Dia encara Noite, que ainda estava possuída por Talita.
Lucífago havia virado pó, assim como sua bengala. Seu pequeno monóculo, também feito de um ouro negro, estava no chão.
Talita o pega e encara Dia.
- Diga para menina usá-lo. – Diz Talita.
Dia acena positivamente com a cabeça, em silêncio.
O fantasma da garota sai. Noite apaga.
“O débito há de ser pago.” – Diz a voz na escuridão.
- Mas que saco! Eu sei. – Diz Noite à voz.
“Pague o débito e receba seu nome de volta.” – A voz diz.
- Meu nome... – Diz Noite pensativa.
A garota acorda num rompante. Ela estava deitada sobre feno. Já estava amanhecendo, Dia estava sentado ao seu lado, com uma fogueira acesa.
- Bom dia. – Diz o garoto.
Noite olha ao redor.
- Sonhou com o que? – Dia pergunta.
- Com nada. – Responde a menina.
Dia sorri.
- Vai se acostumando. – Ele diz e depois boceja.
- Você não dormiu? Tá com olheiras horríveis. – Diz Noite.
- Não dormi porque eu tinha que ficar de olho em alguém que desmaia do nada. – Dia diz. – Você devia cuidar direito da sua mana espiritual sabia? Ela não é infinita.
Noite suspira.
- Cê vai aprender muita coisa comigo, guria. – Dia diz. – Toma, fiz uma sopa.
Ele entrega um pequeno pote metálico para Noite.
- Obrigada. – Diz a menina.
Noite tomava a sopa em silêncio e olhava ao redor. Eles não estavam na cidade fantasma.
- Pra onde você me trouxe? – Pergunta Noite.
- Carreguei você até aqui, numa casinha estranha e abandonada. Lá dentro tá tudo uma zona, então coloquei você nesses fenos daqui. – Dia diz. – Aliás, cê é mais pesada do que parece.
Noite sorri.
“A mesma coisa que minha mãe dizia.” Pensa a menina.
Dia suspira.
- E então, o que faremos hoje? – Pergunta o menino.
- Nada. Temos que esperar escurecer pra encontrar a direção da estrela d’alva. – Diz dia.
Dia ri.
- Você sabia que as estrelas não se movem? – Diz Dia. – É só ver pra onde ela fica e caminhar em direção à ela.
- E você, por acaso, lembra a direção dela? – Pergunta Noite.
O garoto fica em silêncio.
- Foi o que eu pensei. – Diz Noite sorrindo.
Tyler estava em cima da bolsa da garota, comendo outra banana.
- Onde arranjou isso? – Pergunta Noite rindo.
- Ah, bom dia senhorita. O senhor Dia trouxe pra mim de dentro daquele estranho vórtice azul. – Diz Tyler.
Noite encara Dia.
- O que é aquele vórtice azul? – Pergunta Noite.
- É um portal que vai pra casa da Levi. – O garoto responde.
- E por que não nos levou pra lá? – Noite volta a perguntar.
- A Levi... – Dia hesita. – Ela não gosta muito de visitas.
Noite suspira.
- Vou caminhar. – Diz Noite.
- E eu vou dormir. – diz Dia. – Se você morrer, eu to fodido. Então evita entrar em confusão.
Noite revira os olhos.
- Vamos Tyler. – A garota diz colocando o ouriço dentro da bolsa.
Noite começa a caminhar e Dia deita-se no feno.
O lugar tinha a grama amarelada, o cheiro de terra molhada predominava, dizendo à garota que havia chovido há pouco.
- Tyler, você conhece esse lado de Lugar Nenhum? – Pergunta Noite.
- Certamente senhorita. – Diz o ouriço. – Mas aqui não há muito o que se fazer. Era uma comunidade rural.
Noite caminhava por uma estrada com milharais secos ao redor. O Sol estava quase a pino.
- Eu não entendo o tempo deste lugar. – Diz Noite.
- Você se acostumará, senhorita. – Tyler diz dentro da bolsa. – Senhorita, acho que isto é de seu interesse.
Tyler segurava o monóculo que Talita havia pego.
- Isso... Isso era do Lucífago. – Diz Noite, pegando o monóculo.
