As horas foram passando e a cada segundo a dor que sentia sem notícias de Luan me sufocava um pouco mais. Eu já não tinha mais unhas e nem ao menos as lágrimas caiam mais, estava devastada por dentro, completamente dolorida e machucada. Eu daria qualquer coisa para poder consertar aquela situação, faria qualquer coisa que Luan quisesse, e acataria qualquer decisão que ele tomasse, mesmo que ela me matasse por dentro. Não sei quanto tempo passei lembrando de Luan, de como havíamos nos conhecido e de todas as coisas que havíamos passado. Coisas que pareciam ter acontecido há tanto tempo, mas que se mantinham intactas na minha memória, a onde sempre ficariam.
Foi só quando Fábio retornou ao hospital que eu percebi que já havia amanhecido. Me perguntou como estava Luan, e eu apenas disse que não tinha notícias. Aparentemente ele tinha descoberto que atropelou um astro nacional e parecia um tanto desesperado, mas se manteve quieto. Eu me perguntava constantemente porque o Sr. Amarildo ainda não havia voltado, se esqueceu ou se as notícias não seriam boas. Mas a cratera no meu peito parecia me devorar toda vez que eu pensava no pior, e rapidamente eu afastava os pensamentos. Perder Luan, perder seu sorriso, sua voz e a sua alegria contagiante mesmo a distância, não era algo que eu conseguiria lidar nem em pensamentos.
Peguei meu celular a procura de alguma coisa para me distrair e encontrei três novas mensagens que provavelmente não havia escutado chegar. Duas delas era de Guilherme, e diziam: “Não vai vir para a escola?” e “Passou no jornal que houve alguma coisa com o Luan Santana, tá sabendo?” e uma era da Cristina, que dizia: “Meu Deus Luiza, é verdade que o Luan sofreu acidente?”. Fiquei me perguntando como haviam descoberto em tão pouco tempo, mas me lembrei que as notícias correm, e notícia ruim voa. Não estava com cabeça para respondê-las, apenas escrevi uma mensagem para minha mãe, caso ela não me encontrasse em casa e ficasse preocupada.
“Mãe, estou com um amigo no hospital, mas estou bem, não se preocupe.” E desliguei o celular, pois não havia ninguém que eu quisesse falar além de Luan, e eu sabia que ele não iria me ligar.
Estava tentando lidar com a dor que me consumia naquele momento em pensar o quanto sofrimento estava causando aos fãs de Luan, a toda a família Luan Santana, do qual eu tinha tanto orgulho de fazer parte, mas os pensamentos de que tudo poderia ter sido diferente invadiam a minha mente constantemente. Pensava em como seria se eu não tivesse conhecido Luan, se nossas vidas não tivessem se cruzado naquele dia.
Eu sei que ainda estaria atrás dele, atrás daquele abraço que eu tanto sonhava. Talvez um dia o conseguisse, entrasse em seu camarim e o visse sorrindo para mim, talvez o dissesse algumas poucas palavras, um “eu te amo” sussurrado, antes de dar-lhe um último abraço e ir embora. Apenas virar as costas e sair sem atrapalhar toda a sua vida, mas ainda assim sabendo que aquele seria o melhor momento da minha. Exceto pelos últimos acontecimentos, eu não me arrependia de absolutamente nada dos lindos momentos que havia passado ao lado de Luan, mas talvez a vida dele fosse muito mais feliz se eu não tivesse aparecido, e pensar nisso me corroía por dentro.
Ainda estava dispersa, sentada displicentemente na mesma poltrona e roendo as unhas que já não tinha mais, quando o pai de Luan apareceu dizendo que a cirurgia havia sido um sucesso e que ele já estava fora de perigo. Nada conseguiria descrever a felicidade e o alívio que percorreu por todas as minhas veias. Sentia que finalmente podia voltar a respirar e lágrimas caíram involuntariamente pelo meu rosto. A única coisa que conseguia fazer era agradecer a Deus por ter cuidado e protegido o meu anjo, o meu menino e tivesse impedido que seu sorriso se apagasse para sempre.
