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História Moon Lovers: The Second Chance - O Que Mais Deveria Lembrar?


Escrita por: VanVet e AndyeGW

Notas do Autor


Olá pessoas!
Antes de tudo, obrigada pelas sinalizações. Estamos recebendo vários acompanhamentos e isso é ótimo!!
Esse capítulo finalmente encerra essa festa maluca, Ha Jin volta a cena para a alegria de quem tava sentindo falta e um aguardado momento para o final.

Ótima leitura e fiquem à vontade para comentar.

:*

Capítulo 15 - O Que Mais Deveria Lembrar?


Ha Jin olhou ao redor e seus olhos seguiam com desesperada aflição as vozes que ecoavam naquele ambiente. De repente, se viu naquela realidade obscura de Goryeo onde todos os herdeiros e suas progenitoras se empenhavam de todas as maneiras para tomar para si o controle de toda uma população.

Almejou sumir dali. Queria voltar para sua casa e nunca mais colocar os pés naquele lugar ou ter contato com aquelas pessoas, até que viu a senhora Min-joo caminhar para a sala de reuniões sendo seguida por Ah Ra e Yun Mi logo atrás. Gun, Taeyang, Jung, Eujin e Sun, ao lado da mãe, foram em seguida. Finalmente Sook, de braço dado a mãe, passou e olhou para Shin que ainda estava de pé próximo ao chafariz. Em seguida ele também seguiu o caminho dos outros, falou algo ao pai e rumou para a sala no encalço do irmão mais velho.

Seria o momento oportuno para fugir, e era o que ela pretendia, até que foi alcançada, antes mesmo de iniciar a sua trajetória, pela governanta Nyeo.

— Precisarei de você, Ha Jin.

O tom de voz da mulher estava tenso, e ao olhar para ela, a mais nova percebeu que seus olhos estavam focados no senhor Hansol que, ao olhar de volta para a governanta, fez um discreto movimento de cabeça em resposta. Em seguida, a mulher continuou.

— Preciso que me ajude a tomar conta de tudo enquanto os senhores estão no escritório.

— Mas…

— Ha Jin — ela a olhou fixamente e parecia tensa — Eu preciso da sua ajuda, por favor — a mais nova apenas anuiu com a cabeça e viu a governanta sair em disparada para a cozinha.

Quando Ha Jin olhou novamente para a sala, o senhor Hansol já havia desaparecido pelo corredor e um alvoroço estava instalado naquela recepção. Meia dúzia de acionistas se aglomeravam, dispostos por trás da porta do escritório, os ouvidos colados na madeira e sorrindo animadamente. A jovem governanta suspirou pesadamente e se aproximou deles.

— Senhores, por favor, venham sentar — começou com seu mais largo - e falso - sorriso.

— Não agora, pequena — Doh Yoseob respondeu com um sorriso autêntico e conspiratório  — Nós fizemos uma aposta e vamos dobrar os valores — a boca de Ha Jin se abriu em ‘o’ quando ouviu isso. Ao fundo, vozes se sobressaltavam no cômodo.

— Eu acho que ele não vai aguentar a pressão e nomeará um dos filhos — ela escutou um dos acionistas falar animado depois de observar a porta e sorrir — Dobra a minha.

— Não… Hansol é um homem de palavra — outro senhor comentou — Yoseob, triplica a minha. Hansol vai continuar com a ideia da disputa.

— Opa!!! Isso é bom — Doh Yoseoh anotava tudo em uma folha de guardanapo bancando o “bicheiro” entusiasta —  E você?

— Mantenho minha aposta — outro homem falou receoso enquanto os olhos de Ha Jin ficavam, a cada instante, mais esbugalhados.

— Não acredito que estou vendo isso…

Ela comentou sem imaginar que seria ouvida. Os homens, até então empolgados, um deles com uma taça de cristal colada ao ouvido servindo como amplificador do som, olharam para ela com ares de curiosidade. Ela piscou inúmeras vezes antes de perceber o que estava acontecendo, pensando em uma forma de se livrar da situação.

— Eu… Eu quero dizer… — começou sem muita segurança — Estamos servindo um ótimo buffet com tudo do melhor e os senhores aqui, de pé, perdendo de desfrutar do que há de melhor no salão…

— Menina… O que há de melhor está aqui, bem atrás dessa porta — um dos homens sorriu após mais uma leva de gritos.

