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História Igual Que Ayer - Ela me chamou de pai


Escrita por: jaimencanto

Capítulo 9 - Ela me chamou de pai


LETÍCIA

 

                        Era como nos velhos tempos. Marcia e eu estávamos falando sobre tudo o que fizemos durante aqueles anos e como sempre, os assuntos no fim rendiam boas gargalhadas. Eu já estava me sentindo renovada, e foi como se jamais tivéssemos deixado de nos falar por tanto tempo. De repente me peguei falando sobre Fernando, mas não da maneira que eu costumava falar ultimamente, e sim da maneira que eu falava quando estávamos juntos.

- Ele a trata muito bem. - Falei sobre a relação de Fernando e Júlia. - Sempre soube que ele seria um ótimo pai.

- Eu também. - Marcia concordou. - É difícil encontrar homens assim hoje em dia. A maioria não quer saber de ter filhos.

- Bom... Se te interessa saber, Guilhermo não é assim. Ele também sonha em ser pai.

- É mesmo? - Marcia sorriu. - Que bom saber. Ele está ganhando muitos pontos comigo nessa conversa.

Nós duas rimos até que nossa conversa foi interrompida com o toque do meu celular. Pensei que seria Fernando para dar notícias sobre Júlia, mas novamente não reconheci o número que apareceu na tela.

- Pode me dar licença? - Perguntei à Marcia.

- É claro. Fique a vontade.

    Apertei o botão para atender a ligação é assim que coloquei o telefone ao ouvido, ouvi um soluço. Meu coração disparou e eu não soube distinguir se era um choro de criança ou não.

- Alo? - Torci para que não fosse Júlia.

- Leticia?

A voz não me era estranha, mas eu ainda não consegui adivinhar de quem era.

- Sim?

- Aqui... É Terezinha Mendiola. A mãe do Fernando.

Arregalei os olhos espantada e Marcia me olhou curiosa. Em todos os anos, até mesmo quando estava com Fernando, Terezinha jamais havia ligado para mim.

- Como vai, Terezinha? - Perguntei tentando não parecer tão fria.

Marcia imediatamente cuspiu o suco e me olhou assustada. Ouvi vozes ao fundo da ligação e percebi que Terezinha estava mais nervosa do que eu pensava. Imediatamente pensei que algo poderia ter acontecido com Julia, mas então, Fernando teria me ligado, e não ela. Não sei se me sentia aliviada ou ainda mais tensa, já que para Terezinha me ligar, algo muito grave deveria ter acontecido.

- O que aconteceu? – Perguntei apreensiva.

               Ela falou algumas coisas que eu não consegui entender. Estava nervosa demais para conseguir se explicar, e as vozes ao fundo não ajudavam em nada.

- Terezinha, espera. Eu não estou entendendo nada. Fale devagar, por favor. O que aconteceu?

- Eu preciso que você venha aqui em casa, agora mesmo!

 - O que foi que aconteceu? – Voltei a perguntar, preocupada.

- Fernando está muito nervoso, fora de si. E mesmo assim está insistindo para dirigir. Nós estamos tentando acalmá-lo, mas está impossível!

- Por que ele está assim? A Julia está bem? – Meu coração estava disparado.

- Sim, ela está bem! Mas Fernando está muito alterado. Só você consegue acalmá-lo.

               Me levantei imediatamente e Márcia me olhou.

- Estou indo agora mesmo.

- Obrigada.

               Desliguei o celular e Márcia também se levantou.

- O que aconteceu? – Perguntou preocupada.

- Eu não entendi muito bem. Terezinha estava chorando, muito nervosa. Disse que Fernando está alterado e quer pegar o carro, mas não está em condições.

- Meu Deus! O que aconteceu será?

- Eu não sei, mas preciso ir para lá o mais rápido possível.

- Eu a levo!

- Seria ótimo, obrigada!

               Pagamos a conta e saímos às pressas em direção ao carro de Márcia. Durante todo o caminho pensamos em algumas hipóteses que poderia ter deixado Fernando tão alterado a ponto de sua mãe me ligar chorando, mas nenhuma era tão grave assim. Eu estava preocupada, não apenas por Julia estar lá e provavelmente estar vendo tudo, mas tambem com ele. Poucas vezes vi Fernando nervoso, e nessas poucas vezes, eu preferia não ter visto. Eu sabia como ele ficava fora de si, e definitivamente se ele dirigisse daquela maneira, algo pior poderia acontecer. Eu não queria pensar naquilo, ou ficaria ainda mais preocupada.

               Por sorte não demoramos muito tempo para chegarmos. Márcia se anunciou para o segurança à porta e ele permitiu nossa entrada. Logo descemos do carro e seguimos em direção à casa às pressas. Assim que entramos pela porta da frente, eu vi Fernando sentado ao sofá com a cabeça baixa, escorando em seus joelhos. Humberto estava parado ao lado dele, parecendo tenso. Assim que nos viu, ele deu um suspiro de alivio e bateu no ombro de Fernando. Nos aproximamos dos dois, e assim que Fernando ergueu sua cabeça, percebi que ele havia chorado. Seus olhos estavam vermelhos de uma maneira que só ficaria depois que ele chorasse bastante.

- Meu Deus! O que aconteceu? – Márcia perguntou quando nos aproximamos.

               Nenhum dos dois responderam. Me abaixei na frente de Fernando e ele me olhou com pesar, e logo seus olhos encheram-se de lágrimas.

