Pov. Reyna Dixon
No dia seguinte, todos estavam quase prontos para saírem. Conversei com qualquer um que havia aceitado o plano, tentando abrir os olhos de cada um sobre como Negan não devia ser subestimado, mas quando perguntavam-me o porquê era um caso mais sério. O que passei com Negan era uma coisa apenas minha. Tinha vergonha que outros soubessem, até mesmo Daryl, apesar de querer compartilhar meus sentimentos com meu irmão.
Rick estava cego de confiança, lançando palavras de apoio e coragem para os quatro cantos da comunidade, dizendo que podiam passar por mais essa, e viveríamos felizes para sempre, sem incômodos a não ser os Walkers. Tinha vontade de socá-lo, até fazê-lo perceber o quão estupidamente estava agindo, e o quão suicida aquele plano seria.
Jayden queria ajudar, e queria participar do plano, assim como Cassie e Carl, mas quase proibi os três de sequer se aproximarem das organizações. Rick concordou comigo nesse ponto. Ele queria o filho seguro, mas mesmo assim não me escutou quando, mais uma vez, pedi para que repensasse.
Tentei convencer Daryl a não ir, mas meu irmão parecia tomado pela raiva do homem que achou na estrada, e arrependia-se de não tê-lo matado quando pôde, então colocou na cabeça que se matasse os Salvadores naquele momento, seria melhor depois, mas o que todos não entendiam, era que o pior realmente era começar uma maldita guerra.
— Daryl, não vê que isso é errado? — perguntei mais uma vez, observando meu irmão carregar um rifle e algumas pistolas.
— Vamos atacá-los enquanto dormem, nem vão ver o que os atingiu. — disse ele, sem desviar o olhar para mim. — Andy vai nos guiar até o posto avançado, vamos apagar os guardas, salvaremos o tal Craig e mataremos Negan e os outros. — Franzi o cenho.
— Posto avançado? — perguntei, Daryl assentiu, indiferente. Arregalei os olhos por um instante. — Filho da puta. — grunhi, chamando a atenção de Daryl. — Onde está Rick?
— Provavelmente perto dos portões. — Ele respondeu. — Reyna, não vai adiantar falar novamente.
— Você não entende? — Encarei seus olhos. — Negan não estará lá. — disse simplesmente, antes de caminhar até o trailer, onde Rick conversava com Jesus e Andy. — Rick. — chamei uma vez. O líder encarou-me.
— Reyna...
— Por favor, me escuta. — pedi ao me aproximar. Rick suspirou, mas deixou que eu falasse. — Esse posto avançado não é o único lugar. — disse, quase afobada demais. — Negan não estará lá. — Rick pareceu pensar por um instante, fazendo-me pensar que estava realmente cogitando a ideia de desistir.
— Mas os homens dele estarão, podemos cuidar dos outros depois. — disse ele, convicto. Arfei, derrotada. Rick segurou delicadamente meu rosto. — Vamos conseguir.
— Sei que vão, mas tenho medo do que virá depois. — respondi enquanto colava minha testa na dele e fechava os olhos.
— Negan não é imortal, Rey. — disse ele, acariciando levemente minha bochecha.
Não respondi, apenas o puxei para um abraço. Fechei os olhos enquanto sentia a leve carícia em meus cabelos. Estava apavorada. Não queria deixá-los ir, mas não conseguia impedí-los, e me sentia impotente por isso. Quando a guerra começasse, e ela realmente iria, irei sentir-me completamente responsável por não ter protegido melhor minha família.
— Por favor, não faça isso. — Tentei mais uma vez ao sussurrar as palavras no ouvido de Rick.
— Precisamos. — Ele respondeu, depositando um leve beijo em meu pescoço.
Afastei-me, sentindo que estava falhando em protegê-lo, proteger Daryl e qualquer outro que eu amasse. Até mesmo Padre Gabriel estava indo, e também sentí-me desconfortável com a ideia de perdê-lo. Olhei mais uma vez nos olhos de Big Grimes, decepcionada comigo mesma, antes de dar as costas e voltar para casa.
(...)
As horas passavam, mas meu nervosismo e pavor não estavam nem perto de ter um fim. De acordo com o plano suicida de Rick, eles atacaríam à meia noite, enquanto todos dormiam. No momento estava na cozinha com Jayden. O garoto preparava algo para Cassie, Carl, Julian e Judith comerem antes dos mais novos dormirem. Cassie estava no quarto de Carl, como vinha acontecendo frequentemente, enquanto esperavam o jantar.