— Você quer participar da aposta? — Yoseoh perguntou animado para a governanta, que respondeu de sobressalto, assustada.

— Eu?

— Pode apostar qualquer valor… Não se intimide com essa meia dúzia de velhotes… Não vamos falar para seu patrão… — ele sorria com ansiedade, a caneta à mãos para adicionar a nova apostadora no papel.

— Eu não quero apostar em nada, senhor — ela parecia transtornada com a suposição.

— E o que quer aqui, afinal? — o acionista manteve a conversa, os dois observados pelos demais.

— Entendo o sentido dessa aposta… consigo sim, compreender — ela continuou — Mas isso não é o melhor a ser feito, afinal… é uma reunião particular e…

— Acho que a menina tem razão — um dos senhores mais velhos começou e ela curvou-se levemente em um agradecimento que se desfez em seguida, sendo este substituído por uma expressão incrédula, os olhos arregalados — Minhas pernas estão ficando cansadas… Vamos continuar a aposta sentados.

— É verdade… E, de toda forma, conhecendo as mulheres ali dentro, ouviremos tudo o que acontecer de onde estivermos nessa mansão… — foi um outro que apoiou sorrindo a dentes largos.

Os homens sorriram e comentavam sobre os valores ao se afastarem, deixando Ha Jin ainda mais perplexa enquanto os observava. Os comentários na sala principal geravam um barulho que incomodava e as discussões ouvidas do escritório apenas incitavam os comentários.

Se encaminhou com rapidez até a orquestra e pediu, gentilmente, que começassem a tocar algo mais animado e alto o suficiente para abafar o que acontecia no aposento privado.

— Moça, isso é meio complicado… Está muito barulhento, mas vamos fazer o melhor  — um dos rapazes respondeu de má vontade, provavelmente pensando em todo o tumulto.

Caminhou apressada para a cozinha, não sabia ao certo o que deveria fazer dali para frente. Lembrou das palavras de Yun Mi, ditas horas atrás, e pensou se alguma daquelas pessoas realmente se daria ao trabalho de comentar sobre a governanta que quebrara taças quando presenciavam aquele show apresentado pela família da casa..

Encontrou a governanta Nyeo de um jeito que nunca vira antes. Ela parecia frustrada enquanto falava com um grupo de funcionários. O tom de voz era ríspido e forte, oposto à serenidade eficiente e costumeira.

— Eu não quero saber de fofocas sobre esse jantar, estamos entendidos?

O silêncio foi a resposta para a pergunta. Da porta, a mais nova observava os funcionários, inclusive Ryung, de cabeça baixa, ouvindo o que a mulher dizia com severidade. Imaginou que algo de grave houvesse acontecido.

— Não vou admitir novamente esse tipo de comportamento. Vocês são minha responsabilidade e os tratarei tal qual se fizerem merecedores de serem tratados. Agora vão e continuem os seus trabalhos, e fiquem atentos se não quiserem que esse seja o último a realizarem nesta mansão.

Os funcionários se separaram e sumiram pouco a pouco através da porta e sequer se deram conta que Ha Jin estava alí, em pé, os observando. Ela viu a governanta apoiar as mãos sobre a mesa e abaixar a cabeça parecendo cansada. Se aproximou com cautela, temendo o que poderia ouvir.

— Governanta Nyeo — chamou em um tom baixo, preocupado, e a mais velha a olhou, esgotada — Posso ajudar em mais alguma coisa?

— Ha Jin — a mulher falou depois de soltar um grande suspiro — Obrigada por ter ficado.

— Aconteceu algum problema com os funcionários? Quer ajuda?

— Não… Acredito que já resolvi — ela continuou aparentemente abalada — Eu ouvi alguns deles fazendo comentários maldosos sobre os patrões e combinando de se revezarem atrás da porta do escritório… Você sabe…

— Sim… — a mais nova concordou enquanto lembrava da cena que presenciara com os acionistas — Mas é normal… faz parte do ser humano ter esse tipo de atitude.

— Eu sei… bem sei — Nyeo parecia um pouco distante agora — Como estão as coisas?

