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História O lado bom da vida - Tente me impedir. Agora também é MEU problema.


Escrita por: DiaeNoite

Notas do Autor


Se preparem.


Dia 07/11/2015.

Capítulo 22 - Tente me impedir. Agora também é MEU problema.


Fanfic / Fanfiction O lado bom da vida - Tente me impedir. Agora também é MEU problema.

- Estou indo, mãe.

- Não vá se meter em outra confusão, Percy. Não quero te ver todo arrebentado mais uma vez.

- Eu já expliquei para a senhora o que aconteceu. - Dou um beijo na sua testa e pego as chaves do carro. - De qualquer forma, já foi tudo resolvido.

- Não sei, estou com um mau pressentimento.

- Bom, eu posso ficar aqui com a senhora. Vejo TV com você, comemos pizza e eu perco uma grande oportunidade de melhorar minhas notas com a ajuda da pessoa mais inteligente da escola. - Digo com a minha melhor cara inocente.

- Okay, me convenceu, vai. - Sua mão empurra de leve meu ombro para a saída enquanto fala.

Rio e fecho a porta.

- Tchau!


(...)


- Pode ser... amanhã e aqui às...?

- Pode. - Respondo.

- Que horas? - Monst... Annabeth franze as sobrancelhas.

- Qualquer uma.



Eu sou um idiota. Devo ter soado como um pré adolescente marcando um encontro. 

Puta merda, Percy.

Guardo as coisas e fecho a mochila. Já estou aqui há quase uma hora e nada dela. Isso é o troco pelo meu atraso aquele dia?

Me debruço na mesa. Que sono. Queria poder dizer que tive uma boa noite de sono, mas, como sempre, não tive. Por que ela está demorando tanto? Mas... ah, claro, não combinamos o lugar. Que mancada. Jogo minha mochila nos ombros e me levanto. Vou procurar fora da biblioteca, já não basta os alunos presentes me encarando e se perguntando o que estou fazendo aqui.


(...)


15:30

Chega, ela não veio, já procurei em todo canto.

 - Percy?

Merda.

Me viro devagar, fui pego no flagra. Seu uniforme do time está molhado de suor, em contraste com a minha roupa super seca e nada do time por não estar presente no treino que está acontecendo agora mesmo.

- Will.

- Cara, você tá bem?

- Por que? Estou tão ruim assim? - Brinco, mas seu jeito de me encarar me deixa ansioso.

- Você não tem comparecido aos treinos.

- Ah.

- E você é nosso capitão.

Não quero admitir, mas sei, de uns tempos pra cá não tenho ligado muito para o time, ou para o basquete. Não tenho conseguido dormir direito e o tempo que esqueço tudo é uma grande sorte. Mas querendo ou não, uma coisa leva à outra e por isso estou aqui: minhas notas. Subir minhas médias para continuar no time para conseguir bolsa na faculdade.

- Eu já conversei com o treinador, ele está sabendo.

- Percy, aconteceu alguma coisa? Quer dizer, quando encontraria você andando pelo colégio em um sábado? - Seu olhar é de preocupação, mas sua pergunta entrega que está curioso também para saber mais.

- Relaxa, Solace, está tudo bem.

Puxo sua mão e bato ombro com ombro pronto pra dar uma despedida.

- Te vejo por aí.

- Quê isso? - Escuto-o perguntar.

Me viro. Droga.

Me forço a parecer indiferente olhando as minhas anotações manchadas na sua mão.

- *141? Que número é esse? Cola, Percy?

Centro de Valorização da Vida.

- É. É... eu estava em uma prova.

Will ri. Me pergunto se não está fingindo não saber do que se trata. Ele é voltado à medicina, deve conhecer essas coisas. Mas sorrio também para disfarçar.

O único motivo dos meus rascunhos escritos na minha mão não está presente, e agora essas ajudas não me servem de maneira nenhuma mesmo. Estão borradas.

- Vou nessa, Will.

- Quando voltará aos treinos?

Que merda. Me deixa ir embora logo.

- Essa semana mesmo. Vou dar um jeito. E Will?

Ele me olha esperando a resposta. Não temos tanta intimidade um com o outro, é um pouco estranho estarmos conversando a sós. 

- Sim.

- Teria como não contar aos outros que me viu? Eles não sabem que estou aqui.

Will assente, me dá um último aperto de mãos e vai.

Ele vai contar? Não parece o tipo que faz fofoca.

Enfim...

Coloco meus fones de ouvido e vou embora.

