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História Meu Melhor Amigo - Sensação Horrível


Escrita por: jaimencanto

Capítulo 5 - Sensação Horrível


               Eu ainda não tinha certeza se estava fazendo a coisa certa. Durante os dois dias que se passaram, não consegui pregar o olho à noite. Eu torcia para que algo acontecesse para me impedir de ir nessa viagem, como por exemplo, Otávio me negar essa semana de folga. Mas, não. Otávio não me negou, pelo contrário. Estava agradecido pelas horas extras que fiz, poupando metade do trabalho que todos os funcionários teriam durante o mês. Além de me dar a semana de folga, Otávio ainda me deu uma parte de adiantamento para que eu pudesse me “divertir”. Ele mal sabia que diversão seria a ultima coisa que eu teria naquela cidade.

               Márcia e Carolina me levaram até o aeroporto para se despedirem. É claro que eu sabia que na verdade elas me acompanharam para que eu não desistisse, e era o que eu realmente faria. Porém, mais uma vez não foi dessa vez que algo deu errado. Elas fizeram questão de ficar comigo até o momento da chamada do meu vôo, e eu não tive outra escolha além de me despedir.

- Ligue para a gente assim que chegar. – Comentou Carolina enquanto me abraçava.

- Tudo bem.

- Tem certeza que ele vai estar te esperando no aeroporto, não é? – Márcia perguntou.

               Ele poderia não estar. Seria mais uma desculpa para que eu voltasse.

- Sim, ele disse que sim.

- Ótimo. – Márcia sorriu e me puxou para um abraço. – Faça uma boa viagem.

- Obrigada.

               Suspirei criando coragem para me afastar, mas antes que o fizesse, puxei as duas para um abraço.

- Obrigada por tudo.

               Márcia e Carolina retribuíram o abraço, e então eu me afastei, acenando para elas enquanto caminhava em direção à plataforma. Elas retribuíram o aceno animadas, e eu me senti péssima por deixá-las daquela maneira. Mesmo que eu não tenha lhes dado esperanças de que realmente diria toda a verdade para Fernando, elas esperavam que tudo se resolvesse assim que eu chegasse à cidade. Mas, eu sabia que isso não aconteceria. Na verdade, eu não fazia idéia do que aconteceria.

               Eu nunca fui fã de avião, mas estava aliviada pela viagem não durar muito tempo. Ao menos nesse tempo, eu poderia colocar as coisas no lugar, e pensar no que eu realmente faria quando chegasse à cidade. Qual seria a minha reação ao rever Fernando? Qual seria a minha reação quando ele me apresentasse sua... Noiva? É difícil pensar que Fernando realmente tem uma noiva. Eu não consigo me acostumar com essa idéia, mas será porque é estranho pensar no meu melhor amigo prestes a se casar com alguém que eu mal conhecia, ou porque o fato dele se casar com alguém me incomoda? Eu poderia desistir. Poderia inventar um desmaio e dizer que não me senti bem dentro do avião. Mas, não seria justo com Fernando. Quando falei que aceitava ser sua madrinha, eu pude perceber sua felicidade e empolgação. Fernando estava realmente precisando de mim, e eu não teria coragem de deixá-lo na mão. Principalmente ele que sempre me ajudou em todos os momentos.

 

 

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               Letícia mal conseguiu sair do elevador. Se Fernando não estivesse segurando-a, ela já teria caído ao menos três vezes desde que entrou no seu prédio.

- Onde estão as chaves? – Fernando perguntou quando pararam de frente ao apartamento ela.

- Na minha bolsa. – Ela riu.

               Fernando abriu a bolsa dela e tirou as chaves, abrindo rapidamente a porta. No mesmo instante Letícia adentrou o apartamento e seguiu para o sofá, sentando-se pesadamente nele.

- Você precisa de um banho. – Ele comentou fechando a porta.

- Não... Eu preciso beber mais! – Exclamou com a voz embolada.

- Não precisa não. – Ele riu. – Você vai ter um coma alcoólico se beber mais um gole de álcool.

               Ela riu.

- Vamos... Eu te ajudo. – Fernando segurou em sua mão e Letícia tomou impulso para se levantar.