— Está tudo tranquilo… — mentiu e o silêncio seguinte foi quebrado pela mais jovem novamente, molhando os lábios antes de falar — Governanta… Não quero me intrometer, mas…

Nyeo a olhou com curiosidade e Ha Jin a encarou. O semblante era tão diferente do que costumava ver, que reforçou a impressão de que algo a mais estava acontecendo na cabeça daquela mulher. A mais nova hesitou, mas sem ter objeções da mais velha, decidiu continuar.

— Agora há pouco eu acabei ouvindo, sem querer, algo que me pareceu confuso… — Ha Jin parou esperando ser interrompida. Aproveitou que a governanta a analisava de forma absorta e prosseguiu — As senhoras Min-joo e Ah Ra falavam do senhor Shin à mesa e… a senhora pareceu bem… incomodada, então…

— Não gosto da forma como a senhora Min-joo trata o filho — falou simplesmente.

— Eu também não gostei das poucas coisas que ouvi… — Ha Jin continuou, pelas beiradas — Me pareceu que ela não gosta do filho…

— É o que todos pensam…

A governanta confirmou surpreendendo a mais nova que parou de falar para ouvi-la. Observou Nyeo erguer a cabeça e focar um ponto qualquer diante de si.

Parecia bem mais cansada do que Ha Jin lembrava ter visto, além de submersa em seus pensamentos de maneira estranha, preocupante. De repente, ela recomeçou a falar, puxando o ar com pesar antes de iniciar o monólogo.

—  E uma conclusão bem óbvia de se chegar, Ha Jin. O senhor Shin era muito pequeno quando sofreu um grave acidente aqui na mansão. Foi algo realmente lamentável, terrível e, naquele momento, o senhor Hansol pediu para que a senhora fosse embora. Pouco tempo depois eles já haviam se separado.

“A senhora Min-joo se recusou a levar o filho machucado com ela, a cuidar dele, e tomou apenas o senhor Gun para si. Na época eram apenas os três herdeiros mais velhos e a situação parecia complicada. Nunca em minha vida havia presenciado tanta maldade e ele era tão pequeno…

"Desde aquele dia ela trata o filho mais velho como se fosse o culpado por sua separação do senhor Hansol e eu, por ter presenciado tudo e me dedicado a cuidar do menino, acabei me afeiçoando… Muitas vezes não consigo aceitar que um garoto tão bom receba um tratamento tão grosseiro de alguém que deveria protegê-lo e amá-lo. Ele era apenas uma criança e…

A governanta Nyeo olhou para Ha Jin como se despertasse de um transe. Ha Jin, que agora entendia a tristeza da governanta, lembrou-se de So e de como fora abandonado pela mãe, se dando conta em seguida que não saberia mais nada sobre o passado triste daquele menino que levava em seus ombros uma história tão familiar.

— Vamos voltar ao serviço?

— Sim, governanta Nyeo.

***

A orquestra tocava algo mais agitado e o ambiente estava relativamente incômodo unindo música alta, muitas conversas, gargalhadas e gritos em um mesmo espaço. Ha Jin, juntamente com Nyeo, tentava fazer com que o local parecesse mais agradável enquanto, quase todos, aguardavam animados algum dos Wang despontar do corredor. Os acionistas, no momento, apostando qual dos interessados seria o primeiro a sair daquela sala de reuniões.

Na Na, que fora deixada sozinha por Gun tão logo o senhor pronunciou suas primeiras palavras, estava agora sentada à mesa de Lee Sun Hee, esposa de Sook. Em seu colo, Ha Na beliscava algumas porções sobre a mesa, quase vencida por completo pelo sono. As duas mulheres tinham uma relação próxima e compartilhavam alguns passeios juntas. Elas também dividiam uma amizade tranquila e haviam se afeiçoado desde que se conheceram, anos atrás.

— Eu jamais imaginei que o senhor Hansol teria uma ideia dessas…

— Nem eu, Na Na — Sun Hee respondeu à amiga — Sook havia comentado sobre uma possível sucessão, que o Sr. Wang se aposentaria em breve, mas jamais imaginamos que ele poderia pensar em algo desse tipo. Sabemos que essa atitude só trará ainda mais desavenças para a família…

— Eu sei… E por isso não entendo as ideias dele.

