o café para Letícia todos os dias, mas por algum motivo havia perdido esse costume, e nesse momento eu pensei “Por que?”. Eu tinha me esquecido como era ficar de folga, e como não tinha muita coisa para me preocupar, várias coisas que adiei por tanto tempo começaram a me incomodar. A mudança de rotina no meu casamento foi uma delas. Quando foi que Letícia e eu nos envolvemos tanto com o trabalho à ponto de nos tratarmos como se estivermos em serviço até mesmo dentro de casa? É claro que tínhamos nossos momentos íntimos, e cada um deles sempre era especial. Mas eu não era mais romântico como costumava ser. Eu não a surpreendia com uma flor pela manhã, com um café na cama... E isso me incomodou. Assim que entrei na cozinha vi o meu celular vibrar sobre o balcão. Era uma mensagem de um numero desconhecido.

 

“Omar está bem. Passou por uma cirurgia, mas está fora de perigo. Vai continuar internado por alguns dias, mas não se preocupe. Rodriguez já está mais calmo e acho que está começando a sentir sua falta no trabalho. Continuamos na mesma. Espero que você e Lety estejam bem. Marcela.”

 

               Me senti aliviado por saber que Omar estava bem, mas meu alívio só seria cem por cento quando eu fosse visitá-lo e pudesse pedir desculpas pelo que causei. Achei uma atitude legal de Marcela de se preocupar em me mandar uma mensagem, mas pensei se seria uma boa idéia que Lety soubesse. Eu sabia do seu ciúmes por ela e de todas as desavenças que as duas tiveram até Marcela mudar para outro quartel, mas Lety precisava saber que Omar estava bem, e conseqüentemente precisava saber quem me deu a notícia. Deixei o celular sobre o balcão e me preocupei em preparar o café da manhã. Perdi um pouco o jeito de fazer as coisas, mas no fim consegui não colocar fogo na cozinha. Depois de arrumar o café da manhã em uma bandeja, peguei uma flor de enfeite que havia sobre o armário da cozinha e a coloquei ao lado da xícara de café. Caminhei com cuidado até o nosso quarto e quando cheguei à porta, Letícia estava acordando.

- Bom dia. – Falei sorrindo.

- Bom dia. – Ela me olhou, e então sentou-se à cama. – Uau, o que é tudo isso?

- Tinha tempos que não trazia o café na cama para você... Achei que iria gostar.

- Muito tempo mesmo. – Ela riu. – Parece ótimo! E essa flor?

- Bom... Não comprei nenhuma recentemente, então tive que usar a de plástico.

- Mas eu adorei. – Ela sorriu.

               Coloquei a bandeja na cama em sua frente e me sentei ao lado dela.

- Como você dormiu?

- Bem. Com a cabeça um pouco cheia depois de tudo, mas eu mentiria se dissesse que não me senti feliz em dormir tanto.

- Já são dez e meia. Acho que há muito tempo não acordamos tão tarde.

- É verdade. – Ela riu mordendo um pedaço da torrada.

- Acabei de saber que Omar está bem. Ele passou por uma cirurgia, mas está fora de perigo.

- É mesmo? – Ela me olhou animada. – Isso é ótimo!

- É sim. Fico um pouco mais aliviado.

- Eu disse que ficaria tudo bem. – Ela sorriu. – Mas quem te deu a noticia?

- Marcela...

- Ah...

- Eu sei que vocês...

- Não temos mais esse problema, Fernando. Sei que eu e ela já tivemos nossos problemas, mas acho que foi importante trabalharmos juntas. Quando você correu atrás daquele cara e nós ficamos sozinhas com os outros, nós fizemos... Um bom trabalho juntas.

- É mesmo?

- Sim. Acho que eu tinha tanto ciúmes por saber que vocês dois já tiveram alguma coisa que eu criei uma raiva desnecessária por ela. E conseqüentemente ela também criou por mim.

- Ela não tem raiva de voce, Lety. Aliás, no final da mensagem ela desejou que estivéssemos bem.

               Ela riu.

- Não vou dizer que estou contente com isso, mas foi legal da parte dela te dar notícias.

- Foi o que pensei. – Sorri continuando a observá-la tomar o seu café.

 

 

 

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- Eu não suporto essa mulher! – Letícia abriu a porta do carro.

- Você precisa se acalmar... Não pode sair à trabalho assim. – Fernando falou entrando na viatura.

- É impossível! Ela sempre consegue me irritar! Quem ela pensa que é para dizer que eu deveria ter feito uma ocorrência porque um carro parou em local proibido para um idoso entrar? Ela não tem compaixão?

- Ela gosta de fazer as coisas certas. Tecnicamente era o que você deveria ter feito, mas você preferiu fazer algo mais humano. – Fernando a olhou. – Fique calma, tudo bem?

- Por que sempre tenho a impressão que você a defende?

- Não é isso, Lety. – Ele suspirou. – Só estou dizendo por que ela te alfinetou.

- Ela sempre faz isso! Desde que eu comecei a trabalhar com você. Qual é o problema dela?

               Fernando não respondeu.

- Eu fiz alguma coisa para ela?

- Não...

- Você sabe de alguma coisa?

               Ele continuou em silencio.

- Fernando?

- Nós... Meio que... Já tivemos algo há um tempo atrás.

- O que? – Ela o olhou abismada. – Ela é sua ex?

- Não é bem uma ex, Lety. Nós não tivemos nada sério. Só saímos algumas vezes, e já faz muito tempo. Nós dois concordamos que não levaria à nada.

- Eu não acredito Fernando. Eu realmente não acredito. – Letícia desceu do carro.

- Lety! Espera!

