História Couchsurfing - Nunca aposte com seus amigos

Raiva.

Tudo o que eu conseguia sentir no momento era raiva.

Sábado, 09:32 min.

E algum infeliz estava tocando incansavelmente a campainha do meu apartamento. Algum infeliz não. Aqueles infelizes. Sehun e Jongin, ­– Kai para os mais próximos – meus melhores amigos do colégio e da faculdade. Como viramos amigos eu não sei.

Os dois eram os dois mais desejados do colégio – e agora os mais desejados da faculdade – enquanto eu sou o nerd esquisitão. Até hoje me olham torto por andar com eles, e muitos dizem que eu estou acabando com a imagem deles, mas ambos batem o pé e dizem que nunca vão me deixar.

E eu agradeço, afinal, eu provavelmente teria passado toda minha vida escolar e até mesmo os anos na faculdade sozinho, se não fosse por eles.

Mas todo o amor que sinto por eles não está consegue conter minha vontade de levantar e matar os dois. Já faz três minutos que eles estão tocando a maldita campainha. Eu acordei desde o primeiro toque já que meu sono não é lá um dos mais pesados. Mas continuei na cama por todo esse tempo na esperança de que eles desistam.

Nota mental: Tirar a campainha.

Quando o barulho irritante da campainha finalmente parou e eu pensei que eles haviam desistido, o meu celular começa a tocar. E eu conhecia bem a música. Era o toque que Kai havia colocado para identificar as suas ligações.

Bufei irritado e decidi acabar logo com aquilo.

Procurei pelos meus óculos na cômoda ao lado da cama e me levantei assim que o encontrei. Coloquei os óculos e ajeitei de forma precária meu cabelo bagunçado e já um tanto quanto sujo. Precisava urgentemente lavar aquilo.

Atravessei o apartamento em passos lentos, não estava muito a fim de receber os dois ali logo de manhã para fazer barulho e bagunça.

Respirei fundo e abri a porta, sendo surpreendido ao ver Kai prensado contra a parede por Sehun, enquanto este deixava alguns selares estalados pelo pescoço do moreno.

Eu sabia que os dois se pegavam, tanto que eles nunca poupavam detalhes sobre o que acontecia. E minha única reação era tapar os ouvidos com as mãos e iniciar uma série de "lá lá lá lá" para abafar as vozes. Mas eu nunca tive a "oportunidade" de ver acontecendo de camarote. Após alguns segundos absorvendo a cena, tomei a atitude mais infantil que consegui pensar no momento.

Dei um chute fraco na bunda de Sehun, fazendo ele se afastar de Kai no susto. Não aguentei e cai na gargalhada ao ver a cara de ambos.

– Vocês me acordaram nove da manhã pra ver essa pegação toda, seus viados? – Perguntei e logo dei espaço para os dois entrarem.

Eu sabia que o apartamento não estava tão organizado. Afinal eu sou um universitário que não tem tempo nem para comer, que vive estudando e mora sozinho.

Meus pais moram no interior, mas como consegui uma bolsa entrar em uma faculdade na capital, meus pais usaram o dinheiro para pagar a faculdade para alugar um apartamento. Ele não era grande, mas era o suficiente para no máximo duas pessoas. Três se espremer um pouquinho.

São dois quartos, um banheiro, uma cozinha, uma sala, uma pequena área de serviço e uma varanda. Nada luxuoso.

Meus pais pagam o aluguel, contra minha vontade devo ressaltar. Já disse milhares de vezes que eu poderia arrumar um emprego de meio período, mas eles batem o pé dizendo que eu devo focar apenas nos estudos. E eu agradeço. Não consigo nem imaginar como seria a minha vida se eu ainda tivesse que trabalhar.

– Não reclama não que é o melhor pornô gay que você iria ver. – Retrucou meu amigo loiro enquanto puxava Kai para dentro do apartamento pela mão.

Fiz uma leve careta que não passou desapercebida por eles.

– Ah, Chanyeol. Nem vem com esse papinho de "sou hétero e curto peitos" que a gente vê você olhando a bunda dos garotos. – Dessa vez a voz de Kai tomou conta do local.