- Você deve me odiar, não é? – Ela perguntou enquanto caminhavam pelo corredor.

- Por que eu odiaria?

- Não é a primeira vez que eu passo da conta e você cuida de mim.

- Eu não ligo para isso.

- É por isso que você é o melhor amigo de todos.

               Fernando riu, parando de frente o banheiro.

- Você consegue tomar um banho, não é?

- Acho que sim. – Ela riu. – Se eu não conseguir tomar um banho, preciso ser internada.

- Tudo bem. Vou te esperar aqui fora então.

- Certo.

               Fernando lhe deu as costas e seguiu para o quarto dela. Letícia fechou a porta do banheiro e com dificuldade começou a se despir. Por mais que ela gostasse de festas e de bebidas, não era com freqüência que ela ficava daquela maneira. Apenas três vezes em sua vida Letícia tomou um porre à ponto de não conseguir ficar em pé direito, e em todas as três vezes Fernando estava presente para ajudá-la.

               Quando terminou de se despir, Letícia caminhou até o Box do banheiro e ligou o chuveiro. Ao sentir a água fria cair sobre seu corpo, ela pulou para trás, desequilibrando-se caindo no chão. O barulho do tombo e o grito que ela soltou quando caiu assustou Fernando, que imediatamente correu até o banheiro e abriu a porta, sem se importar se ela estava despida ou não. Mas Letícia não se despiu por completo, e ainda estava com sua roupa intima, achando graça da situação.

- Meu Deus, Lety! O que aconteceu? – Ele entrou no banheiro caminhando até ela.

- Eu caí.

- Isso eu sei. Quero saber como.

- Eu não sei.

               Fernando desligou o chuveiro e segurou o braço de Letícia, ajudando-a se levantar.

- Meu Deus! Você está me vendo de roupa intima! – Ela exclamou abraçando ao próprio corpo.

- Eu não estou reparando nisso, Lety. Vem, vamos para o quarto. Você não está em condições de tomar banho.

               Fernando ajudou Letícia a ir até o quarto, e quando entraram, ela se jogou sobre sua cama, cobrindo o seu corpo com o lençol.

- Eu estou péssima! – Choramingou.

- Não é pra menos, não é? Amanhã vai ser pior.

- Você deveria me dizer coisas boas.

               Fernando riu enquanto abria a gaveta da cômoda.

- Fernando, por que você é tão bom pra mim?

- Você já perguntou isso três vezes hoje, Lety.

- Desculpe. Mas é que você está sempre me ajudando quando eu mais preciso, e eu acho que não mereço.

- Não precisa começar com o drama... – Ele tirou uma camisola de dentro da gaveta e a entregou. – Tire essa roupa molhada. Acho que isso você consegue fazer, não é?

- Claro que sim!

- Ótimo. – Ele sorriu. – Eu vou pegar um travesseiro e uma coberta para mim. Vou dormir no sofá.

- Você vai dormir aqui? – Ela sorriu. – Ah, Fernando... Eu não quero te incomodar.

- Eu não vou te deixar sozinha no seu apartamento bêbada desse jeito. – Ele riu.

- Está vendo? É por isso que eu digo que não mereço tanto.

- Tudo bem... Se precisar de alguma coisa você me grita.

- Obrigada.

- Não me agradeça agora. Ainda temos uma longa madrugada pela frente. – Ele riu, referindo-se à ultima vez que Letícia ficou daquela maneira. Passaram a madrugada acordada com Letícia debruçada sobre a pia do banheiro. – Boa noite, Lety.

- Boa noite.

               Fernando pegou um dos travesseiros e saiu do quarto, deixando Letícia a sós.

 

 

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- Senhorita?

               Ergui minha cabeça para olhar para a aeromoça.

- Nós já fizemos o pouso. – Ela sorriu.

               Olhei através da janela e só então percebi que tinha adormecido.

- Desculpe. – Tirei o cinto e me levantei.