- O que houve? – Perguntei segurando suas mãos.

- Me desculpe, Lety... – Disse com a voz rouca.

               Eu não entendia absolutamente nada que estava acontecendo. Até que Henrique apareceu à sala, com a boca machucada e uma bolsa de gelo em sua testa.

- O que aconteceu com você? – Márcia perguntou.

               Henrique olhou para Fernando e sua feição de tristeza logo mudou para raiva. Só então percebi que havia acontecido algo entre os dois, e para que brigassem, deveria ser algo muito grave. Eu sabia o quanto Fernando respeitava Henrique, não apenas por ele ser o seu irmão mais velho que sempre o protegeu dos chiliques de sua mãe, mas também porque acima e tudo eles eram amigos.

- Conte para ela. – Humberto disse batendo no ombro de Henrique.

               Eles estavam falando de mim. Me levantei confusa e Henrique me olhou da mesma maneira que Fernando olhou quando chegamos.

- Me contar o que? – Perguntei.

- Tem uma coisa que você precisa saber. – Henrique disse.

               Demorou um tempo, mas enfim ele criou coragem para me dizer o que estava acontecendo. Henrique começou relembrando sobre a carta que eu mandei há Fernando quando descobri que estava grávida. Eu não sabia o motivo daquela recordação, até ele começar a explicar o que realmente aconteceu. Desde quando Terezinha roubou a carta do apartamento de Fernando, até a minha conversa com Henrique ao telefone. Ele contou toda a verdade, que Fernando não sabia de nada e nem chegou a saber da existência da carta. Tudo foi armado por Terezinha e Henrique.

               A medida que ele revelava mais coisas, me sentei pesadamente ao sofá encarando o chão. Eu não sabia o que sentir. Não sabia se ficava extremamente furiosa pelo que fizeram, se ficava aliviada por saber que Fernando jamais me rejeitou ou se negou saber sobre a minha gravidez, ou se me sentia péssima por todos aqueles anos de enganação. Fernando e eu fomos vítimas.

- E eu sinto... Sinto muito mesmo, Lety. De verdade. -Henrique finalizou o desabafo.

               Não respondi. Estava literalmente sem palavras. Fernando respirou fundo e deitou a cabeça no sofá, tampando o rosto com os braços. Márcia e Humberto apenas nos olhavam, provavelmente sem saber o que dizer para nos ajudar.

- Por que não vai ver como sua mãe está? – Humberto disse à Henrique, e ele balançou a cabeça concordando.

               Olhou para Fernando uma ultima vez e saiu.

- Eu sabia que tudo não passava de um mal entendido. – Márcia disse.

- Não foi um mal entendido, Márcia. Foi uma armação! – Fernando disse olhando-a. – Uma armação da minha própria família.

- Isso é um absurdo! – Ela disse revoltada. – Eu sempre soube que sua mãe não batia bem da cabeça, desculpe, Humberto. Mas Henrique? Eu sempre disse que ele era um idiota, mas nunca imaginei que eu tivesse razão.

- Eu nunca vou conseguir perdoá-los. – Fernando disse rancoroso, e então me olhou, aproximando-se de mim. – Eu espero que você saiba que eu jamais a negaria, não é? Se eu soubesse sobre a carta teria respondido imediatamente, e eu nunca iria... Nunca iria recusar um filho seu.

- Eu sei. – Falei sincera, com a garganta em chamas. – Agora eu sei disso. Na verdade, eu deveria saber, mas... É tudo tão complicado. Eu estava magoada, não é fácil pensar com clareza quando se está magoada. Eu deveria ter imaginado que sua mãe faria algo assim.

- Eu também. – Ele disse magoado.

- É tudo muito confuso! – Suspirei. – Precisamos de um tempo para... Colocarmos tudo no lugar.

               No mesmo instante, Julia apareceu à sala. Julgando pelas suas roupas de banho, ela provavelmente estava sendo entretida na piscina, e estava acompanhada por Isabela. Tentei não pensar sobre Isabela estar na casa dos pais de Fernando, principalmente porque não era o momento para mais um problema para martelar em minha cabeça.

- Oi mamãe! – Julia andou em minha direção e eu a envolvi em um abraço.

- Oi meu amor. – Sorri me sentindo reconfortada em seu abraço. – O que estava fazendo?

- Eu estava nadando. Isabela estava comigo, mas não quis entrar na piscina.

               Sorri para Isabela e ela retribuiu o sorriso.

- Você está chorando? – Ela perguntou andando em direção à Fernando.

               Ele não respondeu. Apenas passou a mão em seu rosto e sorriu triste. Julia o abraçou e eu senti que meu coração explodiria com aquela cena. Ele apertava o abraço e eu percebi que também sentia-se amparado com o carinho de Julia. Ela tinha esse dom.

- Eu sinto muito. – Ele sussurrou enquanto a abraçava.

               Márcia me olhou com tristeza e eu tive que ter forças para controlar a vontade de chorar com ele. Eu estava tão confusa e magoada quanto ele, mas claramente sua dor é maior, por saber que foi traído por sua própria família. Olhando a maneira que ele abraçava Julia, de certa forma me senti culpada por ter acreditado em toda aquela história, e ter impedido Fernando de saber sobre ela por tanto tempo. Mas, eu também era vítima naquela história, e mesmo que me doesse pensar nisso, eu teria que me concentrar no presente.

