História Hold my hand and sing me to sleep - Eu ainda vejo você toda vez que fecho os olhos

O retorno da casa abandonada tinha sido desconfortável e estranho, Lisa estava muito calada e andando longe da mais velha e Jennie tinha percebido aquilo, também não tinha sido um dia fácil para ela. A coreana tinha perdido a conta de quantas vezes se sentiu confusa com as lembranças que tinha da mais nova e com a enorme vontade de abraça -la e mante-la por perto o tempo todo. Como que se para recuperar todo o  tempo perdido desde que se afastaram
    - Tá tudo bem? – Perguntou Jennie quando as duas se aproximavam da casa da mesma. – Você tá um pouco estranha.
    - Eu sei.... É só que, sei lá, acho que eu estou um pouco confusa hoje. – Falou a loira olhando para o chão e parando de andar.
    - Você quer ir pra casa agora? – Perguntou a mais velha, que ainda não queria entrar.
    - Já tá um pouco tarde. Acho que eu preciso ir...
   Jennie não pôde conter o olhar um pouco decepcionado e perdido. Lisa estava muito confusa para ficar perto da amiga por mais tempo, tudo estava um pouco estranho. Talvez fosse apenas uma confusão causada pela nostalgia das lembranças que as atravessaram naquela tarde. Como não se deixar afetar por tudo que as duas poderiam ter sido se não tivessem se afastado ao ponto de não conseguirem ficar confortavelmente a sós? Como não pensar no quanto eram próximas e no quanto gostavam uma da outra?
“É, deve ser só isso” – Pensou Lalisa. – “Eu só estou com saudade do que a gente foi, não com vontade de ser algo a mais. ”
- Tudo bem então Lise, a gente se fala amanhã, ok? Tenta acordar na hora dessa vez. – A mais velha lhe deu um beijo na bochecha e se despediu com um sorriso tranquilo enquanto entrava na casa térrea.
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    A cama parecia extremamente desconfortável e nenhuma posição parecia certa. Não seria nem um pouco fácil dormir naquela noite e Lisa sabia muito bem disso. A cena se repetia sem parar em sua mente.
     A loira se perguntava incansavelmente se Jennie também se lembrava, ela tinha certeza que sim, mas sempre ficava aquela dúvida torturante bem lá no fundo. Elas fingiram por tanto tempo que nada tinha acontecido que agora realmente parecia que tinha tudo sido um sonho ou algum erro muito escondido no passado.
      Será que a mais velha encarava isso desse jeito? Um erro infantil e nada mais? O que teria acontecido se Lisa não tivesse indo embora? E o que aconteceria agora que tudo que aconteceu estava voltando a tona com toda a força e trazendo consigo todas as sensações há muito tempo enterradas no passado? Lisa tinha medo, ela tinha muito medo.
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   - Eu te avisei para não andar com eles. O que você vai dizer pros seus pais, Lisa?! – Brigava Jennie enquanto segurava o cabelo, ainda castanho, da mais nova para que a mesma estivesse preparada caso precisasse vomitar de novo.
   O corpo franzino e pouco desenvolvido das duas denunciava a pouca idade, deviam ter o que, 12,13 anos?
    - Desculpa, Jen. Eu não sei no que eu estava pensando, foi mal. - Respondeu Lisa enquanto sentava-se no chão, com as costas apoiadas na parede da lateral da casa e a cabeça entre os joelhos.
    Jennie sentou-se ao seu lado e passou a mão pelos cabelos da mais nova, preocupada.
    - Não é só porque você brigou com seu pai que precisa fazer isso. Não vai adiantar, Lise.
    - Ele não tinha o direito de se mudar pra tão longe... Eu só não queria que ele fosse embora.
    - Eu sei, Lise. Mas isso não vai ajudar.
   Lisa apoiou a cabeça no peito da mais velha e ficou calada recebendo o carinho da mesma.
    - Eu prometo que vai ficar tudo bem, só não faz mais isso.
   Lisa levantou a cabeça e olhou nos olhos da outra, seu cabelo ainda comprido e castanho caía desajeitado sobre o olho direito .
   - Eu não vou mais fazer. Prometo.
   Os olhos se encontraram um pouco confusos e assustados, era aquela sensação que as duas ainda temiam, os olhos procurando, caóticos, algum ponto no rosto uma da outra até encontrarem a boca, molhada e semiaberta. Jennie ajeitou o cabelo da mais nova, colocando a mecha, que caía sobre os olhos, atrás da orelha da mesma. Os rostos foram se aproximando e o peito foi subitamente tomado pela batida forte e apressada do coração. Tudo era confusão e ansiedade. E foi assim que se deu o beijo. As mãos tremiam e o coração apertava, mas as bocas prosseguiam na dança desengonçada e molhada. Os olhos,fechados, já não viam mais nada, mas sentiam toda aquela imensidão do momento.