               O avião estava vazio, e eu fui a ultima à sair. Estava tão cansada que assim que o avião decolou, peguei no sono. Assim que entrei no aeroporto senti o meu coração disparar e minhas mãos suarem. Enfim chegou o momento de reencontrá-lo, e eu não fazia idéia de como seria. Seria estranho revê-lo depois de um ano? Ele me trataria diferente? Essas perguntas martelavam em minha cabeça enquanto eu olhava em volta procurando por ele. O lugar não estava cheio, mas era totalmente desconhecido para mim. E se ele não fosse me buscar? O que eu faria? Eu teria coragem de ir embora e deixá-lo, ou eu simplesmente ficaria no aeroporto até ele se disponibilizar a me buscar? Mas eu já deveria saber que Fernando jamais faria isso, e quando o avistei ao fundo acenando em minha direção, não pude deixar de abrir um largo sorriso.

               Foi como se tudo o que aconteceu desaparecesse. A raiva que eu sentia dele até poucas horas atrás não existia mais, e foi por isso que eu imediatamente corri em sua direção, envolvendo-o em um abraço apertado. Para o meu alívio, ele retribuiu o abraço, me tirando do chão enquanto o apertava. Foi como se nada tivesse mudado. Foi como se nada tivesse acontecido.

- Que saudades, Lety! – Ele exclamou enquanto me abraçava.

- Eu senti tanto a sua falta. – Falei.

               Fernando me colocou no chão e eu separei o abraço, olhando-o logo depois. Ele estava sorrindo, e parecia animado em me ver, o que me deixou aliviada. Talvez aquela viagem não fosse tão ruim assim.

- Está com fome?

- Morrendo.

               Ele riu.

- Vamos pegar sua mala e eu vou te levar para um restaurante que conheci.

- Japonês?

- Sim!

               Sorri satisfeita e ele me acompanhou na busca pela minha mala.

 

 

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               Chegamos ao restaurante e escolhemos uma mesa um pouco mais ao fundo. Fernando puxou a cadeira para que eu me sentasse, e logo depois sentou em minha frente. Eu queria dizer o quanto estava aliviada por ele ter ido me buscar ao aeroporto sozinho, mas temi que ele se ofendesse. Estávamos muito bem até então, e Fernando parecia o mesmo de sempre. Isso me deixou extremamente feliz.

- E então... Como foi a viagem? – Perguntou sorrindo.

- Foi boa. Na verdade, eu apaguei. Só acordei com a aeromoça me chamando.

               Ele riu.

- Parece algo que você faria mesmo.

- É que não durmo muito bem há alguns dias.

               Seu sorriso diminuiu e ele escorou-se à mesa.

- Obrigado por vir, Lety. De verdade.

- Não precisa me agradecer. Você já fez tanto por mim...

- Mas isso não se compara a nenhuma outra coisa que já fiz por você. Quero dizer... Eu... Realmente estou precisando de você.

- Mas por quê? O que é que está acontecendo?

               Ele suspirou, mas não me respondeu.

- Antes de tudo acho que te devo desculpas. Sei que já pedi, mas preciso pedir pessoalmente.

- Fernando, não...

- Eu não deveria ter me distanciado, e acredite... Foi horrível ficar todo esse tempo sem falar com você.

- Então por que parou de falar comigo? – Não resisti em perguntar. – Por que parou de responder meus emails e simplesmente desapareceu?

- É complicado...

- Ah... Sei. Complicado. – Brinquei com o guardanapo.

- É que eu acho que você não entenderia.

- Por que exatamente você me chamou para ser sua madrinha?

- Porque você ainda é minha melhor amiga, e eu preciso de você do meu lado.

- Você não parecia precisar de mim nesses últimos meses.

               Ele se calou, me olhando com pesar.

- Desculpe. – Pedi. – Quer saber? Vamos deixar isso pra lá. O que importa é que eu estou aqui e você vai... Se casar. – Eu não deveria ter feito uma pausa antes de dizer a palavra “casar”, mas foi mais forte do que eu.

               Fernando pareceu um pouco desconfortável, e eu tentei melhorar a situação.

- Me conte... Como você a conheceu mesmo?

               Não, não me interessava saber como ele a conheceu muito menos como foi que ele a pediu em casamento. Mas, como aceitei ser sua madrinha, era meu dever me esforçar e fingir interesse nesse relacionamento. E era meu dever como melhor amiga saber um pouco mais sobre sua noiva.

- Conheci no trabalho.

- E o que mais?