- Desculpe ter ficado tanto tempo sem te conhecer. – Ele disse sem conter as lágrimas, enquanto a abraçava.

               Julia o olhou e limpou as lágrimas dele, sorrindo logo depois.

- Está tudo bem. Não precisa se preocupar com isso. Você está sendo um ótimo pai.

               Todos nós sorrimos, inclusive Fernando, que voltou a abraça-la. Percebi que eu estava chorando junto com ele, e tratei de limpar logo as lagrimas. Julia não iria querer ver o seu pai e sua mãe chorando no mesmo dia. Desviei minha atenção para Isabela e ela também sorria emocionada para os dois. Só então parei para pensar que só havia um motivo para ela estar ali na casa dos pais de Fernando. Ele não a levaria lá se os dois não tivessem um relacionamento. Senti o ciúme me dominar e logo me levantei. Todos olharam para mim e eu tentei disfarçar, olhando para Julia.

- Seu pai precisa descansar. É melhor irmos embora.

- Ah, mamãe! Não podemos ficar um pouco mais? – Choramingou.

- Não, meu amor. Precisamos ir. Seu pai precisa ficar um pouco... - Olhei para Isabela. – Sozinho.

- Mas eu posso ficar e fazer companhia para ele não ficar sozinho.

               Eu me emocionava ao vê-la tratando-o com tanto carinho, e como toda aquela tristeza se resumia à um mal entendido relacionado à Julia, não tive coragem de negar o pedido dela.

- Bom... Se ele não se importar.

               Ela o olhou animada e Fernando sorriu.

- Seria ótimo!

- Então, tudo bem.

               Eu nunca havia passado uma noite sequer longe de Julia, mas embora já estivesse sentindo sua falta, eu me sentia feliz por saber que Fernando ficaria bem com sua companhia.

- Eu a levo em casa. – Marcia disse à mim.

- Obrigada. – Sorri. – Então... Amanhã eu a busco? – Perguntei à Fernando.

- Eu a deixo na casa dos seus pais.

- Tudo bem.

               Me abaixei e ela me abraçou.

- Se comporte, tudo bem?

- É claro! – Ela sorriu. – Tchau, mamãe.

- Tchau, meu amor.

               Julia também estava feliz por passar mais tempo com seu pai, e eu notei isso.

- Obrigado, Lety. – Fernando disse.

- Tudo bem. – Sorri. – Nos vemos amanhã.

- Certo.

- Humberto, Isabela... Até logo.

- Até. – Isabela sorriu.

- Até logo, Lety. – Humberto respondeu.

               Márcia acenou para todos e nós seguimos até a porta. Antes de sair, olhei para Julia que estava empolgada ao lado de Fernando e sorri. Sorri por saber que apesar de tudo, as coisas estavam indo bem.

 

 

 

•••

 

FERNANDO

 

 

               Chegamos em meu apartamento e Julia olhou em volta. Não era um lugar tão espaçoso, mas eu conseguia me sentir confortável ali. E pelo visto ela também gostou, porque logo que chegou sentou-se ao sofá e sorriu enquanto estudava tudo à sua volta.

- O que achou? – Perguntei trancando a porta.

- Eu gostei. Muito. É maior do que imaginei.

- Maior? – Sorri olhando-a. – Você pensou que eu morava em um buraco? – Brinquei e ela gargalhou.

- É claro que não!

- Bom, mas fico feliz que tenha gostado. – Sorri. – Está com fome?

- Muita!

- Eu pensei em fazer algo... Mas acho que você não vai gostar.

- O que?

- Hum... Espaguete, talvez. Mas acho que você não gosta muito, não é?

- Mas eu AMO espaguete! – Ela disse empolgada.

- Ah é? Então acho que vamos ter espaguete para o jantar.

- Oba!

               Passar o restante da noite na companhia da minha filha com certeza me animou. Por um tempo pensei ter esquecido o que aconteceu, e todas as vezes que ela gargalhava ou me fazia rir, eu sentia o meu coração se encher de alegria, e tudo o que eu e Letícia sofremos até ali, não parecia tão doloroso quando eu pensava que minha vida havia dado uma reviravolta. Enquanto jantávamos e ela se deliciava com o espaguete, eu não conseguia parar de sorrir.

- O que acha de ter um quarto para você aqui? – Perguntei durante o jantar. – Poderíamos pintá-lo de vermelho, comprar brinquedos novos para ele...

- Seria ótimo! – Ela sorriu, mas não pareceu tão empolgada quanto eu esperava. – Mas o que eu queria mesmo era ter uma casa para que eu, você e minha mãe morássemos juntos.

               A olhei com tristeza.

- Meu amor, infelizmente... Não é tão simples assim.

- Você e minha mãe nunca vão ser um casal?

               Eu não soube o que responder. Ela era nova demais para entender toda a confusão que era a minha relação com Lety, e que apesar de eu ainda amá-la com todas as forças, não era tão fácil resolvermos as coisas, mesmo depois do que descobrimos naquela manhã.

- Eu...  Não sei, filha.

- Eu ouvi minha avó dizendo que minha mãe e Guilhermo formavam um bonito casal. Mas quer saber? Por mais que eu goste dele, eu acho que você e minha mãe combinam muito mais.  E eu acho que vocês deveriam se casar.

- Muito bem, mocinha... – Me levantei rindo. – Acho que você comeu muito espaguete e ficou um pouco doida da cabeça.