- Quando é que você pretendia me contar? – Ela perguntou revoltada. – Nós já estamos namorando há mais de um mês e eu estou suportando as alfinetadas dessa mulher durante todo esse tempo sem ao menos saber que vocês já tiveram alguma coisa?

- Eu não achei que fosse importante, me desculpe.

- Não achou que fosse importante? Não achou que fosse importante dizer para a sua namorada que você tem uma ex dentro do ambiente de trabalho?

- Ela não é minha ex, Lety!

               Letícia bufou e caminhou afastando-se.

- Aonde você vai?

- Vou a pé!

- Lety!

               Fernando correu em sua direção e a alcançou, parando em sua frente.

- Fernando, sai da minha frente.

- Não. Não vou deixar você sair assim.

- Nós temos uma ocorrência pra resolver. Vai me impedir de trabalhar?

- Se você continuar nervosa assim, vou.

- EU NÃO ESTOU NERVOSA! – Ela praticamente gritou.

- Ei pessoal! – Omar se aproximou animado, mas seu sorriso diminuiu quando percebeu que eles estavam brigando. – Ahm... Nos falamos depois...

- Não! – Fernando disse antes que ele se afastasse. – Fica, Omar. Quero que você diga à Lety sobre a minha relação com a Marcela.

- A Marcela?

- Sim!

- Bom... Vocês saíram algumas vezes um tempo atrás, mas acho que vocês não deram muito certo. Eu não sei, Fernando! Você não me disse muita coisa!

- Viu só? – Fernando olhou para a Lety. – Eu não disse por que sabia que não daria em nada. Agora me diz qual foi a primeira coisa que eu te disse antes de pedir a Letícia em namoro.

- Você quer que eu repita tudo? Você falava dela sem parar.

               Fernando o fuzilou com os olhos.

- Acho que foi algo do tipo que você nunca sentiu isso por ninguém, e sabia que Lety era a mulher certa. Ah, Fernando, por favor! Não me faça repetir isso. Me sinto um idiota.

- Tudo bem, isso já é suficiente. – Fernando voltou a olhar para Letícia. – Viu só?

- Isso não significa nada. – Lety disse cruzando os braços. – A questão não é o que vocês tiveram, e sim que você não me contou nada.

- Eu sei, me desculpe por isso! Eu só não sabia que você era tão ciumenta.

- Ih... – Omar deu um passo atrás.

- Ciumenta? – Letícia o olhou indignada. – Então acha que tudo isso é apenas sobre ciúmes?

- Não foi isso que eu quis dizer...

- Mas você disse! E eu acho melhor você parar de falar porque só está piorando sua situação. E eu não quero que venha atrás de mim! Vou resolver essa ocorrência sozinha!

               Letícia passou por Fernando e ele não teve tempo de ir atrás dessa vez. Omar bateu em seu ombro e riu.

- É... Isso que dá namorar uma policial.

               Fernando não respondeu.

- Você pegou a arma dela?

 

 

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Lety

 

 

- Tudo bem... Temos essa opção, e essa. – Mostrei dois filmes para Fernando. – Qual você quer?

- Hum... O segundo.

- Eu também estava pensando nele. – Sorri animada e segui até o aparelho de DVD.

- Nem acredito que vamos assistir à um filme depois de tanto tempo. – Fernando comentou esticando-se ao sofá.

- Nem eu. – Depois que coloquei o filme me sentei ao lado dele e fui envolvida por um abraço.

               Não me lembrava que Fernando era tão crítico com os filmes que escolhíamos. A cada cinco minutos ele fazia um comentário sobre as atuações, sobre o cenário, sobre as falas e sobre a história. Por mais que parecesse insuportável, eu me divertia com a maneira que ele era observador, ao invés de simplesmente se deliciar com o filme. Na cena final, o casal finalmente ficou junto e tiveram dois filhos, mas ao invés de fazer alguma crítica, Fernando olhou para mim e ficou me encarando por algum tempo.

- O que foi? – Perguntei. – Não vá me dizer que não queria que eles ficassem juntos?

- Não. Não é isso. – Ele riu. – É que eu estava pensando... Agora que eu fui afastado do caso e Rodriguez provavelmente não terá a mesma confiança em mim, nós podemos... Bem... Você sabe...

- Não estou entendendo. – Me ajeitei ao sofá para olhá-lo.

- Você queria que tivéssemos filhos, e eu disse que enquanto estivéssemos trabalhando tanto não seria uma boa idéia.

- Está me dizendo que agora que você foi afastado do caso você quer ter filhos?

               Ele não respondeu.

- Fernando, você não precisa fazer isso para me agradar. Não é como se fosse a compra de um sofá novo que eu tanto queria e você não. Ter filhos é algo sério, e enquanto você não se sentir bem com isso, de nada adianta.

- Mas eu estou me sentindo bem com isso.

- Não, não está. Até ontem você não queria ter filhos, por que de repente quer ter?

- Só estou dizendo que agora é mais fácil, oras.

- Mais fácil... – Bufei. – Sabia que você está piorando cada vez mais a situação?

- E por quê? – Ele perguntou irritado. – Que coisa, Lety! Você quis por tanto tempo que falássemos nesse assunto, e quando eu finalmente concordo você procura mil maneiras de reclamar.

- É porque eu sei que está fazendo isso para me agradar!

- E qual o problema nisso?

- Você quer que tenhamos um filho só para me agradar? Se fosse assim eu teria feito uma inseminação! – Falei irritada. – Eu quero que o meu marido queira ter uma família comigo, e queira isso tanto quanto eu. Não quero que você seja um “ajudante”.

               Me levantei impaciente.