— É difícil entender o que se passa na cabeça do Sr. Wang.

— Isso é muito estranho… — Na Na parecia absorta em seus pensamentos enquanto dialogava.

— Provavelmente ele já pensou em tudo…

—  Provavelmente… — Na Na concordava aconchegando a menina em seus braços — Mas todos pensávamos que a sucessão seria de Gun…

— Todos? — Sun Hee perguntou interessada — Todos “quem”?

Na Na pareceu um pouco desconcertada com a pergunta repentina da amiga. Ouvira, na verdade, e muitas vezes, do próprio Gun a respeito da sucessão. Falara com tanta convicção que ela se dera conta apenas agora de que ele era o único a afirmar essa condição.

— Na Na, me desculpe — a outra pareceu ponderar as palavras — Sei que já estão juntos faz algum tempo e em breve Gun será seu noivo… oficialmente. Sei também que ele é meu cunhado, mas não posso aceitar a ideia de que ele seria a melhor pessoa para assumir esse cargo…

— Por que não? — perguntou confusa e, ao mesmo tempo, curiosa.

— Sook me contou algumas coisas que ele fez com Taeyang e eu não acredito que alguém capaz de trair o próprio irmão seja a pessoa mais indicada para o cargo máximo da empresa.

— O que está dizendo…?

— Acho bom procurar saber mais sobre algumas coisas, minha amiga — a mulher aconselhou gentilmente.

— Está tudo bem por aqui? — Ha Jin se aproximou da mesa da prima com uma bandeja e um sorriso tenso.

— Sim — Na Na respondeu distraída e a governanta notou a expressão da prima com estranhamento. Sun Hee, ao contrário, sorriu amplamente.

— Tudo ótimo, Go Ha Jin, obrigada!

— Ah… Oi governanta Go — a pequena, que parecia dormir, despertou.

— Quer algum canapé? — Ha Jin ofereceu com simpatia para a menina que a olhava.

— Não é daqueles ruins, é? — a pequena perguntou fazendo careta.

— Ha Na, tenha modos — a mãe lhe chamou à atenção sem realmente estar zangada.

— Acredito que não… — a governanta continuou oferecendo a bandeja — São Kalbi-Kui.

— Ah… — a menina ampliou as expressões aparentemente se recordando de algo — Esse eu quero. Meu tio Shin me deu alguns hoje e são deliciosos…

— Pois coma… Já passa das onze e alguém já deveria estar dormindo — Sun Hee comentou e a menina a olhou alarmada.

— Não posso esperar o vovô voltar? — a criança suplicou colocando os canapés no prato.

— Não… — a mãe era firme, embora falasse com docilidade.

— Nem dar boa noite ao papai?

— Amanhã você dá um grande beijo de bom dia nele.

— Mamãe… Eu preciso dar um beijo na vovó.

— Tenho certeza que ela não se importará em vê-la outro dia para isso...

— Mamãe... 

Ha Jin sentiu aquele conhecido incômodo ao ouvir o nome de Shin e pensou sobre ele enquanto ouvia, com em um transe, a pequena Ha Na tentar convencer a mãe sobre permanecer na festa ao enumerar vários motivos que eram prontamente rebatidos pela mais velha.

“Shin… Não mais So… O que mais do meu So se perdeu com o passar desses anos…?”

Sorriu novamente para a menina e a serviu um pouco mais, contanto, observou mais uma vez a prima e seu olhar distante, um pouco calada.

Se perguntando o que mais de errado poderia acontecer naquela noite, ouviu um estrépito; a porta da sala de reuniões se escancarou atraindo os olhares de todos e a senhora Min-joo, aparentemente transtornada e um pouco descabelada, saiu em disparada na direção da porta principal.

Os comentários começaram e logo cessaram, segundos depois, quando Gun, igualmente irritado, o rosto avermelhado, fez o mesmo caminho que a mãe. Na Na pareceu se preocupar e Ha Jin viu a senhora Sun Hee tocar o seu pulso, a impedindo quando tencionou retirar a menina de seu colo e levantar-se para seguir o outro.

