História Nossa Surpresa - Bêbados Sabem O Que Dizem

- O que te preocupa tanto sobre sua sexualidade, Peter? Já conversamos várias vezes que, qualquer que seja a sua escolha, não há motivo para se envergonhar.

A voz calma de May sempre acalmava o rapaz, mesmo pelo telefone. O mesmo estava ainda trancado em seu quarto temporário, ainda com vergonha de sair e encontrar com alguém, principalmente alguém que presenciou o encontro desastroso. Ligou para sua tia, e, automaticamente, estava agarrado ao ursinho de longa data. Outra razão para não querer ser visto por qualquer outra pessoa. Uma humilhação em um dia já estava de bom tamanho.

- Tia May... É só que... - o jovem passava a mão na cabeça várias vezes. Sua tia não conseguiria entender, principalmente porque não sabia que isso havia saído da boca de um Deus. - É incomum, só isso. Podem dizer o que quiser, mas continuo sendo um anormal.

- Peter Benjamim Parker! Quantas vezes terei que mandar você tirar isso da cabeça?! Você continua sendo um adolescente, um ser humano como qualquer outro, e nada - nem mesmo seus poderes - te fazem ser anormal. Se as pessoas não conseguem perceber isso, não deixe que isso te incomode. Você sempre teve e sempre terá duas famílias que te amam desde o primeiro momento, sem se importar com seu físico, querido.

As palavras da senhora aqueceram o coração do sobrinho como um dos melhores abraços que ele já havia sentido. Mas sabia que era apenas momentânea, e que ainda estaria envergonhado com qualquer um, parecendo que dedos apontavam para ele ou pessoas sussurrando, rindo de si. Não que ele quisesse que as palavras da tia entrassem por um ouvido e saíssem pelo outro, muito pelo contrário,  seu desejo era se sentir especial dessa forma em todos os momentos. Mas é difícil deixar de lado depois de se acostumar com a vergonha, que só havia crescido ano após ano. A pior parte é como a forma de Peter suas chances de relacionamentos havia sido afetada. Em sua mente, dominava o medo. Todos sabem como é o mundo atual, sem uma relação sexual, um relacionamento parece não se construir. Assim que o rapaz se sente: que nunca terá alguém que entenderia aquilo que todos zombaram. Ele já se preparava, já se acostumara a estar sozinho.

- Eu sei, tia May...

- Peter, eu sei que você diz que sabe, mas só te peço, por favor, não diga, FAÇA. Se não fizer por si mesmo, faça por mim e pelos seus pais.

- Qual deles? - o jovem duvidou em relação à quem sua tia pensou quando disse "pais". Ela sempre se referia aos verdadeiros assim, mas eles estão mortos. Mas também, não entrava na cabeça da senhora que Tony e Steve eram "pais" de seu sobrinho, pois nunca, querendo ou não, estiveram presentes.

- Qual deles vêm à sua mente?

Peter permaneceu em silêncio. Sabia que era outra "pegadinha" da tia, que ela usaria no futuro para dar uma lição de moral sobre alguma dúvida que ele sabe que terá.

O mesmo nem teve tempo para respondê-la, pois seu telefone tocava, mostrando uma chamada nova. Foi explicar à tia antes de atender.

- Me desculpe, tia May, mas tem outra ligação na linha...

- Tudo bem, querido. Conversaremos depois. - mesmo por telefone, era perceptível que May estava sorrindo do outro lado - Pense bem na nossa conversa, está bem? Até mais, meu amor.

Ambos desligaram. Peter nem reparou no número que chamava, só queria acabar com seu toque irritante.

- Alô?

- Peteyyy... - falou a voz embargada na linha

- Wade?! 

- Poorr quee a surrrpresaaa, babyy boooyy...?

O mais novo levou uma das mãos à testa, tentando manter a calma com o loiro. Quando Wade falava daquele jeito, só podia significar uma coisa.

- Wade! Não me diga que você está bêbado, de novo!

- Tá booommm, eu não digo, masssss ainda vai ser a verdadeee. Você querendo ouuu não, meu caro peteeyy... - o mais tentava falar, entre soluços e risadas absurdamente altas

- Quantas vezes eu vou ter que dizer para você não falar comigo quando beber?!

- Não foi minha culpa, peteeeyyyy - e a voz começou a ficar molenga - Euu queria aaaapenaaass um boquetinhooo, e depois surgiram taaaanntosss outros coposs...

O outro revirou os olhos. A história era sempre a mesma. Começa com Wade e seu copinho, e termina com Peter, um bêbado e suas incontáveis bebidas.

- Por que você me ligou, Wade?

- Eu preeeecisooo de vooooccêêêêê, peeeteyy...

- Tava demorando... - sussurrou enquanto revirava os olhos - Onde você está?

- Você saaabbeeee...

Ligação encerrada. Peter seguia em direção à janela de seu quarto enquanto resmungava sobre a irresponsabilidade de Wade consigo mesmo. Já estava se preparando para lançar uma teia no prédio da frente quando recordou da porta que havia deixado trancada.

