História Main Character - Jikook - Chapter 3

  Às oito da manhã, no dia seguinte, eu já estava entrando no prédio ao lado de Taehyung. Ele me buscara cedo, mal havia aberto os olhos quando ouvi as batidas desesperadas na porta. Eu teria que me acostumar com essa rotina durante minhas férias, depois delas, eu teria que me virar entre faculdade e trabalho. Por que eu aceitei esse trabalho mesmo? 

  Pelo menos de manhã os amigos de Taehyung não pareciam tão dispostos para marcar saídas, eles só acenaram preguiçosamente das suas cadeiras enquanto passávamos pelo corredor, mesmo assim Tae insistia em enfiar a cabeça nas portas e gritar um bom dia. Eu não fazia questão disso. Seria o meu primeiro dia sendo staff de um idiota que me olha como comida. De novo, por que eu aceitei esse trabalho? Quando os acenos acabaram, Taehyung me guiou além da porta da sala de reuniões, dobramos em um corredor e continuamos reto até o final, onde várias portas continham estrelas na frente. Pareciam feitas de papel E.V.A. Taehyung me apontou a última, na parede que acabava o corredor, no meio da estrela havia um nome - Jeon Jungkook. Revirei os olhos para a estrela feia, que sim, eu pegava raiva até do que não tinha nada a ver. Tae riu e me deu um beijo na bochecha antes de empurrar minhas costas para que eu fosse em direção à porta. Ele se enfiou em uma a esquerda com o seu nome, então eu só tinha uma opção. Já estava ali, oque mais eu podia fazer? 

  Girei a maçaneta e a porta abriu. Adentrei a um cômodo grande, à direita e à esquerda haviam duas penteadeiras modernas, com luzes ao redor do espelho. Em frente a elas, cadeiras de salão de beleza, e sobre a bancada das penteadeiras haviam caixas e caixas de metal, como as de maquiagem para crianças, mas eram maiores e tinham um ar profissional por serem de metal e sem enfeites. A sala estava vazia, não parecia ser um camarim único. Fechei a porta e virei-me para o cômodo vazio. Pensei oque eu faria ali. Jungkook não estava e eu não era maquiador, teria que o esperar então. Sentei-me em uma das cadeiras de salão, elas giravam. Deixei minha bolsa no chão e puxei as pernas para cima do acolchoado da cadeira. Era confortável, e as luzes da penteadeira me deixavam mais bonito, talvez aquilo ajudasse a aumentar a autoestima dos atores quando eles se viam mais bonitos do que já eram. Se bem que Jungkook não precisava de um espelho pra se ver mais bonito, qualquer um serviria. 

  Eu não gostava dele, não significa que não posso ver como ele é bonito. Ele tinha cabelos escuros, em um tom natural, a primeira vista parecia ser tímido - em programas de tv especialmente, era sempre oque menos falava entre os convidados -, vestia-se ressaltando seu corpo que também tinha boa forma. Ele não era feio, como deve ter percebido. E eu achar ele bonito e atraente, não significa que eu vá gostar dele. Estou aqui a trabalho, não para arranjar problemas. Nem para resolver a incógnita da minha vida. Diziam que a vida de atores e cantores sempre é cheia de confusões. Como drogas, sexualidade escondida, esse tipo de coisas. Eu não era nenhum dos dois, mas eu queria ver se isso realmente acontecia. Talvez eu não seja o único confuso no mundo. Grande possibilidade de eu não ser. 

  A porta se abriu devagar, como se a pessoa atrás dela hesitasse em abrir. Fiquei girando na cadeira enquanto esperava quem quer que fosse. Já havia passado uns dois minutos quando eu finalmente consegui ver o rosto de quem era. Jungkook estava conversando no celular e a cada três mensagens ele dava um passo para dentro do camarim. 

  Pigarreei tentando chamar sua atenção. 

  -Bom dia, HyeMi. 

  -Bom dia. -respondi, mas ele não prestou atenção na diferença entre eu e a maquiadora que nem estava ali. -Jungkook. 

  -Hã? 

  Respondeu com a cara no celular ainda, parado à porta. Deu mais um passo. 

  Me levantei irritado e o empurrei para que andasse o suficiente para fechar a porta. Então ele finalmente pareceu acordar, me olhou de cima a baixo como fez da primeira vez e sorriu. 

  -Bom dia, Jimin-ssi. Logo reconheci a delicadeza. - ele enfiou o celular no bolso e se aproximou dois passos. -Que pressa para fechar essa porta. Estava querendo ficar sozinho comigo? 

