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História Me Volis Tu - Ciganos


Escrita por: MissChaddy

Notas do Autor


Pessoas, mais uma Zutara. O título significa "Eu te amo". Foi usado a linguagem dos ciganos, eu me esqueci qual língua é, mas o que vale é a intenção.
Boa leitura!

Capítulo 1 - Ciganos


 A noite estava belíssima. As estrelas brilhavam, a Lua estava ofuscante e o som que percorria as extensas ruas de Londres doce e contagiante. Animados, com gritos de alegria e som de saltos, risadas, conversas aleatórias, o povo que atravessava a cidade naquele momento não era desconhecido aos conterrâneos de Londres. Não desejados, mas já conhecidos.

As crianças ricas apontavam na janela, prontas para verem o grande grupo passar, iluminando as ruas com suas tochas e tocando seus instrumentos com cada vez mais vontade. Os meninos de rua ficavam encantados, alguns chegavam a unir-se ao grupo e eram tão bem acolhidos que não mais iam embora.

Os jovens e suas acompanhantes na rua espremiam-se contra as paredes das casas, sujando as roupas bem passadas e amassando os vestidos bufantes. As moças tapavam os lábios rosados e tentavam, em vão, conter as exclamações surpresas e algumas palavras cheias de ódio. Praguejavam contra as moças, filhas dos fortes homens que carregavam tendas, materiais e instrumentos, que dançavam e se divertiam livres pelas ruas. Os moços temiam a sujeira de suas roupas pelos cavalos e outros animais que andavam entre aquele povo; temiam, inutilmente, o roubo que pensavam que poderiam sofrer.

Mas aquele povo, aquele tão animado grupo, não desperdiçava seu tempo olhando ou resmungando enquanto olhava para aquelas pessoas. Sua felicidade era maior, o desapego que possuíam os impediam de olhar para aquelas tristes figuras e reclamar, praguejar contra o destino impiedoso que os aguardava. Queriam o presente, a felicidade do agora; queriam tudo o que pudesse lhes acrescentar ou que pudessem realizar naquele momento.

Uma garota em especial, Katara, filha do líder do grupo Hakoda, divertia-se mais do que as outras garotas. Contida pelo irmão, Katara vez ou outra desvencilhava-se de Sokka para que pudesse rodopiar e balançar o vestido de tecido leve, sorrir, conversar e rir alto das piadas dos rapazes que passavam perto de si.

Katara era belíssima. Os olhos azuis, perspicazes, rodavam e procuravam novas figuras, observava os instrumentos passando de mão em mão. Eram astutos, brilhantes e pareciam carregar o fogo da paixão. Seus lábios, carnudos e avermelhados, traziam sempre um sorriso deveras malicioso e muitas vezes inocente; palavras doces e também obscenas escorriam por aqueles lábios como o veneno de uma cobra. A pele, cor de canela, era limpa, sem macha, mas castigada pelo Sol muito bem aproveitado. Seus cabelos, longos, ondulados e um pouco maltratados, chamavam a atenção quando Katara rodopiava e pulava. Era belo de se ver. Imaculada, ela era desejada por muitos e poucos possuíam o privilégio de tocá-la ou sequer aproximar-se dela.

Hakoda, seu pai, era um homem muito íntegro, sério e o precioso líder daquele povo. Estimado por muitos, era conhecido não só por sua bondade e paciência, mas também pela rigidez com que cuidava dos seus. Seus filhos eram seu bem mais precioso, especialmente Katara, a quem lhe lembrava muito a falecida esposa, Kya. Sokka, o mais velho, lhe era extremamente fiel e fazia tudo o que Hakoda pedisse. Eram o filho mais obediente; contrário a Katara, que exalava rebeldia e falta de controle.

Ele sabia que, naquele meio, Katara seria vista como uma mulher impura e de fácil conquista. Jamais poderia se casar. Hakoda temia por isso — não poderia morrer em paz se não casasse seus filhos. Mas ela não facilitava e escapava de suas mãos com exímia habilidade e facilidade. Contava com o apoio de Sokka, mas o filho era facilmente levado pela irmã e muitas vezes Hakoda desconfiava que ele a ajudava em suas bagunças. Olhando de longe, atrás de todos na passagem pela cidade, via o quão feliz seus filhos estavam. Eram nômades, ciganos sem terra fixa; o mundo era o seu lar. Gostava de saber disso, pois os seus filhos gostavam da vida que tinham e ele não pensava em mudar de vida tão cedo.

A travessia não durou muito. As pessoas, não importava o lugar onde passassem, os olhavam e torciam seus finos e arrebitados narizes, por isso não mais se incomodavam; por isso espalhavam a alegria que os cercava e não brigavam, não se incomodavam em perguntar o que afligia os gadjês — os não ciganos. Era mais do que suficiente a vida que tinham. Eram mais do que felizes; eles eram gratos.

O terreno que se alocaram ficava às margens da grande Londres, um lugar próximo a natureza, ao mar, onde poderiam estender suas tendas, fazer sua música e seus produtos, sem a intervenção do governo. As tendas não demoraram a ser erguidas, o fogo logo estava aceso no meio da comunidade e os músicos aproximavam-se do calor para tocar. As bebidas corriam de mão em mão, as crianças desperdiçavam seu tempo, doce infância, ao correr uns atrás dos outros, rindo e gritando felizes. Os moços sorriam galantes e aproximavam-se de suas pretendentes. As moças, cochichavam e faziam burburinhos desnecessários a fim de chamar a atenção deles.

Katara saía da tenda de seu pai, sorria para tudo e todos, saltava pelas crianças e bebericava de algumas bebidas que passavam por si. Ouvia a voz de seu irmão, longe e cercado pelas garotas que ele tanto apreciava. Distraída, não se deu conta do corpo forte e alto que trombara em si, as palavras ressoando próximas em seu ouvido, fizeram com que Katara voltasse seu olhar para cima e percebesse de quem viera.


 

— O manusha khevelan tut!¹


 

— Jato — o nome dele fluíra de seus lábios com arrogância e talvez um pouco de sarcasmo. Jato, integrante importante da comunidade, era forte e belo. Desejado por muitos, dedicava toda a sua atenção apenas a Katara, que o rejeitava com firmeza e certa diversão. Seu olhar sedutor, encantava-a, como todas as garotas, a diferença, no entanto, estava em Katara; ela não cairia em sua lábia. — E por que não está dançando?


 

— Sabe que desejo dançar só com você, minha doce amiga — ele dissera. Soltara o cigarro e jogara-o no chão, pisando em cima. Sua mão direita atrevera-se a tocar seu braço, mas Katara esquivara-se com habilidade, sorrindo para ele.


 

— Sabe que eu não quero dançar contigo, moço insolente — ela dissera, ferina e arisca. Jato sorriu, acostumado à rejeição diária, alimentando-se dela e afastando-se com rapidez.


 

Katara prosseguiu seu caminho, adentrando a mata, encontrando alguns casais grudados, espremendo-se contra as árvores; encontrava animais noturnos e passava por eles sem medo, acostumada a situação. Não demorou a encontrar o que desejava; uma laguna iluminada pela Lua. Separada do mar por algumas grandes rochas — Katara podia avistar os barcos ao longe, no porto — a laguna apresentava uma água fresca e limpa, situação mais que favorável para ela. Não se incomodou com suas roupas e adentrou na água, sentindo o corpo esfriar quase que imediatamente.

Mergulhava e tornava a subir, respirando e sorrindo, jogando a água para o alto e divertindo-se com a situação. Katara era vista como uma pessoa problemática. Diziam, na comunidade, que ela não queria se casar, não queria ser mãe, que não gostava dos afazeres domésticos. Mas era uma mentira inventada por pessoas más ali — uma boa parte da conversa. Ela queria se casar, queria ser mãe, mas não queria ser subjugada por seu marido, ser submissa a ele e nunca mais poder fazer o que queria. Não seria livre com os homens que encontrava, sendo parte de sua comunidade ou não.

Seus pensamentos insólitos não mais se demoraram. O barulho na mata chamou sua atenção e fez com que pusesse-se de pé e observasse com demasiada atenção. O barulho aumentava, castigava as folhas e galhos; o som de espadas e passadas pesadas instigavam sua curiosidade. Katara chegou a pensar que seriam bárbaros a invadir sua nova casa, por isso temeu e não se demorou a sair da água. Sua movimentação, no entanto, chamou a atenção dos estranhos e os passos não se demoraram a se aproximarem de si. Katara sentiu seu braço ser segurado com força. Sentia o couro da luva marcar sua pele e, como que por instinto, puxou seu braço, fazendo o estranho soltar uma exclamação de puro ultraje. Engoliu em seco e deu alguns passos voltando-se para os estranhos.

O homem que segurava seu braço era, claramente, um nobre. Estava cercado de guardas e estava armado também. Mas a situação não fez Katara baixar a cabeça ou tentar fugir. Os olhos do estranho prenderam-na em demasia e sua atenção ficou dispersa, dividida entre olhar os bonitos olhos e as espadas apontadas para si.


 

— Quem é você? — a voz, claramente jovem, adentrou seus ouvidos e fê-la prestar mais atenção ao dono dela. Mais do que os olhos, dourados e brilhantes, o homem possuíam uma bela voz.