A diferença da Goode desse sábado para o outro é que está claro e posso ouvir ao longe o barulho de outras pessoas pela escola. É engraçado lembrar como a Fantasminha invadiu tudo comigo. Arrombar lugares... Quando alguém pensaria isso dela? Mas também... quando alguém se quer pensou nela? Quis ser amigo dela, a olhou sem preconceitos, perguntou se estava bem. Se tocou do motivo dos seus casacos.

Por que ela não veio?

- Johansson? Você por aqui?

Ninguém merece.

- Até onde eu sei, eu estudo aqui.

Sr. D para de girar seu chaveiro de leopardo nos dedos e deixa de me olhar com desprezo para revirar os olhos. Gostaria de lhe dar uma rasteira, mas me contento em revirar os olhos também. Haja paciência.

- Bancando o engraçadinho? Achei que já tivesse advertências de mais no seu histórico. Sua mãe não lhe ensinou a ter bons modos?

Não seja impulsivo, não caia no jogo dele. Não seja impulsivo, Percy. 

Foda-se.

- Ah, ela ensinou com certeza, mas eu abro uma exceção a não ter quando me comunico com...

- Dionísio, vamos! Estamos atrasados. 

Sr. Brunner me aperta o ombro com afego e me cumprimenta, após me interromper, e então começa uma conversa acalorada com Sr. D sobre um compromisso. Brunner se despede de mim e recebo um olhar de ódio de Dionísio. Os dois se vão apressados e gesticulando muito sobre um conselho importante.

Olho para a porta aberta à minha esquerda. Diretoria. Não há ninguém lá dentro, nem a secretaria em seu balcão. Também não há ninguém ao meu redor. Entro na sala.

Preciso ser rápido, não sei quanto tempo tenho até que alguém volte. Passo pela área da pequena recepção e abro a porta do escritório daquele babaca. O armário com os dados dos alunos deve estar aqui em algum lugar, mas onde? Abro todas as gavetas destrancadas e nada. Onde eu me esconderia caso a secretária volte? Merda, tenho pouco tempo e nenhuma resposta.

Letra A: deveria ser fácil. Passo os olhos pelos adesivos de informação em cada armário até parar em um: "Alunos destaques". Fala sério, se não achar nada nesse, essa escola tem sérios problemas. Mas como vou abrir?

Corro os olhos mais uma vez ao meu redor e acho um clipse prendendo uns documentos em cima da mesa. Pego e desenrolo. Tá legal, calma. Como Annabeth faz isso mesmo?

Eu só posso estar ficando louco. Mas por que há algo tão bom nisso? A adrenalina está me subindo a cabeça, e o perigo de ser pego é bem prazeroso pra falar a verdade. 

Aproximo o arame da fechadura e o encaixo. Estou suando. Não posso me envolver em outro problema tão cedo. Giro o ferrinho várias e várias vezes. Nada. Isso está começando a me irritar. Tento de novo: nada. De novo: nada. E de novo: nada. Mais uma desgraçada merda de vez: na... a gaveta pula pra frente.

Olho para as pastas lá dentro. Várias e várias pastas organizadas por marcadores com letras.

Eu. Não. Acredito.

Eu consegui.

O som de um apito ao longe me dá um susto e me acorda. Preciso ser rápido. Mexo nas pastas e encontro a que eu quero.

"ANNABETH CHASE" é o que vem escrito como título. Pulo todo o resto e vou logo ao que me interessa: seu endereço. Rasgo um pedaço de uma folha aleatória na mesa e anoto o que preciso. Coloco de volta sua pasta no lugar e antes de fechar, uma outra me faz parar: "PERCY JACKSON".

O que há sobre mim ali?

Pego o documento e o abro. Há sete folhas sobre mim, muito do que está escrito é sobre meus campeonatos e vitórias, algumas sobre advertências e punições, outras sobre meu comportamento e personalidade. Como se soubessem quem realmente seus alunos são...

Uma coisa chama a minha atenção.

"O aluno apresenta comportamento rebelde e tende a não obedecer regras, mas possui um potencial muito grande dentro de si. Percy Jackson tem grande influência para grandes comoções dentro e fora do colégio, possui capacidade de liderar e exercer apoio de equipe..."

Antes que eu termine, algo me chama atenção lá fora. Eu tenho que ir. Guardo de volta minha pasta e empurro a gaveta. Saio do escritório de Dionísio e também da sala de recepção. O que quer que tenha feito barulho, por sorte não foi por aqui. Ando mais rápido para longe. Eu consegui.

A felicidade de ter conseguido o que queria me atinge com força e me faz rir sozinho.

Eu consegui.

