Ela corria.
Talvez não rápido o suficiente, mas eu podia ouvir as batidas frenéticas do seu coração enquanto tentava manter-se viva. Seus pulmões imploravam por ar, suas pernas suplicavam por um descanso e seu corpo almejava à todo custo, viver.
Tentando ignorar a dor intensa causada pelos cortes profundos nos pés, ela tentava desviar-se dos galhos secos da floresta que a espetavam, fazendo ela mancar e seu corpo tornar-se cada segundo mais lento.
Ela estava ofegante. Seu coração pulsava a 160 batimentos por minuto. Eu podia ouvir os jatos de sangue que suas artérias bombeavam para o resto de seu corpo, tentando à todo custo manter-se em movimento.
Era uma corrida pela sobrevivência.
Ela ainda não sabia que por mais que corresse eu estaria a esperando logo à frente, na linha de chegada. Enquanto corria a garota olhava à todo tempo para trás, apavorada e sozinha tentava manter-se o mais longe possível da cabana escura, desviando-se dos galhos e procurando por minha presença.
Ela tinha a pequena ilusão de ter despistado o demônio louro que a seguia.
Eu podia ouvir sua respiração descompensada, podia sentir o desespero que percorria cada centímetro de pele e que a obrigava a sussurrar baixinho, implorando ajuda à Deus. Pobre garota. Mal sabia o quanto o seu deus costumava falhar com as garotas que tentavam escapar da velha cabana de madeira.
Eu podia sentir o quanto seu limite estava próximo.
Afoita, a garota procurava com os olhos algum lugar para se esconder. Ela não sabia que eu já estava à sua espera logo à frente, com uma faca enferrujada nas mãos.
Não tinha como fugir, não havia como se esconder, e, naquela parte mais afastada da floresta eu duvido que alguém ouviria o seu grito de misericórdia quando eu rasgasse a sua primeira peça de roupa.
Ela gritava alto, debatia-se em meio às minhas mãos ágeis que seguravam fortemente seu pescoço enquanto eu deslumbrava o pânico nos olhos e seu corpo fraco e desidratado.
Ela clamava por socorro, mesmo sem saber que aquele era o meu som preferido.
Ponto de Vista Elisa:
"A polícia local afirma que mais uma vítima foi encontrada e possuía o mesmo corte na região do rosto. Só nesta semana foram encontrados três corpos e todos possuíam as mesmas características. Todas elas eram mulheres, com menos de vinte anos e todas elas com cortes profundos espalhados pelo corpo. A polícia ainda não localizou o suspeito e ainda não possui nenhuma pista sobre quem é esse homem.
Nossas condolências à família e lamentamos informar que infelizmente mais uma garota entrou para a lista do "Maníaco da Califórnia", qualquer informação voltamos ao vivo diretamente da Califór..."
Olhei mais uma vez o relógio de canto da sala e o mesmo apontava ser incríveis três horas da madrugada. Amanhã teria aula e eu ainda estava aqui, sem sono e assistindo o jornal que passava durante o intervalo da série.
Aquele tipo de notícia nunca me agradou muito e eu resolvi desligar a televisão. O sono já havia dado sinais claros de que estava ali e após ouvir esse tipo de notícia, percebi que aquele era o momento perfeito para ir dormir.
[...]
Já se passavam das sete horas da manhã. O sol já adentrava as cortinas brancas do meu quarto e me causava uma certa irritação nos olhos. Meu despertador havia tocado a alguns minutos atrás e eu o desliguei na esperança de dormir por mais alguns instantes, se não fosse por meu pai, que chamava meu nome incansavelmente no andar de baixo. Eu podia ouvir sua voz ser abafada pela porta e em um ato de rendição me levantei e só conseguir responder um "tô descendo", que acredito ter sido ouvido, já que ele não pronunciou mais.
Droga! Eu estava realmente atrasada!
O relógio apontava sete e vinte e seis da manhã e as aulas começavam exatamente às oito. Me levantei rapidamente tirando todas aquelas cobertas de cima de mim e por sorte, meu pai já havia separado minhas roupas em cima da penteadeira.
Ele sabia que iria me atrasar.
Entrei rapidamente no box tirando o pijama listrado e senti a água quente percorrer por todo meu corpo, me trazendo a incrível sensação de leveza. Tomei um banho apressado e vesti a roupa que estava separada. A camiseta do colégio, uma calça jeans de lavagem escura e o vans surrado preto que ganhei no meu último aniversário, o de dezessete anos. Fiz um delineado nos olhos, passei um lip tint nos lábios, penteei meus longos cabelos ruivos, prendi em um coque bagunçado e me ohei no espelho. Estava exatamente como sempre.