               Ele não parecia querer falar sobre o assunto, mas se não falássemos sobre isso, em algum momento falaríamos sobre nós dois, e eu não queria fazer isso naquele momento.

- Bom... Na verdade ela é a filha do Gonzáles.

- Ela é a filha do seu chefe? – Perguntei surpresa. – Fernando, você não se prostituiu para conseguir um cargo mais alto no escritório, não é?

               Ele riu.

- Não. Ela me ajudou quando eu comecei a trabalhar para ele, e fomos nos aproximando. – Ele suspirou, mexendo-se inquieto. – Nós podemos não falar disso? Eu queria aproveitar que você está aqui...

- Aproveitar como?

- Não quero falar sobre o casamento por enquanto.

               Não quer falar sobre o casamento? Então por que raios eu estou aqui?

- Você quem sabe...

- Quero que me conte como está a sua vida. – Dessa vez ele sorriu. – Preciso saber o que você fez durante esse tempo que não conversamos.

- Não fiz nada de mais. Apenas trabalhei...

               Não quis dizer para ele que passei todos aqueles meses sofrendo sua ausência, sem animo algum para sair de casa. Contei para ele sobre o meu trabalho, e acabei inventando algumas coisas para não parecer que minha vida foi um completo tédio durante um ano inteiro. Ele pareceu animado com a conversa, e quando dei por mim, parecia que nada havia mudado. Estávamos rindo, fazendo piadas e Fernando sugeriu que tomássemos alguns saquês, e eu não pude recusar. Realmente as coisas estavam ótimas, e por um breve momento pensei que tinha sido uma boa idéia aceitar aquela viagem.

               Depois de saques e um almoço animado, Fernando me levou para sua casa, insistindo que seria um desperdício que eu ficasse em um hotel. É claro que aceitei, mesmo pensando o que a sua noiva acharia disso. Mas sinceramente, isso pouco me importava. Eu só queria aproveitar todo aquele tempo perdido e ficar ao lado do meu melhor amigo.

- Você não me disse que sua casa era tão grande. – Comentei quando descemos do carro.

- Não é tão grande assim. – Ele riu tirando minha mala do porta-malas.

- Está brincando? Dá para morar duas famílias aí dentro. Cada uma com cinco filhos.

- Não exagere, Lety. – Ele gargalhou. – Vem, vamos entrar.

               Eu o segui enquanto ele carregava minha mala. A casa era realmente muito grande para apenas uma pessoa, mas de muito bom gosto. Quando entramos, saímos diretamente na sala, que era incrivelmente grande. Havia uma lareira (sabe-se lá porque), dois sofás extremamente chiques e um tapete branco que me chamou a atenção. A sala não parecia combinar com o gosto de Fernando, e pelo que me lembro, ele detestava decorações claras. A sala parecia um consultório.

- O que achou? – Fernando colocou minha mala no chão e me olhou.

- É... Bem... Branco. – Não soube ao certo o que responder.

- É. – Fernando riu.

- Desde quando você gosta de branco assim?

               Ele apenas olhou em volta, mas não respondeu.

- Pensei que encontraria uma sala com móveis de madeira, um carpete escuro e uma mesinha de centro.

- Costumava ser assim.

- Costumava?

               Mais uma vez ele não respondeu. Continuei observando a decoração e caminhei pela sala, me aproximando da estante que havia alguns porta retratos, mas todos estavam vazios.

- Que lindas fotos. – Brinquei e ele riu aproximando-se. – Qual é o intuito disso?

- Eu não tenho fotos suficientes para colocar. Acabei deixando todas na casa dos meus pais.

- Eu tenho algumas que podem combinar aqui.

- É mesmo?

- Sim! Se lembra daquela foto que sua mãe me deu?

- Ah não, Lety! – Ele exclamou e eu gargalhei. – Eu não acredito! Você disse que tinha queimado essa foto.

- Jamais! Nunca vou me desfazer dessa foto.

               Eu me referia à foto de Fernando com apenas cinco anos de idade, com a cueca na cabeça e totalmente nu. Quando Terezinha me mostrou essa foto, eu tive um ataque de riso que durou mais ou menos dez minutos, e ela achou interessante me dar a foto de presente já que eu havia gostado tanto. Eu ainda a guardava, e Fernando nunca me perdoava por isso.