      A última coisa da qual Lisa se lembrava era o olhar assustado e confuso de Jennie no momento em que o beijo cessou. Ainda podia ver o sorriso contido da mais velha antes de levantar e montar na bicicleta para correr  para o mais longe possível.
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     Lisa não conseguia parar de repetir a cena diversas vezes na cabeça. Fazia tanto tempo, mas tudo ainda era tão intenso e tão presente quanto no dia em que aconteceu.
     A mais nova não poderia estar mais confusa. As duas tinham decidido, num pacto silencioso e subentendido, nunca mais comentar e fingir que nada daquilo tinha acontecido. Talvez por medo e proteção, talvez por ser uma época confusa e não parecer a hora certa, mas quando seria a hora certa então? Elas não sabiam. E, três ou quatro anos depois, o momento certo de comentar e trazer tudo à tona, ainda não tinha chegado.
     As duas fingiam que aquilo tudo não tinha acontecido. Brincavam de agir como se o dia, o beijo, o toque e todo aquele sentimento tivesse caído em completo esquecimento. Mas as duas se lembravam e sabiam disso.
    Lisa ainda podia sentir a boca da mais velha se enroscar e se perder com a sua; e aquilo ainda fazia seu coração acelerar.
   Fazia tanto tempo... Mas todo aquele sentimento era tão intenso que ainda deixava a garota loira completamente assustada e perdida.
    Por isso ela tinha decido esquecer, apagar aquilo tudo e nunca mais tocar no assunto. Mas, pelo visto, sua mente fizera questão de guardar todos os pequenos detalhes daquele momento.
    O jeito que o céu estava completamente nublado, mas como, mesmo assim, tinha uma coloração lindamente arroxeada. O gosto da bebida ainda presente na garganta e o arrependimento socando a boca do estômago junto com o enjôo. Lisa podia se lembrar perfeitamente dos jornais velhos espalhados pelo chão, rodeados por pedaços de papelão e bitucas de cigarro. O engraçado é que ela não conseguia lembrar de nenhum dos rostos dos garotos daquela tarde, nem da marca das bebidas e dos cigarros, tudo parecia meio igual. Mas ela  se lembrava claramente da blusa azul anil de algodão que Jennie usava, junto com seu shorts jeans branco preferido, no momento todo sujo com a poeira do chão da casa abandonada. Mesmo depois de tanto tempo e de tantas coisas terem se embrenhado no caminho das duas, Lalisa conseguia se lembrar perfeitamente de como Jennie aproximou seus lábios aos dela e da sensação de ter aquela língua encostando na sua. Lisa ainda podia sentir sua mão fechar em espanto e depois se soltar na cintura da mais velha. Ela ainda conseguia se culpar pelo impulso de montar na bicicleta e correr pra longe daquela que tinha largado tudo naquela tarde pra ajudá-la a consertar seus erros infantis.
    Ela sempre tentava se convencer de que era uma fase muito difícil e que isso justificava tudo. O casamento dos pais estava em ruínas e o pai da garota estava se mudando para longe. Ela se sentia abandonada e muito assustada. Talvez tudo isso justificasse o impulso de correr, o impulso de ir embora e fingir que nada nunca aconteceu.
   E,por um tempo, deu certo. No dia seguinte ao ocorrido, as duas se encontraram e não disseram uma palavra sobre o que tinha acontecido. O pai de Lisa tinha terminado de fazer as malas e Jennie só a abraçou, como se dissesse que estava tudo bem, não só sobre o pai, mas sobre as duas também, como se dissesse que elas não precisavam lidar com aquilo naquele momento e que estava tudo bem fingir que nada tinha acontecido.
   Mas Lisa não conseguia parar de sentir como se tivesse abandonado a mais velha naquele dia.
   Foi ali que elas se afastaram. Foi naquele exato momento que elas começaram caminhos diferentes, que elas começaram a agir como se nunca tivesse sido só elas contra o mundo. Foi ali que tudo se perdeu. E Lisa ainda via aquela cena se repetir toda vez que fechava os olhos.
   Elas nunca mais voltaram para a casa abandonada e, quando o fizeram, tudo voltou junto, pelo menos para Lisa.
   E agora, por causa de uma maldita lembrança reprimida há muito tempo, a loira se encontrava acordada em plena madrugada, sem conseguir pensar em outra coisa senão  na mais velha. E foi aí que tudo começou a rodar pela primeira vez.