Os comentários se tornaram ainda maiores quando Taeyang saiu da sala de reuniões em direção ao primeiro andar, a mãe desmaiada em seus braços, sendo velada pela filha que, anteriormente tão educada e interessada nos convidados, sequer se deu ao trabalho de olhar os demais.

Um pouco depois Eujin rumou transtornado, em passos largos, para a saída da mansão, Ji Eun Tak apareceu logo atrás, o semblante entristecido enquanto abraçava-se à cintura de Sun.

Logo após Jung apareceu. Parecia descrente do que havia acontecido e foi o único que ainda tentou esboçar um sorriso para os convidados enquanto atravessava a sala em direção à mesa do buffet. A senhora Li Chang Ru apareceu instantes depois, também abraçada à cintura do filho e, como ele, mantinha o olhar tristonho, se aderindo da mesa onde a governanta estava servindo.

— As coisas não foram fáceis… — Wang Sook falou para todas.

— E, certamente, continuarão difíceis — a senhora falou em sua sabedoria aparente.

— Levarei mamãe em casa. Já volto.

— Estou de motorista filho, não se preocupe.

—  Vou dispensá-lo, então… Preciso sair um pouco desse lugar.

—  Eu lhe entendo...

— Boa noite, vovó — a menina saiu do aconchego do colo de Na Na e abraçou a senhora.

— Boa noite, minha querida… Espero que você não seja infectada pelos vírus terríveis existentes nesse ambiente… Boa noite, garotas — falou dirigindo-se às outras enquanto a menina dava um beijo no pai. Saíram em seguida.

— Preciso ir ao médico? — Ha Na perguntou com cautela para a mãe assim que a avó se afastou com o pai. A mãe sorriu em resposta e explicou o que aquilo significava enquanto se preparavam para sair.

Alguns minutos se passaram, sendo esses permeados por comentários curiosos ao perceberem que nem Sr. Wang ou filho que havia reaparecido saíram do escritório. Todos permaneceram sentados, talvez impressionados demais com aquela situação ou simplesmente esperando o desfecho de tudo, até que o herdeiro que faltava saiu rapidamente, também em direção à porta principal.

Ha Jin teve o súbito impulso de ir procurá-lo. Sentia em seu âmago que aquela reunião não havia sido fácil para ele. Sabia que ele precisaria de apoio e, em seu coração, desejava oferecer-lhe seu abraço, como fizera tantas vezes no passado.

“No passado… Os tempos são outros” — pensou e conseguiu, por aquele instante, se conter.

***

Uma hora após Hansol se desculpar com todos e agradecer à presença de cada um, Ha Jin estava em seu aposento, preparado especialmente para ela, e reunia suas roupas e demais pertences que havia levado quando ainda pensava que descansaria ali.

A governanta Nyeo havia dito naquela manhã que ela poderia dormir naquele quarto ao fim do evento, e ela realmente considerou a ideia para evitar o cansaço do trajeto até sua casa, mas, no decorrer da noite, se deu conta de que aquele não era o melhor lugar para apoiar a cabeça no travesseiro e descansar.

Devolvia tudo para a sua bolsa com pressa, atenta para não colocar nada que não lhe pertencesse ali. As ideias divagavam enquanto executava sua coleta, o desejo de falar com ‘ele’ aumentava e contrastava com a ânsia por ir embora de uma vez. Estava cansada do trabalho e, ainda mais, cansada daquelas pessoas, do ambiente hostil que nem mesmo mil anos foram capazes de amenizar.

Voltou para a cozinha a fim de avisar para a governanta que não ficaria naquele lugar. Precisava de um tempo, respirar um ar mais puro e livre de tantas picuinhas e interesses monetários. Precisava estar longe para tentar digerir novamente toda lembrança do que vivera no passado e que via repetir-se no presente.

— Governanta Nyeo, estou indo.

A mais velha parecia ainda mais cansada. Seu semblante demonstrava o quão intenso havia sido aquele jantar. Nyeo havia trabalhado incansavelmente durante aquela semana e Ha Jin sentiu o desejo de auxiliá-la um pouco mais, porém não o faria.

— Ha Jin, ainda com essa ideia? Fique aqui, no seu aposento. Já é mais de uma hora da manhã e, provavelmente, não tem ônibus para a sua casa — a voz representava perfeitamente o aspecto abalado da senhora.

