1. Spirit Fanfics >
  2. Goner >
  3. Capítulo 4.2

História Goner - Capítulo 4.2


Escrita por: ALUSIE

Notas do Autor


Oi, desculpem a demora. Enfim, espero que gostem <333 (final re-escrito)

Capítulo 5 - Capítulo 4.2


      Subo as escadas e vou até meu quarto pisando duro e ao adentrar o cômodo, bato a porta, tomando cuidado para não fazer muito barulho e acordar minha mãe, que dormia no quarto ao lado, apenas o suficiente para que os três ouçam lá de baixo. Me jogo na cama e fico encarando o teto.
      A raiva fervilha meus neurônios e a única coisa que vem em minha mente é um milhão de xingamentos diferentes. Eu ainda não consigo acreditar que eles vão me mandar embora só para eu ganhar dinheiro e pagar umas contas! Solto um grunhido de frustração e jogo meu travesseiro do outro lado do quarto.
      Eu não quero ir! E eu quero dizer isso para eles, quero mostrar que sou útil aqui, mas, pelo que me pareceu, minha opinião não importa, já que estou sendo obrigado à morar com o velho amigo do meu pai. Pego uma jaqueta jeans pendurada na cabeceira da cama, mordo a manga e grito, no entanto o som é abafado pelo tecido. Largo a roupa e tapo meu rosto com as mãos.
      A frustração já estava começando à fazer compainha para a raiva e me pego ponderando duas opções: chorar ou descer até lá e xingar todos eles. Mas aquela não era solução. Na verdade, aquilo só pioraria tudo e aí sim eu não teria nenhuma chance de ficar. Eu preciso relaxar antes de tomar qualquer decisão.
      Me levanto e caminho até o banheiro, fechando e trancando a porta ao passar por ela. O cheiro de produtos de limpeza e sabonete me atingem imediatamente e eu faço uma careta. Começo a me despir e jogo a roupa suja em um cesto ao lado da pia branca. O ar frio do banheiro me toca e eu corro até o chuveiro e ligo a água morna. Caminho em direção ao pequeno espelho e encaro meu reflexo, esperando a água esquentar.
      Sorrio ao ver meu estado. Agora eu entendo o porque de terem ficado tão preocupados, eu pareço um louco! Meus cabelos, normalmente penteados para o lado, estavam desgrenhados e caíam nos meu olhos; em meu rosto era quase invisível um pequeno corte na bochecha que já até cicatrizara; meu corpo estava todo sujo de terra, mais nas mãos de quando eu toquei aquela coisa nojenta; e, na medida que a adrenalina ia embora, o cansaço já pousava em meus olhos verde-oliva. Eu consigo até imaginar a reação de Jenna:
      Ei, homem das cavernas, precisa de ajuda para voltar para a idade da pedra?!
      Meu sorriso se alarga quando seu sorriso divertido se materializa em minha mente, junto com o brilho habitual em seus olhos castanho-claros. Mas o meu sorriso se desfaz, junto com a imagem da garota, e é substituído por uma expressão de tristeza e o pensamento de que eu nunca mais a veria de novo. Baixo o olhar para meus punhos cerrados, apoiados na pia e mordo a parte de dentro da bochecha. Aquele pensamento me deixa desesperado. Eu preciso ve-la, agora. Preciso senti-la, preciso ouvir sua voz. E preciso contar a ela da garota.
      Fecho o chuveiro, pego uma toalha pendurada atrás da porta de carvalho do banheiro, enrolo-a na cintura e saio. Meus olhos voam por todo o quarto até se focarem no aparelho preto na estante acima da minha cama, ao lado de alguns bonecos velhos e uns livros de fantasia. Apanho o walkie talkie, estico a antena e começo à procurar a frequência correta, girando e a apertando o pequeno botão. Era bastante comum garotos da minha idade terem uma bicicleta e um troço daqueles.