Desci as escadas apressada e à alguns metros vi papai na cozinha correndo de um lado pra o outro e dizendo coisas que não conseguia entender. Desviei o olhar e vi Nicholas, meu irmão mais novo de três anos que permanecia entrertido em algo que fazia parte do cereal. Dei-lhe um beijo estalado nas bochechas e ele sorriu. Noah, meu irmão mais velho, saiu da sala me dando um leve tapa na cabeça como cumprimento.
- Bom dia pra você também, Noah.
- Vamos filha, você está atrasada. - ouvi papai dizer e retirei Nick da cadeirinha de alimentação.
Respirei fundo e caminhei lentamente até a garagem dos fundos, ali começava mais um dia.
[...]
Ao avistar os portões serem fechados me despedi rapidamente de papai e me dirigi ao portão de entrada, correndo o mais rápido que minhas pernas me permitiram, mas tive o azar de tropeçar em algo que não consegui ver, pois Shawn tratou de ser mais ágil, me segurando em seus braços grandes e largos.
Shawn Mendes era um garoto moreno dono de um belo par de olhos cor de mel, que tinha um sorriso encantador. Ele era capitão do time de basquete da escola e por isso estava o tempo todo ao meu redor, esperando apenas um sinal de rendição.
Apesar de atraente, Shawn era um garoto como todo típico capitão do time que achava que todas as meninas deviam se deitar aos seus pés... algo que ele sabia que comigo não era bem assim.
- Calma aí, calma aí princesa... Onde vai com tanta pressa? - Shawn me segurou com os braços e evitou que eu caísse de cara no chão.
- Pô Mendes, você não perde uma, né? - eu sorri pra ele, enquanto retomava a postura. - Valeu por me segurar, mas agora eu preciso ir.
- Você sabe como é, né? Eu não posso deixar essas oportunidades passarem. - ele riu, debochado.
Revirei os olhos e sai dali apressada, avistando Mayla Shelton - minha melhor amiga - encostada no muro do pátio, me esperando para entrar.
- Bom dia garota que sorri do nada. Encontrou com o Shawn denovo? - ela riu, fazendo minhas bochechas corarem.
- Sai daqui, Mayla. - eu empurrei ela e sorri. - Aquele garoto não dá sossego!
- Eu e as meninas do time apostamos que até o baile de máscaras vocês dois se pegam! Quero as cinquenta pratas, então colabora comigo e pega ele logo!
- Não pira, maluca! - eu fiz uma falsa cara de nojo. - O Shawn com certeza tá fora da lista das boquinhas que eu quero beijar esse ano.
[...]
O sinal bateu, apontando o início das aulas.
A primeira aula estava exaustiva e eu não conseguia me concentrar em absolutamente nada do que o sr. Potter falava. Várias lembranças vinham á tona e eu viajei em meus próprios delírios. Pensei na minha mãe - que nos abandonou a mais de três anos para fugir com o amante rico - e no quanto ela era linda. Lembrei de todas as noites que me contava uma história antes de dormir, de como seus cabelos eram ruivos como o meu e de como eu adorava dormir ouvindo o som da sua voz.
Penso nas vezes que precisei dela e ela não estava lá. Nos últimos três anos tenho guardado muitas coisas pra mim e tive que aprender muitas coisas sozinha.
Preciso tirar tudo isso dos meus pensamentos e preciso afastar as lembranças que me fazem tão mal.
Sutilmente pedi licença para me ausentar da aula e fui jogar uma água no rosto e me recompor das dolorosas memórias. Entrei no banheiro feminino, lavei o rosto, refiz minha maquiagem e sai de lá caminhando em passos lentos e com pensamentos longes, mas repentinamente algo me trouxe à tona novamente.
Senti um impacto forte contra meu corpo e fui ao chão no mesmo instante, sem conseguir tempo para assimilar o que aconteceu.
Um impulso de raiva correu por entre meu corpo e eu senti as veias do meu rosto saltarem pra fora quando gritei com o garoto que caiu ao meu lado.
- Caralho, meu! Está com os olhos enfiados aonde? - não obtive respostas. - Além de cego você também é surdo? Eu tô falando com você! - eu me levantei, passando as mãos na camiseta branca que agora estava suja.
O garoto que estava de capuz e virado de costas pra mim, virou-se.
- Prazer, Bieber. Justin Bieber.
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