Paro para rir um pouco. Talvez alto demais, talvez esquizofrênico demais. Deslizo pela parede até estar sentado no chão. Eu consegui o endereço dela. Eu consegui.

Quero gritar muito alto uma série de palavrões, mas me contento a só rir mesmo. Preciso ser discreto, preciso ir logo.

Me levanto e saio com mais pressa possível da Goode. Entro no carro e dou a partida.


POV. Annabeth

Já estou mais do que cansada de ser jogada contra a parede em uma situação sem saída. Se eu for, eu vou sofrer as consequências quando voltar, se eu ficar, eu vou sofrer as consequências de ter deixado Perseu sem respostas. Eu só queria uma saída, uma solução que resolvesse as duas coisas. Já estou farta de sofrer ataques pelos dois lados. Eu estou enlouquecendo.

- Patrick, p-por favor. E-ele está me esperando e eu não tenho o número dele.

Controlo toda a raiva que estou guardando comigo, não posso demonstrar ou tudo estará arruinado como sempre. Patrick desgruda os olhos do seu celular para mim com tanta frieza que sinto vontade de me encolher para longe da sua visão. Se ele soubesse a raiva que tenho... O medo e o ódio de tudo isso.

- Você não vai querer discutir comigo, vai? Sabe o que acontece com você toda vez que faz isso. Eu já disse, você não vai.

- Por que?

Minhas mãos tremem, mas não por medo, por ódio. Assim como as lágrimas que caem. A raiva que sinto faz meu corpo esquentar; talvez meu sangue. Cruzo os braços para poder fechar as mãos em punhos tão forte até que me sinta descarregando tudo o que sinto.

Isso tudo é azar? Isso tudo é algum teste divino que eu tenho que passar?

Não estou apenas cansada, estou exausta. Já fui humilhada, espancada e quase estuprada. E eu sou apenas uma garota. Sempre perco o controle sobre o meu corpo e o que fazem com ele. Não adianta o quanto eu tente escapar, alguém sempre aparece para me derrubar e pisar em mim, o que eu fiz para merecer isso?

A culpa me bate assim que retorno a olhar para Patrick e seu ódio comigo. Aperto meus braços contra o meu corpo.

Eu matei a minha mãe.

- E-eu também sinto a falta dela.

- NÃO VENHA ME FALAR ISSO! - Seus olhos, se possível, ficam ainda mais furiosos. - Você tirou de mim a mulher que eu amava. Tudo o que me resta agora são lembranças. Eu não posso trazê-la de volta, eu não posso tocar nela, não posso ver o seu rosto mais uma vez, e você é a culpada. Acha que é fácil? Acha que é fácil sair por aí e encontrar uma pessoa que possa substituí-la? Alguém para colocar no lugar de Athena? Você é jovem, acha que sabe tudo, acha que conhece o real sentido do amor. Não é bem como você deve pensar. Eu perdi o amor da minha vida. Sua mãe foi a única pessoa que me fez ver que levar um tiro pode ser menos doloroso do que perder a pessoa amada. E tudo isso é culpa sua, você vai pagar. Eu vou fazer da sua vida um inferno.

Eu fui a responsável por tudo. Eu fui a culpada pelo acidente, eles estavam lá por causa de mim, eu fiz com que os dois fossem ao meu encontro pela teimosia de ter querido curtir com meus amigos e me opor a ir com eles.

- Você por acaso está querendo provocar uma briga?

A medida que ele se aproxima, eu me afasto. A raiva que mostra por mim é assustadora. Sinto como se ficasse duas vezes maior e mais forte. E o que eu tenho além de um corpo quebrado? Todas as vezes que tentei usar distrações para escapar eu fracassei, as várias tentativas de fuga me causavam dor no final, nas vezes que tentei prendê-lo em uma conversa para que não tocasse em mim não deram em nada, seu ódio é maior que tudo. Hospitais? Comprados e subordinados. Polícia? Funcionaria se me levassem a sério e não telefonassem para Patrick, se acreditassem em mim e nas marcas no meu corpo e o culpado por elas, se não me entregassem de volta a ele e eu sofresse punições horríveis por isso.

Tudo o que eu sou, todo o meu conhecimento não conseguiu o parar a tempo de não encostar em mim. E ele sabe disso, ele se orgulha disso. Ele pode me machucar até sangrar sempre que tiver vontade, e eu não vou poder fazer nada.

- Patrick, eu...

- Você vai calar a boca - Seus músculos se tencionam e seus olhos escurecem. Preciso levantar o rosto para o olhar nos olhos. - e me obedecer.


