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História AmorTemQuatroLetras - Último Adeus


Escrita por: Believe8

Capítulo 32 - Último Adeus


Ravi encarava seu reflexo no espelho, em silêncio. Estava no quarto de Emma, no qual havia dormido na noite anterior, e eles se arrumavam para o enterro de seu pai.

Enterro. A cada vez que pensava nessa palavra, sentia o corpo arrepiar. Até aquele momento, ainda não era real, definitivo, mas ali seria. Seu pai seria sepultado, teria o corpo coberto de terra e pedra, e Ravi nunca mais veria o homem que o havia criado e dado amor por toda a sua vida.

“Amor?” Emma se aproximou dele, os dois se encarando pelo espelho. “Está pronto?”

“Não, mas nunca vou estar.” Ele ajeitou a camisa branca, suspirando.

“Você sabe que eu não vou sair do seu lado, certo?”

“Sei, e isso me conforta muito.” Ravi a abraçou, beijando sua testa.

Ouviram alguém bater na porta e se viraram na direção, vendo Cirilo surgir em roupa social e com a expressão triste.

“Vamos?”

“Vamos.” Concordou Ravi, começando a andar com o apoio da bengala e da namorada. “Tio, meu irmão?”

“O Jaime está com ele, vai arrumar e levar para o cemitério. Seus avós estão com a sua mãe, e a Sara está com a Alicia e a Lara. O Liam vai com a Carmen e o Dan para o cemitério.” Explicou o médico, cansado.

Fazia menos de 24 horas que Davi estava morto, mas o enterro já estava tardio. O costume judeu era muito diferente e bem mais rígido, e exigia que a pessoa fosse sepultada no mesmo dia. Porém, a liberação do corpo, translado do mesmo e de todos do nordeste para São Paulo foi trabalhoso e demorado.

Tão logo puseram os pés em São Paulo, no começo da madrugada, foram todos dormir. Agora, tão logo o dia raiou, a cerimônia fúnebre teria início.

Se dirigiram para o cemitério judaico em silêncio, encontrando os demais ao chegar ali. Isaac e Rebecca os esperavam, os dois abatidos. Abraçaram os netos e a nora em silêncio, todos com os olhos cheios de lágrimas.

“Meninos, vocês sabem que... Nossas tradições são diferentes, correto?” Isaac questionou os netos, que assentiram. “Pela tradição judia, ninguém poderia ver o corpo do Davi mais.”

“O quê?” Se indignou Liam.

“Calma, querido.” Rebecca segurou a mão do neto. “Nós conversamos com nosso rabino, e... Abriremos uma exceção, como toda a vida do seu pai foi. Eu e Isaac não veremos seu pai, mas vocês podem vê-lo, se quiser.”

“Eu não quero.” Avisou Kaue, sério. “Isso é uma violação ao kevod ha'met e eu não farei isso!”

“Hã?” Perguntou Liam, confuso.

“Kevod ha'met é o princípio do respeito aos mortos.” Explicou Isaac, orgulhoso. De todos os netos, o único que havia se mostrado interessado nos costumes judaicos era o caçula, e isso o orgulhava.

“Bom, nós queremos ver ele.” Avisou Sara. “Mãe?”

“Eu vi seu pai antes de virmos embora, filha... E para mim está bom.” Valéria tentou sorrir para a garota. “Vão vocês três.”

“Emma...” Ravi virou para a namorada, que assentiu.

“Eu vou com você, soldadinho.”

“Você quer que eu vá?” Nina perguntou para Liam, que assentiu.

Enzo apenas encarou Sara, que lhe estendeu a mão em silêncio. Os seis então se puseram a caminhar na direção indicada pelo casal mais velho.

Na sala praticamente vazia, apenas um caixão simples no centro. A tampa estava entreaberta, revelando um corpo coberto por lençol. As paredes eram forradas de azulejos brancos, e havia apenas um lavatório e uma bancada no recinto.

Liam e Enzo empurraram mais a tampa, deixando a parte de cima do corpo coberto pelo lençol visível. Ravi estendeu a mão para puxar, mas Sara o impediu.