      Tenho um pouco de dificuldade para achar a frequência por causa da interferência das árvores ao redor, mas algumas tentativas depois o chiado cessa e o rádio fica em silêncio. Aperto o botão ao lado do aparelho e digo, baixinho:
      - Jen? Jen, você tá aí? - sem respostas. - Ah, qual é, Jenna, eu sei que você tá me ouvindo. - nada. - Então tá, vou te encher até você atender isso. Jenna, Jenna, Jenna, Jenna, Jen...
      - O que você quer? - a voz sonolenta, porém zangada, da menina surge do outro lado.
      - Finalmente! Você estava dormindo?
      - Não, estava fazendo minha aula de sapateado noturna. - pude imaginá-la revirando os olhos. - É claro que eu estava dormindo!
      - Ah! Bom, desculpe, mas não interessa, o que interessa é que você precisa vir aqui. Agora.
      Pausa.
      - Barry, você por acaso sabe que horas são?
      - Não, porque eu estou sem o meu relógio.
      - Mas você quase nunca tira ele, só para tom... Eca! Você tá...?
      - Pelado? Bem, sim. - sinto meu rosto esquentar. - mas isso também não interessa. - baixo a voz. - Eu preciso de você aqui.
      O outro lado da linha fica em silêncio mais uma vez, mas depois de alguns segundos ouço um suspiro e sua voz cansada retorna:
      - Bar, eu sei que você tá passando por um momento difícil com a sua família e tal, mas eu não posso ir aí toda vez que você fica triste. Ainda mais de madrugada.
      - Mas isso não tem relação com a minha família e eu não tô triste. - minto, sentindo um nó se formar na minha garganta. - É... outra coisa.
      - Então o que é?
      - Eu... - olho pela pequena greta abaixo da porta do meu quarto, esperando ver sombras dos pés de alguém escutando atrás da porta, mas não há nada. No entanto, mesmo sabendo que não há ninguém ali, decido não arriscar. - Não posso falar disso aqui ou vou ficar muito encrencado. Você vem?
      O outro lado fica em silêncio de novo.
      - Tudo bem. - ela volta com um suspiro exasperado. - Chego aí em 15 minutos.
      - Certo. Me encontre atrás do celeiro.
      - Mas se isso for algo imbecil, eu juro, Lannister, que vou socar a sua cara. - ouço-a dizer antes de desligar.
      Coloco o rádio de volta em seu lugar habitual e corro para o banheiro, tranco a porta novamente, jogo a tolha na pia e ligo o chuveiro. Me jogo embaixo da água sem me importar com a baixa temperatura e lavo meus cabelos e limpo meu corpo. Saio do box e apanho a toalha, e seco meu corpo e cabelos.
      Jogo a toalha encharcada em cima da minha cama e abro o guarda-roupa de mógno e pego uma roupa de baixo, uma calça jeans surrada, uma camiseta cinza-claro e um par de meias. Me visto na velocidade da luz e na hora de calçar os tênis brancos e sujos de terra eu acabo caindo com um baque surdo no chão de madeira oca da casa e por alguns segundos angustiantes e preciosos, fico caído esperando alguém se levantar e vir até o meu quarto, mas nada acotece e eu me calço no chão mesmo.
      Me levanto e volto para o banheiro, escovo meus dentes e meus cabelos, que mais pareciam um ninho de pássaros. Depois volto para frente do guarda roupa e apanho algumas roupas velhas como uma calça de moletom, uma camiseta branca manchada, uma jaqueta de moletom, um corbertor empoeirado e uma almofada rasgada. Coloco tudo dentro da mochila azul desbotada jogada ao lado da porta e antes de sair coloco meu relógio no pulso e visto a jaqueta jeans. Jogo a mochila nas costas e vou até as escadas, com os passos tão leves quanto uma folha de papel. Dou uma rápida olhada na porta entreaberta do quarto de minha mãe e vejo-a dormindo serenamente, com meu pai deitado em um colchão mofado ao lado da cama para que minha mãe tenha bastante espaço na cama. Dou um pequeno sorriso e volto à ação.