- Lety...

- Eu vou para o quarto. Quero ficar sozinha.

               Deixei Fernando para trás e adentrei o apartamento, indo diretamente para o quarto. Bati a porta com tanta força que a parede ao lado balançou, assim como as molduras que estavam penduradas. Me deitei pesadamente à cama e respirei fundo tentando não deixar que a raiva aumentasse. A cada vez que eu me lembrava da maneira que Fernando tocava naquele assunto, a raiva parecia piorar. Não era assim que as coisas deveriam ser, e eu jamais imaginei que teríamos tantas discussões sobre isso. Afinal, Fernando sempre demonstrou que gostava de crianças. Mas eu não imaginava que ele gostava apenas das crianças dos outros.

 

 

 

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               Letícia não parava de apertar uma mão na outra. Estava tensa, nervosa e ansiosa, e não poderia estar diferente quando estava à caminho da casa dos pais de Fernando para conhecer toda a família. Já estavam namorando há dois meses, mas só então conseguiram uma folga no domingo para que Fernando pudesse apresentá-la pessoalmente, já de tantas vezes que ele falava dela, todos sentiam que já a conhecia há anos.

- Você quer se acalmar? – Fernando perguntou rindo enquanto dirigia.

- Não consigo. E se ninguém gostar de mim?

- Claro que vão gostar, Lety. Eu disse que meus pais são tranqüilos e minha irmã também.

- Você já apresentou outra namorada para eles antes?

- Há muito tempo, quando eu era adolescente. Mas pra que você quer saber isso?

- Quero saber se ela voltou viva de lá.

               Ele gargalhou.

- Claro que sim.

- Então eles gostaram dela?

- Sim.

- Ótimo. Agora fico mais nervosa.

- Por quê?

- Porque eles podem ter gostado tanto dela que podem me odiar. Já viu nos filmes? A sogra diz para a namorada do filho “você nunca será como ela”.

- Lety, você sabe que está imaginando coisas, não é?

- Eu sei. Mas é inevitável.

- Primeiramente, já faz muito tempo que eu levei uma namorada lá, eles nem devem lembrar dela mais. Segundo, eles não vão fazer esse tipo de comparação. Eles não são assim.

               Letícia apenas respirou fundo tentando se tranqüilizar. Durante o restante do caminho eles ficaram em silencio, embora Fernando se divertisse em ver Letícia tão nervosa. Assim que chegaram, Fernando parou o carro de frente à casa dos pais e assim que abriu a porta para Letícia, ela continuou sentada.

- Não vai descer?

- Não. Acho que desisti.

- Então você não quer mais conhecer meus pais?

- Não. Não agora. Estou passando mal...

- Sei. – Ele escorou-se à porta, divertido. – Sabia que isso é injusto, não é? Eu já conheci seus pais.

- E ficou tão nervoso quanto eu.

- Mas eu fui. E percebi que fui bobo por estar tão nervoso. Eles gostaram de mim e me trataram muito bem.

               Letícia suspirou.

- Vamos, Lety. Nem parece que é a mulher mais durona do trabalho.

               Ela riu e finalmente se convenceu, descendo do carro. Fernando lhe deu um carinhoso beijo no rosto e segurou em sua cintura assim que fechou a porta do carro.

- Se eu disser alguma besteira, por favor, me acoberte.

               Fernando gargalhou e os dois caminharam em direção à porta. Ele a abriu e fez sinal para que Letícia entrasse em sua frente, e foi o que ela fez. O nervosismo aumentou ainda mais quando ela admirou a casa, grande e muito bem decorada. Antes que pudessem caminhar pelos cômodos à procura de todos, Lety praticamente trombou com uma mulher que caminhava às pressas sem prestar atenção em nada à sua frente.

- Ah! Desculpe! – Letícia disse rapidamente.

- Vocês chegaram! – Ela abriu um largo sorriso. – Mas que demora! Mamãe está em tempo de ficar louca!

- Márcia, essa é a Lety. Lety, essa é a Márcia, minha irmã.

               Letícia já estava envergonhada o suficiente para conseguir dizer qualquer coisa, então preferiu apenas sorrir. Mas, para sua surpresa, Márcia a puxou para um abraço apertado que a deixou um pouco mais aliviada.

- Como é bom finalmente te conhecer. Fernando fala tanto de você que chega a ser chato, acredite.

               Lety riu.

- Me desculpe por estar com pressa. É que eu estava indo buscar a toalha do Pietro. Ele tomou muito leite e fez um estrago na roupa do papai.

- Onde ele está?

- Estão todos no jardim. É melhor vocês dois irem logo, antes que mamãe tenha um treco de ansiedade.

               Fernando riu.

- Vamos, Lety. Você já conheceu a mais louca da família, agora vai conhecer a parte normal.

               Márcia bateu no ombro de Fernando.

- Não me provoque hoje. Tenho muitos segredos seus que Lety adoraria saber, eu aposto.

- Eu adoraria sim. – Lety riu e Fernando torceu a boca.

- Fique a vontade, Lety. Eu volto em um instante.

- Obrigada.

               Márcia se afastou dos dois e Fernando olhou para Lety.

- Viu só? Eu disse que ela ia gostar de você.

- Não sabia que ela era tão...

- Louca? – Ele riu. – Ela é.

- Legal. – Lety completou.

- Isso também. Agora vamos, minha mãe deve estar tão ansiosa quanto você.