— Rey? — O garoto chamou, e só então percebi que não prestei atenção em nada que ele havia dito. — Perguntei se vai querer sua macarronada com queijo. — Ele repetiu, encarando-me um pouco preocupado.
— Não estou com fome, Jay. — respondi dando de ombros. Ele desligou o fogão e virou-se para mim na bancada.
— Eu sei que está preocupada. — disse ele. — Droga, eu também estou. — Ele riu levemente. — Mas tem que acreditar que eles vão conseguir. Vão voltar vivos e seguros.
— Sei que vão, mas não é isso que me preocupa. — respondi sem deixá-lo terminar. — Negan me preocupa. — Jayden me encarou por alguns segundos.
— Está falando dês de quando voltaram de Hilltop para não mexermos com Negan, porque o conhecia bem o bastante. — Ele começou, apoiando-se na bancada de mármore. — Mas não conta a ninguém o que aconteceu. Como conheceu Negan? O que ele fez com você? Por que esse medo todo de um homem, sendo que sobreviveu duas vezes às mordidas dos mortos? O que ele tem de tão grandioso?
Ele despejou as perguntas. Engoli em seco, lembrando-me mais uma vez dos meus tempos com Negan e seus filhos. Encarei novamente os olhos de Jayden antes de desviar o olhar até os dedos das minhas mãos, que não paravam de se mexer com tamanho nervosismo.
— Não quero falar sobre isso. — Era idiota, mas sentia vergonha da história com Negan, assim como sentia vergonha da história com meu pai.
— É exatamente por isso que não fez diferença alguma quando pediu para não seguirem com o plano. — Ele continuou. Não voltei a encará-lo. — O povo de Alexandria nunca esteve tão confiante e corajoso de si mesmo depois da invasão dos Walkers. Acham que são invencíveis agora que temos Rick, você, Daryl e o resto. — Ele fez uma pausa. — Como quer que não se sintam assim sem o argumento necessário? — perguntou, encarando-me sugestivamente.
— É complicado, Jay. — respondi após longos segundos em silêncio, com o olhar do garoto queimando cada músculo em meu corpo.
— Sei que não se sente bem com esse assunto, e que acha que vão julgá-la por isso. — Ele continuou mais uma vez. Ainda não o encarei. — Mas, Rey, eu não dou a mínima para o que todos dizem. Quero seu bem estar. — Naquele momento ergui meu olhar, até alcançar o seu. — Sei que não sou Daryl, ou Merle, mas sou sua família, assim como você é a minha. — Ele sorriu fracamente. — Amo você como se fosse minha irmã mais velha, e algumas vezes como se fosse minha mãe. — afirmou, esticando seu braço até sua mão alcançar a minha. Ele a apertou firmemente. Suspirei.
— O que eu fiz para merecer você, garoto? — perguntei para ninguém em especial, enquanto retribuía o aperto em sua mão. Ele sorriu.
— E então, vai me contar? — Ele perguntou. Engoli em seco mais uma vez antes de assentir fracamente e começar a falar.
(...)
Dizer a Jayden toda minha trajetória com Negan foi realmente relaxante. Senti um peso imenso se esvair de minhas costas ao compartilhar o tão pavoroso assunto com o garoto. Apesar de Jay ter se assustado um pouco com tudo o que Negan fez, não olhou-me com pena em momento algum, e o agradeci internamente por isso. Mesmo assim pedi para que não contasse a Cassie, ou a Carl, porque queria conversar com meu irmão antes.
Todos já estavam em seus lugares na mesa de jantar. Jules brincava com seu copo de plástico enquanto Judy distraía-se apenas observando o pequeno. Aqueles dois se desenvolveram tão rapidamente naquele mundo, e pareciam crescer e aprender a cada dia, cada hora e a cada segundo que passava. Provavelmente já falariam pelos cotovelos depois de uns dois meses. — Mais do que já estavam falando.
— Carl, depois de comer troque o curativo do olho. — ditei enquanto levava uma garfada de macarronada a boca, com o jeito bruto e costumeiro de um Dixon.
— Okay, mãe. — Ele respondeu sarcasticamente, revirando o olho. Cassie riu, enquanto Jayden apenas sorriu levemente.