      Chegando na sala de estar meu coração quase sai pela boca. A televisão ligada iluminava todo o cômodo, revelando Ben roncando no sofá verde e Jess deitada no outro, posicionado do lado esquerdo do primeiro. Mordo a língua para não emitir nenhum som e volto à andar lentamente até a cozinha.
      Até eu pisar em uma tábua velha, que solta um rangido um pouco alto demais e eu fico imóvel.
      Faço uma careta e o pânico cresce em meu peito. Olho para trás e vejo Ben se remexer no sofá e meu coração bate ainda mais rápido. Olho para os dois lados, avisto a porta do banheiro de visitas aberto e corro para lá. Alguns segundos depois meu irmão passa na frente do meu esconderijo, arrastando os pés, e se dirige para a cozinha.
      Ouço-o resmungar algo como "esquilos idiotas" e depois o som de água batendo no fundo de um copo de vidro. Ben volta carregando o copo e se deita novamente no sofá. Conto até 15 e os roncos retornam. Saio do banheiro e corro até a cozinha, enfiando pacotes de biscoito e caixinhas de suco na mochila e saio.
      Respiro fundo o ar fresco da natureza e seco o suor da testa, que eu nem notei que já se acumulava. Corro para a parte de trás do celeiro e espero. Dou uma rápida olhada no relógio e vejo que marcava as 2:30 da noite. Eu estava atrasado em cinco minutos, mas ela também estava.
      E quase como se estivesse esperando sua deixa, uma garota baixinha surge do meio da árvores, carregando uma mochila verde nas costas e uma lanterna. Meu coração dispara quando seus olhos encontram os meus. Por mais que façam quase 1 ano e alguns meses que estamos namorando eu ainda fico um pouco nervoso na presença dela.
      - Atrasada. - digo, batendo com o indicador no relógio, fingindo seriedade, mas com um sorriso no rosto.
      - E por acaso eu tenho que obedecer algum horário seu, fazendeiro? - retruca, tentando se manter séria, mas perde e um lindo sorriso toca seus lábios.
      Corro em sua direção e a envolvo em um abraço apertado, tirando seus pés do chão e rodando-a no ar. Ela é pega de surpresa e solta um gritinho, mas o retribui e ri. Coloco-a no chão e nos encaramos por uns momentos, até que ela quebra o silêncio.
      - Credo, parece até que não nos vemos faz anos.
      Rio.
      - Para mim, ficar longe de você por alguma horas é quase isso, Jenna Smith. - digo acariciando seu rosto e vejo-o corar no escuro.
      Ela estava um pouco ofegante pela caminhada de dois quilômetros entre nossas casas e eu pelo abraço e a tensão com Ben. O ar de nossas respirações que escapava por entre nossos lábios jogava pequenos vapores condensados, por causa do ar frio da noite. Mesmo sendo quase três horas da manhã ela estava linda, o que me faz sorrir. Eu, por outro lado, devia estar um trapo.
      - Você é linda, Jen. - digo.
      Ela ri.
      - Se você quiser me beijar poupe seus elogios para mais tarde.
      Meu sorriso se alarga e eu me inclino, tocando seus lábios com os meus em um beijo terno e sereno. Ela retribui e envolve minha cintura com seus braços. Nos separamos depois de uns segundos e eu a encaro, os rostos tão próximos que nossas respirações se misturavam.
      - Posso elogiar você agora? - sussurro.
      - Agora sim.
      - Você é linda, Jen.
      Ela solta outra risada baixa.
      - Você também é, fazendeiro.
      Ficamos assim por alguns momentos, as testas coladas e os olhos fechados, simplesmente apreciando a presença um do outro, até que ela quebra, novamente, o silêncio, afastando um pouco o rosto.
      - Então, o que você quer me mostrar? Eu não andei isso tudo só para ficar olhando para sua cara. - noto um leve tom de ironia na sua voz.