- Ela ficaria linda aqui! – Peguei um dos porta-retratos rindo.

- Não! Me dá isso. – Ele riu tentando pegar o porta-retratos, mas eu o coloquei atrás do meu corpo.

               Fernando se aproximou e me abraçou, tentando pegar o porta retratos. Estavamos gargalhando e de repente ouvi alguém se aproximar. O barulho do sapato de salto ecoou por toda a casa que foi impossível não ouvirmos, mesmo que estivéssemos rindo. Fernando e eu viramos para a mesma direção, e imediatamente vi uma mulher parada no meio da sala. Fernando se afastou de mim e eu coloquei o porta retratos de volta na estante, limpando a garganta logo depois.

- Eu não vi que já tinham chegado. – A mulher falou sorrindo. – Então você é a famosa Lety!

- Lety... Essa é a Marianne. – Fernando disse abaixando a cabeça. – Marianne, essa é a Lety.

               Marianne. Não pude deixar de olhá-la cima a baixo e tive que admitir, ela é realmente bonita. O cabelo estava preso em um coque e ela usava um vestido formal até demais. Eu preferi imaginar que teria algum evento relacionado ao casamento do que pensar que ela ficava assim dentro da casa de Fernando. Enquanto eu a “estudava”, Marianne caminhou em minha direção e me abraçou, me surpreendendo. Dei leves batidas em suas costas, sem saber exatamente o que fazer e então ela se afastou, sorrindo.

- Eu estava ansiosa para te conhecer! – Ela disse animada. – Quando Fernando disse que você ficaria conosco eu fiquei tão animada.

               Conosco? O que ela quis dizer com isso?

- Ah! Isso me lembrou que tem um frango no forno para o jantar. Pode me dar licença por um instante?

               Eu não precisei responder. Marianne andou as pressas adentrando a casa e logo desapareceu, me deixando a sós com Fernando. A única reação que tive foi olhar para ele e cruzar os braços, esperando uma explicação.

- Quando ia me contar que ela estava morando com você? – Perguntei em voz baixa para que ela não pudesse me escutar.

- Quando você chegasse aqui. – Ele respondeu no mesmo tom.

- Fernando, eu não posso ficar na sua casa se ela mora com você!

- E por que não?

- Oras... Porque não! Ela pode não gostar!

- Ela concordou sem problemas.

- Fernando...

- Lety, isso é apenas um detalhe. Tenho certeza que você vai gostar dela. Ela estava empolgada com a sua chegada, você não precisa se preocupar com isso.

- E quem é que prepara o jantar às três da tarde?

- Ela é um pouco perfeccionista. Gosta de fazer tudo antecipadamente.

               Apenas suspirei e não tive mais argumentos. Depois de um almoço tão animado eu quase me esqueci que estava ali para o casamento de Fernando. Não esperava conhecer a tal Marianne tão cedo, e principalmente ter que dividir a mesma casa com ela por uma semana. Eu estava totalmente desconfortável com aquela situação, e não sabia quanto tempo agüentaria.

 

 

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               Depois que Fernando me apresentou toda a casa e o quarto onde eu ficaria, ele me deixou a sós para que eu pudesse tomar um banho e relaxar um pouco depois da viagem. Depois que tomei um banho, deitei à cama a fim de descansar um pouco e tomar coragem para descer e encarar o casalzinho. Eu ainda não sabia qual seria minha reação ao ver Fernando perto de outra mulher, mas a sensação não me agradava nem um pouco. Enquanto pensava nisso, o sono me pegou e sem perceber eu adormeci o restante da tarde.

               Quando acordei, percebi que já havia escurecido e me levantei às pressas. Quando saí do quarto, a casa estava silenciosa, e por um instante pensei que eu estava sozinha ali. Mas logo encontrei com Fernando no corredor, e ele estava caminhando em direção ao quarto onde eu estava.

- Ah! Você acordou! – Ele sorriu. – Eu estava indo te chamar para o jantar.

- Desculpe, não era minha intenção dormir tanto.

- Não se preocupe. – Ele sorriu. – Vem, Marianne está te esperando.