- Mas é verdade!

- Tudo bem! – Recolhi os pratos da mesa. – O que quer fazer agora? Quer ver um filme?

- Você tem filmes de criança?

- Não exatamente, mas devo ter algum Harry Potter perdido por ai.

- Eu adoro Harry Potter!

- Então... Será Harry Potter. – Sorri. – Por que não toma um banho enquanto eu ajeito tudo por aqui?

- Tudo bem.

- O banheiro é logo ali virando a direita. Sabe para qual lado é a direita?

 - Por favor... Eu não tenho mais cinco anos. – Ela debochou e eu sorri divertido. Ela pegou sua mochila e seguiu pelo corredor. Por alguns segundos ela ficou parada, olhando para a porta da direita e da esquerda, mas acertou onde era o banheiro. Balancei a cabeça rindo e levei os pratos para a cozinha.

 

 

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               Lety parou à porta da cozinha e observou Fernando lavar as louças. Demorou um tempo até ele perceber que ela estava ali, e então sorriu olhando para ela.

- O que foi? – Ele perguntou.

- Você é uma verdadeira dona de casa. – Ela brincou.

- Dono de casa, por favor.

- Tudo bem. Dono de casa. – Ela se aproximou abraçando-o por trás. – Vou ser uma esposa de sorte. Você sabe fazer tudo.

- Quase tudo. Ainda estou tentando não deixar o arroz queimar.

- Você pega o jeito.

- Não vai ficar mal acostumada, não é?

- É claro que não. Quero dizer... Eu acho que não.

- Acha, não é? – Ele riu passando espuma no nariz dela.

- Precisa de ajuda? – Ela sorriu maliciosa, desabotoando um botão da camisa de Fernando.

- Eu preciso terminar de lavar essa louça... – Ele respondeu divertido.

- Você pode fazer isso depois.

               Fernando gargalhou virando-se para ela entrelaçando seu braço por sua cintura. Letícia riu e ele a colocou sentada sobre a pia.

- Eu te amo. – Ele sussurrou olhando para os lábios dela.

- E eu te amo muito mais.

               Satisfeito, ele se colocou entre as pernas ela e a beijou.

 

 

 

•••

 

 

 

               Eu já conhecia todas as falas daquele filme, mas como era o único próprio para crianças, não tivemos muita opção. Eu já deveria imaginar que Julia estava cansada demais para conseguir assistir à um filme inteiro, mas esperava que ao menos até a metade do filme ela estivesse acordada. Mas, depois de exatos vinte minutos, ela adormeceu em meu colo. Eu também estava exausto, mas não queria acordá-la tão logo. Seu sono parecia tão profundo...

               Enquanto eu acariciava os cabelos dela e lutava contra o sono, repetindo todas as falas do filme, meu celular avisou que havia chegado uma mensagem. Pensei que seria Letícia perguntando como ela estava, mas logo vi o nome de Isabela.

*Isabela: Você está melhor?

*Fernando: Estou melhorando... Obrigado. E obrigado pela ajuda hoje na casa dos meus pais.

*Isabela: Não há de que. Como estão as coisas aí? Estão se divertindo?

*Fernando: Estávamos. Agora o sono nos pegou. Hahaha

*Isabela: O mesmo aqui. Bom, só quis saber como estavam.

*Fernando: Desculpe não ter tido tempo de falar sobre o seu almoço. Amanhã conversamos, ok?

*Isabela: Tudo bem! Boa noite!

*Fernando: Boa noite!

               Coloquei o telefone sobre o sofá e já não aguentava mais lutar contra o sono. Desliguei a TV e com cuidado peguei Julia no colo. Ela resmungou um pouco, mas deitou sua cabeça em meu ombro voltando a dormir. Caminhei até o meu quarto e com cuidado a deitei à cama. Eu a cobri e ela se mexeu. Me virei pronto para sair do quarto, mas ela segurou minha mão. Eu a olhei, e ainda com os olhos fechados ela apertou minha mão.

- Boa noite, papai.

 

 

•••

 

 

A emoção me fez fazer o impensável. Assim que sai do quarto peguei o meu celular e apertei o contato de Lety. Só quando ouvi o som da chamada e sua voz que atendeu quase imediatamente que me dei conta do que estava fazendo.

- Alo?

- Ahm... Oi.

- Oi.

Percebi que eu não havia formulado o que diria.

- Como estão as coisas? - Ela perguntou.

- Bem. Na verdade, ótimas.

- Tanto assim? O que fizeram de tão bom?

- Apenas comemos dois sacos de doces e açúcar puro.

- Isso é sério?

- Não.

Ela riu.

- Na verdade, acabou de me acontecer uma coisa... Ótima.

- O que?

- Júlia. Ela... Ela me chamou de pai.

Mais uma vez fez-se silêncio, e eu não sabia se era bom ou ruim.

- Isso é... Fantástico! - Ela disse realmente animada.

- Não é? - Sorri me sentando ao sofá como se ainda estivesse nas nuvens. - Não sei explicar o que senti e o que estou sentindo agora. A sensação é... Ótima.

- Eu posso imaginar.

- Está chorando? - Perguntei ao notar um som estranho do outro lado da linha.

- Não. Estou ficando um pouco gripada.

- Sei. - Ri fingindo acreditar.

- Então agora está tudo bem?

- Depois disso... Definitivamente.