- Jarvis, se alguém bater na porta, diga que estou dormindo, ok?

- Sim, sr. Parker.

Assim ele se lançou para o edifício à frente, aterrissando no telhado do mesmo. Desceu pela escada de emergência na parede de trás, seguindo pelo mesmo caminho discreto que sempre usou para chegar ao seu ponto de encontro com o loiro mercenário. Mas apenas ele estava lá, não avistando Wade.

- Wade?

Seus sentidos de aranha começaram a alarmar igual à sirenes, significando que algo se aproximava cada vez mais. O aranha girava sua cabeça lentamente, antes de decidir virar o corpo para trás. Em questão de milésimos, foi agarrado por dois fortes braços que ele conhecia muito bem.

- Petey! Você veio! - a voz do mais velho não estava mais tão molenga, mas era notável que estava longe de estar sóbrio

- Wa-wade... Eu preciso re-respirar... - o moreno já estava vermelho beirando o roxo pela falta de ar

- Oh, desculpa o entusiasmo. - o soltou.

Peter mal havia recuperado o fôlego e pegou seu amigo pelo braço, com a intenção de voltar para a torre antes que sentissem sua falta.

- Vamos! Quanto mais rápido formos, mais rápido acabamos com isso.

- Wow, wow, wow, wow, wow! - Wade parou, puxando Peter pelo braço até seus corpos ficassem colados - Espera aí, baby boy. Eu disse que precisava de você.

- Para te levar pra casa, não? - o mais novo estava bastante confuso com o jeito que o bêbado agiu.

Ambos ficaram se olhando por alguns segundos, antes de Wade dar uma gargalhada, como se tivesse ouvido a melhor piada do século, deixando Peter mais confuso.

- Petey, petey, petey... Tão inocente... Eu tenho pernas. Se fosse só para voltar para aquele buraco, eu ia usá-las, não é?

- Chega, Wade! Fala logo o que você quer comigo!

- Com prazer...

Nem um segundo depois, os lábios de Wade se selaram com os de Peter, explorando cada centímetro de sua boca. O mais novo tentava empurrar o mais velho, querendo se soltar, o que parecia improvável graças à força e a falta de vontade de Wade. Enquanto o mesmo não se importava, só continuava a apreciar a dança que sua fazia na boca de Peter. Antes de sentir uma dor enorme nas suas partes baixas.

- Porra, Petey! - gritou enquanto gemia de dor - Eu queria que você conhecesse minhas duas amiguinhas, mas não com o seu pé?

O moreno nem dava ouvidos. Sua cabeça estava muito confusa para se concentrar em qualquer coisa. O que havia sido esse beijo, afinal? O que ele devia fazer? O que Wade quis com isso?

- Mas que merda foi essa, Wade?!

- Eu disse que precisava de você, só não disse em que sentido... 

A respiração de Peter ficava mais ofegante. Ele estava incrédulo com as palavras que saíam da boca de Wade. Seria possível que o loiro realmente quisesse algo com ele ou...

- Você não está falando coisa com coisa, Wade. Você está bêbado!

O outro apenas balançava a cabeça, rindo, fitando o chão.

- Nunca ouviu falar que o que dizemos quando estamos bêbados são coisas que nunca dizemos quando estamos sóbrios, baby boy?

Peter apenas permaneceu em silêncio, tentando processar a ideia maluca que havia brotado em sua mente. Podia Wade gostar, realmente, dele, sem o efeito do álcool agindo? O que ele diria? Os dois eram apenas amigos até aquele momento e Peter nunca imaginou que Wade quisesse mais do que isso. Uma resposta indesejada, não só quebraria um coração de um, mas também a longa e duradoura amizade de ambos. E isso era uma das coisas mais preciosas da vida dele. Bem, ninguém disse que era preciso de uma resposta imediata.

- Bem, já conseguiu o que queria. Agora, se me der licença... - falou o jovem em direção às escadas de emergência

- Não acredita em mim... não é?

Nenhuma resposta.

- Eu falei sério, Petey, eu juro. Bebi demais mas sei o que falo. O que eu preciso fazer pra você acreditar em mim?

- Wade... Eu só... Só quero ir pra casa agora... Depois conversamos.

O moreno estava na metade da escada, não esperou uma resposta do loiro. Até que o mesmo gritou.

- Eu vou te provar, Petey! Eu preciso de você!

Peter não respondeu, seguiu seu caminho até a Torre Stark, pensando na cena que acabará de acontecer.

Ele sabia dos diversos casos que Wade teve com mulheres, mas nunca imaginaria que ele pudesse trocar qualquer mulher por um adolescente qualquer. E qual era seu sentimento sobre seu amigo? Foi então que Peter percebeu: ele nunca havia pensado sobre sua sexualidade, já que nunca imaginou que alguém pudesse ter algum interesse nele. 

Não, Peter não podia ser gay. Wade não estava falando sério, era um delírio da bebida. Depois de um tempo, ambos esqueceriam aquela noite e tudo voltaria a ser como antes.

Era nisso que Peter queria acreditar.