  Senti minhas orelhas pegando fogo e bufei. Pensei quando Taehyung me ligou e eu fiquei muito animado com a ideia de cuidar do ator do meu personagem favorito, agora... eu queria voltar no tempo e bater na minha cara. 

  -O rangido da porta estava me incomodando. -resmunguei.

  Voltei a minha cadeira e cruzei as pernas sobre o estofado, encarando meu reflexo bonito. 

  -Você é tão pequeno. -disse Jungkook atrás de mim. 

  Ignorei a princípio. Mas eu esqueci que ele era insistente. Jungkook veio até a minha cadeira e segurou-a por trás, abaixou o rosto até o nível do meu ombro e sorriu para mim através do espelho. Senti sua respiração na minha nuca e segurei um suspiro. Eu não estava carente, é que ele estava muito perto. 

  -Pensei que não viria. -ele disse. 

  -Quero experiência. 

  -Hum... que tipo de experiência?

  Seu tom em geral não emitia malícia nenhuma, mas seu rosto o entregava facilmente. 

  -Q-Quero ser diretor, então... -engoli nervoso. -Eu quero ver como as coisas aqui funcionam. 

  -Ah, sim. 

  Ele se curvou mais e deitou a cabeça no meu ombro. 

  -Então, vamos sair hoje ou não?

  -Que? -exclamei.

  -Eu falei com você ontem e você disse 'sim, vamos sair e tomar sorvete'.

  -Eu nunca disse isso. - pausei para pensar um pouco e conclui. -Eu nunca disse mesmo. 

  -Jimin-ssi, você tem que ser mais legal comigo. Vamos trabalhar juntos por meses. 

  -Mereço. -suspirei. -Jungkook, eu nunca aceitei sair com você. 

  -Deixa de ser chato. -ele me sacudiu pelos ombros. Senti minha cabeça como um bonequinho de mola. -Hyung, por favor. 

  Ele estava me amolecendo, infelizmente. Maldito garoto bonito. 

  -Jungkook, vamos fazer o seguinte. -me levantei e fiquei de frente para ele, que fazia um bico de birra. -Eu saio com você se você não me irritar hoje. 

  Seus olhos brilharam de entusiasmo.

  -Mesmo? 

  -Mesmo. 

  -E vamos tomar sorvete também, porque... sabe, eu gosto de sorvete. 

  -Ok, tomamos sorvete. 

  Ele apoiou o queixo na mão e franziu a testa, então olhou para mim e sorriu. Descruzou os braços e segurou meu rosto. Minha ação foi tentar sair dali, mas ele foi me levando para trás até bater as costas numa penteadeira. As luzes faziam seus olhos brilharem ainda mais. Ele apoiou uma das mãos na minha cintura e pressionou o corpo contra o meu, não muito, mas eu senti o corpo que eu estava admirando a poucos minutos se moldar no meu. 

  -Jungkookie... -o apelido saiu sem querer e sussurrado. Me senti péssimo por isso, parecia que eu estava o provocando. Ele sorriu de lado e acariciou minha bochecha. 

  -Hyung, você gosta de sorvete de chocolate? 

  -Uhum. -respondi com nervosismo, ele podia ter dito sorvete de Figo e eu diria que adorava. 

  -Ótimo. 

  -Por que está tão perto?

  -Ah, isso? -ele riu ao se aproximar mais ainda. -É só para chamar sua atenção, já que parece que você não me suporta. 

 -Quem te disse isso? 

  -Taehyung. -ele riu. 

  Pensei que eu demoraria a querer dar uns tapas do Tae. Mudei de planos, pode ser agora. 

  -N-não é bem assim. 

  -Então você gosta de mim? 

  -Não diria isso. Diria... não odeio. 

  -Bem melhor. -ele riu com ironia e se inclinou mais na minha direção. 

  Meu rosto quase se fundindo ao pescoço não deveria ser uma cena sexy, com a papada aparecendo enquanto eu tentava me esquivar dele. Mas por que eu me importava se eu parecia sexy? Quanto mais eu afastava o rosto do dele, mais ele se inclinava. Eu não queria admitir no momento, mas aquele joguinho dele era até interessante, porque infelizmente eu tinha uma queda por pessoas idiotas. 

  -Jungkook! -me endireitei imediatamente, e seu rosto pairou a centímetros do meu. -Parou.

  -De dar em cima de você? 

  -Sim! 

  -Desculpe, queria saber até onde você me negava. E parece que você me odeia mesmo. 