               Os dois adentraram a casa e passaram por uma enorme sala de estar, que tinha uma porta de vidro ao fundo que dava para o jardim. Assim que se aproximaram da porta, Letícia logo notou a família reunida à mesa no jardim. A conversa parecia empolgante e eles davam gargalhadas, mostrando que a harmonia entre eles era das melhores. Fernando abriu a porta e imediatamente todos voltaram sua atenção para eles. A mãe de Fernando foi a primeira a se levantar e caminhar em direção aos dois, antes mesmo que se aproximassem.

- Ah! Graças a Deus chegaram! Pensei que não viriam mais! – Ela parou de frente para Letícia.

- Não demoramos tanto, mamãe. Não precisa exagerar. – Fernando riu. – E essa é a Lety. A Senhora estava ansiosa para conhecê-la...

- Estava mesmo. – Terezinha sorriu olhando para ela. – Queria conhecer quem era a moça que roubou o coração do meu filho.

               Letícia riu envergonhada.

- Ela é tão bonita quanto você falou, Fernando.

- Ela é sim. – Fernando sorriu colocando as mãos no bolso.

- Obrigada. – Letícia sorriu. – É um prazer conhecê-la, Dona...

-Dona não. – Ela riu. – Somos da família. Pode me chamar apenas de Terezinha.

- Tudo bem.

- Venha. Os outros também estão ansiosos para te conhecer.

               Terezinha segurou a mão de Lety e praticamente a arrastou em direção à mesa. O pai de Fernando se levantou e se apresentou à ela e logo depois Otávio, o cunhado de Fernando, que carregava um bebê no colo. Pietro era o sobrinho e afilhado de Fernando, e Lety já o conhecia por Fernando falar tanto nele.

- E esse daqui é o xodó da família. – Terezinha falou sobre Pietro.

- Ele é lindo! – Letícia sorriu enquanto o olhava.

               O bebê pareceu animado em vê-la, e deu um lindo sorriso quando ela o olhou.

- Ele gostou de voce. – Otavio riu. – Quer segurá-lo?

- Ah...Eu... Não sei se sou boa com isso. – Ela sorriu sem jeito.

- Claro que é. É só segurá-lo.

               Otávio rapidamente entregou Pietro para ela, e mesmo sem ter a mínima noção de como segurar um bebê, ela conseguiu fazer a coisa certa. Pietro pareceu gostar de estar em seu colo, e aproveitou para brincar com o colar que havia no pescoço dela. O colar que Fernando lhe deu quando deram o primeiro beijo. Letícia não tinha muita experiência com bebês, mas assim que segurou Pietro e notou que não ela não era tão ruim quanto pensava, pela primeira vez cogitou ela cogitou a idéia de um dia ser mãe.

- Você já apresentou a casa para ela, Fernando? – Terezinha perguntou.

- Não, ainda não.

- Então venha, querida. Vou apresentar à você.

- Claro. – Letícia se preparou para devolver Pietro para Otávio, mas Fernando a surpreendeu ao pegá-lo do colo dela. Ela jamais imaginou que ele pudesse se dar bem com crianças.

               Terezinha novamente a arrastou de volta para casa e lá elas se encontraram com Márcia. Ela acompanhou as duas pelo tour pela casa, e a cada cômodo que apresentavam à Lety, uma história diferente era contada. Ela já se sentia mais leve e aliviada por saber que estava se dando bem com a família de Fernando. A aprovação de sua mãe e sua irmã talvez fosse ainda mais importante, mas pelo visto ela não precisava mais se preocupar com isso.

- E esse daqui é o antigo quarto do Fernando. – Terezinha abriu a porta. – Não tive coragem de desfazê-lo ainda.

- Mamãe ainda acha que vamos voltar pra cá milagrosamente. – Márcia riu.

- Não é isso. Mas e se um dia precisarem?

- A não ser que Lety brigue com Fernando e o coloque para fora de casa, acho que não.

               Letícia riu.

- Não diga isso, Márcia. Vai deixá-la sem jeito.

- Não tem problema. – Letícia sorriu.

- Mamãe, a Lety já deve estar cansada de conhecer a casa. Você bebe alguma coisa, Lety? Nós costumávamos preparar alguns drinks antes do almoço, mas agora que estou amamentando... – Ela suspirou. – Mas se quiser, posso preparar um para você.

- Eu adoraria.

- Não vá embebedá-la, Márcia. Pega leve com os seus drinks. – Terezinha ralhou.

               Márcia revirou os olhos e entrelaçou o braço com Lety.

- Ela está dizendo isso porque eu coloco um pouco mais de vodka no drink dela. – Ela sussurrou para Lety quando as duas caminhavam pelo corredor.

               Letícia não conseguiu conter a gargalhada que ecoou por todo o corredor, assim como a de Márcia. Já estava mais do que óbvio que as duas estavam se dando bem, e enquanto Márcia preparava o famoso drink para Letícia, elas conversavam sobre o relacionamento dos dois.

- Fernando é uma jóia rara, Lety. Acredite. – Márcia comentou enquanto colocava algumas frutas no liquidificador. – Nós sempre fomos muito próximos, e o meu medo sempre foi que ele não encontrasse alguém que o merecesse. Ele é muito bom para as pessoas, e isso sempre me preocupou. Tive medo de que ele se magoasse, sabe?

- Eu imagino. – Letícia escorou-se ao balcão. – E ele já se magoou antes?

- Que eu saiba não. Na verdade Fernando só trouxe uma namorada aqui em casa, e isso faz muitos anos. Eramos novos, acho que por isso não foi para frente. Depois que ficamos adultos ele não trouxe mais ninguém aqui. Fernando sempre foi muito certinho, ele não namoraria alguém que realmente não gostasse.

               Lety sorriu satisfeita.

- E acredite quando eu digo que te conheço melhor do que você pensa. – Márcia riu.