               Eu o segui pela casa e logo entramos na sala de jantar. A mesa estava delicadamente preparada para o jantar, e eu me senti em uma ceia de natal. Marianne apareceu logo depois carregando a bandeja com o frango, e sorriu ao me ver.

- Eu disse para o Fernando não te acordar, mas ele disse que você não ligaria...

- Na verdade ela já estava acordada. – Fernando puxou a cadeira para que eu me sentasse.

- Ah! Então que bom. – Ela colocou o frango sobre a mesa, e Fernando também puxou a cadeira para ela se sentar. – Eu preciso dizer que estava um pouco nervosa para a sua chegada.

- Por quê? – Perguntei ao me sentar.

- Porque Fernando fala tanto de você que eu queria que tudo estivesse perfeito para a sua chegada.

- Não precisava se incomodar. – Sorri sem jeito.

- Eu falei para ela que você prefere as coisas mais simples. – Fernando sentou-se ao lado dela. – Mas ela insistiu em fazer esse jantar.

- Precisava de uma comemoração especial, não é? – Ela riu. – Eu espero que goste.

               Eu estava ao máximo tentando me esforçar para parecer a vontade, mas a verdade é que eu não estava nem um pouco a vontade. Estar sozinha com os dois era incômodo para mim, e eu me sentia uma intrusa. Uma atitude estranha, já que não era a primeira vez que eu via Fernando acompanhado de outra mulher. Fazíamos muito isso na época da faculdade, e na maioria das vezes era eu quem induzia ele a ficar com alguém. Mas era diferente naquela situação, e todas as vezes que ela segurava sua mão ou ria para ele, eu desviava o olhar para não ver aquela cena.

               O jantar estava realmente delicioso, e pelo menos fome Fernando não passaria. Marianne passou o jantar inteiro falando sobre como estava empolgada para a minha chegada e como era importante a minha presença naquela semana. De certa forma estava até repetitivo demais ela dizer isso, e graças à Deus Fernando notou isso também, mudando de assunto. Enquanto conversávamos, notei que Marianne parecia certinha demais, até mais do que Fernando. Eles não pareciam combinar como um casal, principalmente porque Fernando parecia tratá-la com frieza, já ela fazia o contrário. Estava sempre chamando-o de “meu amor” e tentando agradá-lo de alguma maneira. Ele era carinhoso com ela algumas vezes, mas parecia envergonhado quando o fazia.

- Papai não aprovou no início, mas depois conseguimos convencê-lo. – Marianne contava sobre quando foi morar com Fernando. – Ele confia muito em Fernando, não é meu amor?

- É... – Fernando forçou um sorriso enquanto brincava com o garfo em seu prato.

- Você também é advogada? – Perguntei à ela.

- Sim! Mas papai não gosta que eu trabalhe. Eu vou apenas algumas vezes até o escritório, quando as coisas estão apertadas.

- Então você não trabalha?

- Não por falta de vontade. – Ela riu. – Fernando também prefere que eu não vá para o escritório todos os dias.

- Não é bem assim. – Fernando limpou a garganta, envergonhado. – Só acho que não tem necessidade você ficar indo todos os dias, principalmente porque sabe como seu pai é.

- Mas eu já me acostumei com isso. – Ela riu entrelaçando o seu braço ao dele. – Acabo aprendendo receitas novas quando fico em casa. E me divirto limpando tudo por aqui.

- Realmente, você faz um ótimo trabalho. – Sorri. – O jantar estava muito bom... E a casa está... Bem... Limpa.

               Fernando prendeu o riso.

- Obrigada! – Ela sorriu animada. – Fernando deixou que eu decorasse a sala também.

- Ah... Então você decorou. – Tentei não parecer tão debochada.

- Eu gosto de iluminação, sabe? Pela manhã quando o sol bate na janela fica tudo tão claro.

               Até demais.

- Entendo.