  -Não odeio. Eu só... não gosto... muito e não quero ser beijado.

  -Obrigado pela parte que me toca. 

  Alguém limpou a garganta à porta. Virei o rosto na direção do barulho, quase em pânico. HyeMi estava lá, nos olhando maliciosa balando o crachá nos dedos. Ela olhou para Jungkook depois para mim, e então para ele, e desceu os olhos pelos nossos corpos colados. 

  -Atrapalho? -perguntou com um sorrisinho ao fechar a porta. 

  -Não. -respondeu Jungkook, mas continuou a me prensar ali. 

  -Ótimo, então só continuem. 

  Ela fingiu nos ignorar e foi abrir uma das caixas de metal na penteadeira oposta. Jungkook voltou sua atenção para mim e franziu o nariz.

   -Onde estávamos? 

  Eu estava em choque e ele fingia pensar no que conversávamos.

  -Você disse que se eu fosse legal com você, você me beijaria, não foi? -perguntou.

  -Não! -reclamei. -Pare de distorcer oque eu digo e se afaste.

  -Ok, sorvetinho. 

  -Que? 

  Ele se afastou deixando um beijo na minha bochecha. Piscou e foi para a cadeira onde HyeMi o esperava para começar a maquiagem. 

  -Sorvetinho. -ele disse mais alto. -Seu novo apelido. 

  -Não, Jungkook. 

  -O que? Eu te chamei de gostoso. 

  -Sem apelidos. 

  -Uhum. Que tal... bolinho? 

  HyeMi riu. 

  -Verdade ele parece um. -concordou ela.

  -Perfeito. Jimin, o bolinho. 

  -É, definitivamente. -eu afirmei. -Não gosto de você. 

  -Você vai gostar de mim, basta tempo. 

  -E paciência, oque eu não tenho. 

  -Se você me deixar te beijar como você pediu... 

  -Eu não pedi! -interrompi. -Eu nem falei de beijo.

  Me sentei novamente na cadeira oposta à dele e o vi sorrir pelo espelho com os olhos fechados, enquanto HyeMi limpava a pele dele. 

  -HyeMi, você tem que acreditar em mim. -pedi juntando as mãos. 

  Ela olhou de relance para mim e riu. 

  -Vocês tem cara de quem vão se beijar. 

  -Eu disse. -ele concordou sorridente. 

  -Não vou beijar esse... esse idiota. 

  -Veremos, meu caro bolinho. 

 

***

  Eu já havia cogitado que aquele prédio não tinha espaço suficiente para filmagens. Era composto de salas de equipes -de apoio, de maquiagem, figurino, design, entre outros. Então quando Jungkook, HyeMi e uma ajudante finalmente terminaram a maquiagem, que demorava mais do que eu imaginava,  eles começaram a guardar as coisas em bolsas para, aparentemente, sair dali. Me levantei desnorteado, Jungkook não parecia tão maquiado, em geral o cabelo havia levado mais tempo, oque também não fazia sentido, ele não tinha cabelos longos para tudo isso. HyeMi se aproximou de mim com uma mochila de gato nas costas e me estendeu um papel. 

  -Uma lista do que o Jungkook é alérgico, só para... você sabe, caso ele tente se envenenar sem te avisar. -ela piscou e saiu da sala junto a outra garota que mal falava. 

  Olhei ao redor e o encontrei abaixado no chão, jogando algumas coisas de uma mochila para outra. Me sentei novamente, já que esse parecia ser o meu trabalho ali. 

  -Hyung, você acha que vai demorar muito para a gente chegar no set? -ele perguntou ainda curvado sobre as bolsas. 

  Olhei de lado tentando ver oque tanto ele guardava, mas seu corpo cobria oque quer que fosse. 

  -Talvez. Não tem nenhum set de gravação aqui perto. Você é ator, nunca procurou saber disso? 

  -Não. -ele bufou. -Sabe, eu costumo dormir no carro. 

  -Por que? 

  -Eu tenho que me preparar para ser uma pessoa diferente, então eu durmo. 

  -Sinceramente... você e o Rabbit não são muito diferentes. Não digo fisicamente, mas você entendeu. 

  Ouvi ele rir, e também o som do zíper quando fechou a bolsa. 

  -Me chamou de psicopata? 

  -De atrevido. -joguei os ombros. -Não vai precisar dormir muito. 

  Ele se ergueu e jogou a bolsa sobre um ombro. O olhei com um sorriso falso e ele apertou os olhos na minha direção. 

  -Vamos, pequeno. Você vai ter que suportar a pessoa que você odeia pelo caminho todo ainda. 

