A morena acordou com um barulho em sua porta. Várias batidas, uma atrás da outra, fortes. Penteou os cabelos com as mãos, passou a mão pelo rosto e se levantou, tentando manter uma cara melhor do que a de sono que com certeza carregava. Abriu a porta e deu de cara com sua irmã, a duplicata e o irmão mais velho.
- Regina! Eu achei que você tinha morrido na banheira e alguém tinha vindo buscar o seu rim! Tô te ligando desde às oito da manhã. Você perdeu o café. – Zelena esbravejou.
- Ah, desculpe... Acho que o celular não tocou. Que horas são? Oi...
- Onze e meia. Vai vir almoçar com a gente?
- Hãn, claro. Só vou tomar um banho.
- Vamos esperar você no restaurante do primeiro andar. Não demora, eu tô com fome! – A ruiva de cabelos soltos virou o corredor, sendo seguida pelos outros dois irmãos e deixou Regina em sua privacidade. Ela tomou um banho rápido para acordar e saiu, deixando a bagunça de sua cama para trás. Em menos de vinte minutos já estava adentrando o restaurante e procurava pelos irmãos em alguma mesa. Ao se aproximar deles, abraçou Daniel e Melena, a irmã gêmea de Zelena, totalmente o oposto da irmã desmiolada.
- Oi! Quando vocês chegaram?
- Hoje de manhã. Umas nove e meia o navio atracou no porto e nós entramos. Não consegui vir antes por causa do trabalho. – Daniel beijou a testa de Regina.
- E eu meio que dependia dele pra ir me buscar. Tive que trabalhar no laboratório até tarde ontem.
- Como anda sua pesquisa? – Regina perguntou depois de abraçar a irmã tão ruiva quanto a outra, afinal eram gêmeas univitelinas, embora de personalidades totalmente diferentes. Zelena era extrovertida, adorava a curtição da vida, tivera vários namorados, amava expor seu belo corpo cheio de curvas e avantajado e apesar de ser muito inteligente, odiava estudar. Melena por sua vez era tímida, só teve um namorado na vida, com quem terminara para que pudesse se focar somente nos estudos e em seu sonho de ser uma grande geneticista.
- Muito bem, mas os cálculos não terminam. A experiência com o acelerador de partículas em N14 e N15 para analisar o comportamento das mitocôndrias não deu muito certo, embora, isso tenha aberto nossos olhos para a diferença de...
- Melena, ninguém quer saber. Ninguém te entende. – Zelena bagunçou o cabelo da irmã.
- Desculpa, me empolguei. De modo resumido? Nada deu certo, mas vamos tentar de novo.
- Ah, melhorou! – Daniel riu e fez sinal para um garçom. Escolheram qualquer prato sem muito critério e quando o homem saiu, voltaram a conversar sobre seus assuntos pessoais.
- Já falaram com o advogado da vovó? – Regina perguntou.
- Já, e eu particularmente acho que vovó não gostava muito da gente. Ela pegou pesado nas coisas. – Melena retorceu a cara, e arrumou os óculos em seu rosto. Apesar de não precisar, adorava usar óculos para compor seus looks de cientista moderna.
- O que foi que ela mandou você fazer? Mostra! – A irmã cutucou sua gêmea, querendo ver a carta.
- À vontade. Eu não vou fazer mesmo.
- Ah, não. Nada disso! Daniel e Mel, eu não sei ainda o que vocês vão ter que fazer, mas, desde que isso não coloque em risco a vida de vocês, todos nós vamos jurar conseguir. Não podemos deixar a vaca da Belle ficar com o dinheiro pra ela. Não vamos falhar.
Os três outros irmãos se olharam, apreensivos.
- Não importa se vamos ter que enganar o advogado ou se vamos ter q mudar nossas vidas um pouco. Estou falando sério. Vamos conseguir o dinheiro juntos. Ok? – Ninguém respondeu mas ela insistiu. – Ok?
- Tá bom. – Eles concordaram.