- Por que?

- Ele fala de você o tempo inteiro! Desde quando começaram a sair juntos ele fala sobre você, como você é ótima no trabalho, como você é bonita, como você é divertida. É sempre Letícia pra lá e Letícia pra cá.

- Me desculpe por isso. – Ela riu.

- Mas eu me sinto muito feliz por ele, de verdade. Estou aliviada por ele ter encontrado alguém que saiba valorizá-lo e que faz ele feliz.

- Eu jamais me permitiria magoar ele. Como você disse, ele é raro. Eu nunca me senti tão bem com alguém como me sinto com ele.

- Que lindo! – Márcia a olhou. – Vocês estão mesmo apaixonados, não é?

               Letícia sorriu como resposta.

- Eu sei que faz pouco tempo. Já faz o que? Um mês?

- Dois.

- Dois meses. Não é muito tempo. Mas eu não me espantaria se ele a pedisse em casamento em um ano de namoro.

- Um ano? – Lety riu. – Eu acho que não.

- Por que não?

- Na verdade não falamos muito sobre casamento. Eu nem sei se ele é o tipo que quer se casar.

- Ah, ele é sim. E é do tipo que vai querer ter filhos também.

- Sério?

- Você não falam mesmo sobre isso?

- Bom... Até então nunca tocamos no assunto.

- Vem aqui para eu te mostrar uma coisa...

               Lety se levantou e caminhou até Márcia, parando ao seu lado. Ela olhava através da janela da cozinha de onde conseguiam ver onde o restante da família estava reunida. Fernando conversava animadamente com Otávio, mas o pequeno detalhe que chamou a atenção de Letícia foi que ele ainda carregava Pietro em seu colo, como se já tivesse o costume de fazer isso.

- Eu acho que você ainda não teve a oportunidade de ver o Fernando com alguma criança, não é?

- Na verdade não.

- Ele sempre foi muito carinhoso com Pietro, desde quando ele nasceu. Não escolhemos ele par ser padrinho só porque ele é o meu único irmão. – Ela riu. – Escolhemos porque ele é a pessoa certa para esse papel.

               Lety continuou a admirá-lo através da janela da cozinha e foi inevitável não sorrir enquanto via aquela cena.

- Bom... Mas eu não quero pressionar vocês. – Márcia colocou o drink na taça e o entregou à Lety. – Vocês podem falar sobre isso no tempo certo.

- Obrigada. – Lety pegou a taça e provou o drink. Estava mais forte do que ela esperava, mas não queria dizer isso para Márcia em sua primeira visita à casa. Ela poderia não gostar da crítica.

- E então? O que achou?

- Está ótimo! – Ela forçou um sorriso.

- Que bom que gostou! – Márcia disse animada. – Vamos voltar para o jardim?

- Vamos.

               Quando caminharam em direção ao jardim, Letícia procurou por um lugar onde pudesse descartar aquele drink, do contrário ela ficaria bêbada antes mesmo do almoço. Mas não teve outra alternativa. Teve que tomar o restante da taça, e ainda aceitar uma segunda rodada oferecida por Márcia. Após os drinks e o almoço que foi bastante animado, Letícia ainda se sentia um pouco alterada, mas conseguiu disfarçar bem enquanto estava entre a família. Na hora de ir embora, quando se despediram, Letícia entrou no carro e deu um longo suspiro de alívio. Não tinha falado nenhuma besteira mesmo depois de dois drinks de praticamente álcool puro.

- E então? Está mais calma agora? – Fernando perguntou assim que entrou no carro.

- Estou. – Ela sorriu.

- Estou admirado que você conseguiu tomar dois drinks feitos pela Márcia e não ficou bêbada.

- Seria horrível se eu dissesse que estou um pouco alterada até agora?

               Fernando gargalhou.

- Não. Ela é péssima em fazer drinks. Eu teria dito isso à você, mas você parecia estar gostando. Preferi não dizer nada.

- Eu estava tentando ser agradável.

- Então conseguiu. – Ele sorriu. – Eles te adoraram.

- Eu também gostei de todos, principalmente do Pietro. Ele é uma gracinha.

- Ele é sim. – Fernando girou a chave na ignição.

- Posso te perguntar uma coisa?

- É claro.

- Eu não quero que pense mal de mim, e também não quero que pense que eu estou sendo afobada.

- Eu devo me preocupar? – Ele a olhou.

- Não. Eu só... Queria saber se você... Já pensou em ter filhos algum dia.

               Fernando continuou olhando-a em silencio.

- Mas não estou querendo dizer que nós precisamos... Você sabe. Estamos namorando apenas há dois meses. Eu só queria saber porque nunca tocamos no assunto e... Quer saber? Deixa pra lá. Não precisamos falar disso agora.

               Ele riu e segurou sua mão carinhosamente.

- Sim, eu já pensei em ter filhos um dia. – Respondeu tranquilamente. – É claro... É algo muito sério que precisa ser bem planejado...

- É claro. – Letícia sorriu. – Eu só fiquei curiosa porque... Eu não sabia que você se dava tão bem com crianças. Confesso que fiquei te espionando da janela da cozinha enquanto você segurava o Pietro.

               Fernando sorriu.

- E acho que você leva muito jeito com isso.

- É... Eu não diria que sou expert nisso, mas desde que Pietro nasceu eu sou bastante apegado à ele. Talvez por ser o meu primeiro sobrinho. Se depender da Márcia ainda terei muitos.

               Letícia gargalhou.

- Na verdade... Teremos. Isso também serve à você.

- À mim? Por que?

- Oras... Os meus sobrinhos serão seus também.