– Nem vem vocês com essa conversa. Já disse que bunda é bunda.

– Tsc. Enrustido. – Sehun  respondeu e logo se jogou no sofá, colocando Kai em seu colo.

– Vamos parar com isso. Viemos aqui pra outra coisa. – Kai mudou o rumo da conversa.

– Espero que seja para avisar que a faculdade explodiu e teremos meses de férias. – Não me levem a mal. Eu adoro estudar, mas aquilo já estava consumindo tanto as minhas forças que nem punheta eu estava conseguindo bater.

Eu não sou um adolescente com os hormônios a flor da pele, mas todo homem tem necessidades. E eu já estava na mão desde que minha última namorada terminou comigo.

–- Que horror, Yoda. – Sehun se meteu na conversa. – Viemos aqui para ver os Doosan Bears acabar com o seu timinho. – E um sorriso provocador tomou conta dos lábios finos.

Ah... A KBO League. Meus amigos torcem para os Doosan Bears e eu para os Samsung Lions. E sempre que chegava a época da final eles vinham até meu apartamento para assistirmos ao jogo juntos. Esse ritual era feito há dois anos desde que nos mudamos para cá. Mas antes nos juntávamos na minha casa e dormíamos todos no chão.

Eles também tinham conseguido uma bolsa na mesma Universidade, mas moravam em outro apartamento. Sim. Eles moravam juntos.

Se eu me sentia excluído? Um pouco. Mas era até melhor ficar em um local diferente para não ter que aguentar as festinhas nos finais de semana.

– E vocês acham mesmo que vão conseguir ganhar? – Ri debochado. – Os Samsung Lions ganharam sete vezes desde 2007. Tirando o título de 1985. E o timinho de vocês já ganharam quantas vezes mesmo? Ah, é. Quatro. – Terminei a provocação e me joguei no outro sofá.

– É o que veremos. Algo me diz que vocês vão se dar muito mal esse ano. – Sehun rebateu a provocação.

– Calma, garotos. – Kai conteu a conversa antes que chegasse em ofensas. – Vamos ser civilizados esse ano. Sem pancadaria. Pensei em algo mais interessante.

– Tipo o que? – Sehun perguntou por nós dois.

– Uma aposta. – Kai respondeu em seguida. – É simples. Se os Samsung Lions ganharem, nós iremos pagar todas as suas despesas com a faculdade por um mês. – Meus olhos brilharam no momento em que ele finalizou a frase. Faculdade era algo que consumia boa parte do dinheiro que meus pais mandavam além do aluguel. Então sobrava muito pouco para minha diversão, como jogos e revistas em quadrinho. Eles iriam pagar pelas refeições e materiais, o que não era nada barato.

Mas não seria um problema já que eles conseguiram trabalhos que pagavam o bastante para universitários. Assim como eu, os pais de Sehun e Kai pagavam o aluguel para o apartamento que eles dividam, mas eles gostavam de ter o próprio dinheiro para gastar com festas e bebidas nos fins de semana.

– Hm... Nada mal. E o que eu vou ter que fazer se por algum milagre os Doosan Bears ganharem?

– Isso é simples. Nós vamos ter o direito de dar uma animadinha nessa sua vida chata. E você não vai poder reclamar.

Ponderei por alguns segundos. Eu não sei o que eles planejam com isso. E pode-se esperar de tudo quando se trata dessa dupla dinâmica. Provavelmente me mandariam para uma boate gay, o que não me parece tão ruim.

– Tudo bem. Eu aceito.

– Ótimo! – Kai levantou do colo de Sehun animado. – Agora vamos limpar esse apartamento porque está imundo. E Chanyeol, vai lavar esse cabelo.

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Era onze e meia quando terminamos a faxina no apartamento. E assim que tudo estava limpo eu fui lavar o cabelo. Kai disse que iria começar a preparar o almoço com Sehun e sinceramente? Não queria nem imaginar o que eles fizeram enquanto eu tomava um de meus longos banhos.

