"Lembro-me do dia em que nos conhecemos, da forma em que seu jeito me intrigou. O cigarro na sua boca e a estranha sensação que eu tive de que você lia mentes.
Se eu soubesse que te encontraria, teria subido antes no terraço.
— Rafael Lange."
Era mais uma daquelas noites em que eu não conseguia dormir. Meus olhos não conseguiam ficar fechados por muito tempo e eu sempre estava a procura de uma distração ou mais café.
Peguei mais uma xícara cheia do líquido preto e caminhei pelo corredor pensando no que fazer.
Já passava da meia-noite, nenhum dos meus amigos me atenderia, visto que tínhamos um evento no dia seguinte e eu deveria ser o único se arriscando na madrugada com o perigo de se atrasar.
Peguei minha chave e saí do apartamento. Eu precisava de ar puro, então subi até o terraço do prédio.
As meias brancas dariam trabalho para serem lavadas, mas, de qualquer forma, eu não me importava com aquilo no momento.
Caminhei pelo local e assustei-me ao ver uma silhueta sentada no parapeito. As luzes da cidade iluminavam um pouco a tal pessoa.
Conseguia ver que era uma garota. Estava sentada de lado. Um cigarro estava entre seu dedo do meio e o indicador. Ela tinha cabelos curtos e castanhos, mas as pontas eram roxas. Ela vestia um moletom enorme e uma calça jeans. Vans estavam em seus pés.
— Oi. — escutei minha própria voz dizer, tomei um gole do café.
Ela se virou para mim e me olhou por um longo tempo. Sua pele era pálida, pude notar.
— Tudo bem? — perguntei quando percebi lágrimas em seus olhos.
— Ah, patético. — respondeu rindo fraco e secando as lágrimas. Tragou o cigarro e soltou a fumaça aos poucos. Odiava cigarro. — Também odeio. Não sei por que ainda faço isso.
Ela parecia ter lido minha mente. Arregalei os olhos por uns instantes e endiretei meu corpo sentindo-me vulnerável perto dela. Deixei tão claro assim?
A garota jogou o cigarro no chão e pisou, apagando-o.
— Estou acostumada, eu acho. Não é um vício nem nada. — falou, mesmo eu não perguntando.
— Tudo bem? — repeti.
— Não, mas dizem que eu vou ficar bem. Sempre dizem. — virou-se novamente, ficando de costas para mim — É ridículo o quanto as pessoas mentem, né? — não achei que ela quisesse mesmo uma resposta, então assenti, sabendo que ela não veria.
— Por que está sozinha aqui a essa hora? — perguntei.
— Por que você está? — deu uma risada fraca, quase imperceptível — Louco, não? Você também está aqui, então, por que é estranho eu estar?
— Eu não sei. — afirmei e dei um passo a frente.
— Gosto daqui. As estrelas e a lua. O silêncio tranquilizador misturado com os barulhos noturnos. É tudo tão calmo. Nada a ver com a minha vida. Nada a ver comigo.
— Nossa. — murmurei.
Ela girou no parapeito e por um momento eu tive medo de que ela caísse. Suas mãos firmaram-se do lado dela. Seus olhos estavam presos em algo que parecia estar atrás de mim. Não ousei me virar.
— Acho que tenho que ir. — ela pegou impulso e pulou do local anterior. Limpou a roupa e passou por mim. Virei-me na direção que ela seguia.
— Qual seu nome? — perguntei. Ela parou perto da porta que levava até a escada.
— Boa noite, Lange. — resmungou um tanto sarcástica e saiu.
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