Julian e Judith tinham a falha tentativa de comer sozinhos, mas toda vez que levavam o pequeno garfo com a macarronada para suas bocas, o alimento sempre voltava ao prato. Terminei de comer rapidamente, e logo os ajudei a terminarem o jantar. No fim, os dois pareciam cansados pelo dia longo brincando, como se nada demais estivesse acontecendo.
Levei Julian nos braços até o quarto, enquanto Carl levava Judith. Cassie ficara na cozinha ajudando o irmão a arrumar as bagunças do jantar. Os pequenos não deram tanto trabalho para dormirem, então logo eu e Carl já saíamos do quarto, após depositar um leve beijo em cada um.
— Aonde pensa que vai, Little Grimes? — perguntei ao perceber que Carl apressara o passo até seu quarto. Ele parou e bufou. — Vem, vou trocar seu curativo.
— Eu faço isso sozinho... — Ele tentou contradizer, mas o interrompi.
— Carl. — disse seu nome em um aviso. O garoto revirou o olho e seguiu-me até o banheiro.
Peguei a pequena caixa com primeiros socorros em um armário em baixo da pia. Carl permaneceu de pé, apenas observando. Ele sentia vergonha do machucado no olho, mas parecia ficar um pouco mais confortável quando eu o ajudava a trocar o curativo.
Virei-me em sua direção, e desenfaixei sua cabeça. Como todas as vezes, Carl olhou para os próprios pés, constrangido. Não disse nada, apenas limpei ao redor do buraco no lugar de seu olho. Ver aquilo mexia levemente comigo, lembrando-me do sufoco que eu e principalmente Rick passamos ao vê-lo cair no chão após Ron atirar.
— Você contou a Jayden sobre Negan? — Ele perguntou, enquanto pegava uma nova faixa da caixa de primeiros socorros.
— Você ouviu, não foi? — perguntei de volta, suspirando em seguida.
— Cassie achou melhor nós não ouvirmos. — Ele respondeu, ainda com o olhar direcionado para o chão. — Não ligo para o que Negan possa ter feito, nem eu, nem meu pai vamos deixar que faça de novo. — concluiu, com uma convicção que era sempre presente em seu pai. Forcei um sorriso.
— Você é igual seu pai. — comentei, ainda com um leve sorriso no rosto. Terminei de enfaixar sua cabeça, logo colando esparadrapos para que o curativo não caísse.
— Eu estou falando sério, Rey. — disse ele, mais convicto ainda.
— Eu sei que sim.
(...)
Parecia uma eternidade quando vi os primeiros raios solares do dia invadirem Alexandria da torre de vigia dos muros. Não consegui pregar os olhos naquela noite. O quarto sem Rick não era o mesmo e a casa sem Daryl parecia ficar mais vazia, além de minha preocupação e medo terem aumentado. Não recebi notícia alguma pelo rádio, e estava começando a me estressar.
Passei a noite toda na torre de vigia, agarrada ao arco, e atenta a qualquer movimento do lado de fora dos portões. Meus pensamentos estavam completamente misturados, revezando entre minha família correndo perigo, Negan e seus filhos e meu passado.
O único momento que senti-me feliz com uma lembrança ao longo da noite, foi quando a imagem de Michael e Lincoln veio à minha cabeça. Os dois irmãos eram nossos melhores e únicos amigos. Éramos praticamente colados, apesar de Will sempre ter um chilique toda vez que nos via com eles. Nunca entendi o ódio de meu pai nos dois irmãos. Na verdade nunca entendi seu ódio em mim e meus irmãos.
Mas então voltei a lembrar de Negan, mas não dos tempos ruins, e sim dos tempos em que admirava o homem protetor e valente que conheci. O jeito que ele defendia os filhos, e até mesmo eu desse mundo de merda, encantavam-me, até chegar a um ponto em que pensei que realmente gostava dele. Nos aproximamos cada vez mais, e quando digo isso, quero dizer aproximar de verdade. Mas então tudo isso foi para os ares.
Negan até poderia ter boas intenções no começo. Achar comida para todos, e deixar nosso grupo crescer cada vez mais. A cada dia que passava, liderava cada vez melhor as pessoas, até acharmos a maldita fábrica, onde tudo começou a mudar. Negan recebia cada vez mais poder de nosso grupo, e cada vez mais considerava-me como sua propriedade. Confesso que fiquei extremamente desolada quando percebi que Negan apenas ficou comigo por conta de poder. Para mostrar que tinha a mulher mais forte e corajosa em suas mãos.