  Me levantei e revirei os olhos. Lembrete; bater no Taehyung. 

  -Não me chame assim.

  -Ainda estou decidindo seu apelido. 

  Cruzei os braços e dei as costas. Sai do camarim com seus passos a poucos metros de mim, não fiz questão de acompanhá-lo e ele fez o mesmo.

 

***

  A alguns meses eu desistira da academia. Lembrei disso quando cheguei perto do carro no estacionamento da empresa. Não me pergunte porque, mas eu corri até ele, estava mais animado do que os atores principais e as outras equipes. Ali embaixo, havia uma dúzia de furgões idênticos, pretos e com bancos nas laterais do fundo. Eu não sabia se haviam motoristas para todos eles, mas para aquele primeiro dia, haviam três. Virei-me para as pessoas que ainda vinham vagarosamente para os carros, uns porque carregavam malas, outros -Como Jungkook e Taehyung- por pura preguiça. 

  A luz que entrava pelos basculantes nos cantos da parede, vinha da rua, deixava poças no chão, mas não iluminavam o suficiente, e como era dia, as luzes fosforescentes pendendo do teto, não estavam ligadas. O cheiro ali embaixo era de pneu queimado, afinal estávamos no nível da pista e isso também trazia uma chuva de cascalho que se variava de cada janela. Quando um quase caiu na minha cabeça, eu pulei para o lado e dei um encontrão em alguém. Virei-me para ver quem era e para minha sorte havia sido Taehyung. Depois de ter saído do camarim do Jungkook, eu não o vira por muito tempo, e não tivera a chance de dar uma surra nele por ter contado ao Jungkook sobre minha antipatia. Fechei a cara para ele e me afastei. 

  -Não ligue. -avisou Jungkook a Taehyung. -Ele está chateado porque você me contou que ele me odiava. 

  -Ah. 

  Ele me olhou entendendo a situação, sorriu e fez algo que eu não esperava dele. Taehyung me deu um selinho e foi andando de costas para outro furgão. O tempo parecia ter parado, olhei envergonhado ao redor e evitei olhar para Jungkook que estava logo ao meu lado. Pigarrei e fui para as portas do furgão, as abri e dois sofás estavam dispostos de lados opostos. Pensei que só assim para Jungkook dormir, ele não ficaria ali deitado em bancos. Me ocupei de um, ainda olhando para o piso. Sentia que eu podia desmaiar se vergonha, principalmente quando ele entrou e fechou as portas. Fechei os olhos e tentei me concentrar em não ficar vermelho a ponto de explodir. 

  -Não sabia que vocês tinham alguma coisa. -ele disse, soando... desapontado. 

  Ergui o rosto e franzi a testa. 

  -Devia ter me avisando antes de me deixar dar em cima de você. -concluiu ele. 

  Abri a boca para responder, mas a fechei. Jungkook parecia envergonhado tanto quanto eu, as pontas das suas orelhas estavam vermelhas. Adorável. Pensei no momento a alguns minutos atrás, não havia plateia quando ele fez aquilo, e Taehyung adorava atenção. Não era feitio dele fazer algo sem receber aplausos, a não ser que... ele estivesse tentando me ajudar. Ele não me beijou com segunda intenção, foi apenas na vista de Jungkook. É, devia ter sido isso. Formulei uma resposta rápida que não me comprometesse, nem a Taehyung. 

  -Nós... não temos compromisso. 

  Parei para analisar oque eu disse, foi idiota de qualquer jeito, mas, me de uma folga, eu estava nervoso.

  Ele ergueu uma sobrancelha e riu, tirou o celular do bolso e voltou para o seu mundinho. O ar havia ficado pesado, eu estava me sentindo sufocado e desconfortável. Por que ele tinha esse poder me fazer me sentir mal se eu nem o conhecia direito? Troquei de sofá ficando ao seu lado. Jungkook me olhou de canto do olho e franziu a testa. Devia estar pensando oque esse idiota estava fazendo. 

  -Jimin-ssi? -perguntou, desconfiado. 

  -Hum?

  -... Algum problema? 

  -Você ficou de cara feia, só vim ajudar. 

  Ele riu, se virou me empurrou com as mãos na minha perna. Eu já estava disposto a voltar quando ele deitou de lado e pôs a cabeça na minha cocha. 

  -Bem melhor. -murmurou voltando a jogar no celular. 

  Revirei os olhos, mas me senti melhor. Eu estava sendo muito legal com ele, qual o meu problema?