      - Certo, me siga. - respondo, ignorando o comentário, e vou até a porta do celeiro. Repito o processo que fiz mais cedo com a garota estranha e ao fechar a porta vou até as escadas e paro de um lado dela e Jenna do outro. - Escuta, o que eu vou te mostrar aqui ninguém pode saber.
      Ela franze as sobrancelhas.
      - Agora eu estou com medo. O que você está escondendo, Lannister?
      - Prometa que não vai cantar para ninguém. - ela assente, concordando. - É sério, Smith, você não pode contar isso nem para a sua mãe.
      Jenna hesita. Ela entra em um conflito em sua mente, e eu não sabia disso pela sua expressão, mas porque eu sabia de sua relação com sua mãe. Ela e Marie são quase como melhores amigas, Jenna contava tudo o que acontecia em sua vida para sua mãe e vice versa. As duas tinham uma confiança e uma amizade tão grande que chegava à ser absurda. Nem Jess e a mamãe eram assim. Na maioria das vezes a mãe que descobria das coisas que aconteciam com minha irmã porque esta não contava absolutamente nada para a mais velha, o que tornava a relação das duas bem mais difícil do que realmente parecia.
      Então relutante, a garota à minha frente concorda.
      - Ótimo, agora suba. - digo apontando para cima.
      - O quê? E você vem atrás de mim?
      - Sim.
      - De jeito nenhum. Eu sou garota, você tem de manter seus olhos sempre à frente, fazendeiro.
      Bufo e começo à subir as escadas. Jenna é teimosa, ela não subiria antes de mim nem se lhe pagassem, e discutir com ela era a mesma coisa que nada.
      - Mas meus olhos estão sempre à frente.
      - Os meus não. - olho para baixo e vejo-a encarando minha parte traseira e eu sinto meu rosto corar de constrangimento.
      - Pare com isso. - volto à subir.
      - Não. - retruca.
      Chego ao topo e olho em volta procurando a menina desconhecida, mas não à vejo e a confusão invade minha mente. Jenna para ao meu lado e também olha em volta.  Ando pela plataforma, procurando pela garota desconhecida. O som de meus tênis batendo na madeira ecoa por todo celeiro e eu solto um assobio baixo, o mesmo que eu usei para chamá-la mais cedo.
      - Ei. - chamo. - Sou eu, Barry, pode aparecer. Eu trouxe uma amiga. O nome dela é Jenna e ela não vai fazer nada a você. - olho para a garota do outro lado da plataforma. - Não vai, Jen?
      - Não.
      - Viu? Pode sair, tá tudo bem.
      Paro e vejo pelo canto do olho um fardo de feno se mexer. Me viro em sua direção e agarro uma vassoura encostada na parede ali perto. Me aproximo dele à passos leves e curtos e puxo o fardo, que cai no chão lá embaixo com um baque surdo e um farfalhar, fazendo um pouco de poeira levantar. Olho para onde o fardo estava e dou um sorriso aliviado. A menina estava lá, com seu rosto sujo e o cabelo bagunçado.
      - Eu disse que iria voltar. - digo.
      Me aproximo do pequeno ser humano e estico o braço para ajuda-la a se levantar. Sua mão agarra meus dedos esguios e a puxo para ficar de pé. Novamente ela tem uma certa dificuladade para se manter de pé e eu noto o porque. Suas pernas magras não conseguiam suportar o peso do resto do corpo.
      - O que você estava fazendo ali? - pergunto e solto a vassoura, que ao cair faz um barulho alto, fazendo a menina se assustar.
      - Escondida. - responde.
      - Ah.
      Ainda segurando sua mão dou a volta na plataforma e paro em frente à Jenna. As duas tinham a mesma altura, então uma não tinha de erguer o rosto para encarar a outra, e as duas também têm a mesma altura do meu ombro. Já eu meço quase quatro fardos de feno empilhados.
      - Hã... Bar? Quem é ela? - pergunta Jen franzindo a testa.
      - Ela? É uma garota que eu achei. - respondo.
      - Você achou? Como assim? - ela arregala os olhos.