É claro que ainda havia o fato de que Letícia e eu teríamos que conversar a sós sobre o que aconteceu, mas eu estava tão extasiado com isso, que a única coisa que passava em minha cabeça naquele momento era Júlia me chamando de "papai" repetidas vezes.

- Vocês estão sozinhos aí?

- É claro. Por que não estaríamos?

- Pensei que Isabela estivesse aí também.

- Não. Eu a deixei em casa quando viemos.

- Ah...

- Mas por que está perguntando isso?

- Por nada. Pensei que ela costumasse dormir aí.

               Não pude evitar abrir um largo sorriso.

- Está com ciúmes Letícia Padilha?

- Não. É claro que não! Não tenho motivos para isso. Foi apenas... Uma curiosidade.

- Certo. - Respondi meio à um riso.

- Bem... Vou desligar. Precisamos descansar. O dia foi... Cheio.

- Tudo bem.

- Boa noite.

- Para você também.

Continuei na linha mesmo depois que ela desligou. A sensação de ter voltado ao passado me fez sorrir. Apesar de tudo o que aconteceu, ironicamente Letícia e eu parecíamos estar nos acertando. Exceto o fato de que eu ainda não sabia seus motivos para ter terminado tudo entre nós dois. Nada voltaria a ser como antes enquanto eu não soubesse de tudo, e pelo visto, ela ainda não estava disposta a dizer.

 

 

•••

 

LETÍCIA

 

               Não sei o que deu em mim depois que desliguei o telefone. Acho que desabafei tudo o que estava prendendo durante todo o dia. Deitei em minha cama, abracei ao meu travesseiro e chorei. Chorei por pensar que uma maldita armação fez com que eu me afastasse de Fernando por seis anos. Que por uma armação, eu privei minha filha de conhecer o próprio pai. Que por uma armação, eu pensei que todos aqueles anos Fernando me negara, e que fez o mesmo com Julia indiretamente. Mas também, chorei por saber que Julia era melhor do que isso, e que era uma garota forte e que mesmo com tão pouca idade, conseguia superar tudo isso. Eu que por tanto tempo tive medo do que poderia acontecer quando ela soubesse sobre Fernando, e quando soubesse do que aconteceu para que ela não conhecesse o pai por todos aqueles anos, enfim estava aliviada por tudo estar se encaixando. Eu daria tudo, tudo para ouvi-la chamando-o de pai pela primeira vez. Fernando não sabia, mas um dia eu contaria que sua primeira palavra foi “papai”, mesmo que ela não o conhecesse. Ela não disse para Guilhermo, e não disse para nenhuma outra pessoa. Ela disse para mim. Tão pequena, tão frágil e tão indefesa. Eu chorei naquele dia, e depois de seis anos chorei novamente pelo mesmo motivo.

               Eu sabia que a culpa do que aconteceu não era inteiramente minha, mas no fundo, eu me sentia péssima pelo que aconteceu e pelo que passamos. Eu ainda amava Fernando, amava tanto quanto antes, e a única coisa que eu poderia fazer era guardar esse sentimento para mim. Precisávamos conversar, isso era fato, mas precisávamos do momento certo. Precisávamos sentir que estava na hora de falarmos sobre tudo, e não agirmos por impulso. Eu esperava que um dia Fernando pudesse entender porque eu fui embora, e que também pudesse entender que depois de todos aqueles anos, mesmo depois de ter sido magoada por ele (ou pela sua mãe, que armou tudo isso), eu ainda o amava. Com todas as minhas forças. E por isso chorei. Chorei, porque foi o único momento que pude desabafar sobre isso, sozinha em meu quarto provisório na casa dos meus pais.

 

 

•••

 

FERNANDO

 

 

No dia seguinte acordei mais cedo do que de costume. Ainda estava me sentindo extremamente bem por ter terminado minha noite da melhor maneira. Nem mesmo ter dormido no quarto de solteiro naquela cama mais dura do que uma rocha me tirou o bom humor. Logo fui preparando o café da manhã, algo que eu não fazia há algum tempo já que costumava comer alguma coisa à caminho do trabalho. Enquanto eu estava à cozinha lendo um jornal enquanto os ovos fritavam, ouvi um barulho de passos se aproximando, e quando olhei à porta, Julia me olhou sonolenta abraçada ao seu ursinho.

- Bom dia, princesa. – Sorri.

- Bom dia. – Ela sorriu ainda sonolenta.

- Você dormiu bem?

- Sim! Não estou acostumada a dormir sozinha em uma cama tão grande.

- Você ficou com medo? Deixei a luz do abajur aceso para evitar isso.

- Não... – Ela se aproximou e eu a peguei em meu colo.

- Sabe... Ontem você disse algo para mim quando eu a coloquei na cama que me deixou muito, muito feliz. Eu não sei se você disse isso em sã consciência, mas...

- O que? Eu te chamei de papai?

               Abri ainda mais o sorriso.

- Sim!

- Eu espero que não se importe.

- Mas é claro que não. Por que eu me importaria?

- Eu não sei. Talvez... Você prefira que eu te chame de Fernando.

               Sua inteligência era fora do normal. Eu não sentia que conversava com uma criança de apenas seis anos.

- Para ser sincero, me chamar de papai é muito mais legal.

- É? – Ela sorriu.

- Sim! Muito!

- Então... Tudo bem!

               Beijei seu rosto satisfeito e a coloquei no chão, voltando a mexer os ovos.

