Finalmente era outubro! Finalmente o dia em que eu poderia me encontrar com o Maçã.
Depois que saí do colégio, mal me despedi dos meus amigos e já saí o mais rápido possível com o meu skate rumo à pizzaria, na esperança de acha-lo lá.
- Olá... – dei um sorrisinho ao vê-lo.
- Que bom que você veio. – respondeu também com sorrisinho de canto. – Vim aqui na esperança de que você viesse.
- Eu também. – sorri ao me sentar ao lado dele. Olhei bem para o cabelo, que estava diferente. – Gostei do cabelo.
- Quase desisti do moicano. Mas resolvi deixar até eu passar em alguma faculdade.
O moicano dele estava bem menor, e listrado de verde, azul e amarelo, enquanto que as laterais estavam verdes. Só que, tudo já estava meio desbotado.
- Preciso te mostrar uma coisa. – falei já com ar de riso, abrindo minha mochila. E tirei não só a minha prova de matemática, como a prova dos outros amigos. – Olha a falta que você faz. – disse ao jogar as folhas na mesa. – Se você não nos ajudar com a próxima, podemos ficar de recuperação...
- Então quer dizer que eu faço falta só com isso? – apesar de que ele estivesse zoando, fiquei um tanto abalada. Juntei as provas e guardei na mochila de novo.
- Não. – respondi evitando olhá-lo. – Por que não foi me ver? Você poderia ter dado um jeito de nos falarmos...
- Obrigado por lembrar... Preciso desbloquear você e a Bia. – disse ao pegar o celular.
- Por que você me evitou? – insisti.
- Julie... – ele me olhou sério. – Quando eu tinha a sua idade, eu achava que só porque sou punk eu tinha que agir como um rebelde sem causa. Mas não é bem assim. A luta é contra o sistema, não contra as pessoas.
Esta última frase caiu bem forte dentro de mim. Não de um modo ruim, mas também não aceitei muito bem na hora. Aquilo me mostrou o quanto ele era maduro. E eu acabei me sentindo uma criança.
- Tudo bem que você pode me falar que quem faz o sistema são as pessoas, mas, mesmo assim... Temos pessoas específicas para atacar. – acho que ele esperou que eu respondesse, mas visto que não falei nada, voltou a falar: – Eu não queria contrariar seu pai. Ele é tão legal, cara... Eu quis reconquistar a confiança dele... Ele é todo certinho. Era esperado que tivesse aquela reação, já que rolaram essas coisas com a gente, e a gente nem namora.
- Sim... – concordei desviando o olhar.
- Sabe se hoje já temos ensaio? – perguntou arqueando as sobrancelhas.
- Não sei.
- Ei, não fica chateada comigo. – disse ao passar o braço ao meu redor. E virou meu rosto para ele.
- Eu tô bem, Maçã. Eu só tô me sentindo uma criança perto de você... Com você falando essas coisas.
Ele riu, e fez um carinho na minha bochecha com o polegar. Olhei-o semicerrando os olhos, e ele tirou as mãos de mim.
- O que vamos fazer hoje então? – disse com sorrisinho de canto, se encostando à cadeira.
- Bom, eu não estou a fim de ficar com você.
E eu não estava mesmo. Não tinha clima para isso. O clima ainda estava meio estranho... Por conta daquele mês que ficamos separados.
Já ouvi muita gente falando que geralmente quando um casal fica separado por muito tempo, o reencontro é maravilhoso, e a saudade começa a ser matada no segundo do encontro. E no fim, as coisas não aconteceram como imaginei... Então talvez não gostássemos tanto um do outro como eu tinha pensado durante esse mês que passou...
- Tudo bem. – deu de ombros sem tirar o sorrisinho do rosto.
- Eu não sei o que podemos fazer. A Bia não está aqui para dar uma ideia...
- Por que ela não veio?
- Queria me deixar sozinha com você... – revirei os olhos, e ele riu.
- Quer me ajudar com português? – perguntou arqueando as sobrancelhas.
- Como assim o aluno nota dez está precisando de ajuda? – eu disse zoando.
- Os vestibulares estão se aproximando... E a professora de redação continua me dando entre quinhentos e seiscentos.
- Ok... Posso dar umas dicas.
Nós fomos até a casa dele, e entrei no quarto dele mais uma vez.
Dessa vez ele jogou toda a roupa que estava na escrivaninha em cima do colchão, e ficou sentado na cadeira, enquanto fiquei sentada no colchão, ao lado da pilha de roupas.
Ele me deu algumas redações para ler, e comecei a indicar no que ele poderia começar a melhorar.
Passamos umas duas horas só falando de redações, filosofia e sociologia. E depois que cansamos, comentei que eu queria mudar a cor do meu cabelo. Até porque, o rosa já estava bem desbotado e o meu cabelo tinha crescido, ou seja, a raiz estava um pouquinho grande. Quatro dedos de raiz, para ser mais exata.
Ele disse que tinha tinta colorida para o cabelo ali no quarto dele, e que se eu preferisse, poderia até descolorir a minha raiz se eu quisesse. Mas acabei aceitando só que ele pintasse meu cabelo mesmo. Fiquei com medo de ele descolorir e eu acabar saindo com metade do cabelo que entrei.
Ficamos ouvindo algumas músicas agitadas, enquanto ele pintava meu cabelo de roxo e separava algumas mechas para pintar de azul.
- Sua raiz é meio diferente... – comentou reparando bem na cor dos fios, enquanto passava a tinta no meu cabelo.
- É que meu cabelo é meio diferente. – respondi com ar de riso.
- Que cor é o seu cabelo?
- Ruivo.
- Você é ruiva? – ele disse surpreso.
- Sim. Achei que já tivessem comentado com você, quando começou a sair um pouco com a gente...
- Se falaram, eu não prestei atenção direito.
- Pois é.
Mas o meu ruivo não era laranjinha, nem aquele tom mais puxado para o loiro. Era meio escuro mesmo. Fácil de ser confundido com castanho claro.
Assim que ele terminou, prendeu meu cabelo, e foi lavar as mãos.
Acabei o ajudando por mais quarenta minutos, porque era o tempo que eu tinha que esperar para a tinta fixar no meu cabelo.
Minutos mais tarde eu estava de cabelinho novo e feliz com o resultado.
- Muito obrigada por ter me ajudado com o cabelo. – falei sorrindo, enquanto terminava de enxugar o cabelo de frente para ele.
- Eu que agradeço pela ajuda. – disse sorrindo também. – Viu como faço um bom trabalho?
- Você já é praticamente profissional.
Ele riu.
- Bem, eu vou para casa agora, então. – falei ao me lembrar do horário. – Até porque você precisa ir para o cursinho.
- Sim, é verdade. Então tudo bem. A gente se vê amanhã de novo. – disse sorrindo.
- Sim! E dessa vez estarei com a Bia. – sorri.
- Acho bom. Também estou com saudades dela.
- Bom, eu vou descendo então. – disse me virando.
- Eu abro pra você.
Peguei minhas coisas e descemos juntos.
Não rolou nada além de uma troca de sorrisos e “até logo”.
E, aparentemente, estava tudo bem para mim com as coisas desse jeito.
Aparentemente.
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