- É um artefato demoníaco. – Diz Talita, aparecendo ao lado da menina.
Noite se assusta, mas logo sorri.
- Onde esteve? – Pergunta a menina.
- Vagando. – Diz Talita. – Coloque o monóculo.
Noite, depois de algumas tentativas estranhas e desastradas, consegue colocar o monóculo.
Tudo que seu olho direito via era o escuro, como se ela estivesse com ele fechado.
- Não vejo nada. – Diz Noite.
- Concentre-se e olhe direito. – Diz Talita.
A garota fecha seu olho esquerdo. Tudo estava escuro. Aos poucos o lugar vai tomando forma. Noite conseguia ver perfeitamente onde estava, mas agora conseguia também ver alguns lugares com luzes chamativas. Eram luzes de várias cores: Atrás dela, distante, havia uma luz azulada, ao longe, à sua esquerda havia uma fraca luz vermelha, de seu lado direito via-se uma luz cinzenta e à sua frente uma luz alaranjada que emanava no horizonte.
Noite ouve um chiado e tira o monóculo. O chiado vinha da frente. A garota caminha mais rápido em direção a ele.
Uma sombra estendia-se no chão, em frente a uma pequena e acabada casa, cujo tempo castigara bem.
A sombra tinha a forma de uma mulher. A forma de uma mulher que era bem familiar para Noite.
- Senhorita, acho que deveríamos retornar. – Diz Tyler, colocando-se para dentro da velha bolsa de couro.
Noite dá um passo em direção à sombra que chiava.
“Isso não se mexe, mas grita como os infernos.” – Pensa Noite dando outro passo para perto da sombra.
Silêncio. O chiado havia parado e a sombra desaparecera para dentro da casa num rompante.
- Senhorita, não acho uma boa ideia entrarmos aí. – Diz Tyler.
- Vamos, não há nada com o que se preocupar. – Diz Noite. – Se ela quisesse nos atacar já teria feito isso.
Noite adentra a velha casa. Pó e terra estavam distribuídos pelo lugar. Talheres e pratos estavam em cima de uma mesa de madeira. Teias de aranha consumiam as paredes.
Noite vê uma escada logo em frente. Após alguns passos a garota está no segundo andar da casa.
Um longo e escuro corredor. Duas portas; Uma aberta e outra fechada. Havia uma janela tapada com algo que se assemelhava a um grande pano preto.
Noite entra no quarto que estava com a porta aberta. Vazio e claro. A garota encara a paisagem que dali de cima não era tão morta quanto ela pensava.
Aos poucos Noite abre a última porta da casa, o único quarto que ela não havia entrado.
Uma vaga silhueta nas sombras.
- Olá? – Pergunta Noite.
Silêncio.
- Por favor, deixe-me só. – Alguém diz dentro do quarto.
- Muito prazer, eu sou Noite. – Diz a menina.
Silêncio.
- Como você se chama? – Pergunta Noite.
- Não tenho nome. – A voz diz.
Noite aproxima-se da silhueta.
- Por favor, não entre. – Diz a voz.
- Por quê? – Pergunta a menina.
- Porque você vai acabar como todos os outros. – A voz volta a dizer.
Noite dá outro passo em direção à silhueta.
- Vamos, é a última vez que lhe digo: Saia. – Diz a voz.
A garota vai até a janela tapada com o mesmo pano preto que a anterior e o puxa. A luz do dia – que já era o fim da tarde – ilumina o quarto sujo e empoeirado.
Noite encara o corpo.
- Oh céus. – Diz Tyler voltando a se esconder na bolsa.
- Agora está feliz? – Pergunta a voz.
O corpo vira-se para Noite. Era apenas um corpo empoeirado, vestindo roupas beges e sujas. Sua cabeça não era presa ao pescoço, que estava dilacerado e deixando uma vertebra da coluna à mostra. A cabeça estava em seu colo, encarando a menina. Os olhos da... pessoa encaram Noite.
- O que aconteceu com você? – Pergunta a menina.
- Longa história. – Diz a cabeça.
- Tenho tempo. – Noite responde.
- E medo, não tem?
- Claro. – Responde Noite. – Só que ele não vai me levar à nada agora.
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