 

Sua pele branca refletia a luz da Lua e Katara chegou a pensar no quão engraçado e adorável aquilo era. Possuía curtos cabelos negros, caindo pelo rosto e parecia ser muito macio e sedoso; ela teve vontade de estender a mão e afagar aqueles cabelos por horas. Sua atenção fora redobrada ao ver a cicatriz no rosto bonito; deformada e avermelhada, era sinal de perigo para Katara. Mas o rapaz parecia tão inofensivo, tão além do perigo e da violência que ela não resistiu muito e deixou que o seu instinto descansasse um pouco.


 

— Sou Katara — respondeu. Sua voz soara baixa, mas firme e decidida. O rapaz demonstrou certa surpresa ao perceber a força com que a garota, Katara, dissera o seu nome. Ousada e nada submissa, mantivera a ponta do nariz sempre apontada para o alto e seus olhos sempre colados nos seus. Ele se surpreendeu.


 

— O que faz aqui? — indagou franzindo a sobrancelha. Ela não deu ouvidos, sua expressão fechou e ela pensou seriamente em fugir dali. Percebendo a intenção de Katara, relaxou em seu lugar, respirou e deixou que a garota tivesse um pouco de espaço. — Sou Zuko, filho de Ozai, general do exército inglês.


 

— Olá, Zuko, filho de Ozai — ela respondeu, cínica em suas palavras. Zuko arqueou a sobrancelha, sorrindo levemente. — Estamos morando aqui perto. Pode vir comigo e participar da nossa festa se assim o desejar.


 

Katara sorriu, provocante e virou o corpo lentamente, caminhando para fora dali com certa pressa. Hipnotizado pelo movimento incessante dos cabelos de Katara, Zuko seguiu-a e como consequência todos os seus soldados.

Zuko não demorou a ouvir aqueles sons contagiantes e recheados com gritos e risadas de alegria. Ele se surpreendeu — não estava acostumado àquele tipo de som. Seus soldados andavam com as mãos nas bainhas das espadas, temendo a situação. Mas não havia com o que se preocupar, Zuko pensava, Katara está a frente e vai os defender. Doce engano. Katara não se importou em sair correndo de perto deles e chorar, copiosamente, até chegar ao seu pai.

Hakoda enfureceu-se e ao ver Zuko e seus homens se aproximando, puxou a espada e apontou para a garganta do forasteiro.


 

— E bar ti rodielto duar ² — Hakoda gritou e toda a comunidade agrupou-se, deixando os homens a frente. Zuko posicionou-se, temeroso por sua vida e a de seus companheiros. — O que faz aqui?!


 

— N-Nós… — começou, gaguejando miseravelmente. Hakoda era intimidante, fazia-o tremer e não mais querer falar. — Nós acabamos de chegar de viagem. Encontramos a garota na laguna e a seguimos, preocupados com a sua segurança.


 

Katara, levantou uma sobrancelha, surpresa pela sinceridade e coragem do rapaz ao expor a verdade. Ela sorriu e afastou-se lentamente do pai, sabendo que a culpada, no final de tudo aquilo, seria ela.

Zuko ainda tremia — o olhar de Hakoda matava — mas mantinha-se de pé, firme e forte, como havia aprendido durante os dezoito anos de sua vida. No entanto, sentia medo. Em sua primeira viagem sozinho, resolve perseguir uma maldita cigana e põe não só a sua vida, mas a de seus parceiros em risco. Ainda de olho no líder da comunidade, Zuko retirou a mão da espada e fez com que os amigos repetissem o gesto. Hakoda os observava com cuidado e apreciou a desistência deles, baixando a própria espada.


 

— Vão embora — foi só o que ele disse e foi mais do que suficiente para Zuko sair rapidamente do lugar, arrastando seu grupo pelo meio das tendas e fogueira.


 

O pequeno grupo saiu da floresta e pode enfim respirar. Zuko não poderia dizer que sentiu falta daquele lugar — ar sujo, ruas sujas, casas sujas. Mas era a sua casa e estava feliz por pisar nela novamente. Caminharam despreocupadamente por ali, cada um entrando em suas respectivas casas. E qual foi a surpresa de Zuko ao encontrar Azula, sua doce irmã, na porta de casa, aguardando-o.


 

— Azula — murmurou, numa indagação velada. Ela sorriu e abraçou a cintura do irmão. O vestido bufante, de tecidos caros espremiam-se contra o corpo de Zuko. Ela parecia bem e Zuko desconfiava de toda a situação.


 

— Parece que fez um bom negócio em sua viagem — ela dissera, o sorriso prepotente por natureza. Zuko sorriu, meigo, e assentiu. Puxou a irmã e adentraram a casa.


 

— Fizemos — respondeu, feliz pelo resultado. — Vossa majestade, com certeza, vai adorar a nova situação.


 

— Zuko — Ursa, sua mãe, chamou-o enquanto descia as grandes escadas. Zuko sorriu para ela, feliz por vê-la novamente depois de tantos meses. — Como cresceu… e está mais magro! Venha comer alguma coisa.


 

— Deixe o garoto, Ursa — Ozai, seu pai, famoso general da rainha, disse. Sua expressão, fechada como sempre e rígido como somente ele poderia ser, denunciavam a falta de interesse no filho. Zuko suspirou, muito discretamente. — Conte-me a nossa situação. Espero que não me decepcione.


 

Zuko sorriu, pressionado pela situação. Beijou a fronte da mãe, segurou as mãos de Azula e seguiu com o pai para os fundos da casa. Contou, em detalhes, toda a situação que os envolvia enquanto bebia do vinho que o pai lhe oferecera. Via, com orgulho, o sorriso do pai aumentar a cada palavra e o seu alívio tomar conta a cada vez que o pai o elogiava. Ao fim da narrativa, Ozai colocou a mão sobre o ombro do filho, apertou e sorriu muito brevemente, virando o rosto para frente e colocando-se a observar a labareda do fogo na lareira.

Ele compreendeu a situação e saiu dali sem demora. Encontrou-se com sua mãe em seu quarto. Zuko estava bêbado então não se importou em arrancar as roupas e pular dentro da grande tina de madeira repleta de água quente. Ursa sorriu enquanto banhava o filho, preocupada com a situação em que ele se encontrava. Passou a mão nos cabelos negros e puxou-os para trás, expondo a grande cicatriz. Ela tocou a antiga ferida e logo retraiu a mão, sentindo pelo filho, a dor da queimadura.


 

— Eu conheci uma pessoa estranha hoje — Zuko murmurou jogando a cabeça para trás. Seus olhos encontraram sua mãe, uma mulher linda de face tristonha. Zuko fechou os olhos, lembrando-se de Katara.


 

— E como era essa pessoa estranha? — Ursa indagou. Zuko franziu o cenho, centrado demais em sua lembrança e nas mãos de sua mãe.


 

— Bem… — vacilou na escolha de palavras. Ursa sorriu enquanto via a testa do filho enrugar-se com facilidade e rapidez. — Ela… tinha os olhos azuis.


 

— Mas só isso? — ela dissera, decepcionada com a capacidade descritiva do filho. Zuko deixou uma risada escapar por entre os lábios. Levou a mão direita aos olhos e tapou-os, envergonhado pela situação.


 

— Muito bonita — recomeçara. Seus lábios tremularam e a voz vacilou. Ursa sorria, curiosa pela continuidade. — Muito bela.


 

— Certo. Nós avançamos — sua mãe, contendo risadinhas sarcásticas, disse. — Ela tinha olhos azuis e era muito bela. E o que mais?


 

— Bem… ela me enganou completamente. Eu quase morri — as palavras, por um momento, fizeram Ursa rir; mas ao ver a seriedade do rosto parcialmente tampado do filho, Ursa levou as próprias mãos aos lábios.


 

— Zuko! — seu nome escapara dos lábios rosados de sua mãe com espanto e ele arrependeu-se quase que de imediato de ter dito aquelas palavras. — O que aconteceu?


 

— Ela estava nadando na laguna — começou a narrativa, pouco preocupando-se com a descrição de Katara. — e eu a surpreendi. Ela se assustou e tentou sair de lá, mas eu a segurei. Acho que fiz mal, mamãe. Não se deve machucar uma mulher e eu acho que apertei muito forte o braço dela. Um braço magro e parecia tão frágil! Mas eu fiz mesmo assim. O que me surpreendeu foi ela ter puxado o braço e se afastado de mim com uma impetuosidade impressionante.


 

— Surpreendente — Ursa murmurou, ciente da situação da mulher naquela sociedade. Passava por aquilo todos os dias. Ser submissa ao marido, fazer sempre o que ele queria e nunca, nunca, recusar um toque dele. Era uma vida difícil. Por isso, apesar de amaldiçoar a garota por levar seu filho a morte, não pôde deixar de ficar surpresa com sua atitude.


 

— Não é? Mas quando ela se apresentou e eu também, ela me chamou para ir a uma festa…? — sua memória falhava; a bebida fazia efeito. — Quando nós chegamos, vimos que era uma comunidade cigana. O pai dela apontou a espada para mim. Eu nunca senti tanto medo.