- Isso é um pedido de casamento indireto? – Ela riu.

               Fernando sorriu.

- Quem sabe?

 

 

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               Acabei adormecendo enquanto tentava me acalmar. Não percebi as horas passando, e só acordei quando ouvi batidas à porta. Ainda sonolenta, levantei a cabeça do travesseiro mas não estava nem um pouco afim de voltar àquele assunto com Fernando.

- O que é, Fernando? – Perguntei em voz alta.

               A porta se abriu e quando olhei, vi que não era Fernando.

- Oi. – Márcia sorriu. – Posso entrar?

- Márcia! É claro! – Rapidamente me sentei à cama e ela se aproximou, me cumprimentando com um beijo no rosto. – Eu não sabia que você viria.

- Fernando me ligou há alguns minutos e pediu para que eu viesse. – Ela sorriu sentando-se à cama.

- Ele pediu? Por quê?

- Disse que você precisava conversar com alguém.

               Revirei os olhos.

- Estão com algum problema?

- Onde está o Pietro?

- Está com ele. Saíram para tomar um sorvete.

- Ah...

- E não mude de assunto. – Ela me olhou. – O que está acontecendo?

- Não é nada demais. Fernando é um exagerado.

- Então você estava sozinha aqui no quarto por nada? É pior do que eu imaginava. – Ela se levantou. – Eu estou morrendo de fome. Será que não poderíamos preparar alguma coisa?

               Sorri divertida e me levantei.

- Claro. Ainda não tivemos tempo de fazer compras, então temos que procurar algo para fazer.

- Ah, e por falar nisso... O que foi que aconteceu? Não estavam à trabalho em outra cidade?

               Saímos do quarto e caminhamos pelo corredor, seguindo em direção à cozinha.

- Fernando não te contou?

- Não. Na verdade ele só me ligou e pediu para que eu viesse.

- Ele foi afastado do caso.

- O que? Por quê? – Ela me perguntou abismada.

- É uma longa história, e para dizer a verdade nem temos permissão de falar sobre isso. É um caso delicado, e estamos fazendo o possível para não se espalhar, ou as coisas ficarão piores.

- Obrigada por me chamar de fofoqueira.

- Não é isso. – Respondi rindo. – Você sabe... É questão de trabalho.

- Eu sei. Só queria descontrair. – Ela sorriu encostando-se ao balcão.

- Mas de qualquer maneira, ele está um pouco chateado com isso. – Abri o armário procurando alguma coisa. – Sabe como ele gosta do trabalho, e ter recebido um sermão do nosso chefe depois de tantos anos fazendo um ótimo trabalho foi doloroso para ele.

- Eu imagino. Fernando realmente ama o trabalho.

- É...

- Mas se bem o conheço, de certa forma ele está feliz por terem um tempo de folga, não é?

- Acho que sim. – Respondi sem muito animo.

- E o que foi que aconteceu? Vocês brigaram?

- Não exatamente. – Suspirei olhando-a. – É o mesmo assunto de sempre.

- Filhos?

- Sim.

- Ah... – Ela cruzou os braços. – Ele ainda está com aquela besteira de adiar a conversa?

- Não, agora é pior. Ele acha que temos que ter filhos por obrigação.

- Como assim?

- Até ontem ele não queria ter filhos, Márcia. Ele disse que por causa do trabalho e da nossa rotina não seria bom pensarmos nisso agora. E hoje ele já mudou completamente de opinião.

- Talvez ele tenha percebido que prefere ter filhos com você do que se dedicar totalmente ao trabalho.

- Não foi isso. Eu não quero obrigá-lo à nada. Nós somos parceiros acima de tudo, não apenas no trabalho mas também na vida. Se ele não quer uma coisa, eu não vou obrigá-lo a querer, principalmente algo tão sério como ter filhos.

- Mas você não se chateou quando ele disse que não queria por agora?

- Claro que sim. Mas o que eu poderia fazer?

- Eu não estou entendendo... Então você ficou brava por ele não querer ter filhos, mas agora está mais brava ainda por ele querer?

- É esse o problema! Eu não sei se ele quer. A maneira que ele falou soou como: “agora que não tenho que me preocupar tanto com o trabalho, podemos fazer o que você queria”. Não quero que as coisas sejam assim, Márcia.

               Ela continuou me olhando.

- Engraçado... Nunca pensei que Fernando teria esse problema. Ele sempre foi tão apegado ao Pietro, e eles se dão tão bem.

- Eu pensei a mesma coisa. – Suspirei desanimada. – Sabe de uma coisa? Acho que vamos ter que pedir algo para comer. Aqui não tem absolutamente nada.

               Márcia riu e no mesmo instante a porta se abriu. Ouvi a voz de Pietro que conversava animadamente, e logo Fernando se aproximou com ele em seu colo, totalmente sujo de sorvete.

- Acho que o sorvete estava mesmo gostoso, não é? – Márcia riu olhando para os dois.

- Eu juro que tentei que ele não se sujasse... – Fernando sorriu e olhou para mim.

- Tia Lety! – Pietro exclamou animado.

- Oi meu amor. – Me aproximei dos dois. – Que saudade eu estava de você! E como você cresceu!

               Ele riu.

- Por que não dá um beijo de chocolate na tia Lety? – Fernando sugeriu.

- Ah, eu adoraria! – Sorri.

               Pietro se aproximou e me deu um beijo melado enquanto gargalhava.

- Que beijo mais gostoso! – Falei rindo.

- Ah... Eu comprei uma pizza. Achei que estariam com fome. – Fernando falou. – Está em cima da mesa.