“Não podemos.”

“Sara...”

“Ravi, não podemos. Nossa fé pode não ser judaica, mas a do nosso pai era, e dos nossos avós e irmão também. E por respeito a eles, devemos obedecer aos rituais.” Lembrou a menina. “E também... Eu quero manter a lembrança do papai aquele dia no hospital.”

“Você quer manter aquilo em mente?”

“Ele vivo, Liam! Vivo, sorrindo, conversando com a gente... Não um cadáver frio e... E...” Mas as lágrimas a impediram de prosseguir, sendo abraçada por Enzo.

“Ela está certa.” Ravi concordou, com o olhar perdido.

“Isso não faz sentido. Por que temos que respeitar o judaísmo, se não somos judeus?” Reclamou Liam.

“Porque seu pai era, amor... Por ele.” Nina acariciou o rosto do namorado. “E sua irmã está certa... Mantenha as boas lembranças e imagens do seu pai! Acho que é sobre isso que se trata esse princípio dos mortos, preservar a lembrança da pessoa quando era viva!”

Ele não concordou, mas aceitou. Ajudou Enzo a empurrar a tampa do caixão, simples, de volta. Observou a Estrela de Davi sobre a madeira, com as iniciais de seu pai embaixo, e suspirou, deixando a sala com os irmãos e amigos.

“Viram?” Perguntou um irritado Kaue.

“Não, não vimos. Não tivemos coragem de quebrar o... Como é o nome mesmo?” Perguntou Sara.

“Kevod ha'met.” Explicou o mais novo, um pouco mais animado. “Fico feliz por isso.”

“Kaue, você que entende... Pode nos explicar mais sobre como é o sepultamento judaico?” Perguntou Luca, curioso.

“Bom, a preparação da pessoa para ser sepultada é uma cerimônia muito importante. Por nosso corpo aloja nossa alma, e por isso deve ser mantido muito limpo. Quando morremos, nossa alma, que estava abrigada em nosso corpo, começa uma separação lenta e dolorosa, que vai acontecendo conforme o corpo se decompõe.”

“Espera, então a alma do papai está presa ao corpo dele?” Se horrorizou Ravi.

“Presa não, ligada! Quando o corpo é sepultado na terra, se desintegra lentamente, e isso é confortante para a alma! A ruptura da ligação entre o corpo e a alma não é imediata, e esse processo de compartilhar as sensações do corpo durante a decomposição é benéfica para a alma!” Apesar de pequeno, o garotinho falava com sabedoria.

“Não sei exatamente o quão benéfico isso pode ser.” Resmungou Enzo, tentando que Sara não o ouvisse.

“Assim que à Chevra Kadisha, que é a Sociedade Funerária judia, pegou o papai e se encarregou de preparar ele, fez os primeiros procedimentos. Os braços foram estirados ao lado do corpo, retiraram todos os adornos, incluindo a aliança, e o cobriram com o lençol que vocês viram.”

“Ele não vai ser enterrado com a aliança dele e da mamãe?” Perguntou Liam, revoltado.

“Enfim... O kevod há’met diz que, ao não vermos a pessoa depois de morta, limitamos sua morte apenas ao aspecto físico. Conservamos assim a memória e a imagem dela quando viva, e assim a pessoa possa alcançar a dimensão espiritual.”

“O que eu te falei lá dentro?” Nina perguntou para o namorado, que ainda estava emburrado.

“E por que o caixão é tão simples? Tão... Pobre?” Perguntou ele, irritado.

“As pessoas vêm do pó e voltam ao pó.” Recitou o mais novo. “Chegamos a esse mundo sem nada, partimos dele da mesma forma. O caixão deve ser simples, o menos dispendioso possível, com a Estrela de Davi e as iniciais do falecido.” Kaue ignorou o irmão. “Agora, o corpo do papai será finalmente preparado para o enterro.”

“E como é isso?”