Ele novamente me disse para ir para casa e descansar, pois, Luan estava dormindo e talvez demorasse muito para acordar e mais uma vez eu recusei, eu esperaria o tempo que fosse, eu só queria vê-lo e ter a certeza de que ele estava bem, para que o buraco no meu peito parasse de doer um pouco que fosse. Sr. Amarildo conversou alguns minutos com o motorista do carro que atropelou Luan, que ainda estava sentado quieto ao meu lado, mas não pude ouvir o que eles falavam, pois me levantei para beber água, minha boca estava seca pelo tanto que havia chorado.
Quando voltei, ele já estava saindo e apenas me deu um meio sorriso quando sentei novamente na poltrona. As horas foram passando sem que eu tivesse conhecimentos delas, apenas as sentia cada vez mais pesadas, cada vez mais cansativas. Fabio havia ido embora dizendo que teria que sair, mas voltava depois para saber notícias. Encostei a cabeça na poltrona e fechei os olhos, deixando meu pensamento vagar até Luan, eu sentia a dor ali ainda presente, mas a única coisa que me confortava era pensar que naquele momento ele estaria dormindo, talvez sonhando, longe de qualquer perigo e de qualquer coisa que pudesse machucá-lo, incluindo a mim.
Não conseguia sequer me perdoar pelo que havia feito, eu estava perdendo parte do meu coração e não conseguia aceitar, eu estava sufocando, quis ficar sozinha, queria conseguir pensar, mas acabei estragando tudo e machucando a pessoa que mais amava na vida. É claro que eu deveria ter previsto que Luan iria atrás de mim, mas no fundo eu sabia que ele fora em minha direção apenas para me fazer entender e não por ter mudado de ideia, e isso me doía.
Como o movimento no hospital havia aumentado, eu não estranhei quando percebi alguém sentar na poltrona ao meu lado e continuei com os olhos fechados.
— Com licença. – Ouvi uma voz desconhecida falar e abri os olhos para ver quem era. Um homem gordo em um terno surrado estava me encarando. – Você é testemunha ocular do acidente envolvendo o cantor Luan Santana, certo? – Ele perguntou ao revirar alguns papeis em uma maleta que estava carregando. Eu assenti com a cabeça sem entender nada. – E qual é o seu nome?
— Luiza Villar.
— Eu sou o policial Azevedo.
— Policial? Por quê? – Perguntei assustada. – Foi um acidente.
— Foi um atropelamento, só vamos investigar. – É claro que um acidente com o maior fenômeno da música brasileira teria certo tipo de atenção, e a repercussão que poderia causar me dava medo. – Você tem quantos anos?
— Dezessete. – Eu achava que policiais sempre usassem fardas, e era estranho ter que falar com um.
— Vou te fazer algumas perguntas, está bem? – Eu concordei enquanto ele pegava um pequeno gravador.
Ele me fez algumas perguntas e eu expliquei o que havia acontecido naquela noite, tomando o máximo de cuidado para esconder minha relação com Luan. Parecia ter elaborado cada uma com antecedência e eu não estava nem um pouco a vontade de responder nenhuma delas. Mas passado algum tempo ele pareceu satisfeito. Disse que era só aquilo por enquanto, mas se precisasse voltaria a me procurar. Assim que ele saiu eu voltei a encostar a cabeça na poltrona e fechar os olhos, tudo ficava mais fácil na minha imaginação, quando eu sonhava acordada com Luan sorrindo e cantando em cima de um palco, como ele gostava tanto de fazer.
As horas foram passando sem que o pai de Luan voltasse para me dizer qualquer coisa sobre ele. Eu já não aguentava mais ficar ali sentada, por mais que andasse para lá e para cá, aquele lugar era sufocante. Não queria me afastar dali por medo de que o Sr. Amarildo aparecesse, mas resolvi arriscar ainda assim. Havia outra moça na recepção e ela parecia mais simpática, pedi por favor a ela para que me avisasse caso um senhor de camiseta amarela e casaco preto aparecesse ali e ela me garantiu que avisaria.
Eu sabia a onde queria ir, mas não sabia como chegar até lá. Pedi ajuda para uma enfermeira que estava passando, que me indicou o caminho. E após andar alguns corredores eu finalmente a vi, tão linda e majestosa quanto eu imaginava ser. O lugar a onde cada parte de mim ansiava desesperadamente. Muito mais que apenas um lugar, um lar, mas principalmente um refúgio de paz.