      - É. Mas é uma história esquisita, não sei se você acreditaria.
      - Eu acredito em qualquer coisa, você sabe disso.
      Paro e penso por um momento, me lembrando de todas brincadeiras que eu fiz e ela acreditou em mim.
      - Tá. - digo finalmente. - Mas é melhor se sentar.
      E é o que fazemos. Nos sentamos e eu conto à ela sobre o que aconteceu na floresta e como eu a trouxe para cá. Deixo de lado a parte da conversa com a minha mãe e a minha mudança. Jenna ouviu tudo atentamente, balançando à cabeça em algumas partes e fazendo uma cara de nojo quando falo do buraco na árvore. Quando termino ela fica em silêncio por alguns instantes, encarando a lua, que já estava alta no céu.
      Por fim ela suspira e me olha.
      - Porque você não contou para ninguém?
      - Lembra daquele cachorro que eu achei quando tinha treze anos?
      - Ah. - outra pausa. - E você não sabe nada da vida dela.
      - Não. - respondo mesmo sabendo que aquilo não foi uma pergunta.
      - Você sabe, pelo menos, o nome dela?
      - É... não.
      Ela ergue as sobrancelhas.
      - Como você traz uma garota para a sua casa e nem sabe o nome dela?! - diz, jogando os braços para cima.
      - Eu... esqueci de perguntar.
      Ela bufa e revira os olhos.
      - Qual o seu nome? - Jenna pergunta, mais calma e se inclinando para ela.
      As duas se encaram, sem dizer nada, provavelmente se estudando. Aperto os lábios e toco o ombro da menina, que vira o rosto para mim e me encara.
      - Pode confiar nela. - digo, com a voz baixa. - Ela é amiga.
      - Confiar?
      - É. Quando você acredita que uma pessoa não está mentindo e que ela não vai quebrar uma promessa, você confia nela.
      Ela pareceu confusa.
      -  Tipo amigos e pessoas que você ama. - Jen completa.
      - Isso, tipo amigos.
      Os olhos da menina desconhecida vão de mim para a outra, que olhava, cabisbaixa, para as próprias mãos. Me pergunto o que havia deixado-o daquele jeito e penso no que ela havia dito alguns segundos atrás, sobre cofiança, e me lembro de quando ela depositou toda sua confiança em Lancaster, seu ex melhor amigo, que à traiu de uma maneira covarde e absurda. Entrelaço seus dedos nos meus e ela ergue o olhar para mim. A garota dá um sorriso fraco e olha para nossas mãos.
      - Eleven.
      - Hein? - me viro para a outra, que mantinha seus olhos fixos em mim.
      Ela retira o casaco azul sujo, o coloca no colo e sobe a manga do seu vestido rosa puído, revelando uma tatuagem escrita "011". Franzo as sobrancelhas e analiso aquilo. Era uma tatuagem definitiva, aquilo eu tenho certeza, mas quem faria isso com uma garota tão jovem?
      - Esse é seu nome? Eleven? - pergunto.
      Ela faz que sim.
      - Quem fez isso em você? - aponto para a tatuagem, que ela rapidamente esconde.
      - Homens maus.
      - E o que lugar era aquele que você estava?
      - Lugar ruim.
      - Ajudou muito. - Jenna bufa e eu aperto, de leve, sua mão.
      - Os homens maus te colocaram no lugar ruim? - continuo.
      Ela faz que não.
      - Demogorgon.
      Franzo a testa.
      - Demogorgon?
      - Monstro.
      Ergo as sobrancelhas.
      - Porque você não fala e nem sabe o significado da maioria das palavras? - pergunta Jen.
      - Homens maus... não... deixaram.
      - E você estava com quem antes de ir para o lugar ruim?
      Ela hesita e volta à olhar para meus dedos e os de Jenna entrelaçados e uma lembrança pareceu voltar à assombrar sua mente, porque pude notar lágrimas brotando em seus olhos.
      - Mike. - responde depois de algum tempo em silêncio.
      - Esse Mike é um homem mau? - pergunto.