— Realmente, não há mais ônibus… — ela pensou naquele detalhe pela primeira vez — Mas eu não quero ficar aqui. Preciso descansar em minha casa, com minhas coisas. Olhar meu teto e pensar em tudo o que vivi essa noite…

— E como pretende ir para casa? A senhorita Na Na já foi faz um tempo…

— Não sei… — refletiu — Talvez… a pé até a avenida e vejo se encontro algum táxi. Sou bem acostumada a fazer longas viagens a pé.

— Menina, por favor, é perigoso. Não seja tão cabeça dura e fique aqui…

— Eu agradeço a preocupação, governanta, mas não quero ficar. Boa noite.

— Pedirei um táxi daqui, então… Espere um pouco.

— Não… realmente não precisa…

— Ha Jin, eu… — a mulher ia falar novamente, mas uma terceira figura apareceu na cozinha sorrindo gentilmente - embora o semblante fosse cansado - para as duas.

— Ainda tem alguma coisa pra comer aqui? Esse final da reunião me deu uma baita fome…  

As duas governantas o olharam, ambas acenando com a cabeça. Eujin se dirigiu até as bandejas dispostas sobre as bancadas e começou a beliscar o que ainda lhe parecia atrativo.

O rapaz já não usava o terno. A gravata estava frouxa e torta para o lado, os dois primeiros botões da camisa abertos e as mangas haviam sido dobradas até os cotovelos. Finalmente, ele observou a bolsa de Ha Jin, e que ela estava com roupas usuais.

— Aonde vai, Ha Jin? — perguntou com curiosidade enquanto mastigava.

— Pra casa… — respondeu sem muita convicção.

— A essa hora? E por que não dorme nos aposentos dos empregados. É bem legal lá… — a forma como falou fez com que ela se perguntasse como ele sabia que os aposentos eram legais.

— Preciso da minha casa, do meu cobertor… Não sei se dormiria bem aqui, essa noite…

— Entendo você perfeitamente — Eujin continuou — E essa foi apenas a primeira reunião que você viu… Embora tenha sido uma das mais movimentadas dos últimos tempos — ele disse tranquilamente, nem de longe era o Eujin transtornado que saíra cego de raiva daquele escritório — Minha família consegue ser bem animada quando se empenha…

— Boa noite para vocês, então — ela cortou o comentário e fez uma vênia breve.

— Ha Jin… — a governanta a chamou.

— Como pretende voltar pra casa a essa hora? — Eujin perguntou, se dando conta do horário, prestes a lhe oferecer a usual carona até o ponto de ônibus — Não tem mais coletivo a essa hora.

— Eu sei, mas…

— Vou pedir um táxi para ela, senhor. Não se preocupe — Nyeo falou rapidamente.

— Não precisa — ele respondeu para a governanta — Eu levo Ha Jin em casa. Acabei de voltar da casa de mamãe… Vou buscar o carro.

— Senhor Eujin, não…

— Não vou te deixar ir de táxi para casa a essa hora. Qual a sua outra opção? Ir a pé? — a mais nova o olhou exasperada — Me espere na saída da mansão. Vou no meu quarto e já desço na garagem pra pegar o carro. Me espere, por favor.

— Senhor Eujin, eu…

— É uma ordem.

Ele saiu deixando as duas governantas para trás. A mais velha olhou para Ha Jin, que retribuiu seu olhar. Ao menos agora Nyeo tinha visto que, na verdade, não era ela que se aproximava dos herdeiros e lhes pedia o que quer que fosse, mas eles mesmos se aproximavam, independente de ela dizer não.

***

Shin estava sentado em um dos bancos da área externa da mansão quando os faróis de um carro o despertou de seus pensamentos. Observou Eujin deixar o automóvel na garagem, passar muito próximo a ele no caminho de pedras e entrar na residência sem sequer notar o irmão.

“Sempre vivendo nas sombras… Acho que já faço parte delas... ”

Pegou uma pedrinha no chão e a jogou para cima, pegando-a novamente no ar. A perna dobrada sobre o joelho balançava o pé enquanto ele remoía as muitas coisas vivenciadas naquelas três horas.