A igreja do hospital era pequena e aconchegante, havia poucos bancos, um altar, vasinhos de flores e vidros coloridos nas janelas. Não havia ninguém ali, então entrei devagar, admirando a capela antes de me ajoelhar atrás de um dos bancos. Uma grande cruz estava pendurada na parede e foi para ela que eu direcionei o meu olhar. Apoiei o cotovelo sobre o banco e o queixo sobre as mãos, e fiquei apenas olhando-a. Não sabia por onde começar, mas o que realmente queria era agradecer, agradecer a Deus por ter protegido e cuidado de Luan. Eu não me via no direito de pedir mais absolutamente nada, mas se tivesse o direito de fazer um último pedido, seria que o sorriso de Luan nunca se apagasse.
Fechei os olhos e tentei falar tudo que eu queria, mas poucas palavras saíram e nenhuma conseguia expressar tudo aquilo que queria dizer. Olhei em volta e notei uma caixinha de pedidos no canto da capela, lá havia pedaços de papeis e canetas. Me levantei e fui até lá, pegando-os e voltando a me sentar. No fundo eu sabia que mesmo se não falasse, Deus poderia me entender. Mas eu queria poder falar, poder dizer tudo que sentia, e sempre fui melhor com as palavras escritas do que as pronunciadas. Pensei muito sobre o que escreveria e conclui que talvez nenhum começo fosse bom o suficiente, mas algo dentro de mim me pediria para tentar.
Querido Deus… Comecei e parei por alguns segundos, respirei fundo e só então continuei. Por todas as noites eu tenho pedido muitas coisas para o senhor, mas hoje eu gostaria apenas de agradecer. Agradecer por tudo que tens feito na minha vida, mas agradecer principalmente por ter colocado no meu caminho um anjo tão especial.
Lembra do Luan Rafael? Aquele anjo que o senhor enviou a Terra para levar alegria a todos a sua volta. Ele está cumprindo a sua missão. Está distribuindo a felicidade, arrancando sorrisos, curando corações feridos e principalmente transformando vidas. Ele leva luz para onde era escuridão, colore o que era preto e branco e é capaz de dar vida a qualquer coisa. Mas eu sei que toda essa áurea incandescente, essa personalidade espetacular e esse sorriso encantador, se deve ao senhor. Eu sei que desde o início o senhor soube quanta importância ele teria no mundo e quantas vidas ele mudaria. Isso é o que os anjos fazem, não é? Transformam tudo que é sombra em raios solares.
A única coisa que queria fazer era agradecer por tê-lo colocado em meu caminho, por ter cruzado o meu destino com o dele e ter me dado a chance de encontrar um motivo para ser feliz. Obrigada por ter me dado o seu sorriso para me fazer sorrir, os seus olhos para que eu possa encontrar neles um refúgio quando tudo parecer desmoronar. Obrigada por ter me dado a sua voz para aquecer meu coração quando tudo aqui dentro for frio, quando faltar carinho, quando faltar aquele abraço tão desejado e principalmente quando faltar a esperança e a força para seguir em frente. Obrigada por ter me dado a sua fé e a sua determinação para me servir como exemplo toda vez que eu pensar em desistir, quando os problemas parecerem pesados demais para que eu consiga carregar.
E quero agradecer principalmente por tê-lo trazido ao mundo e tê-lo tornado o meu anjo. Agradecer por todas as vezes em que o senhor o protegeu de todo mal que pudesse atingi-lo, de todas as vezes que segurou a sua mão para que ele não pudesse cair, ou quando o levantou depois de uma grande queda, tornando-o ainda mais forte. Por todas as vezes que ele deve ter olhado para o céu em busca de ajuda e o senhor o viu, o colocou no colo e deu forças para que ele pudesse continuar levando a felicidade para todos a sua volta. Para que essa mesma força pudesse ser irradiada pelo seu sorriso, pelo seu carisma e principalmente pela sua voz.
Eu te peço perdão meu Deus, por todas as vezes que fui fraca, por todas as vezes que pensei em desistir e acima de tudo, por tê-lo machucado mesmo que sem querer. Não há nada que me doa mais em saber que pude machucar o meu anjo, alguém que a única coisa que tem feito é me fazer feliz.