- Espero que goste de ovos com bacon no café.

- Nós vamos comer isso? – Ela perguntou parecendo perplexa.

- Por quê? Você não gosta?

- Eu gosto muito, mas minha mãe não me deixa comer essas coisas pela manhã.

- Bom... Não precisamos contar para ela. – Pisquei e ela riu.

               Tivemos um café da manhã animado, e para a minha felicidade, Julia dizia a palavra “papai” em cada frase que falava. Ela parecia tão satisfeita quanto eu por dizer isso, e eu não conseguia parar de ouvir enquanto conversávamos. Aquilo definitivamente fez o meu dia, ao menos até eu receber uma ligação durante o café.

- Só um minuto... – Falei à Julia, me levantando e caminhando para o corredor enquanto ela continuava o seu café da manhã.

A ligação era de Henrique, e eu não queria que ela presenciasse outra discussão como a do dia anterior.

– O que é que você quer? – Falei ao atender o celular.

- Fernando, não desligue.

- Eu não tenho nada para falar com você.

- Fernando, me escuta! É o papai...

               Meu coração gelou.

- O que aconteceu? – Perguntei tenso.

- Ele está no hospital. Preciso que venha para cá.

- Mas... Como? Por quê?

- Ele se sentiu mal durante a madrugada, e de manhã desmaiou. Eu o trouxe para cá, estamos esperando darem notícias. Mas, ele está internado.

- Eu... Eu chego aí em alguns minutos.

- Certo.

               Finalizei a ligação e imediatamente procurei pelo contato de Letícia. Olhei para Julia para me certificar de que ela não escutou a conversa, e com as mãos tremulas, esperei ansiosamente Letícia atender.

- Alô?

- Letícia.

- Oi! O que houve? Que voz é essa?

- Eu preciso deixar a Julia em sua casa antes do horário combinado. Na verdade, vou levar ela agora.

- Mas por quê? O que foi que aconteceu?

- O meu pai, ele está no hospital. Se sentiu mal e agora está internado.

- Meu Deus!

- Preciso ir para lá imediatamente!

- É claro! Pode trazê-la.

- Certo. Chego aí em alguns minutos.

- Ok. Até logo.

- Até.

               Desliguei o telefone e tentei ao máximo parecer tranqüilo ao falar com Julia, sem precisar mencionar que meu pai estava no hospital. Eu não queria preocupá-la.

- Ahm... Filha...

Ela me olhou.

- Mudança de planos. Preciso levá-la para a casa dos seus avós agora mesmo.

- Por quê?

- Eu prometo explicar tudo depois. Mas, eu prometo que assim que possível nos vemos de novo, tudo bem?

- Está bem.

- Então... Podemos buscar suas coisas? Já terminou o café?

- Sim! – Respondeu pulando da cadeira. - Podemos ir.

               Ela pareceu entender, para o meu alívio. Rapidamente seguimos à caminho da casa dos pais de Lety, e ao menos os assuntos de Julia me distraíram para que eu não pensasse o pior. Temia pela saúde do meu pai principalmente porque ele era o único daquela casa que parecia me entender, e a ligação que tínhamos um com o outro era muito forte. Henrique sempre foi mais ligado com minha mãe, e eu com meu pai, e saber que ele estava em um hospital, esperando uma resposta para o que aconteceu, era assustador.

               Assim que chegamos, Julia desceu do carro e eu a acompanhei até o portão. Batemos o interfone e logo Letícia apareceu para recebê-la.

- Oi mamãe! – Julia disse animada abraçando-a.

- Oi meu amor! Como foi? Se divertiram?

- Sim! Muito! Nós comemos espaguete, assistimos Harry Potter, e hoje comi ovos e bacon no café... – Sua voz diminuiu e ela olhou tensa para mim. Sorri para ela dizendo estar tudo bem e Letícia riu.

- Que bom que aproveitaram. – Letícia me olhou e seu sorriso diminuiu. – Meu amor, por que não vai lá para dentro ver seus avós? Eu entro em um instante.

- Tudo bem. – Ela virou-se para mim e eu me abaixei para abraçá-la. – Tchau, papai.

               Percebi que Letícia suspirou e abriu um largo sorriso ao ouvi-la dizer aquilo. Apertei o abraço e depositei um beijo em sua testa.

- Até logo, filha.

- Até! Não demora para vir me ver!

- Eu prometo.

               Julia pegou sua mochila de minhas mãos e passou pelo portão, nos deixando a sós.

- Como seu pai está? – Letícia perguntou.

- Henrique me enviou uma mensagem e disse que estão fazendo alguns exames. Precisamos esperar para saber o que aconteceu. Mas pelo visto ele já acordou e está bem.

- Que bom! Fico aliviada em saber disso.

               Ficamos em silencio por um tempo, mas ainda assim senti que Letícia queria me reconfortar de alguma maneira. Ela mal sabia que apenas o fato dela estar em minha frente já me reconfortava de alguma maneira.

- Espero que tudo fique bem.

- Obrigado. – Suspirei. – Bom... Eu vou indo.

- Certo. Me de... Notícias. Assim que souberem de alguma coisa.

- Pode deixar.

- Obrigada por ter cuidado de Julia...

- Foi tão bom para mim quanto para ela. – Sorri satisfeito.

- Eu imagino... Papai. – Ela riu e eu abri ainda mais o sorriso.

- Até mais, Lety.