POV. Percy

Ela estava falando a verdade naquela noite quando disse que estávamos próximos à sua casa. Sua rua fica apenas algumas quadras da Cornucópia. É um lugar grande, rico e muito bonito. As casas fazem um condomínio de luxo muito bem cuidado.

Desacelero e vou mais devagar, tenho de ir olhando os números nos casarões, o que torna tudo mais complicado. Há uma mulher conferindo sua caixa de correio em frente à sua casa, me aproximo com o carro.

Assim que paro o carro ao seu lado, na calçada, ela levanta os olhos pra mim e se espanta, provavelmente pelo resto do que sobrou dos hematomas pela briga. - Ah, oi! A senhora pode me dar uma ajuda?

Ela me analisa por alguns segundos e afirma com a cabeça. - É sobre o que?

- Eu não quero demorar muito. Esse número, ele é de qual propriedade? Teria como me apontar? - Puxo o papel com o endereço e o entrego a ela. Ela vê, mas balança a cabeça.

- É bem pro final, meu filho. De número eu não tenho certeza, só olhan...

- Annabeth Chase, conhece?

Sua postura se endireita e ela me encara enrijecida com a boca aberta. Okay, tem alguma coisa muito estranha aqui. Mais uma vez, quem é essa garota?

Um garoto um pouco mais velho do que eu aparece no jardim atrás dela. Pela sua aparência, diria que é seu filho.

- Mãe, entra. - Estava certo, é seu filho. O garoto franze as sobrancelhas pra mim e me analisa discretamente. Assume uma postura defensiva. - É sobre o que?

A pergunta me pega de surpresa. Pensando bem, eu não tinha pensado muito. O que vou falar para ela quando me vir? Eu só... peguei o carro e vim.

O garoto está esperando uma resposta. Tiro isso da cabeça.

- Eu... estou indo ver Annabeth Chase.

Tem algo muito estranho na maneira que reagem ao nome dela por aqui. Ela já invadiu alguma propriedade privada ou algo parecido? Suas marcas... eles sabem? Ela briga com alguém daqui? Esse garoto já esteve envolvido? Já bateu nela?

Não percebo que estou fazendo cara feia até ver o garoto dar um passo para trás. Não consigo mais vê-lo da mesma forma, sem imaginar se ele pode ser o culpado por machucar Annabeth. Sua reação e a da sua mãe ao nome dela já é muito estranha o suficiente.

- É amigo de Patrick Grey?

Não sei ao certo o que dizer, e se eu falar que não e não for a resposta correta? Mas que puta intromissão.

Por via das dúvidas... - Sou sim. - Ele balança a cabeça e olha para a rua, estala os dedos. Está desconfortável. - O conhece?

Tenho que deixar de pensar que ele pode estar nervoso assim por achar que estou aqui a mando do padrasto da menina que ele bate, mas a cara que faz pra mim depois que lanço a pergunta não melhora nem um pouco o meu ânimo, nem as minhas suposições.

- Só de vista. Cara, eu já estou indo, qualquer coi...

- Você está bem? Parece nervoso.

Okay, não me importo nem um pouco de ter soado ácido demais.

- É... só... um pouco de dor de cabeça.

- Hm. Pode me falar onde é a casa dela? 

- Me desculpe perguntar, - Está falando mais baixo. Desculpo não. - mas você é namorado dela?

Que pergunta é essa?

A menos que ele esteja ficando com ela e ache que eu seja o namorado dela que vem tirar satisfação com ele, não faz o menor sentido jogar essa pergunta logo na lata.

- Não, por que?

Ele volta a encarar a rua desconfortável. Será que é afim dela? Ela é linda, ele pode gostar dela. - Por nada, é só que... ela é conhecida por ser tímida demais e se isolar das pessoas, e... não ter amigos.

- Você gosta dela?

Tão na lata quanto ele me fez aquela pergunta, eu faço essa de volta.

Ele ri de nervoso e nega com a cabeça. - Eu sou gay. - Antes que eu fale alguma coisa, é ele quem se adianta. - A casa que você procura é seguindo em frente, última da rua. Não tem erro.

Casa não, mansão. Nada aqui aparenta menos do que uma grana alta. De qualquer forma, já estou acostumado com esse tipo de coisa.

- Valeu.

Minha raiva do cara se dispersa um pouco, mas continuo com uma cisma a respeito de tudo aqui. Descobrir Annabeth é mais confuso do que tentar entender o motivo das discussões de Will com o di Angelo.