Depois de comermos a comida deliciosa que Kai havia preparado – Já que de acordo com o moreno, o loiro só tinha atrapalhado – decidimos ir ao mercado comprar aperitivos e bebidas para o jogo que começaria as 17h00min.  

A tarde foi divertida. Brincamos e jogamos até o horário do jogo.

E agora estávamos os três em frente à televisão. O jogo estava em seus minutos finais. Os Doosan Bears estavam na frente por alguns pontos, mas nada impossível para os Samsung Lions alcançarem.

Sehun e Kai gritavam com a TV, como se aquilo fosse mudar o resultado. Mas eu não podia falar muito, pois estava fazendo o mesmo.

As latinhas de cerveja na mesa eram o motivo de nossa fala embolada e de toda a empolgação. Não tínhamos bebido muito, apenas o suficiente para ficarmos um pouco mais “alegres”.

E foi quando o último segundo de jogo chegou, percebi que estava perdido.

Doosan Bears haviam vencido.

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Acordei sentindo meu corpo todo dolorido. Eu estava jogado no sofá apenas com uma calça de moletom. A blusa que eu estava usando estava no outro sofá e a sala estava de cabeça para baixo.

Era possível encontrar latas de cerveja e garrafas de soju pelo chão e pela mesa, junto de algumas embalagens de salgadinhos.

Minha cabeça doía mais que meu corpo e a claridade era um incomodo enorme, típico de uma ressaca. As noites de jogos sempre acabavam assim. O que restava agora era descobrir onde Sehun e Jongin estavam.

Na última vez que isso aconteceu, encontrei Sehun dormindo em cima da bancada da cozinha e Kai no banheiro. E eles afirmavam que não sabiam como iam parar nesses lugares estranhos.

Desisti de procurar meus óculos pela bagunça, eu não precisava deles no apartamento já que conhecia bem o local, mas a miopia ainda deixava tudo levemente embaçado.

Abri a porta do meu quarto e forcei a vista.

Por um acaso aquilo era... A bunda do Sehun?

– CARALHO! NA MINHA CAMA? – Sim, eu gritei. Vocês sabem o quão desconfortável é saber que outras pessoas transaram na sua cama? Mesmo sendo meus melhores amigos, aquilo era nojento.

Com sorte os dois acordaram com meu grito. Kai se enrolou no lençol e caiu da cama. Diferente de Sehun que apenas me olhou feio e cobriu o rosto com o travesseiro.

Ah. Esse loiro maldito só pode estar querendo morrer.

E foi assim que começou mais uma manhã normal com meus melhores amigos.

Eu tentando socar a roupa de Sehun em sua goela e Kai tentando me segurar, pois eu iria sim quebrar Sehun na porrada.

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Logo após a confusão no quarto, decidimos primeiro nos arrumarmos. Eu tomei banho primeiro e Sehun e Kai logo depois. A essa altura do campeonato eu nem ligava mais se eles iriam fazer algo no chuveiro, apenas continuei tirando todo o lixo da sala, encontrando meus óculos dentro de um pacotinho vazio de salgadinho.

Após o banho dos dois pombinhos, Kai explicou que eles não haviam transado na minha cama, pois ele garantia que não estava sentindo dor no seu... Bem, em seu traseiro. O que comprovava que não havia acontecido nada já que de acordo com ele “o pau do Sehun é capaz de fazer um estrago.” Uma informação totalmente inútil, aliás.

Após ajeitarmos a sala procuramos algo para comer. Já era meio dia e nós três estávamos famintos. Por sorte no dia anterior nos lembramos de comprar algo para o almoço, o que rendeu uma refeição completa feita por Kai.

E foi enquanto nós almoçávamos que Sehun se lembrou de algo importante.

A aposta.

No mesmo momento eu parei de comer e encarei os dois. Eu tinha sim certo receio do que eles iriam planejar. Poderia ser algo pior que algumas horas em uma boate gay.

Quando um sorriso brotou nos lábios de Kai eu senti que aquilo não iria prestar.

– Chanyeol, já ouviu falar do Couchsurfing?

E foi a risada de Sehun que confirmou o que eu mais temia: Eu estava fodido.