“Ele vai ser colocado em uma bancada e terá o corpo lavado por álcool, e é um tributo importante. Quando nascemos, somos lavados e ingressamos no mundo físico limpos e espiritualmente puros. Ao partir, mesmo que de maneira simbólica, devemos ser purificados também.” Prosseguiu o caçula. “Então ele vai ser vestido com uma mortalha que cobre todo o corpo, fechando os pés e a cabeça também. Então colocaram uma pedra sobre cada olho, e na boca, para que o papai não venha a questionar sua morte ou encontre com Deus antes do Dia do Juízo Final. E então colocaram o talit por cima da mortalha e fecharam o caixão, que é o que iremos ver... Só o caixão.”

“Caramba...” Suspirou Lara, surpresa com todo o ritual.

“O rabino vai fazer as orações fúnebres em hebraico, e seguirão as tradições.”

E realmente se seguiram. Apesar de não entenderem, Kaue, Isaac e Rebeca foram explicando o passo a passo para os não judeus. Em certo ponto, aconteceu o keriá: os enlutados tiveram um pedaço das roupas rasgados, representando seu coração dilacerado pela perda de Davi. Enquanto isso, era recitada uma benção chamada Baruch Dayan Emet (Bendito Seja o Verdadeiro Juiz), para demonstrar que, apesar da tragédia, a crença em D’us continua inabalável.

Então se dá o sepultamento. O corpo é enterrado diretamente na terra, e todos deixam o cemitério logo depois. Na saída do mesmo, tem que lavar as mãos. Caso a água permaneça cristalina, significa que a pessoa não derramou o sangue do falecido.

“E a lápide? Como é feita?” Perguntou Emma, ao saírem do cemitério.

“Ela será colocada daqui alguns meses, em uma cerimônia chama matzeiva. Nesse dia, cobrimos o túmulo com um pano preto, significando nosso luto. É rezado o kaddishe e então descobrem o túmulo. Assim, é encerrado o período de luto.” Explicou Kaue. “Nós também colocamos pedrinha sobre a sepultura, não só nesse dia mas sempre que viermos visitar a sepultura. É um sinal de que nos resignamos com a morte do papai, e que ele sempre será lembrado e reverenciado.”

“E agora?”

“Agora começa o shivá, Sara... Nossa família deve permanecer em casa, de luto, por sete dias, e receber a visita dos membros da comunidade, enquanto um grupo de dez homens, chamados mínian reza as orações fúnebres.”

“Bobagem.” Resmungou Liam. “tudo isso é bobagem.”

“Liam...” Nina tentou conter o namorado, mas foi Valéria quem o fez.

“Você não é obrigado a isso, filho, nenhum de vocês é. Essa é a forma dos judeus seguirem o luto e a dor, e devemos respeitar. Mas também vamos respeitar a forma que vocês quiserem sentir sua dor.”

“Eu quero ir para a casa da vovó e do vovô, fazer o shivá.” Avisou Kaue.

“Eu vou com vocês, querido. E se seus irmãos quiserem, podem ir conosco.”

“Eu passo, obrigado. Quero ficar um pouco sozinho.” Avisou Liam, se soltando de Nina e saindo andando, diante dos olhares de todos.

“Ele está muito revoltado.” Observou Rebecca, preocupada.

“Mas não adianta ir atrás dele, vó... O Liam tem um temperamento bem difícil, e só dele. Na hora que ele quiser e se sentir confortável, vai estourar e nos dizer o que sente. Enquanto isso... Vamos para a casa de vocês? Temos uma tradição do papai para respeitar.” Pediu Ravi, recebendo um aceno afirmativo dos demais.


Notas Finais


Oi gente, demorei mas voltei! Esse capítulo vai ser muito importante mais para a frente, para o desenvolvimento do Liam. Vocês vão entender mais depois. Tudo o que eu falei tirei desse site http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/index.php?option=com_content&view=article&id=255:enterro-judeu-&catid=40:letra-e
E vocês já compraram Amor aos 16? O eBook está na Amazon e no Kindle Unlimited https://www.amazon.com.br/Amor-aos-16-Waal-Pomps-ebook/dp/B0797JMHFL
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É isso aí, gente... Até o próximo!
Beeeijos de luz!


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