Conforme o sol nascia no oriente, as pequenas luzes inundavam a praia com o amanhecer, espantando as sombras da noite e revelando uma jovem surfista de cabelos castanhos que se estendiam até a altura de seus ombros, seus olhos azuis inundados de lágrimas apenas deixavam claro o quanto o seu peito doía. Uma pequena quantidade de sardas seguiam inundando suas bochechas de um lado a outro, uma prancha de surfe permanecia encravada na areia ao seu lado enquanto a mesma levava uma lata de refrigerante aos seus lábios, um pingente contendo uma concha azul pendia sobre seu pescoço.
Ao longe uma figura se movia pela praia em direção a jovem surfista, seus longos cabelos negros, barba e pele morena deixavam claro que aquele estranho ser já estava habituado a andar pelas praias de Baía Arcádia. Para muitos ele era Samuel, o louco que falava com os animais e trabalhava no ônibus de turismo da ilha. Ele se aproximava da jovem surfista que já não mais conseguia segurar suas lágrimas e as deixava escorrer por seu rosto.
- Quantos anos já fazem, Max? - dizia ao se sentar ao lado dela.
- 6 anos... hoje - um soluço escapava de seus lábios ao se lembrar do raio atingindo o barco de Chloe. - Eu fui uma idiota com ela, Samuel.
Durante os três primeiros meses Max se pôs sair de casa nas primeiras horas da manhã e esperar na praia, até o entardecer. As vezes tendo apenas o pequeno almoço que sua mãe lhe preparava para ela levar consigo, porém conforme os meses se passavam seus pais começavam a ficar preocupados, eles sabiam que Max e Chloe eram melhores amigas e por isso entendiam o quanto sua filha estava sofrendo, mas a escola ja havia voltado, e Max ainda seguia a mesma rotina, acordar, escola, praia e só voltava para casa quando o sol se punha, as vezes até mesmo matando aulas e se recusando a assistir as aulas para ficar mais tempo observando o oceano.
No começo pensaram em levá-la em um psicólogo mas Max se recusava a ir e mesmo a obrigando, ela se recusava a falar. Max não queria ficar tanto tempo longe do mar, não quando Chloe poderia voltar. No fundo de seu coração, bem em seu âmago, ela jurava que Chloe estava viva, era como se conseguisse sentir que a sua melhor amiga estava lá, apenas esperando para voltar. Fora num desses dias, sentada na praia examinando atentamente o oceano que Samuel a encontrou. Max, claro já havia ouvido falar sobre o surfista louco que conversava com animais e dirigia o ônibus de turismo da cidade. Ao vê-lo se aproximar, instintivamente Max recuou mais as próximas palavras de Samuel a fizeram escutar.
- As aves me disseram que está procurando por sua amiga. - Samuel apenas se sentava na areia um pouco distante de Max - Ela esta lá não é? - sem nem ao menos olhar para Max, Samuel apontava para oceano.
- Ela amava o mar. - Max se arrependeu de suas palavras assim que terminou de falar, sentiu seu coração ser expremido por se lembrar de Chloe e de sua paixão por aquela vasta imensidão azul que circulava toda a Arcádia Bay. Sentia como se o universo a estivesse punindo por se lembrar dela, por se lembrar da forma como a tratou.
- Você se sente mais perto dela quando esta aqui. - coçando sua volumosa barba Samuel falava mais para si mesmo que para Max. - Os antigos diziam que quando um espírito voltava para as águas, ficar perto do oceano era como conseguiam se comunicar com aqueles que amavam. - Por um segundo Max ficou vermelha assim que ouviu a palavra amor. Ela sempre se sentiu estranha perto de Chloe mas, nunca descobriu o que era, e agora nunca mais teria a chance de descobrir.
- Gostaria de se sentir mais próxima dela, Max?
Desde aquele dia Max voltou a freqüentar as aulas, e começou a aprender a surfar. Seus pais acreditavam que ela finalmente havia superado a morte de sua melhor amiga, mas a realidade era bem diferente, cada vez que entrava na água, cada vez que sentia o oceano sobre seus braços, a sensação que tinha quando surfava apenas servia para fazê-la se sentir ainda mais perto de Chloe.
- Você acabou de ganhar um campeonato, não deveria estar aqui. -
Ignorando as palavras de Samuel, Max apenas voltava a olhar para o oceano abraçando suas pernas.
- Acha que ela ainda está viva? - sua voz saía monótona e embargada pela tristeza.
- Os antigos diziam, que aqueles que amavam o mar recebiam bençãos dos deuses do oceano, e se transformavam em seus guardiões... Talvez ela ela esteja lá te esperando Max. - Um suspiro escapava dos lábios da jovem surfista enquanto a mesma se perguntava quanto tempo ainda teria para observar o oceano.
No ano passado ela havia terminado os seus estudos e sua mãe já cobrava para que começasse uma faculdade, de preferência bem longe do mar. Max sabia que sua mãe acreditava que o surf era apenas um hobby que havia começado devido a morte de sua melhor amiga, e como ela dizia, estava na hora de sua filha tomar jeito na vida.
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Já fazia um tempo que Chloe tinha feito o cemitério de navios perto de Arcádia Bay, seu esconderijo particular.
Ao invés do que seu pai, o rei, lhe falava, Chloe não acreditava que os seres humanos fossem criaturas perversas e nojentas, que nunca possuiriam compaixão ou amor em suas almas.
Não importava o quanto ouvisse as palavras de seu pai, não podia acreditar que seres que criassem tal beleza, como via nos navios afundados, pudessem ser criaturas tão horríveis como seu pai lhe dizia.