 

— Medo? — ela indagou, surpresa pela reação do filho.


 

— Muito medo — respondeu. — E eu fiquei com muita raiva dela. Como ela pôde me enganar assim?


 

— Ora, não seja mimado, Zuko — Ursa disse, rindo baixinho. Bateu de leve na cabeça do filho e se levantou, já cansada de estar ali. — Mas você não me disse o nome dela.


 

— Katara — respondeu prontamente. Seu nome estava na ponta da língua e nem se se embebedasse loucamente seria capaz de esquecer.


 

Katara, a cigana dos olhos azuis, dos lábios avermelhados. Zuko enlouquecera ao vê-la saindo da água. O cabelo encharcado escorrendo pelas costas e tocando a base da coluna, o quadril remexendo-se hipnotizantes. E sua voz…! Tão bonita quanto a dona dela. Katara deixara-o louco. Louco por ela, por seus olhos, por seus cabelos, por seus lábios, pelo corpo curvilíneo — tão incomum na Inglaterra. Deixara-o louco por ser tão ousada, independente, ciente de sua força.

Ela era a sua perdição.

No entanto, embora Katara houvesse lhe causado tantas sensações — inclusive a raiva extrema — Zuko era comprometido. Mai, sua doce Mai, era a mulher que todos desejavam na corte. Bela, pura, filha de um dos comandantes do exército, Zuko tivera a sorte de conhecê-la antes de todos os rapazes dali e fizera a corte rapidamente. Conquistara Mai com muita dedicação e não estava disposto a deixá-la por uma cigana sensual.

Mesmo que seu coração e seu corpo gritassem por aquela desistência.

Seu banho não mais demorara; sequer notara a saída de sua mãe. Secou-se e vestiu-se, jogando-se rapidamente em sua cama, ressonando tranquilo.

A noite para Katara, no entanto, fora turbulenta. Seu pai gritava consigo e jogava as coisas no chão e nem mesmo Sokka fora capaz de impedir o tapa certeiro em seu rosto. Hakoda estava irado, Katara havia colocado toda a comunidade em risco e se não houvesse lidado com o rapaz daquela forma, não mais poderiam pisar ali. Como pai, seu coração ressentia-se em tocar a filha daquela forma. Prometera a si mesmo quando vira o rostinho gordinho da filha nos braços de Kya que jamais levantaria as mãos para os filhos. Mas quebrara a promessa. Um momento de irritação — um não, vários — fizera Hakoda estapear o rosto da filha.

Katara, surpresa com a reação do pai, não derramou uma lágrima. O rosto ardia, a pele queimava e as lágrimas insistiam em querer descer. Mas mantinha-se forte. Sabia que estava errada. Levar um gadjé ³ a sua casa era uma afronta e um perigo para todos. Estava pronta para arcar com todas as consequências de seu ato.


 

— Katara — Hakoda, com a voz vacilante, avançou um curto passo. Ela se afastou, temerosa. Ele suspirou, franzindo o cenho, arrependido do que havia feito. — Você tem que entender que a vida aqui, a sua vida, não é solitária. Não é só você. Há outras pessoas além de você. Eu entendo que não queira se casar…


 

— Mas eu quero — murmurou, interrompendo a fala de Hakoda. Mas ele não se importou, não dando a devida importância.


 

— … ou que não queira ter filhos — continuou. Katara revirou os olhos, cansada daquela discussão infundada. Hakoda repreendeu-a momentaneamente com o olhar, retornando ao seu discurso. — Mas querer arriscar a própria vida assim?


 

— A minha vida? — ela indagou, suspeitando da situação.


 

— Sim — ele disse. A conversa tomara um rumo diferente do que esperava. Hakoda mostrava agora seu lado paterno, egoísta, que não se importava com as outras pessoas, mas somente com sua filha. — E se… ele a tocasse? Katara, eu não saberia o que fazer!


 

— O que? Quer dizer que tudo isso só importa por que ele poderia ter me tocado? — ela reprimiu o grito. Ergueu-se e encarou o pai. — Olha, eu estava disposta a arcar com meu erro. Sei que fiz errado em trazê-lo aqui. Mas o que eu tenho a ver com isso? Pai! Nem tudo se trata de mim ou o Sokka! Você só quer nos controlar!


 

— Chega! — ele gritou. Katara pulou, assustando-se. Hakoda deu-lhe as costas e apontou para a saída da tenda. Ela não se fez de rogada, saiu, a passos pesados e furiosa.


 

Preocupar-se era uma coisa. Querer controlar a sua vida, nos mínimos detalhes, era outra coisa completamente diferente. Pensava na comunidade — diferente de seu pai, pelo visto. Queria o bem das pessoas, mas sentiu medo. O que mais faria? Tinha de levar o tal Zuko para lá ou ele faria o que bem entendesse dela.

Sokka adentrou a tenda que dividiam e encarou-a, temeroso. Katara estava trêmula, carregada de raiva; ele tinha de fazer alguma coisa.


 

— Katara — começou, hesitante. Ela o encarou, ciente de que o irmão nada tinha a ver com aquela situação. Suspirou e focou sua atenção nele. — Esse final de semana… bem, sou eu que vou organizar os espetáculos. Você poderia ir também.


 

— Como se o papai fosse deixar — resmungou. Não poderia negar: queria muito participar dos eventos que produziam. Porém, seu pai, como sempre, nunca a libertaria daquelas amarras que ele intitulava preocupação.


 

— Ele não precisa saber — Sokka havia dito aquela frase com grande pesar. Jamais desobedecera o pai e agora, contrariando todos os seus princípios, estava prestes a levar a meliante para o grande centro de Londres. Ao olhar para Katara soube de imediato que sua irmã aceitara a ideia. Estava errado no que fazia, mas queria a irmã feliz. E se fosse preciso ter a desconfiança do pai, que assim fosse.


 

Eles então, num abraço cúmplice e que selava o acordo, foram dormir ao som incessante da natureza.

O sábado havia chegado mais rápido do que Katara previra. Via todos os seus amigos correndo e embrulhando caixas, guardando facas, cartas e mais jogos que poderiam oferecer a população. Seu pai não lhe dava atenção, então não foi difícil enfiar-se numa das caixas do irmão e sair junto de todos. Flexível como era, contorcer-se naquele lugar não fora uma tarefa difícil; mas escapar do irmão e juntar-se as dançarinas do lugar é que lhe custara algum tempo.

Embora Sokka fizesse tudo para vê-la feliz, não era tão diferente do pai. Controlador e explosivo, seu irmão era uma pessoa bastante chata e difícil de driblar. No entanto, Katara era experiente quanto aos familiares, sabia o que fazer; por isso, ao chegar próximo às amigas, Suki e Yue, despiu-se de toda a frustração que vestia e colocou o manto de mulher indomável que era.


 

— Katara, seu irmão vai nos matar — Yue murmurava, atenta às pessoas que passavam por ali. Katara trocava as roupas, as tradicionais, azuis por vermelhas e maquiava-se conforme pedia o espetáculo. Não dava ouvidos a Yue ou Suki que corria de um lado para o outro com roupas para si e para as outras meninas. Toph, garotinha insolente e enxerida, gargalhava.


 

— Fique tranquila, Yue — ela dizia. Os olhos vagos correndo as ruas a procura de algo que nunca encontraria. Ela se levantou do chão, bateu nas roupas já amareladas e tocou o braço da companheira. — A nossa princesinha sabe se cuidar.


 

— Obrigada, Toph — ela disse, insolente como só ela poderia ser. Uma risada escapou por seus lábios e Katara, agora já vestida, tocou o rosto de Yue, apertando-a entre suas mãos. — Não se preocupe. Eu não vou deixar nada acontecer com vocês caso alguma coisa dê errado. Sokka é maluco por vocês, ele não faria nada demais!


 

— Mas o seu pai sim — retrucou, cerrando os olhos. Soltou-se de Katara e suspirou. Segurou as mãos da garota e olhou com sofrimento para ela. — Eu não quero que fique presa, Katara. Eu juro. Mas se quer se libertar, espere alguém o fazer por você.


 

— Quem? Um marido? — disse com ar de risos. — Yue, eu sou forte. Posso cuidar de mim mesma. Posso me libertar sozinha. Você vai ver. Eu não serei a princesa a ser resgatada; eu vou resgatar o meu príncipe!


 

Yue soltou-a e não pôde evitar o sorriso orgulhoso. Viu Katara subir no palco e aguardar a música iniciar-se.

Zuko resolvera passear naquela manhã esplêndida de sábado. Não por vontade própria, obviamente. Por ele, continuaria em casa, leria um dos vários livros que possuíam; ou talvez dormisse até mais tarde. Não queria sair. Queria a sua casa, a sua cama e a sua cabeça no travesseiro. Mas Mai havia insistido. E que espécie de noivo recusa, mais de uma vez, um passeio com a parceira?

Mesmo sua mãe, sempre defendendo-o, insistira naquela bagunça. E de quebra, ainda tinha de levar Azula e sua amante não-oficial, Ty Lee. As duas andavam de braços dados, como velhas amigas, mas Zuko sabia que elas, em qualquer oportunidade — longe das vistas dos pais — se agarravam. Apreciava o romance delas, mas ficava irritado ao ter de andar com ambas e ter medo de expô-las, resultando assim em dois funerais. Sabia dos riscos. Mas a irmã não aceitava a recusa. Fora obrigado.