- Está vendo por que você é o melhor irmão do mundo? – Márcia disse e nós rimos. – Mas primeiro o mocinho precisa trocar essa roupa e lavar o rosto.

- Pode deixar que eu faço isso. – Falei olhando para Pietro. – Vamos brincar na cama da tia Lety?

- Vamos! – Ele exclamou animado caindo para o meu colo.

- Eu volto logo. – Falei carregando Pietro, saindo da cozinha.

 

 

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Fernando

 

 

               Observei Letícia se afastar enquanto se divertia com Pietro. Ele a adorava, e era notável que ela levava muito jeito com crianças. Eu me sentiria feliz com isso, se a discussão que tivemos horas antes ainda não estivesse me incomodando.

- E então... – Márcia me olhou.

- Vocês conversaram? – Perguntei adentrando a cozinha, pegando os pratos.

- Mais ou menos. Você chegou quando falávamos sobre isso.

- Ela está muito chateada?

- Um pouco. Fernando... O que está acontecendo com você?

               Eu não respondi. Coloquei os pratos sobre o balcão e abri a gaveta pegando os talheres.

- Você já me disse várias vezes que gostaria de ser pai. Por que não disse isso à Lety?

               Continuei em silencio.

- Não vai me responder? Por que pediu para que eu viesse então?

- Para conversar com a Lety, e não para me questionar.

- Não estou questionando, só quero entender o que está acontecendo com você.

- Não está acontecendo nada, Márcia!

- Eu acreditaria, se não te conhecesse tão bem. A Lety acha que voce não quer ter filhos, e eu ainda estou tentando entender o porque.  A ultima vez que conversamos sobre isso você disse que estava empolgado para ter uma família com ela.

- Mas algumas coisas me impedem de fazer isso.

- Tipo o que?

- Tipo o meu trabalho.

- Não acredito, Fernando. – Ela bufou. – Você realmente está mais preocupado com o trabalho do que em ter uma família?

- Não, pelo contrário. – Respondi sem olhá-la. – Olha, Márcia... Você e Letícia podem não entender, mas é um trabalho perigoso. É o tipo de trabalho que nunca sei se voltarei para casa ou não.

- Que horror, Fernando!

- Eu sei que você não gosta que eu fale assim, mas é a verdade. E se Lety e eu trabalhamos nisso juntos, é ainda pior. Olha... Eu não sei se deveria te contar isso, mas aconteceu algo durante essa missão.

               Márcia me olhou curiosa.

- Recebi uma ligação de um falso seqüestro da Lety.

- Ai meu Deus! – Ela levou as mãos à boca.

- Não aconteceu nada com ela, ela estava bem. Mas para resumir a história, eu pensei no pior quando recebi a ligação. E você pode imaginar como fiquei ao pensar que Lety estava correndo perigo?

- Posso imaginar.

- E já pensou como seria ainda maior minha preocupação com Lety grávida? Com os nossos filhos? Seria muito, muito maior Márcia. Eu não ficaria tranqüilo um minuto sequer, pensando que algo pode acontecer à eles.

- Mas Fernando, é a primeira vez que você trabalha em algo tão... Delicado. Vocês normalmente fazem um trabalho mais leve, não é?

- Leve porque estamos acostumados, mas ainda assim é perigoso.

- E você ainda não está preparado para largar sua profissão para ter uma família?

- E como é que terei uma família sem profissão, Márcia?

               Ela não respondeu.

- Olha, eu amo o meu trabalho. E é claro que amo muito mais a Lety. Por mais que vocês duas pensem o contrário, ela é a minha prioridade. Mas é impossível ter uma família sem trabalho, Márcia. Eu sou bom no que faço, modéstia à parte, eu sou muito bom mesmo. Mas não sou bom em outras coisas. Eu não seria bom trabalhando na frente de um computador.

- É, isso seria realmente estranho.

- Eu só queria que a Lety entendesse isso.

- E por que você disse que agora poderiam ter filhos?

- Bom... Basicamente afundei no meu trabalho, não é?

- E não acha que a ofendeu falando dessa maneira? Depois de tudo o que você me disse?

               Respirei fundo.

- Sim, eu sei disso. Não me sinto bem por falar que podemos ter filhos só para agradá-la. Mas eu queria que ela entendesse que o motivo disso não é porque não quero ter uma família com ela, e sim porque me preocupo com isso.

- Eu entendo. – Letícia voltou à cozinha carregando Pietro. – Desculpe, não queria ouvir a conversa, mas você estava falando um pouco mais alto.

               Márcia e eu a olhamos em silencio.

- Olha Fernando, eu realmente não quero obrigá-lo à nada. Eu só gostaria que tivesse sido sincero comigo desde o início. Queria que tivesse dito que você não está pronto para ter filhos porque tem medo o que possa acontecer. Eu teria te entendido melhor.

- Eu sei. Me desculpe.

               Esperei que Lety continuasse o seu sermão, mas para a minha surpresa e alívio, ela sorriu.

- Mamãe! – Pietro caiu para Márcia e ela o pegou no colo.

- Vamos deixar a tia Lety e o padrinho conversarem um pouco e vamos atacar aquela pizza. – Márcia piscou para mim e saiu da cozinha brincando com Pietro.

- Então... – Me aproximei de Lety. – Estamos bem?

- Acho que sim. – Ela sorriu. – Você só precisa me fazer ceder um pouco mais.

- Isso pode ser depois? – A envolvi em um abraço e ela riu.

- Pode.

- Ótimo. – Sorri beijando-a. – Te amo.

- Eu também te amo. Agora por favor, podemos comer? Estou faminta.

               Balancei a cabeça rindo.