               Após o jantar e alguns minutos de conversa, nós nos preparamos para ir dormir. Ainda eram nove da noite e eu não estava acostumada a dormir tão cedo, mas pelo visto eles estavam. Depois que Fernando ajudou Marianne com a louça, nós nos despedimos e eu fui para o meu quarto. Não fazia idéia do que ficaria fazendo ali até que o sono me pegasse, e praguejei mentalmente por não ter colocado nenhum livro dentro da mala. Vesti o meu pijama e pensei em dar um jeito nas minhas roupas para ocupar o tempo. Quando coloquei a mala sobre a cama e a abri, ouvi batidas na porta. Imaginei que pudesse ser Marianne perguntando se eu estava confortável, já que ela parecia preocupada demais em me agradar. Mas, quando abri a porta, me deparei com Fernando.

- Você estava indo dormir? – Ele perguntou.

- Não. Estava indo dar um jeito na minha mala.

- Ah...

               Ele continuou parado me olhando.

- Você... Quer entrar?

               Não parecia a coisa certa à perguntar à ele, mas ele não parecia ter ido até o meu quarto para perguntar se eu já estava indo dormir. Fernando olhou para o corredor e então concordou, adentrando o meu quarto.

- Eu imaginei que você não conseguiria dormir à essa hora. – Ele comentou, sentando-se à cama.

- Desde quando você dorme às nove da noite? – Não resisti em perguntar.

- Eu não durmo. Ela dorme.

- Então você fica na cama olhando para o teto até o sono chegar?

- Algumas vezes eu vou assistir televisão, quando o sono dela está muito pesado.

- Você é bizarro. – Comentei voltando a atenção para minhas roupas.

- O que você achou dela?

- Ela é legal.

- Só isso?

- Quem vai casar com ela é você, você que tem que achar mais coisas sobre ela.

- Só quero saber se você se deu bem com ela. É difícil saber quando você está fingindo.

- Não estou fingindo. Ela é realmente uma pessoa legal, mas ainda não convivi com ela o suficiente para saber mais coisas.

               Ele ficou em silencio. Provavelmente estava pensando o pior de mim, já que o mínimo que eu deveria fazer era elogiar sua noiva e lhe dar todo o apoio.

- Ela é bem correta, não é? – Comentei dobrando uma blusa.

- Por quê?

- Reparei que ela coloca sempre tudo no lugar, tem horário para tudo...

- Ah... É.

- Isso é legal.

- Você acha?

- Eu queria ser organizada assim.

               Ele riu.

- Não consigo imaginar você sendo organizada.

- Não me ofenda, Fernando Mendiola. – Coloquei as mãos à cintura.

- Eu também acho legal, mas não sei... Algumas vezes ela exagera. Queria que ela quebrasse as regras alguma vez.

- Você desejando que alguém quebre as regras?

- Acredite, ela é tão correta quanto eu. Eu me sinto até oprimido. – Ele suspirou. – Sabe há quanto tempo eu não tomo um copo de cerveja? Muito tempo!

- Ela não te deixa tomar cerveja?

- Não é que ela não deixa... É que nos jantares com os amigos e familiares dela só tem vinhos e champanhe. Eu não agüento mais tomar vinho no jantar.

- E você não sai? Vai para um bar com um amigo ou algo do tipo?

- As únicas pessoas que tenho contato nessa cidade são os primos dela e os nossos colegas de trabalho. Mas não, não tenho vontade de sair com nenhum deles.

- Meu Deus, isso é muito triste.

- Agora você vê porque eu sinto tanto sua falta.

- Só por causa da bebida? É bom saber.

- É claro que não. – Ele riu e se levantou me olhando. – Porque você me anima.

               Eu não respondi. Deixei as roupas sobre a mala e nossos olhares se cruzaram. Por um momento me lembrei de quando estávamos no meu apartamento, e a ultima vez que nos olhamos assim, acabamos nos beijando. Quando a vontade de beijá-lo novamente começou a crescer em mim, desviei o olhar e voltei minha atenção para as roupas.

- É melhor você ir dormir antes que sua noiva ache você aqui. – Comentei sem olhá-lo.

- É... Eu já vou...

               Percebi que ele continuou me olhando, mas logo depois se afastou, seguindo para a porta.

- Se precisar de alguma coisa, você pode me chamar.

- Tudo bem.

 - Boa noite, Lety.

- Boa noite.