Todos exibiam os comportamentos anteriores, as características apenas mais intensificadas no decorrer dos anos. Percebera que a ganância deles e a luta incessante por seus interesses se sobressaia aos laços familiares. Notara também que uma decisão muito importante fora jogada no seu colo e recuar não era uma opção, afinal abandoná-la seria, por si só, uma escolha. E tudo tinha um peso maior agora do que há cinco anos. Essa decisão, sim, mudaria por completo a sua vida.

Sentindo uma repentina brisa suave escalar pelo morro e afagar seu rosto, recordou das palavras que havia escutado durante aquela noite: as usuais humilhações já eram esperadas e ele se considerava imune à maioria delas, embora as proferidas pela persona materna ainda lhe perturbasse dolorosamente, mas o que mais lhe causou estranhamento foi testemunhar o apoio de algumas daquelas vozes.

Era fácil esquecer as gentilezas quando existia ofensa em alta demanda, logo, ele foi pego de surpresa ao ouvir coisas tão boas e positivas, especialmente da mãe de Eujin que, apesar dele guardar ótimas recordações, era conhecida pela timidez e imparcialidade excessiva.

Regredindo mais nas memórias, pensou no momento em que decidiu ir embora da mansão. O pai convocou uma reunião familiar para o anúncio - porque não se podia trocar a cor da camisa naquele lugar sem que todos pudessem opinar - e aquele fora o único instante em sua vida que lembrava ter recebido o apoio da mãe.

Ela o incentivou e sorriu em animação diante da sua decisão. Jamais esqueceu a mágoa que sentiu naquele dia e adubava essa lembrança dentro de si cuidadosamente, como uma planta venenosa, para que nunca parasse de produzir sua toxina e deixasse de intoxicar seu hospedeiro.

Dos irmãos, Sook o tentou convencer do contrário. Lembrava-se também de Eujin, quase um homem feito, com os olhos embargados lhe pedindo que ficasse, do semblante contrariado de Yun Mi e do silêncio dos demais. O silêncio que tinha propriedade de corroborar mais intensamente em tudo.

Essa noite havia sido diferente. Havia o apoio de mais alguns, mesmo sabendo que os únicos que verdadeiramente se importavam eram os mesmos de cinco anos atrás.

“Eu faço muito gosto em te ver se aproximando de nós.”

“Sook nem de longe é o único que apoia e fica feliz com o retorno dele… quero que fique entre nós por quanto tempo quiser… senti muitas saudades”

— Saudades… — comentou em meio a um sorriso discreto, o ar solto pelo nariz, olhando a pedra em sua mão.

“Ele me recebeu e me entregou uma florzinha qualquer apanhada na propriedade… queria encontrar um trevo, para minha sorte aqui…  uma criança gentil. O pai disse que aquele gesto só poderia ter vindo de Shin, o mais carinhoso e amável dos seus filhos nascidos… Eu enxergo a mesma doçura de vinte e três anos atrás…”

— Será que sou realmente aquele menino, senhora Eun Tak? — perguntou à pedra áspera e cinzenta — Não sei se muito dele ainda existe em mim.

Mas de todas, a que mais martelava em sua cabeça fora dita bem antes de toda aquela gritaria e confusão. Ela estava incomodando o rapaz desde que a ouvira.

“Apenas deixe claro para as pessoas, que nós dois sabemos quem são, que você não jogou a toalha. Não há porque desistir de algo apenas porque alguns se sentiriam mais confortáveis com a sua exclusão.”

Refletia sobre tudo o que acontecera olhando para as flores muito bem cuidadas à sua frente, pesando tudo à frase do irmão mais velho. Sook sempre teve o dom de fazê-lo pensar e repensar, de cogitar estar errado em suas decisões e imaginar novas possibilidades mesmo depois de ter se decidido.

Foi retirado de seus pensamentos quando percebeu a desastrada das taças caminhando para a lateral da construção de um jeito aéreo, como se sua cabeça flutuasse em qualquer lugar, menos ali onde seu corpo estava. Aparentemente, ela tinha o dom de interrompê-lo.

— Observando essa sua cara eu consigo entender como todas aquelas taças foram quebradas.