- Vou fingir que disseram esse “tá bom” pra valer. – Ela desdobrou a carta da irmã e passou os olhos no texto que continha quase as mesmas coisas que o seu e o de Regina, até chegar na parte da tarefa de sua irmã, para então ler em voz alta. – “Melena, você é muito neurótica com seu trabalho e seus estudos. Aproveite esse mês de férias para se desligar da universidade – isto é, não aparecer lá nem mesmo para sua pesquisa- e vá viver a vida. Vá a festas, faça loucuras, pule de bungee jump, conheça algumas pessoas novas, fique bêbada, e então, você receberá sua parte.” Isso é brincadeira, né?
Regina gargalhou.
- Eu vou pular dessa droga de navio. Que injusto.
- Ah, não comece com seu drama de novo. Daniel, o que você tem que fazer? – Regina perguntou.
- Vocês se importariam se eu não falasse?
- Um pouco... Você nunca nos conta nada.
- Não é nada pessoal, minhas meninas, mas... não é algo que eu queira contar. Ainda. Talvez, eu acabe contando. Mas não agora. Por favor, não pressionem.
- Não vamos, né, Zelena? – Melena repreendeu a irmã, que já estava prestes a persistir.
- Você vai precisar contar uma hora ou outra.
O garçom se aproximou, acompanhado de outra garçonete que o ajudava a trazer os pratos e bebidas, serviu todos na mesa e se retirou. Enquanto jantavam, Zelena soltou o que havia acontecido com Regina, e os outros dois irmãos ficaram preocupados e quiseram saber o resto da história. A morena recontou a história, dessa vez conseguindo segurar as lágrimas, afinal, já havia contado o acontecido umas duas vezes, e de certo modo, estava calejada com isso, mesmo com a tristeza acometendo-a de novo. O jantar se envolveu em três irmãos tentando consolar a irmã do meio.
- Lembram quando a gente ficava chateado com alguma coisa no colégio? A mamãe sempre nos levava pra tomar sorvete. Eu acho que um bom sorvete lá fora ia fazer muito bem agora.
- Sorvete? Sorvete era pra quando a gente tinha 9 anos, Mel. Vamos tomar alguma coisa forte e gelada.
- Nada de álcool pra mim. Um sorvete não vai te fazer menos adulta, Zel.
- Que tal as duas pararem de implicar e deixarmos Gina escolher? – Daniel disse, enquanto inseria o cartão de crédito na máquina que o maître ofeceria, pagando a conta deles todos.
- Acho que... álcool ia me fazer bem. – Regina deu um sorriso murcho de lado e se levantou, tirando um riso vitorioso de Zelena. Os quatro irmãos então caminharam até o bar do lado de fora, sentaram-se ao balcão e pediram alguns shots, inclusive para Melena.
- Bem, enfim. É por isso que eu não vou conseguir realizar o que vovó pediu, mas vocês podem conseguir. O dinheiro indo pra vocês, tá tudo bem pra mim.
- Não. Nada disso. Vamos dar um jeito. Eu disse pra ela que íamos dar um jeito.
- Gina... – Daniel olhou para o horizonte, pensativo, e ganhou a atenção das irmãs. – Vovó por acaso especificou que você tem que se casar com Ruby? Com todas as letras? Ou ela disse apenas que você tem que se casar com alguém que ama?
- Não disse Ruby, não... – Zelena deu um riso diabólico.
- Então você tem um mês para encontrar alguém que goste. Volte à sua vida de solteira e encontre alguém. Um mês é muito tempo.
- Tá maluco, Daniel?
- Não! Não, ele tá muito certo! Gina, você é linda, inteligente, bem-humorada, bem-sucedida, tudo o que você tem que fazer é voltar à ativa! Qualquer mulher que colocar os olhos em você, vai se apaixonar. Sem contar que você pode aproveitar e fazer aquela vadia de cabelo vermelho que não deve mais ser nomeada pagar a língua quando disse que você não encontrará mais ninguém. E ainda pode conhecer o amor da sua vida. Se nada der certo, você separa. Simples.