 

                                                           -----------------------------------

 

Lety

 

 

               Entrei no quarto e Fernando estava mexendo em seu notebook à cama. Tirei os meus brincos e os coloquei em cima da cômoda, reparando através do espelho que ele estava concentrado demais.

- O que está vendo aí? – Perguntei virando-me para a cama.

- Estou pesquisando sobre Joseph Raider.

- E encontrou alguma coisa?

- Alguns prêmios. Alguns... Muitos. Ele é bastante inteligente.

- Não é de se assustar tratando-se de um homem que construiu sozinho uma arma que destrói metade de uma população. – Me sentei ao lado dele na cama. – Amor... Não fique mais olhando essas coisas. Sabe que só vai ficar pior.

- Eu estou bem. Além do mais, não encontrei nada de mais.

- Então feche esse notebook... – Me aproximei dele, beijando seu rosto. – E se preocupe com algo mais importante... Que tal?

               Fernando lentamente fechou o notebook e virou-se para mim.

- Eu não deveria fazê-la ceder um pouco mais? – Ele me olhou divertido.

- Ah... Você não quer? Tudo bem. – Me afastei de seu rosto e me cobri. – Podemos apenas dormir e...

               Antes de terminar a frase, Fernando virou-se à cama e me abraçou por trás, depositando um beijo carinhoso em meu rosto.

- Já disse que você é linda? – Ele perguntou enquanto beijava meu pescoço.

- Hoje não.

- Você é linda.

               Sorri satisfeita e me virei para ele.

- Finalmente podemos ter uma noite em paz?

- É claro que sim. – Ele sorriu malicioso. – E essa é a melhor parte de ter sido rebaixado do cargo.

- Você não foi rebaixado.

- Mas isso não importa. Só me importa estar com você aqui.

               Fernando me beijou sem me dar um aviso prévio. Eu adorava quando ele ficava daquela maneira, e já imaginava que a noite seria ótima. Ele fazia de tudo um pouco para que eu me sentisse especial, amada e principalmente desejada. A cada toque em meu corpo, à cada beijo delicado em minha pele, eu queria dizer o quanto o amava. Queria dizer o quanto o desejava, e o quanto ele me fazia feliz. À medida que os beijos se aprofundaram, Fernando se inclinou sobre mim e imediatamente senti sua mão tocar em minha coxa. Aos poucos sua mão subiu, e junto à ela, minha camisola também. Meu corpo já estava em chamas, gritando por ele. Minha respiração ficou pesada, minhas mãos já estavam cravadas em seus ombros. Os beijos eram intensos e cheio de gana, e a única vez que houve uma pausa entre eles foi para que Fernando tirasse a sua camisa e a jogasse do outro lado do quarto. Novamente ele me beijou e se encaixou entre minhas pernas, fazendo com que eu fechasse os olhos de prazer.

               Eu estava extasiada. Não precisávamos nos preocupar com o trabalho, não precisávamos nos preocupar se receberíamos uma ocorrência enquanto estivéssemos em nosso momento íntimo. Era apenas Fernando e eu, e todas as vezes que eu me lembrava disso, a excitação aumentava ainda mais. Não precisávamos nos preocupar com Rodriguez. Não precisávamos nos preocupar com uma arma perigosa, não precisávamos nos preocupar com Joseph Raider...

               Fernando terminou de subir a minha camisola enquanto continuava a me beijar intensamente. Eu deveria estar ainda mais excitada naquela altura, mas algo passou em minha cabeça que me fez empurrar Fernando pelos ombros, pausando o beijo.

- O que foi? – Ele perguntou com a respiração ofegante.

- Acabei de me lembrar de uma coisa. – Falei sem reação.

- Agora? Amor... Nós estamos...

- Eu sei. Mas... É... Algo estranho.

               Fernando suspirou e passou a mão em seu rosto, ajoelhando-se em minha frente.

- O que você lembrou?

- Quando chegamos ao hotel, eu estava conversando com o Senhor Joseph, e ele me disse algo...

- Você realmente precisa pensar nisso agora?

- Ele me disse que estava arrependido de criar a arma, e que por sua culpa algo ruim aconteceria naquela cidade.

- Mas isso é verdade, não é? De certa forma ele é culpado. Foi ele quem construiu a arma.

- Não. Fernando, você não percebe? – Me sentei em sua frente. – Ele disse que algo de ruim aconteceria naquela cidade.

- Lety, o que...?

- Você ainda não sabia que a arma não seria usada em Nova Iorque. Até então, achávamos que eles estavam levando-a para lá.

               Fernando me olhou pensativo, até finalmente entender o que eu quis dizer.

- Então ele disse que algo ruim aconteceria na cidade, antes de sabermos que a arma não tinha ido para Nova Iorque?

- Exatamente! Como ele poderia saber, se nós não sabíamos?

- Meu Deus...

               Fernando e eu não tivemos reação por alguns segundos. Finalmente algumas peças estavam se encaixando, e se estivéssemos certos, precisávamos dizer aos outros, ou eles estariam correndo grande perigo. Imediatamente peguei o celular de Fernando sobre a cômoda e entreguei à ele.

- Reserve duas passagens.

- Eu não sei... – Fernando encarou o celular.

- Fernando, isso não é hora para você ficar em dúvida sobre seu emprego.

- Mas eu fui afastado.

- Que se dane!

               Por alguns segundos pensei que Fernando não aceitaria, e eu teria que usar o meu poder de persuasão para que ele aceitasse.

- Então... – Ele ergueu os olhos para mim e sorriu. – Estamos de volta no caso?

- Estamos de volta no caso. – Sorri empolgada.


Notas Finais


E então? O que estão achando?


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