Desviei meus pensamentos, não querendo passar mais uma vez todas as imagens daquela maldita cela em minha cabeça. Pensei em Rick, e como estaria no momento. Estava com raiva, não só dele por não me ouvir, mas de mim mesma por não contar a porra da história com Negan, e não protegê-lo como deveria. Se algo acontecesse a Rick, ou a qualquer um, a culpa seria completamente minha.
Meus pensamentos finalmente sumiram de minha mente, ao perceber que um carro e o trailer aproximavam-se dos portões. Assobiei para o morador que estava na rua, e logo os portões se abriram e os veículos entraram. Um alívio imenso inavdiu meu peito ao ver Daryl entrando na comunidade com uma moto — provavelmente recuperada — e Rick saindo do trailer.
Desci da torre de vigia, sendo logo substituída por algum dos moradores. Ainda segurava o arco quando pulei em meu irmão, sentindo o peso esvair-se de minhas costas ao senti-lo retribuir o abraço igualmente aliviado. Fechei meus olhos e suspirei, escondendo meu rosto em seu pescoço.
— Que bom que está bem. — sussurrei mais para mim mesma, mas o senti puxar-me mais contra seu corpo.
Ao nos separarmos, colei nossas testas, sentindo-o acariciar levemente minha bochecha com os polegares. Após alguns segundos, caminhei até Rick, e antes de abraçá-lo, beijei seus lábios de forma desesperada. Precisava senti-lo perto de mim novamente, precisava do calor de seu corpo mais uma vez, para poder certificar-me de que ele estava realmente bem.
Rick retribuiu o beijo, colocando uma mexa do meu cabelo atrás de minha orelha de forma gentil. Ao nos separarmos, a contra gosto, o puxei para um abraço, sentindo seu cheiro, misturado com sangue e terra molhada me entorpecerem. Não queria separar-me nunca dos braços de Big Grimes.
— Jesus nos interrompeu no outro dia... podemos continuar o que fazíamos. — disse ele em meu ouvido. Senti o ar quente de sua boca em contato com minha orelha causarem leves arrepios em minha espinha.
— Você não sabe se controlar, huh? — comentei ironicamente, para então me afastar e depositar um beijo provocativo no canto de seus lábios. — Como foi? — Mudei repentinamente se assunto. Rick pareceu ficar sério.
— Conseguimos. — respondeu, retomando sua postura autoritária. — Negan está morto. — Franzi o cenho. Parecia tão fácil.
— Como sabe que era Negan? — perguntei.
— Ele simplesmente nos disse. — Rick respondeu, enquanto ajudava os outros a tirarem as armas do trailer. Neguei com a cabeça.
— Não é possível. — comentei mais para mim mesma, mas Rick pareceu ter ouvido.
— Negan está morto. Você se preocupou e ainda se preocupa atoa, Reyna. — Seu tom de voz parecia um pouco mais irritado.
— Isso é porque você não sabe que todos simplesmente são Negan. — rebati no mesmo tom. Rick pareceu confuso. — Eu sabia que era suicídio.
— Reyna, está tudo acabado. Por que não consegue simplesmente exergar que vencemos. — Rick perguntou. — Estávamos lá, você não estava. Vimos o que aconteceu, você não viu. Eu matei Negan, você não matou. — A esse ponto, todos já nos encaravam, sem abrir a boca.
— Está querendo dizer que mesmo quando tive a chance, fui covarde o bastante para não matá-lo? — perguntei, com um tom sombrio na voz.
— Se o tivesse matado, não precisaríamos fazer nada disso. — Ele rebateu, nervoso. — Negan está morto. — Ele gritou, olhando para todos os moradores em volta, como se fizesse um comunicado. — Conseguimos mais uma vez. Com a ajuda de Hilltop vencemos, e o crédito é todo nosso. — Todos o encaravam, satisfeitos. — Negan está morto. — Ele repetiu, convicto. Meu sangue já borbulhava naquele momento.
— Não, ele não está. — gritei de volta, fazendo todos calarem-se. Corri meus olhos em cada um, até parar em Daryl. Meu irmão encarava-me impassível. — Negan não está morto. — Fiz uma pausa, voltando a encarar Rick profundamente. — Mas nós estaremos.
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