Eu passei horas pensando em uma maneira de consertar essa situação e nada me parece bom o suficiente. Só o senhor sabe o quanto é difícil para mim, mas eu tomei uma decisão, eu vou deixá-lo ir. Deixá-lo ser feliz sem que eu possa atrapalhar ou interferir. Me dói absurdamente só em pensar, sei que não poderia viver sem ele, pois ele é como se fosse o meu ar, como se eu não pudesse respirar sem ele aqui. Mas sei que esse amor extraordinário e imensurável que carrego no peito é capaz de suportar qualquer coisa, até mesmo as mais dolorosas, se for para vê-lo feliz.
Meu coração é inteiro dele, e nunca soube de alguém que perdesse o coração e continuasse vivendo, mas é isso que estou prestes a fazer. Estou prestes a entregar a minha felicidade em troca da dele. Acho que amor também é feito de sacrifícios, e eu faria qualquer coisa para tentar protegê-lo. Sabe quando as pessoas te dizem para seguir seu coração? Não é o tipo de escolha que eu possa fazer. É claro que meu coração o escolheria acima de qualquer coisa e em qualquer situação. Mas a decisão que tomei me parece a mais sensata, eu estou deixando-o porque o amo, porque sei que ele viveria melhor sem mim.
Eu fico aqui pensando que algum dia ele vai encontrar alguém a quem ele queira se unir, alguém melhor que eu, que possa dá-lo aquilo que não pude, e o fazer mais feliz do que eu poderia ter feito. Apesar da dor aniquilante que sinto aqui dentro, não há nada que deseje mais ao meu menino do que a felicidade. Eu só peço do fundo do coração que quem quer que ele vá escolher possa amá-lo tanto quanto eu o amo. Que o olhe e sinta que ele é tudo aquilo que alguém poderia sonhar um dia e muito mais. Que encontre nele tudo o que precisava para ser feliz, como eu encontro. Que faça dele o seu mundo, que ouça as batidas do seu coração sabendo que é a mais linda melodia já existente no mundo.
Que coloque um sorriso em seu rosto quando ele insistir em desaparecer, que enxugue as suas lágrimas quando elas caírem. Que o abrace apertado quando ele precisar, e o ajude a sempre seguir em frente. Que possa fazer dos seus sonhos os dela, e das suas conquistas a sua maior realização. Que dentro do seu coração não sobre espaço para dúvidas, inseguranças e desamores. Que ela possa ser para ele muito mais do que uma companheira, mas também uma amiga, uma irmã ou até mesmo uma mãe. Mas que acima de tudo, que mereça o seu amor, como eu queria merecer.
Eu sei que ainda irá doer muito mais do que já está doendo, e não sei por quanto tempo eu irei aguentar. Mas a única coisa que peço meu Deus, é que proteja o meu garoto anjo, o meu menino, meu Luan Rafael. Pois mesmo de longe, a sua felicidade será o único motivo para que eu possa continuar me mantendo inteira, e tentar ser feliz outra vez.
Quando terminei a última linha as lágrimas já molhavam todo o papel, todas aquelas palavras me doíam mais do que eu seria capaz de descrever. Não quis reler como sempre fazia com meu diário, apenas dobrei o papel em quatro partes. Abaixei a cabeça e tentei rezar baixinhos todas as orações que sabia, aquelas que havia aprendido com a minha mãe quando era pequena. Quando me ajoelhava aos pés da cama e repetia tudo que ela falava. E era assim que me sentia, ajoelhada aos pés da cama de Deus, pedindo forças, forças para que pudesse cumprir minha promessa de nunca mais fazer mal a Luan e principalmente forças para seguir em frente na minha difícil decisão.
Assim que me levantei fui direto a caixa de pedidos depositar o meu, na esperança de que Deus pudesse atendê-lo. Apesar de aquele lugar parecer reconfortante para mim, não queria demorar muito, tinha medo que Sr. Amarildo aparecesse e eu não estivesse lá. Dei uma última olhada para a grande cruz na parede, antes de agradecer mais uma vez, virar as costas e sair.
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