Shin aproveitou que ela recostou em um dos bancos e, curioso, decidiu se aproximar daquela que lhe roubou o protagonismo durante sua entrada no jantar. Antes de se levantar, arremessou a pedrinha da mão para os jardins que, sem querer, bateu direto contra uma lâmpada da decoração, quebrando-a.  

A garota abriu a boca com grande perplexidade - não era a primeira vez que a via fazendo essa expressão abobalhada - quando se deu conta de quem vinha até ela.

Wang Shin - seu So - estava ali, de pé, parado ao seu lado, as mãos postas para trás, em uma posição ereta e firme, tão característica dele, lhe dirigindo a palavra.

A única coisa na qual ela pensava agora era nos anos que haviam perdido, no amor que poderiam ter aproveitado e não conseguiram.

Um turbilhão de sentimentos se apoderou dela, que queria - e tinha agora a oportunidade -  dizer para ele que sentia muito, que se arrependia de tê-lo deixado. Que não se importava mais em ser sua concubina e que se tivesse de morrer, que fosse ao seu lado. Queria pedir perdão por tê-lo negado a filha, por não ter conseguido voltar e, respirando profundamente, olhou em seus olhos e começou seu discurso:

— Eu… Sinto muito.

A voz estava embargada de sentimentos. Os olhos se enchiam das lágrimas que ela se esforçou para não derramar desde que o reencontrara ali; a emoção não lhe deixava raciocinar e falar ao mesmo tempo. Precisava abraçá-lo, beijá-lo… a súplica se repetindo em sua mente.

“Senti muito a sua falta… muito...”

Ele a observou interessado, o cenho franzido. A garota, além de desastrada e, aparentemente louca, também era emocionalmente transtornada, pois estava prestes a chorar sem qualquer motivo aparente. Se perguntou o quê uma criatura daquelas estaria fazendo na Mansão da Lua. Ela em nada condizia com o perfil da casa.

— Eu sinto muito…

Ela repetiu e ele se moveu, ficando de frente para ela. O coração de Ha Jin parecia em ponto de parar definitivamente. Ela procurou em suas lembranças se havia tomado a sua medicação corretamente naquele dia e fitou, insegura, os olhos de Shin quando lembrou-se que sim.

Ele a olhava intensamente e, em seu olhar, existia o resquício de uma lembrança passada. Seu So continuava igual, todos os detalhes estavam ali, com exceção da cicatriz que o fez se esconder por tantos anos sob aquela terrível máscara. E ela sabia, sentia dentro de seu peito, que ele a estava reconhecendo.

— Seu nome é Go Ha Jin? — ele perguntou, os olhos fixos nos dela.

— Sim… senhor…  — ela respondeu sentindo que, a qualquer momento, perderia o controle sobre seu corpo e cairia do banco.

— Você não é a maluca que ia sendo atropelada por um caminhão um tempo atrás? — ele perguntou novamente, especulativo.

— Eu… Eu…

— É sim… — confirmou antes que ela continuasse os balbucios. A observava com os olhos semicerrados — Você devia estar com essa mesma cara aparvalhada quando quase morreu. Presta mais atenção no que faz, garota. Nem sempre vai ter alguém disposto a te salvar.

— Era… você? Na moto?

Shin olhou para ela com ares de irritação. Aquela garota boboca era a mesma que ele havia salvado da frente do caminhão. Agora, mais do que nunca, tinha a certeza de que ela não deveria estar trabalhando ali.

— Cuide melhor da sua vida.

Dizendo isso, ele começou a se afastar, caminhando em direção à garagem para buscar sua moto. Ha Jin pensou que não havia se enganado quanto aos olhos de So. Era realmente ele, não estava ficando louca como pensou.

— É só isso que lembra de mim?

Deixou que a frase saísse, rápida e ansiosa, sem controle sobre o que dizia naquele momento. Ele parou os passos, hesitando um pouco antes de virar novamente para sua interlocutora.

— O que mais deveria lembrar?

A pergunta foi embalada pelo barulho do motor do carro de Eujin que se aproximava. O herdeiro colocou as mãos nos bolsos, lhe deu as costas e voltou a andar, observando mais adiante - e com estranhamento - a governanta, aparentemente abalada, entrar no carro do irmão mais novo. 



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