Quando descobriu o cemitério de navios seus olhos brilharam, e um sorriso tomou o seu rosto. Tantos quadros, peças, aparelhos, até mesmo músicas de aparelhos antigos que ela conseguia restaurar em uma caverna com um bolsão de ar a qual guardava suas coisas. Ainda podia se lembrar da primeira vez que concertou uma caixa de música dos humanos, no começo ela só queria ver o que tinha dentro, mas quando a música começou a soar seu coração disparou e um sorriso tomou o seu rosto. Desde aquele dia Chloe começava a tentar concertar tudo o que encontrava que era humano.
Porém dessa vez Chloe não estava atrás de máquinas ou de algum tesouro para sua coleção, não dessa vez, apenas procurando um pouco de paz do inferno que sua vida tinha se tornado. Seu pai havia começado a ficar paranóico com ela. Chloe já não mais poderia sair de casa sem escolta, tinha sempre de estar acompanhada, nunca deveria estar sozinha, na realidade ela só conseguiu esse tempo de solidão para si, porque havia conseguido despistar seu guarda e ninguém mais conhecia seu esconderijo.
Um estrondo ao longe a tirava de seus pensamentos, hoje o mar ficaria agitado. Se deitando sobre o convés do navio, Chloe abria os olhos devagar vendo a superfície do oceano cuja luz do sol logo seria encoberta pelas nuvens de tempestade que se aproximavam.
O mar soava forte e as ondas rugiam acima do oceano, para os humanos não havia uma visão mais aterradora do que estar no meio do oceano e ver as enormes nuvens negras se aproximando trazendo uma previsão de desastre e medo. Mas se você é uma sereia, nada melhor do que dormir no fundo do mar ouvindo a tempestade rugir ao longe na superfície, desde que ficasse longe das correntes marinhas, não teriam com o que se preocupar.
Foi em um desses momentos de relaxamento que Chloe sentiu uma leve perturbação nas águas do oceano, ela ainda era jovem e desde que sua barbatana havia crescido, ela usava o seu sonar para se manter distante dos guardas de seu pai e fugir do palácio sem chamar atenção. Se aproximando mais da superfície Chloe se deparou com algo que até então só havia visto a distância. Um par de pernas que se desbatiam desesperadamente, enquanto o resto de si se segurava com todas as forças na pracha de madeira, rezando para que conseguisse se manter acima da água.
Essa humana que tão desesperadamente lutava por sua vida tinha um nome, Maxine Caufield. Mais cedo naquele mesmo após Samuel deixá-la sozinha, Max viu sua mente ser inundada pelas ordens de sua mãe, cada uma lentamente passou diante de seus olhos. O fato dela nunca antes ter ido assistir a uma de suas competições, a carranca que não fazia, o mínimo esforço para disfarçar quando Max comentava sobre seus amigos surfistas, ou sobre o jeito que ela franzia a testa ao ver Samuel e como muitas vezes ela já havia falado que Samuel era um louco e não gostava que sua filha andasse com esse tipo de gente, e finalmente, abandonar a cidade que ela cresceu, abandonar a única esperança que ela teria de que um dia pudesse reencontrar a sua melhor amiga, aceitar que elas nunca mais se veriam.
Lágrimas escorriam por sua face enquanto o pânico tomava conta de seu corpo, sentia como se uma mão estivesse esmagando cada um de seus órgãos internos. Seu coração parecia ser expremido enquanto a imagem de sua melhor amiga tomava conta de sua mente, tudo que ela mais desejava era furgir para bem longe, e correr para o abraço de Chloe a que tantos anos não sentia.
Em um impulso a mesma se jogava no oceano junto com sua prancha e começava a remar. Ela já não percebia o quanto havia se distanciado da praia, ela não podia olhar, ela não queria olhar, sabia que se olhasse para trás o impulso sumiria e ela voltaria para casa se culpando por ser tão idiota. Mas já era tarde de mais, mesmo que Max olhasse para trás e se arrependesse do que estava fazendo, a correnteza já havia pegado e a levava de encontro ao mar aberto, onde uma tempestade se formava.
Sendo atirada em todas as direções pelas ondas que a arremessavam como se ela fosse um pedaço de pano velho. Não importa o quão ruim os humanos poderiam ser se descobrissem sobre as espécies que se escondem no fundo dos oceanos, Chloe não podia ver alguém morrendo na sua frente e não fazer nada. Nadando o mais rápido que podia, Chloe se pôs a ir em socorro da humana que agora era atirada para longe de sua prancha e começava a fundar.
Sendo arremessada para longe de sua prancha, Max sentia seu corpo sendo atirado de um lado a outro, pelas enormes ondas que agora envolviam todo o seu corpo. Sendo jogada para o fundo do oceano, enquanto sentia seus pulmões começarem a arder pela falta de ar, Max só conseguia se lembrar das palavras de Samuel. "Os antigos surfistas diziam que aqueles que amavam o oceano, eram abençoados pelos deuses do mar e se tornavam guardiões do oceano."
Foi então que sentia alguma coisa batendo em suas costas e a levando, sentindo uma lufada de ar invadir os seus pulmões, Max olhava para o lado tentando ver quem a havia salvado. Sua visão ainda estava embasada pelas águas que faziam seus olhos arderem, ainda com a visão embasada Max não pôde deixar de se surpreender com sua salvadora. Bem diante de seus olhos estava uma Chloe mais velha a arrastando para longe da tempestade.
Seu cabelo estava diferente, seu rosto havia amadurecido mas era ela, isso Max não podia negar. Sendo atingida mais uma vez pelas ondas do oceano, ela sentiu sua consciência começar a pender novamente, logo tudo o que via começava ser envolvido pela escuridão. Logo o desespero a inundou, ela não podia perdê-la, não agora, não depois de tanto tempo.
- Chloe... - foi a única coisa que conseguiu pronunciar antes de desmaiar, nos braços de sua salvadora.
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