               Não tive coragem de olhá-lo. Demorou um tempo até eu ouvir a porta se fechar, e quando isso aconteceu, suspirei aliviada, deitando pesadamente à cama. Era apenas o primeiro dia, e eu já tive vontade de beijá-lo. O que aconteceria todas as vezes que ficássemos sozinhos? Eu não poderia me arriscar. Enquanto estava deitada à cama, a imagem de Fernando com Marianne veio em minha cabeça. Eles estavam logo no quarto ao lado, sabe-se lá fazendo o que. Aquele pensamento não me agradou. Não me agradou em nada. Coloquei o travesseiro sobre o rosto tentando não pensar naquilo, mas foi impossível. Fernando estava no quarto ao lado do meu, deitado com outra mulher. Com a sua mulher. Sua noiva e futura esposa.

               Minha cabeça começou a latejar com aquele pensamento, e eu não conseguiria dormir daquela maneira. Me sentei à cama e peguei o meu celular sobre a cômoda, buscando o numero de Márcia na minha lista. Apertei o botão para iniciar a chamada, e rezei para que ela pudesse me atender.

- Alô?

- Márcia!

- Oi! Nossa, até que enfim! Pedimos para você ligar assim que chegasse, onde estava?

- Eu me esqueci, desculpe. Eu estou na casa do Fernando.

- Na casa dele? – Notei um tom divertido em sua voz. – E o que estão fazendo?

- Eu estou no quarto, e ele está no dele. Dormindo. Com a noiva dele.

- O que? Ela está aí também?

- Ela está morando aqui! – Exclamei indignada. – E ele não me falou nada!

- Ai meu Deus! Como ele pôde fazer isso?

- Isso não é a pior parte. Eu tenho que ficar trancada nesse quarto porque não tenho coragem de ficar perambulando pela casa com ela aqui. Além do mais, não quero ter que me encontrar com Fernando. Ele acabou de sair do meu quarto e... Eu... Quase o beijei.

- O QUE?

- Mas eu não fiz nada! Só tive muita vontade de beijá-lo, e depois disso ele saiu do quarto. Ai, Márcia. Eu não vou agüentar! Não vou suportar.

- Calma, você precisa agüentar firme. Só precisa de um momento para vocês conversarem e você dizer à ele tudo o que sente.

- Eu não sei... Não sei se devo fazer isso, Márcia. Acho que isso pioraria a situação.

- Como está a relação de vocês?

- Por incrível que pareça... Está a mesma coisa de sempre. Ele ficou animado com a minha chegada, almoçamos juntos, nos divertimos. As coisas só ficaram um pouco estranhas quando cheguei na casa dele.

- Isso é normal. Mas é só por uma semana.

               Suspirei olhando para a parede que supostamente dividia o meu quarto do quarto de Fernando. A imagem dele deitado à cama abraçado com Marianne novamente dominou meus pensamentos.

- Não. Não posso ficar aqui. – Falei balançando a cabeça. – Amanhã vou para um hotel.

- Tem certeza? Ele não vai se chatear?

- Para ser sincera não estou preocupada com isso, Márcia. Fernando também precisa entender o meu lado. Não posso fingir que está tudo bem o tempo todo.

- Tem razão. Então... Você vai passar essa noite aí?

- Não posso sair sem avisar, e eles provavelmente já estão dormindo.

- Quem dorme às nove da noite?

- Exatamente!

- Bom... Então agüente firme apenas essa noite, e amanhã você vai para um hotel logo quando acordar.

- Sim, eu farei isso.

- Mas você precisa de uma ajuda.

- Ajuda? Que ajuda?

               Ela não respondeu.

- Márcia!

- Você precisa de um namorado!

- O que? Você enlouqueceu?

- Não. Não enlouqueci. Mas não se preocupe, eu vou dar um jeito.

- Márcia!

- Agora preciso desligar. Me ligue amanhã para dizer em qual hotel você vai ficar, tudo bem? Boa noite!

               Márcia não esperou que eu respondesse. Assim que ela finalizou a ligação, suspirei impaciente pensando no que ela aprontaria. De qualquer maneira, minha situação não poderia piorar. Eu teria que agüentar uma semana inteira ajudando Fernando a organizar um casamento que até então eu era “contra”, e aquela sensação horrível ao imaginar ele ao lado de outra tendia a piorar. Piorar muito mais.



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