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História I am - Capítulo 4


Escrita por: Imadeleine

Capítulo 4 - Capítulo 4


Nas antigas sociedades pintar e enquadrar momentos felizes ou fatos relevantes era algo extremamente comum. Ao analisar os diversos quadros presentes nas paredes do antigo teatro municipal da cidade me pego pensando em como seria viver séculos atrás e estar sentado em um jardim ao lado de HyunWoo, enquanto um pintor tracejava nossa silhueta com tinta em uma tela branca e sem vida. Talvez possamos procurar alguém que ainda faça isso, adoraria ter um quadro nosso no meu quarto. Um quadro não é uma má ideia, já que HyunWoo odeia fotografias de si mesmo e eu não tenho nenhuma imagem nossa juntos para guardar de recordação.

O corredor cheira a velas e flores, com um leve toque de chá, que vem da cozinha de funcionários próxima dali. O contraste da sapatilha rose com o tapete carmesim me faz desviar os olhos da pintura de crianças perto de um rio para meus pés. Como a senhora Red diz: O balé me mudou. Pelo contrário, HyunWoo me mudou. Ele é como uma tábua de salvação em meio ao mar agitado que é o mundo em que vivemos. Sempre odiei a ideia de ter que me apoiar ou depender de alguém para ter vontade de respirar todas as manhãs quando eu acordo, mas com ele foi, e é diferente. Algo natural me fez ser assim com relação a ele e agora não dá mais para voltar.

Sinto braços firmes e fortes me envolverem. O calor de seu corpo é tão reconhecível e aconchegante. Sinto-o arrastar seu nariz pelo meu pescoço, solto um riso fraco com o arrepio que aquilo me causou. Seus lábios depositam um beijo em minha bochecha e senti meu rosto esquentar, mesmo depois de alguns meses juntos a sensação de ficar envergonhado ao lado dele ainda é a mesma.

- Se você soubesse o quanto eu te amo acho que se assustaria e sairia correndo. - Ele sussurrou em meu ouvido e riu em seguida.

- Jamais - Me virei para ele envolvendo meus braços em seu pescoço.

- O que eu fiz para te merecer? - Suas mãos envolveram minha cintura e me puxaram para mais perto.

- Acho que essa pergunta quem deveria fazer sou eu - Fiz um bico infantil com os lábios e ele riu da forma mais adorável e que eu amo tanto - Se bem que eu sou um cara sensacional, bonito, e dentre muitas outras qualidades.

- Ah é? - Ele sorriu entrando na brincadeira.

- Sim, e eu tenho um namorado muito bravo e ciumento. E sem contar que ele é tão lindo, atencioso, amoroso, talentoso... - Suspirei de forma teatral - Até cansa falar sua longa lista de qualidades - Ele gargalhou.

- Eu já disse que te amo hoje?

- Provavelmente, mas adoraria ouvir de novo.

- Eu te amo - Ele sussurrou em meu ouvido.

Seu rosto se fixou no meu descendo com destino a um beijo. A conhecida sensação de hipnose me faz ficar preso no mundo profundo que é dentro de suas pupilas. Ele aproximou nossos lábios e fechou os olhos selando-os. Estou pouco me importando agora que alguém apareça e nos veja, ou que nos repreendam por conta do preconceito ignorante e ultrapassado deles. Fechar os meus olhos e sair dessa realidade com os lábios dele se movendo em sincronia com os meus é prioridade no momento.

Talvez seja o típico discurso de alguém apaixonado, mas beijá-lo é como ser coberto pelo pó mágico de Wendy e sair flutuando por aí, é como se todo meu corpo esquecesse que tem uma mente no comando e somente os meus lábios estivessem obedecendo a ordens dos dele, é como estar em um sonho com o medo iminente de acordar e ele desaparecer nos cantos obscuros do meu cérebro, é como uma brisa calma e gostosa em um dia de calor infernal no hemisfério sul.

Estar nos braços dele é como estar deitado em nuvens, ou em lençóis de seda: Sutil e macio. É como ser abraçado pelo mundo e ter o privilégio de se sentir especial em meio a sete bilhões de habitantes. É estar sentado ao lado de uma lareira em meio ao inverno e sentir o calor que ela emana aquecer minha pele.

Seu cheiro é doce e másculo, uma mistura de sensações, algo parecido com estar em um jardim silvestre recém-regado pela chuva, posso arriscar dizer que ninguém é capaz de reproduzi-la, e se fosse, seria algo tão viciante que se engarrafado o mundo inteiro iria fazer de tudo para ter uma dose da fragrância.

Sentir o toque dos seus dedos é com ter o privilégio de ser dedilhado pelo pianista mais perfeccionista e paciente do mundo, é como ser uma nova terra encontrada por um explorador assíduo, é se sentir como um quadro raro de museu, como uma xícara de porcelana antiga para uma dona de casa colecionadora, é como ser a flor mais delicada na mão de um jardineiro apaixonado pelo que faz.