E para melhorar a sua situação, Mai. Ela nem mesmo se esforçava para gostar do passeio. Reclamava de cada grão de poeira que insistia em grudas nas suas unhas polidas, ou na sujeira que se impregnava em seu longo e bonito vestido rosado. Ou do vento e Sol castigando seus belos e macios cabelos negros. Então por que insistira no passeio?

Uma multidão chamou a atenção do grupo. Faziam uma imensa roda ao redor de um palco montado precariamente. Mai não se interessou, como Zuko previra, mas Azula e Ty Lee sim. Elas correram, ainda unidas pelas mãos, até a multidão e enfurnaram-se naquele meio. Zuko não tivera outra escolha senão correr atrás das garotas enquanto puxava uma Mai furiosa.

A frente do povo, o grupo finalmente pôde prestar atenção à pessoa que dançava. Zuko soltou, audivelmente, sua surpresa. Mai encarou-o, desconfiada. Katara, trajada de vermelho dos pés a cabeça, dançava naquele palanque. E qual foi a sua surpresa ao encontrar-se com os olhos colados no corpo da cigana.

Sua roupa, provocante, deslizava por sua pele como se fosse uma cobra; rastejava, lenta e prazerosamente por aquele corpo. A cintura movia-se ao som da música, ritmada, e hipnotizava os espectadores. Os cabelos, agora cheio de adornos, rodopiavam junto do corpo. E o sorriso dela, ah aquele sorriso, era estonteante. Ela não deixava de sorrir por um segundo sequer; mesmo quando o palco ameaçava cair, ou quando alguém insistia em tocar suas roupas. Ela sorria. E seu sorriso aumentou consideravelmente ao ver Zuko, filho de Ozai, em meio a plateia, tão deslumbrado quanto os outros homens.

A garota ao seu lado cerrava os dentes e franzia o cenho de forma inadequada para uma dama daquela sociedade. Ela fazia com que Katara se desdobrasse ainda mais em sua dança já tão sensual e contagiante. Quando ela pulou no meio do povo, seus amigos, os outros membros da comunidade, afastaram a população. Katara rodopiava descalço no chão batido, levantava a poeira e não se importava com isso.

Aproximou-se de uma das garotas próximas a Zuko. Parecia ser sua irmã, em feições tão fechadas e de olhos tão dourados ficava impossível não identificar o parentesco. Sorriu para ela e levantou as mãos, ondulando todo o corpo, deixando uma Azula estática e perplexa com a flexibilidade da garota. Ela passou para Mai, que irritada, virara o rosto e focara toda a sua atenção em um pássaro nojento acima deles. Katara então, seguiu para Zuko.

Ele havia se soltado da namorada; estava com as mãos caídas ao lado do corpo. A camisa branca, aberta até o terceiro botão, mostrava um pingente dourado em forma de chama. Ele suava. Muito. Sentia escorrer por seu rosto. Sabia que vinha da multidão e do sol escaldante acima de suas cabeças; mas sabia, também, que provinha da excitação que sentia crescer ao ver aquela mulher dançar sensualmente a sua frente. Não sabia como se controlar, se devia se controlar e se queria se controlar. Segurava, com muita força, o pano da calça. Queria levar as mãos àquela cintura e apertá-la, puxá-la para si e fazê-la dançar sobre seu colo.

Ele estava enlouquecendo.

A cada vez que Katara esfregava-se nele, Zuko perdia um pouco mais da sanidade que ainda restava em sua mente. Ela o provocava, queria ver aquela máscara de homem sério cair por terra. Instigava-o a concentrar-se em si e somente em si. Queria toda a atenção dele, mesmo que sua noiva estivesse ali. Katara queria Zuko de joelhos e implorando por misericórdia. Aquilo só acabou, para Zuko, quando Mai, enciumada, puxou todos eles pelos braços e os arrastou para longe da multidão deixando Katara sorrindo e divertindo-se enquanto trabalhava.

Zuko estava ofegante e desesperado. O rubor em seu rosto denunciava seu estado, o volume evidente em sua calça não passava despercebido. Nem mesmo por Mai, sempre tão desinteressada em tudo. Ela o encarou com desgosto e esperou que ele terminasse o “ataque”.


 

— Você só pode estar brincando comigo — ela murmurava, irritada. Batia as mãos no vestido, num ato antiestresse. Via Azula e Ty Lee discutirem pelos mesmos motivos. — Qual o seu problema?


 

— O quê? — Zuko murmurou, levando a mão ao rosto quente.


 

— Zuko — Mai aproximou-se dele, sussurrando próxima aos seus lábios. — Você está visivelmente excitado. Nem eu consegui fazer isso!


 

Ele abriu a boca, pronto para contestar e desceu os olhos. Seu rosto avermelhou-se ainda mais e seu estresse só fez crescer ao ver que nada mais conseguia baixar ali. Colocou a irmã a frente de si e de Mai e a empurrou até que chegassem em casa, onde largou a noiva e correu para o próprio quarto.


 

— O que aconteceu? — a mãe de Mai indagou, irritada pela falta de modos do rapaz. Ozai encarou Azula, indagando-a silenciosamente.


 

— Zuzu está passando mal — ela disse. Mai encarou-a, cerrando os olhos. — Vou ver como ele se encontra.


 

Antes de tocar o corrimão da escada, sentiu o aperto do pai em seu braço.


 

— Faça-o descer e vir falar comigo.


 

Ela assentiu, sem muito o que fazer. Seus passos, controlados e silenciosos, não se demoraram a fazer estardalhaço ao chegar no andar de cima. Abriu a porta do quarto do irmão, mas logo fechou-a, contendo a forte risada. Zuko claramente se masturbava. A camisa aberta, as calças no chão, a mão subindo e descendo numa velocidade avassaladora; além dos gemidos sôfregos e mal contidos. Quando Azula notou o silêncio no quarto do irmão, abriu novamente a porta e o encontrou fechando as calças.


 

— Bata na porta, por favor — ele disse irritado; o rosto vermelho e as mãos molhadas. Zuko estava realmente ficando louco.


 

— Sua futura sogra ficou nervosa ao te ver largar a preciosa filha dela. E o papai quer conversar com você.


 

— Diga que não estou bem.


 

— Eu disse. Agora, conte até cem depois que eu sair e desça. Vou dar um jeito de dispensar Mai.


 

Zuko suspirou e sorriu em agradecimento. Esperou Azula sair e começou a contar, mentalmente. Um, dois, três… a imagem de Katara dançando fez-se presente em sua cabeça. Dez, onze, doze… seu rosto, seus lábios sussurrando seu nome, aquele corpo passando e enroscando-se no seu; zuko estava perdendo a cabeça. Vinte e um, vinte e dois, vinte e três… Katara agora estava empurrando-o para longe daquela multidão, jogando-o em um beco qualquer e o prensando na parede de uma daquelas casas gigantescas. A sujeira grudava em sua camisa branca, mas não se importava, Katara estava ali. Trinta e cinco, trinta e seis, trinta e sete…

O beijo. Sentia, em sua mente fértil e criativa, os lábios doces e macios dela. Eles se beijavam com fervor e com certa obscenidade. Ela não se importava com as mãos de Zuko subindo e descendo por suas costas. Cinquenta e nove, sessenta, sessenta e um… Agarrou suas nádegas e ouviu o gemido prazeroso escapando daqueles lábios. Mordeu-os, sugou-os e tornou a beijá-la. Sentia carne de suas coxas nas pontas dos dedos; a imaginação fluía leve e indecente. Setenta e cinco, setenta e seis, setenta e sete… Sentiu as mãos dela tocarem seu corpo. Apertava os músculos de seu peito e gemia sobre o quanto ele era bom naquilo; ela sussurrava palavras obscenas em seus ouvidos. Oitenta e nove, noventa, noventa e um… O ato estava quase consumado. Zuko segurava os seios agora desnudos, roliços e macios como imaginava ser. Estava pronto para enterrar-se nela… cem.

Terminou a contagem e abriu os olhos, olhando para o próprio membro. Havia acabado de se tocar e estava ereto novamente. Engoliu em seco, enfiou as mãos na calça e deu um jeito de parecer mais “confortável”. Desceu as escadas e, como o prometido, Mai e sua mãe não mais estavam ali. Zuko seguiu rapidamente para o escritório do pai, mas ele não estava lá. Ozai encontrava-se na biblioteca, acompanhado de Azula que lhe segredava algumas coisas. Zuko não pôde deixar de fazer careta; Ozai ria com gosto e assentia a cada palavra da irmã.


 

— Ah! — Ozai exclamou. Um sorriso malicioso e enorme instalava-se em seu rosto bonito. — Aí está o meu filho. Um verdadeiro puto. Dê-nos licença, Azula.


 

A garota saiu, sorrindo vitoriosa. Ele devia ter desconfiado. Ela estava boazinha demais, ajudando-o mais do que ela jamais ajudara.