- Até.

               Segui em direção ao carro e notei que ela continuou parada ao portão, até que eu arrancasse o carro.

 

 

•••

 

 

               Cheguei ao hospital e segui rapidamente até a recepção, mas antes de perguntar sobre meu pai, Henrique apareceu chamando pelo meu nome. Eu o olhei e ficamos em silencio por um tempo, mas então percebi que teria que conversar com ele se quisesse saber notícias sobre o meu pai.

- Como ele está? – Perguntei.

- Está bem. Está medicado, mas agora está bem. Não podemos vê-lo ainda. Estamos aguardando o resultado do exame.

- E a mamãe?

- Está no quarto com ele.

               Um silencio perturbador pesou o clima, e então Henrique deu um longo suspiro que chamou minha atenção.

- Será que nós podemos conversar? – Perguntou.

- Não. – Respondi rapidamente e ele arqueou as sobrancelhas. – Não é o momento para conversarmos disso. Além do mais, nada do que você disser vai apagar o que fez e nem fazer voltarmos ao passado para fazer diferente. Então... Apenas esqueça isso.

               Eu ainda estava furioso com Henrique e com minha mãe, mas naquele momento a única pessoa que me importava era o meu pai, e com certeza ele não se sentiria feliz em continuarmos brigando. Até porque o estrago já estava feito, e nenhum dos dois poderia me fazer resgatar os seis anos que passei longe de Lety e da minha filha. Henrique por fim concordou e ficamos em silencio na sala de espera, até Isabela chegar acompanhada de Márcia e Omar. De certa forma eles deixaram o clima menos tenso, mas o silencio ainda estava perturbador.

               Depois de longos minutos esperando por notícias, enfim um médico apareceu e todos nós nos levantamos apreensivos.

- Vocês são da família do Humberto Mendiola?

- Sim! – Henrique e eu respondemos juntos.

- Ele está bem. Já fizemos os exames e constatamos que ele teve um princípio de AVC.

               Senti o meu corpo inteiro se arrepiar.

- E... O que nós podemos fazer sobre isso? Tem algo que possamos fazer para ajudar? – Henrique perguntou.

- Bom, ele já está bem, mas precisa tomar medicamentos controlados.

- Certo. – Concordei.

- E então com o tempo vamos ver como anda o tratamento. E o mais importante, é imprescindível que ele não se estresse. Qualquer coisa relacionada à trabalho, família, seja o que for. Isso pode agravar o estado dele e causar algo pior.

               Henrique e eu nos olhamos. Era um péssimo momento para tal indicação, mas se fosse pelo bem do meu pai, eu estava disposto a ignorar completamente minha mãe e Henrique para evitarmos qualquer tipo de discussão.

- Nós faremos isso. – Falei.

- Então... Logo podem visitá-lo e creio que não vai demorar para ter alta.

- Obrigado, Doutor. – Henrique agradeceu apertando sua mão.

- Obrigado. – Repeti o gesto.

- Não há de que.

               Assim que ele se afastou, Isabela, Márcia e Omar suspiraram aliviados e nos tranqüilizaram dizendo que ficaria tudo bem. De repente, Letícia aparece e fazendo com que todos olhássemos para ela. Eu sinceramente não esperava que ela fosse aparecer ali, mas me senti extremamente feliz ao vê-la.

- Oi. – Ela me olhou.

- Oi. – Respondi apenas.

 

 

•••

 

LETÍCIA

 

               Me senti envergonhada por todos me olhando daquela maneira, mas eu deveria imaginar que chegar ali de surpresa fosse causar essa reação.

- Como seu pai está? – Perguntei à Fernando.

- Agora está bem. Ele... Teve um princípio de AVC, mas está bem agora. Só teve algumas recomendações.

- Oh! – Respondi magoada. – Mas... Pelo menos agora ele está bem, não é? – Sorri triste.

- Sim. – Ele retribuiu o sorriso. – Obrigado por ter vindo.

               Notei que Isabela também estava presente, e comecei a pensar se teria sido uma boa eu ter ido até la. Minha intenção era apoiar Fernando e ficar ao seu lado caso precisasse, mas ele já tinha alguém que fazia isso por ele. Durante o silencio que se formou, Guilhermo se aproximou de onde estávamos e cumprimentou à todos. Fernando o olhou, mas não respondeu seu cumprimento, deixando o clima ainda mais pesado.

- Esse é Guilhermo. – Apresentei à todos.

               Ele apenas sorriu, assim como o restante. Principalmente Márcia.

- E a Julia? – Fernando perguntou quebrando o silencio.

- Ficou com meus pais. Achei melhor não trazê-la para cá.

- Fez bem.

               Não estava sendo fácil todo aquele silencio, principalmente com todo mundo em nossa volta. Eu me sentia desconfortável e sentia que todos esperavam que a qualquer momento fossemos discutir ou algo do tipo. Mas eu não queria discutir. Pelo contrário.

- Nós... Podemos conversar? – Sugeri.

- Sim, é claro. – Ele respondeu imediatamente.

- Tem uma cafeteria aqui do lado. Podemos ir para lá.

- Está bem.

               Olhei para Márcia e ela piscou para mim.

- Eu já volto. – Fernando disse, mas não soube para quem ele disse. Provavelmente foi para Isabela.

               Caminhamos juntos em silencio até a cafeteria, e quando sentamos à mesa, Fernando me olhou.