O gosto dos seus lábios é como uma fruta tropical, úmida e saborosa, doce na medida certa e com sabor inexplicável. É como sentir um algodão doce derretendo lentamente em sua boca, é como colocar um cubo de açúcar na língua e senti-lo explodir trazendo a sensação de prazer que algo feito disso pode proporcionar.

Ser amado por HyunWoo é uma sensação irreal. É como se a qualquer instante eu fosse acordar e nada disso tenha passado de ilusão. É como estar em perigo, mas permanecer mesmo sabendo que isso pode te machucar. É se sentir a única pessoa no universo, é como ter algo essencial que ninguém tem, é ser adorado como um deus, é ser admirado como nem Afrodite ou Psique poderia ter sido, é como ser essencial para a vida dele, é como se quando eu chegasse o mundo inteiro já não tem mais sentindo e tudo já não importa mais, a não ser a mim. Essas sensações de amor são recíprocas, e tantas e tão profundas e ocultas que não consigo expressar em palavras.

...

Todas as diversas cadeiras do amplo teatro estavam ocupadas trazendo uma vasta imensidão de rostos. Os camarotes na área superior estão tão cheios quanto na área comum. Minha apresentação será a última, ou como à senhora Red denominou, o grand finale. Subi até o último andar - Ao som das cinco badaladas do relógio - Onde se localiza o camarote, de frente para o palco, dedicado aos artistas do dia. Meu desejo era apreciá-lo de perto, vê-lo dedilhar as teclas com devoção como eu sempre vejo, mas hoje é o dia dele brilhar para os outros e não para mim. Assim, me conformar de assisti-lo de forma tão distante é uma dura realidade.

Algumas bailarinas saíram do palco que estava forrado de neve artificial graças a apresentação delas. Suas roupas bem desenhadas e em tons de branco e gelo com algumas pedras eram perceptíveis até mesmo daqui de cima. Os músicos do concerto se posicionaram em suas cadeiras e HyunWoo foi convidado a entrar no palco sendo ovacionado com uma salva de palmas. Minhas mãos ficaram doloridas com o entusiasmo com que eu aplaudi junto com todos.

Meu belo moreno sentou em frente ao piano negro e brilhante e o teatro se silenciou. Seus dedos começaram a dedilhar uma melodia calma, mas com um fundo levemente melancólico. O toque dela era como brincar de dedilhar rápido e outrora dedilhar de forma lenta. Ele havia ficado tão lindo de terno e sapatos sociais. A senhora Red deve se orgulhar muito do homem que ela formou. O amor com que ele toca atinge a todos e emociona grande parte da plateia ali presente. Antes que houvesse tempo da orquestra começar a tocar junto com ele uma agitação das bailarinas que acabaram de sair do palco fez com que alguns músicos se assustassem.

- Fogo! - Uma delas gritou e correu rumo à saída pelo corredor entre as fileiras de cadeiras. Meus olhos a acompanharam até perdê-la de vista e voltaram para HyunWoo.

A gritaria começou e algumas pessoas se levantaram das cadeiras preocupadas com sua segurança. Olhei para cima do palco quando escutei um estouro seguido de um estalo de madeira. HyunWoo a essa altura já havia parado de tocar e estava prestes a se levantar. A cortina vermelha presa ao teto do palco caiu em chamas e alguns lustres caíram sobre as pessoas na plateia. Meu coração disparou. Não consigo mais vê-lo! O palco foi tomado pelo fogo e eu só ouço gritos e vejo uma correia alucinada. Uma explosão forte me fez voltar os olhos para o palco novamente, meu corpo estava travado de desespero. O teto cedeu. HyunWoo está lá em baixo e o teto cedeu com ele lá.

Sai do meu transe e desci as escadas correndo. São dez lances até lá embaixo. Os garçons continuavam a servir champanhe para as pessoas, porém elas só sabiam correr ignorando todo e qualquer contato que não fosse para salvar suas vidas.

- Mantenham a calma - Um dos funcionários do local aconselhava a população que se esmagava nas escadas - Por favor, senhores, mantenham a calma!

Precisava descer, mas com tanta gente na minha frente era impossível. Paciência. Paciência. Eu repetia como um mantra em minha mente. Quer saber? Que se foda a educação. Empurrei a mulher esnobe a minha frente, e o homem na frente dela, e todos os que se seguiram conseguindo descer para o sexto andar. Mais um tumulto de gente. Em frente à descida da escada, na parede, o relógio marcava cinco e quatorze.

"- Cinco horas em ponto - Ele riu e meu peito transbordou de felicidade com o som de sua risada.

- Digamos que nós gostamos desse horário - Brinco me lembrando que é essa hora que acaba minha aula de balé e corro para ala onde ele ensaia.