Zuko sentou-se a frente de Ozai e o encarou, pronto para receber um discurso sobre como deveria se manter puro até o casamento. Mal sabia o pai que Zuko já havia perdido a pureza há muito, e roubado-a de Mai há pouco tempo. Porém, contrariando as suas expectativas, Zuko viu o sorriso no rosto do pai crescer.


 

— Quer dizer que está atrás de uma cigana? — ele começou. A voz volumosa e poderosa de Ozai soando baixa e tranquila, até mesmo orgulhosa.


 

— Não estou atrás dela — retrucou, constrangido. Ozai gargalhou; o som de sua risada ecoando por toda aquela biblioteca. Ele se ergueu, foi até uma das muitas estantes e puxou um livro, abrindo-o e pondo-se a lê-lo.


 

— Sabe, Zuko — ele recomeçou, os olhos ainda pregados no livro. — Não há nada de errado em desejar uma mulher. Especialmente se ela for alguém tão incrível que lhe fez tirar os olhos daquela coisa que você chama de noiva. Você pode tocá-la, fazer o que quiser dela. Ela é uma mulher afinal, está na terra para isso. Só me faça um favor?


 

— Sim? — respondeu hesitante, não sabendo decifrar e assimilar as palavras do pai.


 

— Tente não engravidá-la — disse. Fechou o livro com brusquidão, o bom humor esvaindo-se. Voltou-se para o filho, colocou a mão em uma das poltronas e sorriu, sádico. — E se o fizer, livre-se dela antes que peça para assumir a criança. Não é muito difícil.


 

Ozai fez o sinal para que saísse e Zuko o fez sem demora. As palavras do pai mexeram consigo, especialmente aquelas em que deixava implícito que já repetira aqueles atos diversas vezes. Ele saiu perturbado daquela biblioteca, tanto pelo pai, quanto pela imagem de Katara que teimava em assombrar sua mente.

O dia havia terminado para aquele grande grupo. Eles juntavam suas coisas e anunciavam os próximos eventos dali alguns dias novamente. Katara envolvia-se em um manto, pronta para entrar na caixa, mas uma mão segurou fortemente o seu braço e ela revirou os olhos.


 

— As pessoas insistem em me segurar — ela murmurou, olhando para trás e soltando-se assim que viu quem era. — O que quer de mim, Jato?


 

— Saber o que faz aqui — disse irritado. Avançou para tocá-la novamente, mas ela se esquivou e cerrou os olhos. Jato bufou, cuspindo o cigarro que pendia nos lábios e o pisoteou, demonstrando sua falta de paciência. — Escuta, garota. Teu pai tá furioso. Eu não vou poder te ajudar desse jeito. Eu vi teu showzinho, posso te ajudar se você me aceitar.


 

— Sokka! — Katara gritou. O irmão apareceu de imediato. Ainda com os olhos colados no rapaz, Katara sorriu. Tirou o manto e o estendeu ao irmão. — Toma. Eu vou falar com o pai. Eu não preciso de sua ajuda, Jato. Eu não preciso de você. Então pare de ficar mendigando minha atenção, isso cansa.


 

Jato afastou-se, bufando e empurrando a todos. Eles não se demoraram e logo chegaram ao acampamento. Hakoda os aguardava, o rosto vermelho e as mãos trêmulas. Katara pôs-se a frente, tocando o ombro do pai.


 

— O senhor não vai querer fazer um escândalo na frente deles, não é?


 

Hakoda encarou-a e deu as costas, numa ordem muda e muito clara de “vamos ter uma conversinha!”. Katara o seguiu, sorrindo para o irmão, chamando-o discretamente e pedindo que ficasse na porta da tenda. Assim que entrou, encarou o pai sentado, esperando-a em um estado emocional instável.


 

— Antes que brigue comigo — ela começou. — Quero pedir desculpas. Eu deveria ter pedido a sua permissão para sair.


 

— É, deveria — ele respondeu, carrancudo. A raiva atenuando-se a cada palavra da filha. — E por quê não o fez?


 

— O senhor não me deixaria sair, muito menos dançar! — ela disse, abrindo os braços e os jogando para o alto. Katara sentou-se a frente do pai. — Eu quero fazer parte do grupo, mas o senhor não deixa. Eles olham para mim como se eu fosse a esquisita. Não consigo me encaixar.


 

— Não precisa ir para a cidade para se encaixar. Pode ficar com sua avó e ajudá-la nos afazeres — disse, o rosto enrugando-se em preocupação e tentativa de solidariedade. Entendia a filha, só não queria deixá-la para o mundo. Era a sua função, como pai, preveni-la dos riscos que corria.


 

— Mas eu não sou boa nisso — ela disse, espremendo os olhos, deixando a tristeza em que afundava diariamente aparecer para o pai. — Eu quero ser útil, mas ser útil em uma coisa em que sou boa e que gosto de fazer. Além disso, o dinheiro que ganhamos hoje será o suficiente para comprarmos novas tendas e tecidos e materiais que faltam.


 

— Foi tanto assim? — Hakoda indagou, assustado pelo progresso que tiveram. Katara assentiu, sorrindo. Levantou-se e puxou Sokka do lado de fora da tenda, dizendo para que confirmasse. — É verdade, Sokka?


 

— É sim, pai — respondeu. Abraçou a irmã pelos ombros e sorriu para ela, bobamente como só ele poderia fazer. — Graças a Katara poderemos renovar nossas tendas; boa parte delas. E comprar tudo o que faltava para as mulheres fazerem suas joias.


 

Hakoda deixou os lábios, novamente, em uma fina linha. Pensava e Katara sabia que ele considerava deixá-la subir nos palcos. A comunidade precisava daquele dinheiro. Com as crianças que resolveram entrar ali, e foram bem acolhidas, a família aumentava. E o dinheiro diminuía. A comida ficava escassa. Não poderiam ficar para sempre caçando os animais daquela floresta. Olhou para a filha e suspirou, levando a mão a própria testa, onde esfregou fortemente.


 

— Tudo bem — respondeu. Katara comemorou, fazendo o irmão sorrir enérgico. — Mas com uma condição!


 

— Certo! — ela concordou de imediato.


 

— Eu vou assistir as suas apresentações.


 

A condição não a afetara tanto; Katara saberia lidar com aquilo. Por aquele momento, ela apenas decidiu sorrir e balançar a cabeça afirmativamente, concordando com os termos. Era mais do que ela pensou conseguir um dia, devia estar muito feliz.

E foi naquelas condições, “parcialmente livre”, que Katara encontrou o que desejava. Nas semanas que se passavam, mais pessoas aderiam ao costume de vê-la dançar nas praças, ou até mesmo convidá-la para festas, onde eram ainda mais bem pagos. A comunidade crescia conforme o dinheiro entrava, os produtos ficavam mais bem feitos, as roupas ainda mais bonitas e a dança que apresentavam melhorava a cada espetáculo. Ao final de um mês, eles estavam conhecidos por toda Londres.

A apresentação daquele dia seria diferente. Não seria a luz do dia e cobrariam um pouco mais pela diversão que proporcionariam naquela noite. Suki, Yue e Toph estavam encostadas nos fundos do grande palco, agora melhor estruturado e preparado. Pressionavam Katara e passar um pouco mais de batom, ou arrumar melhor as roupas no corpo. A tranquilidade que ela exalava não era normal. Estavam prestes a começar uma performance inédita — até mesmo para elas.


 

— Katara, por favor! — ela escutava seu nome ser pronunciado pela milésima vez naquele curto período de tempo que possuíam. — Nos ajude!


 

— Vocês estão tentando me desesperar? — ela indagou, por fim. Sorriu, cínica. — Não vão conseguir. Suki, vá falar com meu irmão. Aliás, vão vocês três. Preciso me concentrar.


 

Elas suspiraram, desistindo. O que mais esperavam? Era Katara! Independente, segura de si; ela sabia, mais do que ninguém, o que estava fazendo. Para quê preocupar-se? Elas deram as costas e foram receber o público.

Katara, por fim, respirou tranquila. A verdade é que estava nervosa. Um número novo, com seu pai a observando e toda aquela gente… e se errasse? Perderiam muito dinheiro! Não estava disposta a correr esse risco. Talvez fosse melhor cancelar e continuar o mesmo show de sempre.


 

— Filha? — Hakoda aproximava-se com cautela da menina. Percebia, como ninguém, o medo apossando-se dela. Ele não precisava falar muita coisa; Katara atirou-se em seus braços e respirou profundamente, esperando a calma e a serenidade tomarem conta de si. Não demorou muito; seu pai era sinônimo daquilo que procurava e mesmo que nada saísse de seus lábios, ela encontrava tudo o que procurava.


 

Enfim se soltaram e a presença de Katara fora anunciada no palco. Ela subiu, mais confiante do que nunca e pôs-se a fazer o que sabia de melhor. As notas que saiam dos instrumentos eram novas, as curvas de Katara se ondulando eram, de alguma forma, diferentes das que o público estava acostumado. Eles vibraram!

Qual foi a surpresa de Zuko ao encontrar-se, novamente, em meio aquela multidão ensandecida. O público quadruplicara e a visão que tinha da dançarina agora era melhor do que antes. Dava para ver que as apresentações rendia algum dinheiro e que aquilo fora usado para melhorar as condições de trabalho. Ele estava surpreso porque, não só o palco melhorou, ou a cordialidade com que eram tratados havia subido de nível, mas pelas roupas e pelas feições que a dançarina, a tão desejada Katara, exibia.