- Ah, que simples. Nossa. – Regina sorriu irônica. – Até a parte do separar, por mim, pouco me importa. Só que não é qualquer besteirinha que está em jogo... É meu coração, Zel. E o dessa possível outra pessoa. Além do mais, eu nem me lembro mais como é ser solteira.
- Bem, se quiser, te acompanho na festa dos solteiros amanhã. Tem um aviso no mural dos dormitórios.
- Você não tem que arranjar um emprego? – Daniel interviu.
- Então vai você. – Ela retrucou.
- Não posso. Tenho que resolver a minha tarefa.
- Nem conte comigo. EU não vou nesse tipo de festa. Estou considerando ir numa aula de salsa que vi no quadro de avisos e isso já vai ser muita coisa pra mim.
- Agora eu me surpreendi. – Regina comentou, surpresa, para a irmã, assim como os outros dois.
- Parece que vocês estão tendo problemas, primos. – Os quatro irmãos ouviram a voz reconhecível atrás deles. A mulher que estava sentada ao balcão, de costas para eles e que bebia um suco todo enfeitado virou-se de frente para eles com um sorriso cínico. – Sempre soube que não seriam capazes de dar à nossa avó a felicidade que ela merecia, mesmo que ela preferisse vocês.
- Belle... você estava ouvindo nossa conversa?
- Não só ouvi, como vou ficar de olho em vocês, e garantir que não consigam esse dinheiro. – Ela soltou um suspiro, deu uma piscadela à eles e saiu.
- Eu vou à festa amanhã. – Regina franziu o cenho, retorcendo seu lábio superior com a cicatriz de anos atrás.
- Assim que eu gosto. Dan, pode me ajudar com um currículo qualquer? – Zelena suplicou.
- Claro. Vamos lá pro meu quarto. Aliás, acho que vocês deviam subir também... já é bem mais que uma da manhã. – O irmão mais velho ofereceu a sua mão à Zelena, e colocou seu braço pelo ombro dela, depositando um beijo na testa de Regina e na de Melena. – Boa noite, meninas. – A ruiva que usava o grande decote deu um tchau às irmãs e saiu com o irmão.
- Zelena, se eu te ver mais uma vez com essas roupas escandalosas, eu juro que...
- Ah, pare de ser machista. Você não decide o que eu uso.
- Não, mas o problema não sou eu e muito menos a irmã linda que tenho, o problema são os tarados por aí. Se acontecer alguma coisa com você, Zel, eu não sei o que faço.
- Fofinho. – Ela apertou a bochecha dele e entraram no elevador.
- Ela deve ser tão sozinha, né? – Melena comentou, quando voltava para seu dormitório de braços dados com Regina.
- Quem?
- Belle. Ela vive atormentando a gente. E agora, só por causa desse dinheiro, quer estragar nossos planos. Tipo, não que a gente esteja certo de estar fazendo isso pelo dinheiro, mas ela está muito mais gananciosa com a gente. E olha que nossos minutos de interação foram mínimos. Acho que é porque ela é muito sozinha...
- Acho que ela é mal amada mesmo. A gente sempre incluiu ela nas brincadeiras, ela que gostava de arranjar briga. E não acho que estejamos sendo gananciosos. Vovó nos deixou de herança, e quis fazer uns joguinhos com a gente. É a cara dela.
- Eu sei, mas... não é como se precisássemos do dinheiro, é? Digo, nós não precisamos dar alma e sangue nisso tudo.
- Agora que Belle me provocou, precisamos sim. Ela sempre estraga tudo que planejamos. É questão de honra pra mim. – Regina arrumou o cabelo. – Boa noite, Mel. Cuidado com a maluca da sua irmã.
-Boa noite. Fica bem, tá?
A mais velha deu um sorriso de lado e entrou em seu quarto, enquanto a ruiva caminhou para seu dormitório, que era junto do de Zelena. Eram muito diferentes e adoravam se implicar, mas eram inseparáveis, e no momento que souberam que deveriam subir à bordo do navio C’est La Vie, pediram um quarto duplo.
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