- Você... Quer falar sobre o que aconteceu? – Ele perguntou escorando-se à mesa.

- Acho que não é um bom momento para isso.

- Na verdade, eu acho que é um bom momento para isso.

               Esperei que ele continuasse.

- Eu sei que o que minha mãe e Henrique fizeram é imperdoável, e eu nem mesmo sei se algum dia vou conseguir perdoá-los por isso. Ainda tenho raiva, mágoa, e rancor, mas... A situação do meu pai é delicada. Ele não pode se estressar, e com certeza essa confusão que teve ajudou para que ele se sentisse mal. Não quero que ele presencie mais brigas entre meu irmão e eu, então... Bom... Vou tentar evitar ao máximo tocar nesse assunto perto do meu pai.

- Eu entendo, e acho que é mesmo melhor. – Respondi sincera. – De qualquer maneira, você brigar e gritar com eles não vai fazer as coisas mudarem.

- É, foi o que pensei. E está tudo bem para você também? Quero dizer... Evitar esse assunto com Julia ou com outras pessoas?

- Bom... Confesso que é difícil pensar que passei todos esses anos achando que você tivesse nos rejeitado, e... Cuidar de Julia sem ter você por perto de certa forma foi doloroso, apesar de termos a ajuda de Guilhermo. Mas eu vou me esforçar para não pensar nisso, principalmente porque gosto muito do seu pai. Ele sempre me tratou muito bem.

- E eu gostaria de aproveitar para pedir desculpas pela minha mãe. Sei que desde que nós... – Ele deu uma breve pausa. – Desde que nós estávamos juntos ela nunca a tratou bem. Ela precisa entender em algum momento que o que tivemos não foi uma besteira, e foi real.

               Fiquei em silencio.

- Ao menos eu acho que foi real.

- Por que diz isso? – Perguntei ofendida.

- Bom... Depois de tudo o que aconteceu nesses últimos dias, você ainda não disse porque foi embora. E ainda se recusa a dizer.

- E justamente depois de tudo, isso ainda é tão importante?

- Mas é claro que é! Ou você acha que eu simplesmente vou conseguir esquecer que você me abandonou quando estávamos planejando toda uma vida juntos? Na verdade, foi justamente por isso que tudo aconteceu. Se você não tivesse ido embora, não teria toda essa confusão e mal entendido e teríamos criado a Julia juntos!

- Está me culpando por tudo o que aconteceu? – Perguntei irritada.

- Eu não sei dizer enquanto você não me explicar porque me deixou! – Ele aumentou a voz e eu me calei. – Você consegue imaginar o quanto eu sofri com isso? O quanto eu quis simplesmente sumir durante todos esses anos?

- Acontece que para mim também não foi nada fácil todos esses anos! A única coisa que me fazia continuar era Julia, apenas isso.

- Então por que você decidiu ir embora, Letícia? Por quê?

               Respirei fundo controlando as lágrimas, e preferi não responder. Fernando escorou-se à cadeira e continuou me encarando.

- O que ele está fazendo aqui?

- Quem? – Perguntei confusa.

- Guilhermo.

- Ele me deu uma carona. Achei que você precisasse de companhia, mas alguém já está fazendo isso.

- Márcia é como se fosse da família.

- Não estou falando da Márcia. Estou falando da Isabela. – Não consegui me conter.

- Isabela? – Ele me olhou assustado. – Qual é o problema dela estar aqui?

- Nenhum. – Respondi fria. – É melhor voltarmos.

               Fernando concordou e nos levantamos juntos, voltando em silencio para onde os outros estavam. Guilhermo conversava animadamente com todos, e pelo visto tinha se entrosado muito bem. Quando chegamos, todos nos olharam.

- Podemos ir? – Perguntei à Guilhermo. – Você ainda precisa arrumar suas coisas.

- É claro. – Ele concordou.

               Fernando pigarreou e colocou as mãos no bolso, parecendo incomodado.

- Até logo. – Falei para todos, mas olhei para Fernando.

- Tchau, Lety. – Márcia e Isabela disseram.

- Até logo. – Henrique e Omar responderam.

- Foi um prazer conhecê-los. – Guilhermo disse.

- O prazer foi nosso. – Márcia respondeu rapidamente e eu prendi o riso.

- Letícia... – Fernando me chamou.

- Sim? – O olhei.

- Amanhã eu gostaria de levar a Julia para conhecer a empresa.

- Tudo bem.

- Isabela também vai. – Fernando disse abraçando-a pela cintura.

               Senti o meu sangue ferver e percebi que ele estava me provocando. Não quis cair no seu jogo, e apenas assenti com a cabeça, tocando no braço de Guilhermo.

- Vamos...

 

 

 

•••

 

FERNANDO

 

 

- Mas o que foi isso? – Márcia perguntou me olhando, e só então notei que ainda estava abraçado à Isabela.

               Envergonhado, tirei o meu braço de volta dela, que me olhava divertida.

- Desculpe. – Falei. – Não sei porque fiz isso.

- Eu sei exatamente porque fez isso. – Márcia falou e eu a olhei irritado.

- Só fiquei com raiva porque ela trouxe... Ele. – Disse com desgosto e Isabela riu.

- É melhor você dizer à ela que nós dois não temos nada, antes que ela me odeie pelo resto da vida. – Ela disse.

- Eu vou dizer... Quando eu achar o momento.

               Márcia balançou a cabeça.



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