Roupas ainda mais provocantes, vermelho e dourado mesclando-se e confundindo-se em sua pele cor de canela. Os pés descalços, as pernas adornadas com joias reluzentes e douradas, as coxas aparecendo vez ou outra. Os quadris remexendo-se como uma cobra a rastejar, lentamente; os braços envolvendo o próprio corpo. Katara estava ainda mais atraente e Zuko já não mais tinha cabeça para aguentar aquela situação.

Tentara fugir por um mês, por um longo mês, mas era inútil. Por onde passava Katara aparecia. Por toda Londres, eles percorreram e apresentaram seus números fabulosos, com ela sendo a principal atração. Ele estava, novamente, ficando louco! Não mais aguentaria noites solitárias de masturbação, ou pensamentos insólitos e indecentes sobre como deveria tomá-la para si. Queria provar daqueles lábios, tocar aquela pele e fazê-la sua. Queria marcá-la, roubar a falsa inocência que Katara exibia. Zuko estava maluco, alucinado.

Rondava a multidão, circulava e adentrava cada vez mais aquele grande círculo. Aproximava-se do palco com lentidão e uma excitação impressionantes. Era como um leopardo, os quais tanto ouvira falar quando estava na África; rondava a presa silenciosamente, esperava, espreitava. Aguçava os sentidos — os olhos para ver melhor aquela mulher, os ouvidos para poder encontrar sua voz em meio aquelas pessoas, o tato, pronto para tocá-la e os lábios, prontos para chamá-la e clamá-la como sua. E quando estava pronto… atacava.

O ataque, entretanto, não partiu de si. Não, Zuko mantivera-se muito atento, mas o seu ataque falhara miseravelmente. Katara o avistou. Ela estivera de olho em todas as pessoas dentro daquele espetáculo, os olhos atentos e espertos, procurando alguma presa. Não se surpreendeu quando viu Zuko, filho de Ozai, rondando todas aquelas pessoas, procurando se aproximar do palco. Ela foi o leopardo o tempo todo.

Para a surpresa dele, Katara ergueu a mão. Os músicos pararam imediatamente. Era chegado o momento da grande surpresa.


 

— Caros espectadores! — ela falou, ofegante e em voz alta. Todos se voltaram para a figura atraente no palco; as atenções totalmente voltadas para ela. — Esta é uma noite especial! Linda, o céu limpo, a Lua nos iluminando. Nós resolvemos inovar e celebrar esta noite maravilhosa. Um de vocês, pode ter o prazer de dançar comigo!


 

Os gritos, claramente masculinos, encheram o lugar. Katara sorriu, tendenciosa. Zuko estreitou os olhos, disposto a entrar naquele joguinho. Ela estava brincando com todos eles. E pelo olhar que o líder daquela comunidade lançara, aquilo era totalmente novo. Eles não faziam ideia do que estava acontecendo.


 

— Dez pessoas terão de enfrentar Toph no jogo dos copos. Eu apontarei, aleatoriamente, para vocês. Quem for o escolhido, dirija-se a tenda.


 

Ela terminou a fala, não dando mais nenhuma informação. Katara então pôs-se a escolher os candidatos, alguns empurravam-se, mas a escolha era clara e os seus amigos sabiam bem para quem ela apontava. No nono concorrente, Katara parou; fechou os olhos e rodou a mão por todo o lugar, parando exatamente em Zuko. Ela abriu os olhos e sorriu, um sorriso sarcástico, de quem sabe que o jogador vai perder a maldita aposta.

Mas Zuko sorriu também, surpreendendo-a. Deu as costas e seguiu para a tenda. Enquanto Katara retornava a dança, um a um os candidatos saíam, derrotados. Quando foi a sua vez, Zuko respirou fundo e entrou. Era uma tenda absurdamente simples. Sem adornos ou adereços, havia apenas uma mesa no centro daquele lugar. Uma garotinha de aparentemente doze anos ocupava a cadeira atrás da mesa. Rodopiava entre os dedos uma bolinha metálica e três copos jaziam esquecidos em cima da mesa. Ela sorriu e indicou-me a cadeira da frente, pronta para começar a falar.


 

— Você tem exatamente três chances — ela começou, a voz infantil rasgando seus ouvidos. A insolência maior do que se lembrava para uma criança. — Eu vou colocar a bolinha debaixo de um dos copos e vou embaralhá-los. O seu objetivo é encontrar a bolinha pelo menos uma vez. Você entendeu?


 

— Sim — respondeu baixinho, cuidando, não sabia o por quê, para manter a voz naquele tom. A garota parecia muito centrada, embora divertida.


 

— Que bom — tornou a dizer, colocando a bolinha debaixo do primeiro copo. Pôs-se a movimentar os copos, aumentando a velocidade gradativamente. Zuko impressionou-se com a velocidade com que ela mexia os objetos. — Eu sou cega, como pode ver. É impossível a trapaça.


 

Zuko sorriu, desesperado. Queria aquela oportunidade mais do que ninguém e estava disposto a, quem sabe, obrigar a garota a dizer que ele havia conseguido. A presença do rapaz do lado de fora da tenda no entanto não o animara.

Toph parou as mãos e aguardou que Zuko tocasse um dos copos. Ele não se demorou, precipitado e despreparado. Era o copo do meio, tinha certeza. Toph levantou o copo e Zuko bufou pela ausência da bola.


 

— Você tem mais duas chances — ela cantarolou, colocando a bolinha em outro copo. Refez os movimentos e parou as mãos.


 

Zuko demorou-se na escolha do copo. Estava indeciso, por isso tocou o copo da esquerda. Toph o ergueu e Zuko bateu as mãos nas próprias coxas, irritadiço. Ela voltou a colocar a bolinha debaixo dos copos e ele focou ainda mais os seus olhos naqueles malditos copos. Agora, não só a visão, mas a audição estava aprimorada. Estava certo de que a garota trapaceava e provaria aquilo.


 

— Somente mais uma!


 

Viu então a sua chance. Toph arrastara o copo até próximo de si, deixando uma abertura grande o suficiente para que a bola passasse. Ele sorriu, contente por saber a resposta. Notara, naquele meio tempo, a ausência do som característico da bolinha batendo contra os copos. Estava bem ali a sua oportunidade!

Toph parou e Zuko sorriu, triunfante. Segurou a mão esquerda de Toph e puxou-a para o alto. O sorriso que a garota carregava desapareceu e o ar de derrota assolou a tenda. Toph soltou seu braço e puxou a bolinha, entregando-a ao vencedor.


 

— Se disser alguma coisa… — ela começou, em tom baixo de ameaça. Zuko engoliu em seco, preocupado com sua segurança. — Eu mato você.


 

— Eu não vou dizer nada — sussurrou. Toph virou o rosto e sorriu brevemente, desejando-lhe sorte e paz em sua caminhada até Katara. Zuko surpreendeu-se com os desejos da garota, mas, afobado como estava, apenas ergueu-se e saiu rapidamente da tenda.


 

Katara parou então de dançar. A bolinha de metal reluzia nas mãos de Zuko e os homens todos praguejavam ofensas e maldições contra ele e a garota. Katara, no entanto, sorria; parecia orgulhosa e não estava arrependida por seus atos. Deixou que Zuko subisse no palco e tomou a bolinha de suas mãos, erguendo e mostrando as pessoas.


 

— Parece que temos um sortudo — a voz de um rapaz entoou em meio a multidão. Katara tornou a entregar a Zuko e pediu que a música começasse.


 

Zuko guardou a pequena esfera no bolso e colocou-se frente a garota. Katara sorriu para ele e balançou os cabelos, erguendo os braços e balançando os quadris. Ele sorriu, os olhos presos nos dela, flamejantes, ardentes. Os azuis dela brilhavam e pareciam carregar tanto desejo quanto os dourados dele; atraíam-se e aquela ligação que emanava daquele dois era visível a todos. A tensão que os cercava era impressionante. Sokka via-se com ciúmes do que acontecia e Jato reclamava em alto e bom som, mas a música embalava aqueles dois e Zuko via-se cada vez mais perdido na imensidão que eram os olhos de Katara.

Ela baixou os braços, levando as mãos de Zuko a própria cintura, deixando que ele sentisse os movimentos. Katara se aproximou e fez com que ela pusesse-se a dançar junto dele. Os olhos ainda unidos, os lábios roçando-se e os corpos esfregando-se em uma dança totalmente libidinosa.


 

— Mishto hom me dikava tute³ — ela sussurrou contra os lábios dele. Zuko abriu um pouco a boca, mas fechou-a rapidamente. Tomava fôlego, mas ele parecia nunca aparecer.


 

— Eu não consigo te entender — ele murmurou, por fim. Pode sentir o gosto dos lábios de Katara, seu hálito de menta refrescante batendo contra suas narinas. Ela sorriu, sentindo a ondulação do corpo dele bater contra o seu.