- É uma boa hora para se viver e uma boa hora para se morrer - Ele pisca para mim."

Por que HyunWoo? Por que você brinca com coisas tão sérias que nesse momento só me desesperam e apavoram mais ainda? Empurro o resto das pessoas sem nem reparar em quem eram ou deixavam de ser. Minha visão estava turva por conta das lágrimas e conforme me aproximava mais do térreo o cheiro tóxico de queimado já invadia minhas narinas causando tontura. O mar de pessoas corria para longe do palco em direção à saída e eu corria na direção inversa.

- Você tem que sair daqui. Não pode ir lá! - Um dos homens da segurança me barrou gritando.

- Senhor - Falei em tom alto pelo barulho - Senhor eu preciso ir salvá-lo. Ele está lá.

- Desculpe, não posso deixá-lo ir - Ele me segurava pelos braços enquanto me debatia tentando me soltar.

- I.M! - Ouvir seu grito fraco. As cortinas tinham virado cinza no chão e um corpo surgiu ao lado do piano erguendo a mão - Changkyun! - Era ele. Meu peito ardeu de dor. Eu preciso ajudá-lo. Ele me chama.

Tirei forças de onde não sabia que tinha e me soltei correndo na direção dele.

- HyunWoo! - Um pedaço do teto caiu na minha frente me fazendo voltar um passo. O caminho estava bloqueado. Olhei para as cadeiras, saltá-las não seria difícil. Braços me puxaram para trás, me arrastando, apesar de tentar me soltar, antes que eu pudesse tentar passar pelas cadeiras - HyunWoo! - Gritei mais uma vez.

- I.M! - Sua voz já estava quase inaudível.

- HyunWoo - Chorei. Chorei de o peito balançar de tanta dor. Não tinha mais forças para me debater. Apenas chorar - HyunWoo eu te amo! - Gritei com toda a minha força - Eu vou te salvar! - Tossi por conta da fumaça.

Minha visão estava escura, talvez não seja pelo choro. Senti um pedaço de madeira cair sobre meu corpo, porém a dor do meu coração era maior que a física. O cheiro da fumaça se impregnou de tal forma que o sentia colado nas paredes da minha narina. Meu corpo amoleceu, meu peito doía de dor por estar longe dele, minha mente só queria ter forças para correr novamente até lá, porém o resto de mim não reagia. Meu coração falhou uma palpitação e o mundo escureceu.

...

Queria voltar ao dia em que ganhei essa maldita rosa dele. Talvez para reviver as alegrias e guardá-las de forma mais profunda. Ela pareceu contar as semanas através da queda das pétalas até o acontecido. Exatamente no outro dia após nosso primeiro encontro ela estava na porta do meu apartamento com um bilhete dedicado por ele. Guardá-la foi meu pecado, foi como ativar a maldição que nela de certa forma existia. A última pétala caiu exatamente no dia do ocorrido e eu não percebi nada.

A última pétala caiu no dia que ele se foi. Ainda dói de uma forma que ninguém nunca vai conseguir imaginar ou conseguir descrever. Quando despertei do lado de fora, sentado na calçada, com a boca com o velho gosto enferrujado de sangue e uma dor insuportável no ombro direito e vi a senhora Red vindo em minha direção, chorando como uma criança deixando a postura de lado, meu coração acelerou em alerta. Um provável bombeiro conversava com um policial a alguns passos de onde eu estava. Parecia que todos estavam muito confusos e desnorteados para prestar a atenção.

- Foi um acidente para todos os efeitos. Ninguém pode saber que foi um atentado de guerra do Norte. Se perguntarem diga que parece que a estrutura antiga iniciou um incêndio no teto por conta própria graças a uma tubulação de gás furada. E que o ambiente estava iluminado por velas, provavelmente algum candelabro deve ter caído e iniciado um pequeno incêndio que se agravou, mas isso só a perícia poderia confirmar.

- Mas é muito rasa essa história - O bombeiro parecia assustado - Não vão acreditar nunca.

- Você quem sabe - O policial deu de ombros - Ou prefere dizer que o país vizinho jogou uma bomba e que ela atingiu parte do teatro municipal da capital do país?

Olhei a rua ao redor e só agora puder ver a imensidão de escombros que ela se tornou. A senhora Red parou um pouco longe e negou com cabeça. Ela escondeu o rosto por conta do choro. Só aí eu entendi. Eu fui covarde, eu não lutei o suficiente. Ele me chamou, ele gritou por mim, ele me viu, ele pensou que eu fosse alguém que ele pudesse contar. Mas eu sou um covarde, fodido, egoísta, que ao invés de lutar, fugiu e desmaiou na hora crucial. Se ele está morto agora é culpa minha. Se o cara que eu amo, se o cara que me salvou, se o cara da minha vida está morto, se HyunWoo se foi é culpa minha, toda e completamente minha. 



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