      Ela nega com a cabeça.
      - Mike... bom.
      Eleven para e funga, tentando conter as lembranças dolorosas.
      - Onde esse garoto vive?
      - Não... lembro.
      - Ótimo. - resmunga Jen.
      Olho para ela que retribui o olhar e temos uma discussão silenciosa sobre a tal Eleven. Seu olhar me perguntava "Vai deixar ela ficar?" e eu respondo-a somente com um dar de ombros.
      - Eu não tenho mais perguntas. - digo.
      - Nem eu. - Jenna comenta.
      - Então OK, Eleven. - puxo a mochila azul para frente do meu corpo e abro, despejando o conteúdo no chão. - Eu trouxe para você uns biscoitos, sucos, roupas, agasalho e um travesseiro. Isso é o suficiente?
      A menina faz que sim.
      - Ótimo. Amanhã eu venho e trago seu café da manhã.
      E antes de descer, a ensino como abrir os biscoitos e os sucos, a instrúo à vestir as roupas, se enrolar no cobertor e usar a almofada para dar mais conforto à cabeça. Lhe desejo boa noite e eu e Jenna tornamos à descer e ao sair do celeiro o ar frio e úmido da noite volta a nos abraçar. Vou com ela para a parte de trás da construção e ao invés de seguir seu caminho ela para e se vira para mim.
      - O que acha dela? - pergunta.
      - Eu não sei. - respondo, afundando as mãos nos bolsos da minha calça. - Ela é um pouco... diferente, mas não consegui notar nenhum tipo de mentira ou bricadeira de mau gosto vindo dela. Ela estava falando a verdade. Eu confio nela.
      - Eu também...
      Jen volta à olhar para baixo e chuta algumas pedras com a ponta de seu all star surrado, fazendo-as correr alguns centímetros e depois pararem ao bater na parede do celeiro.
      - Você está bem? - pergunto, me aproximando.
      - É, tanto faz. - e dá de ombros.
      Seguro novamente seu rosto entre o polegar e o indicador e ergo seu rosto. Dessa vez ela não conteve as lágrimas e permitiu que algumas rolassem. A garota de cabelos castanhos me abraça e afunda o rosto no meu peito. Envolvo-a e acaricio seus cabelos.
      - Isso é por causa do Dan?
      Ela faz que sim e eu suspiro.
      Eu e Jenna sempre fomos amigos, por causa de nossas mães, e desde a infância sempre fomos muito ligados. Um sempre sabia o que o outro pensava ou sentia, essa coisa de melhores amigos. Nós quase nunca estavamos separados, andavamos para cima e para baixo juntos, rindo e roubando balas da velha lojinha que ficava perto de nossa escola. Nós tinhamos até um apelido: "os pestinhas baderneiros, Lannister e Smith".
      Mas quando entramos na adolesência nos afastamos e o máximo de palavras que trocavamos era um "oi" ou "tchau" quando nos cruzavamos no caminho de casa. Até que ela começou à andar com uns alunos mais velhos, da oitava série, e aí nós paramos de vez de nos falar. Jenna estava sempre com  seus amigos populares, indo à festas e voltando tarde para a casa. Só que como ela era muito inocente na época, depositou toda a sua confiança neles e achou que eles eram o máximo e que nunca fariam nada de ruim. Acreditou que eles eram heróis.
      E esse foi o erro dela.
      Um dia Lancaster, seu melhor amigo na época, havia convidado Jen para uma festa e ela, com toda sua inocência de garota de 13 anos, quase 14, aceitou. E por eles serem populares quase toda a escola ficou sabendo, inclusive eu, que tentei faze-la mudar de ideia, mas a garota me xingou, gritou comigo e me ignorou. 
      Então eles foram. E tudo corria bem, eles aproveitaram bastante a festa, dançaram, beberam e etc. Até começar a hora das homeangens e, como todos estavam bêbados, só falaram bobagens e acabaram soltando umas verdades. Lancaster foi o último e disse coisas boas de todos ali, disse que os amava, que levaria eles para sempre no coração e blá blá blá. Mas na hora de falar de Jenna ele a humilhou na frente de todos, disse que ela era uma péssima amiga, interesseira e que nunca gostou da garota.