 

— Eu disse que estou feliz por te ver — ela passou a língua pelos lábios, ciente do olhar dele. Girou o corpo e rebolou discretamente contra a cintura dele, voltando a encontrar seus olhos.


 

— Você quase me matou — Zuko disse, um pouco emburrado por lembrar do dia em que se conheceram. Ela riu; um som delicioso e delicado, como um repicar de sinos.


 

— Era você ou eu — ela respondeu de imediato, o sorriso divertido estampando seu rosto. — Meu pai é um pouco… explosivo.


 

— Eu percebi — disse tomando o controle da dança. As notas aumentando a velocidade, a música chegando ao seu fim. — Quero me encontrar com você novamente.


 

— O que você quer fazer comigo? — ela indagou, suspirando e engolindo a saliva. Katara cerrou os olhos e sorriu minimamente, propensa a aceitar o pedido. O olhar de desafio era atraente para Zuko; ela o incitava a competição, a disputa por controle.


 

— Você sabe tanto quanto eu — Zuko disse, um sorriso discreto, porém sensual, rondando seus lábios. Katara, então, atraída por ele, grudou seus olhos nos lábios dele e sorriu, concordando com aquelas palavras.


 

— Me encontre naquele mesmo lugar.


 

Ela terminou a fala, deixou um breve beijo em seus lábios e terminou a dança — exatamente quando a música parou. O povo aplaudiu, maravilhado pela apresentação e pela disposição daqueles dois. Katara deu as costas e sorriu para Zuko, provocando-o. Ele estava ofegante e suas calças pareciam querer estourar. Ele parecia um adolescente sem controle! Pelo menos conseguia disfarçar o volume…

Zuko não esperou mais convites, apenas saltou do palco e deixou que eles continuassem o show. Viu o pai de Katara repreender-lhe nos fundos, longe da visão do público, mas ela, de cabeça baixa, ainda sorria e parecia vê-lo pelo canto dos olhos. Ele sorriu também, despreocupado, e seguiu para o lado oposto de sua casa.

A floresta estava silenciosa e passar pelo acampamento não foi uma tarefa complicada, visto que as senhoras e os senhores já estavam a dormir. A laguna lhe parecia ainda mais bela àquela hora e aguardar a chegada de Katara nunca fora um negócio tão prazeroso. Ouviu então o som, muito abafado, quase nulo, das pessoas chegando, se acomodando; estavam prontos para dormir.

Esperou, pelo que conseguiu contar, por quase uma hora. E já estava prestes a desistir, quando a visão de Katara se aproximando fez com que parasse. Ela estava trajada de uma forma simples, mas não menos atraente para Zuko. Ela sorriu e não conseguiu dar dois passos antes que ele corresse até ela e a prensasse contra a mesma árvore em que a abordou.

Os lábios de Katara eram como Zuko imaginava — melhores até. Doces como mel e macios como pêssego, Zuko aproveitava a sensação deliciosa que era beijar aquela boca. Ele sorria entre o beijo, desesperado por mais contato. Mas fora separado bruscamente, sendo empurrado por ela.


 

— Que desespero — ela sussurrou, os lábios mostrando um sorriso divertido e um olhar ardente. — Vamos entrar.


 

Ela se referia a água; parecia estar fresca naquela noite quente. Zuko repreendera-se por não pensar naquela possibilidade antes. Katara despia-se sem pressa, sensualmente. Queria provocar Zuko e ver até onde ele podia se conter. Porém, Katara havia caído na própria armadilha; Zuko fazia exatamente o mesmo. Retirava a camisa e deixava-a escorrer pelo tronco devagar, incitando sua imaginação. Retirou as botas e as meias e jogou-as próximas da camisa; desafivelava o cinto e abria a calça sem muita pressa. Quando enfim terminou, Zuko baixou os braços, aguardando Katara, satisfeito por ter causado nela as mesmas reações.

Ainda surpresa e um tanto excitada, Katara terminou de tirar as roupas. Entrou na água com os olhos ainda colados no corpo pálido e marcado com cicatrizes de Zuko. Ela mergulhou, privando-se da visão do rapaz; mas assim que emergiu, viu que estava mais próxima a ele do que esperava. Zuko já estava molhado, com água escorrendo pelo tronco — era uma visão arrebatadora. Katara levantou uma das mãos e levou ao rosto dele, aproximando-se e deixando os corpos, agora nus, resvalarem-se e sentirem-se sem o incomodo das roupas.

Era a melhor sensação que ambos já haviam sentido. A pele, quente e macia, sensível ao toque; as curvas que ambos apresentavam, os músculos rígidos pela tensão; o desejo de se tocarem finalmente se concretizando. Zuko estava encantado com toda aquela situação, e, embora seus olhos nada conseguissem enxergar mais do que puro desejo, sabia aproveitar a situação. Suas mãos, muito inquietas, afagavam a base da coluna da garota e gravavam todas as suas curvas. Seus lábios molhavam-se ao encontrar a pele de sua clavícula. Zuko perdia-se no seu próprio desejo.

Katara não se encontrava em estado diferente; suas mãos, sempre tão atrevidas, dessa vez encontravam-se mais tímidas do que imaginava. Estava constrangida por estar nua na frente de um homem que, desde que o conhecera, habitava seus pensamentos. Sabia bem o que fazia, não era a primeira vez que tinha encontros desse tipo, mas nunca havia se sentido daquela maneira. Tão excitada e desejosa de alguém, a ponto de seduzi-lo em meio a uma grande multidão; sequer havia combinado sexo com alguém daquela forma. Quer dizer, era o que fariam naquele momento, sexo. Até mesmo a palavra soava interessante em seus pensamentos.


 

— Você está pensativa — Zuko murmurou a base de sua orelha, mordendo seu lóbulo antes de começar a dedicar-se a manchar seu pescoço. Katara sorriu, deitando a cabeça para o lado oposto, expondo seu pescoço.


 

— Talvez — respondeu baixinho, a voz mais grave do que imaginava. Apertou os músculos das costas de Zuko, arranhando um pouco a pele branca do rapaz. Zuko gemeu baixinho em seu ouvido, tecendo beijos de seu queixo até seus lábios.


 

O beijo tornou a acontecer, dessa vez mais obsceno e desesperado do que antes. Os barulhos que saíam daquele encontro, chamava a atenção deles mesmo, assustados com a compatibilidade que possuíam. Zuko não podia deixar de comparar Katara e Mai; Katara era quente, sedutora e até seu beijo tinha um gosto diferente, de paixão proibida e avassaladora. Mai, no entanto, era deveras sem graça, desinteressante ao seu paladar que, agora descobrira, encantara-se com Katara. Poderia beijá-la por horas, sem parar; era viciante e Zuko não conseguia se imaginar ficando longe da garota.

Uma de suas mãos, atrevida, desceu pelo corpo da garota. Sentiu os seios firmes, escorreu pela barriga macia e chegou a área mais íntima de Katara. Ela estava quente e úmida, deixando Zuko ainda mais excitado pela situação. O gemido dela despertou a atenção dele; Zuko pensou que poderia ficar ouvindo sua voz manhosa e desejosa por dias e sentiu-se um completo pervertido por isso. Ele mesmo gemeu sentindo Katara daquela forma; gemeu por se imaginar ali, forte e intenso, por estar tocando-a e por ver o quão contorcido em prazer o rosto dela se encontrava.


 

— Eu quero foder você, Katara — soltou, sem nem mesmo perceber. Ela o fazia ficar daquele jeito: excitado, sem pudor, louco por ela. Acariciava-a com força, ouvindo os gemidos dela crescerem com cada vez mais intensidade, incapaz de se conter.


 

Katara apertava-se contra o corpo dele e estava incapaz de falar, por isso, num lapso de força repentina, abriu mais as suas pernas, acomodando-o muito bem ali. Cruzou as pernas na cintura forte de Zuko e jogou sua cabeça para trás, deixando-se marcar e seduzir pelo homem. Zuko não resistiu ao convite e agarrou o próprio membro, conduzindo-o a entrada da garota. Era apertada, como uma virgem, e muito quente. Ele sentia o corpo queimar e não se importava com aquilo; queimar-se-ia se fosse preciso. Queria senti-la da cabeça aos pés e ao unir-se a ela, poderia finalmente fazê-lo.


 

— Espera um pouco — ela sussurrou, ofegando, segurando-o pelos braços. Zuko sorriu, assentindo, ciente do pedido. Ela soluçou, um gemido escapando por seus lábios entreabertos. — Você… você é muito grande.


 

Ele sorriu com prepotência, mas aguardou o aval de confirmação. Não demorou que Katara se movesse e buscasse ela mesmo contato com Zuko, rebolando e pedindo que se movesse sem demora. Ela descobriu ali o quão bom Zuko era com os movimentos de sua cintura. Flexível e controlador dos próprios movimentos, Zuko conseguiu deixar a garota incapaz de falar outra coisa senão gemidos. Intenso e lento, ele se impulsionava para o interior de Katara com ritmo constante, sem parar, deliciando-se com os grunhidos que escapavam dela. Ele mesmo estava incapacitado de conter os rosnados que subiam por sua garganta. Ela era boa demais, sensual demais para que pudesse se conter.