       Jen ficou arrasada e correu dali, chorando e com o coração em pedaços. Eram quase três horas da manhã quando ela apareceu suja e com o rosto riscado de lágrimas. Eu a coloquei para dentro e lhe servi uma xícara de chá para que ela relaxasse e ela me contou tudo. Fiquei extremamente bravo na hora, mas a maneira como ela olhou, em súplica, pedindo para que eu a desculpasse por ter gritado comigo me fez relaxar um pouco. E eu à perdoei, mas, na verdade, eu nunca estivesse bravo com ela e sim preocupado. E aí nossa amizade voltou e eu passava quase todos os dias com ela, lhe assegurando que tudo ia ficar bem e cantando algumas de suas músicas favoritas.
      Alguns meses depois, quando tudo já tinha se acertado e Jenna tinha se recuperado (sozinha), estavamos colhendo algumas flores para a Marie, e nós conversavamos sobre quando eramos crianças, rindo das nossas peripécias e lembrando dos bons momento. E eu,com minha boca grande, acabei deixando escapar sobre meus sentimentos por ela e, surpreendentemente, a garota contou que sentia o mesmo por mim. E, naquele campo, demos o nosso primeiro beijo e começamos à namorar.
      E por mais que tenha se passado quase dois anos dos acontecimentos, a ferida daquilo ainda doía nela.
      - Ei, tá tudo bem. Ele não tá aqui e eu vou proteger você, sempre. - um nó se forma em minha garganta e eu me lembro das palavaras do meu pai sobre a mudança, contradizendo minhas palavras para a garota.
      Tento não parecer nervoso, mas as minhas mãos começam a tremer e a minha respiração fica um pouco mais acelerada. Praguejo mentalmente por eu ser um garoto tão frágil e péssimo mentiroso e torço para que ela não note.
      Ela ergue o olhar e encosta seu queixo no meu peito, os olhos brilhando pelas lágrimas.
      - Porque você está mentindo?
      Aquilo me atingiu como um soco na boca. Então ela percebeu meu nervosismo.
      - Eu... - penso em mentir, mas o bom senso pesa em mim e eu acho que ela merece saber a verdade. Suspiro. - Jen, meu pai quer me mandar para morar com o tio Jim.
      Ela fica horrorizada e se separa de mim.
      - O quê?
      - Ele disse que eu vou para estudar em uma boa escola e ter um bom emprego para pagar as nossas contas.
      - Mas... você não pode ir! E a sua mãe?!
      - Eu disse isso para ele, mas o pai não me escuta. E eu não quero ir, só que ele parece muito certo disso, não acho que vai voltar atrás.
      Jenna me encara por alguns segundos, como se não me reconhecesse. A garota parecia chocada demais para se mover ou falar qualquer coisa, somente me olha com os olhos arregalados e o cenho franzido. Então, ela respira fundo, se aproxima de mim e começa à brincar com com os botões da minha jaqueta. Ela parecia já aceitar aquilo, mas sua voz soa trêmula quando ela pergunta:
      - E quando você vai?
      - Semana que vem.
      Vejo um sorriso triste tocar seus lábios.
      - Então nós temos algum tempo.
      - É.
      O silêncio cai sobre nós.
      - Eu venho te visitar. - digo, depois de algum tempo.
      - Eu sei.
      - É sério, eu vou dar um jeito.
      Jenna olha para mim, sentindo a convicção na minha voz.
      - Promete?
      Encaro seus olhos, que pareciam começar à recuperar seu brilho habitual, substituindo a tristeza e o trauma, e eu sorrio. Jenna é mesmo uma garota muito forte, nada conseguia deixa-la abalada por muito tempo e esse era um dos principais motivos de eu amar tanto aquela garota.
      - Prometo.



Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...