Katara já sentia o ápice se aproximar e sequer sentia seu ponto mais prazeroso ser tocado; Zuko sequer pensava na possibilidade de gozar. Apertou os seios e acabou por seu jogar nos ombros dele, gemendo palavras obscenas e dizendo o quão bom estava e o quanto ele era ótimo naquilo que fazia. Ela estava fora de si, cega pelo prazer que recebia e proporcionava; sequer deu-se conta quando aconteceu seu primeiro orgasmo. Apertou-o fortemente pelos ombros e contraiu sua entrada o mais forte que conseguiu. Zuko parou por um tempo, sentindo-a chegar ao ápice, e sentiu-se zonzo ao ouvi-la dizer que poderia continuar, que queria mais. Ela estava insaciável!

Continuar naquela dança foi fácil para Zuko, fazê-la gozar mais uma vez e finalmente chegar ao próprio orgasmo foi ainda mais tranquilo. Difícil, no entanto, foi conseguir deixá-la e parar de beijá-la. Sair da laguna e secá-la com delicadeza, observando todos os seus traços e vesti-la sem pressa, beijando-a sempre que possível. Zuko estava encantado com Katara; mesmo quando teve de deixá-la partir e seguir o seu próprio caminho, ele não para de pensar na garota. Foi assim por semanas.

Encontravam-se com mais frequência do que se desejaria; Zuko fazia-a sua a maioria das vezes que se encontravam. Eles também, além do sexo que tinham, acabaram por descobrir mais de si. Conversavam por horas a fio, sem descanso, olhando nos olhos um do outro. Mesmo agora, enquanto estavam sentados em uma rocha, longe do acampamento e dos olhos da cidade, contavam os navios que aportavam e riam dos marinheiros. Eram companheiros no sexo e na vida.


 

— E o que acha daquele cara? — Katara indagou, sentada no meio das pernas de Zuko, olhando o movimento incessante dos marinheiros. Zuko resmungou algo, beijou o topo da cabeça dela e aproximou seu rosto do ouvido da garota.


 

— Ele me parece ser um bom sujeito — deu de ombros. Focou-se na imagem do homem musculoso e de cara amarrada. — Casado, com três filhos. Duas filhas mais velhos e um pequeno, ainda correndo atrás de gaivotas pelas docas.


 

— Parece uma vida agradável — Katara resmungou. Seus olhos vagando pelo marinheiro escolhido. — Tranquila.


 

— E é — Zuko respondeu, a voz tão baixa quanto a dela. Aquela apatia assolava aquele relacionamento proibido já a alguns dias. Katara não conseguia mais fingir seus sentimentos. Suas ações nas relações mais íntimas, estavam mais carinhosas e românticas, sentia isso também de Zuko.


 

— Ei — Katara sussurrou de repente, voltando-se para trás. Seus lábios encostaram nos de Zuko por um instante, suas mãos tocando o rosto dele e uma delas sentindo a cicatriz.


 

— Sim? — respondeu, os olhos fixos nos azuis quentes de Katara. Perdia-se naquela imensidão tempestuosa a todo instante; não queria deixar de encará-la.


 

— Eu amo você — disse, a voz hesitante e os lábios tremulando.


 

Ela estava incerta da resposta, mas finalmente havia dito aquilo para alguém. Mesmo que fosse rejeitada agora, Katara estaria feliz pelo relacionamento que vivera naqueles meses que se passaram. Zuko estava surpreso, mas feliz. Nunca ninguém o havia falado aquilo, nem mesmo a sua mãe. Estava feliz por saber que sua vida, que sua existência, valia para alguém. Por isso não hesitou ao respondê-la, ciente dos próprios sentimentos.


 

— Eu também amo você, Katara.


 

Eles sorriram felizes um para o outro, experimentando daquela sensação de formas diferentes, mas que os unia de muitas formas. Ao final daquela tarde, Zuko e Katara trocaram promessas; Zuko deixaria a noiva e fugiria com eles em suas semanas. Deixaria para trás toda a sua família e sua vida de conforto, ficaria com Katara para sempre. Era o que pensava. Ao chegar em sua casa naquela noite, feliz como nunca estivera antes, Zuko surpreendeu-se com Mai.


 

— O que faz aqui? — indagou. Sentou-se próximo a lareira e apanhou um bocado de vinho que se encontrava ali. Mai aproximou-se, submissa e com os olhos colados no chão.


 

— Eu sei que está me traindo — disse. Zuko engoliu em seco e voltou os olhos para o fogo que crepitava baixo na lareira. Mai ajoelhou-se a sua frente, tocando suas mãos; Zuko repeliu o toque, indiferente a garota. Ela franziu o cenho, carregada de raiva. — Todos sabem. Meus pais estão furiosos.


 

— Mai, eu não vou mais me casar com você — ele disse de uma vez. O vinho balançando em sua taça, a voz de Zuko séria e fria. Ela riu baixinho.


 

— Você não está entendendo, meu noivo. Nós vamos nos casar, você queira ou não — ela disse, prepotente. Apertou as mãos de Zuko e fez com que ele lhe encarasse. — Se você não o fizer, meu pai vai cortar relações com a sua família. Seu pai já está ciente, Zuko. Se nós não nos casarmos, seu pai vai te expulsar daqui e você vai morrer na rua.


 

À menção de seu pai, Zuko estremeceu. Ele possuía muitos medos, mas nenhum se comparava ao seu pai. Tocou a cicatriz e tremeu, incapaz de negar aquela afirmação. Mai sorriu, um sorriso maléfico, e saiu dali imponente como sempre foi. Zuko virou a taça de vinho e fchou os olhos, sentindo as lágrimas escorreram. Para Mai parecia ser uma ameaça muito simples, muito vã, mas ele sabia bem do que se tratava. Ozai era mau, de índole muito questionável e sádico. Fazia o mal as pessoas porque gostava e isso o assustava de diversas maneiras. Mesmo que Zuko deixasse a casa, quem sofreria, sabia disso, seria a sua mãe. Talvez Azula, mas sua mãe seria a mais afetada. Não poderia fugir com Katara.

O casamento deles foi marcado para duas semanas após o aviso, quando os ciganos sairiam da cidade. Zuko não conseguiu contatar Katara, por medo e por ser vigiado em casa. Só pôde sair de seu quarto na manhã de seu casamento. Ele estava muito bem vestido, com roupas de ótimo corte e linhas caras, mas seu rosto expressava a mais pura tristeza. Ursa conseguia vez aquilo no rosto de seu menino e se sentia mal por atrapalhá-lo. Ela estava ciente de toda a situação do filho, desde os encontros que acabou por encobrir as mágoas que escutou do filho ao descobrir o porquê do garoto ficar e se casar com quem não queria. Ursa estava tão infeliz quanto o filho.


 

— Ainda há tempo para desistir, Zuko — ela disse. Zuko sorriu dolorosamente, incapaz de manter mesmo aquela expressão.


 

— Não posso deixá-la — foi o que respondeu, não se dignando a dizer mais nada.


 

Azula apareceu na porta e chamou-os para irem logo para a igreja. Contrário às tradições, Mai já se encontrava na porta da igreja, aguardando-o com ânsia e, como já esperava, a indiferença no rosto. Fez uma careta e ofereceu o braço para ela, levando-a até próxima do altar. O padre já os aguardava e falava com pressa, como se temesse a fuga de Zuko. Um barulho, no entanto, fez com que eles parassem a celebração. A companhia de ciganos passava em frente a igreja, festejando e gritando e tocando suas músicas. Pelo menos alguém estava feliz, Zuko pensava.

Estava equivocado, entretanto. Katara, no meio da companhia, estava parada na porta da igreja, acompanhando as palavras do padre e com os olhos fixos em Zuko. Ele fez menção de sair de seu lugar, mas a mão pesada de seu pai o manteve no lugar. Katara chorava, copiosamente, incapaz de parar a celebração. Seus amigos rodeando-a e tentando puxá-la para longe daquele lugar.


 

— Zuko — a voz de Ursa fez-se presente. Zuko não a olhou. — Vamos?


 

A pergunta fez Zuko encará-la. A mão estendida da mãe fez até mesmo Ozai se surpreender, olhando espantado para a esposa. Ele agarrou a mão da mãe com força e ambos correram para a saída da igreja, deixando os convidados chocados com tal ação. Sua mãe, jogou-se em meio a companhia, como se já a conhecesse e abraçou um estranho, que recebeu-a com um beijo longo e apaixonado.

Alheio a sua mãe, Zuko aproximou-se rapidamente de Katara, tomando-a pela citura, erguendo-a e lhe beijando os lábios com amor e saudade. A ação de mãe e filho despertou a fúria de Ozai, que gritava a toda a sua guarda a morte de todos os “malditos ciganos”. Não contavam porém, com a proteção do grupo, que reagiu mostrando as próprias armas e saindo rapidamente daquele lugar.

O caminho foi longo, a luta de ambos ainda mais difícil, mas enfim, Zuko e Katara encontraram a felicidade que tanto procuravam.

 


Notas Finais


O povo te faz dançar ¹
A sorte não te procura duas vezes ²
Estou feliz em vê-lo ³

O link das palavras e expressões que usei: http://www.kumpaniaromai.com.br/textos/termosciganos.htm

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