Sinto como se já tivesse vindo aqui antes, mas não me lembro bem quando. As casas me parecem familiares. Uma me lembra a casa na Flórida que a família de Drew tem.

Drew.


- Tinha quase certeza de que me traria aqui, Percy.

Me desfaço dos tênis e sento ao seu lado no capô do carro. A brisa marítima é tão boa.

- Me sinto ótimo aqui, deveria experimentar vir mais vezes, vai se sentir assim também.

Ela se vira para mim. Seus olhos castanhos são incríveis.

- Eu já estou me sentindo.

Encaro a sua boca enquanto fala. Me aproximo e seguro o seu rosto com calma, ela passa sua mão pelo meu cabelo, pela minha nuca, a beijo devagar e ela retribui.

Ao final, deita no meu ombro.

- Você sabe como surpreender uma garota.

- Você acabou de me dizer que sabia que eu te traria aqui, agora diz que eu sei surpreender uma garota. Me diz, como se entende isso?

Drew ri, mas eu realmente estou pensando a respeito. Garotas são complicadas; Garotas bonitas são mais ainda.

- Você às vezes é tão fofo, Percy.

Ah, não, já conheço o jogo. É a típica frase pra não me chamar de lerdo.

- Cara, você quer dizer lerdo? Já estou cansado de ouvir isso. Quem foi que te contou? Foi o Grover? O que eles andam te falando? Aquele menino-bode...

- Por que? O que ele teria pra me contar?

Ignoro sua cara divertida com a minha situação.

- Fala, Percyto.

E lá vamos nós...

- Percyto não. Por favor, isso é trágico.

- É fofo.

- É Péssimo.

- Não é, não.

Uma ideia me vem à cabeça. - É assim? Então vou passar a te chamar de Karatê Kid, em homenagem ao Dre do fil...

- Você não faria isso.

- Ah, eu faria sim.

Ela empurra meu ombro de brincadeira e ri, solta um palavrão que fica incrivelmente sexy na boca dela.

- Credo, é mais sem graça do que a Mostrinho.

O comentário é bobo, não me atingiria há um tempo atrás e concordaria, mas não mais agora. Me sinto esquisito, o que saiu da sua boca me incomoda tanto quanto como se ela tivesse me dito algo racista. A brincadeira perdeu a graça.

- O que foi, Percy? Ficou... estranho de repente.

- Não... não é nada.

Drew sai do meu ombro e se recosta no carro. - Isso só dá mais ênfase no que eu disse. Tudo envolvendo a nerd é chato. Até você deixou de sorrir.

Não por isso.


No que eu estou metido?

Uma lembrança me passa pela cabeça. Seu padrasto... o cara que eu quase comecei uma briga no hospital... o cara que eu não me dei bem logo de cara. Como posso contar com a sua ajuda para me deixar entrar?

Merda.

No que eu estou metido?

Chego em frente à mansão, é maior que a minha. Tento lembrar de algo relacionado à sua família, mas nada me vem à cabeça. O lugar é lindo. Seja lá quem foi que projetou, está de parabéns pelo trabalho perfeito. Daqui posso ver o grande jardim que leva até o casarão, não há ninguém por perto, só dois carros pretos estacionados.

Okay, é agora.

Um homem de terno está no controle da segurança do portão. Não tem crachá e nem um microfone ou fone de ouvido preso à camisa, o que me parece bem idiota levando em conta a credibilidade de segurança. Me aproximo com o carro.

- Pois não? - Ele quer saber.

Atrás dele posso ver algumas telas de TV transmitindo a captação das câmeras espalhadas pela propriedade. Duas delas me mostram dentro do carro.

O que eu falo?

Me faço parecer impaciente, olho no relógio do celular para dar ênfase. Sei o que estou fazendo, mas não sei se ele é tão idiota quanto aparenta e se cairá.

- Tenho um combinado com Annabeth, é para ela estar comigo nesse final de semana, preciso falar com... - Qual é mesmo o nome dele? O garoto tinha me dito um nome...

- Patrick?

Esse mesmo. Vou no chute. - Sim.

Sua cara está pálida e ele me olha de cima a baixo o máximo possível que sua visão alcança dentro do carro. Não quer demostrar fraqueza na minha frente, então banca uma pose de superioridade que não condiz com o seu jeito. É claro que está indeciso sobre algo e esconde alguma coisa de mim. Sinto minha pele se arrepiar. Algo muito estranho há por aqui.


POV. Annabeth

Sua respiração quente esquenta meu pescoço enquanto fala baixo no meu ouvido. Sua mão machuca meu coro cabeludo enquanto segura minha franja, pressionando minha cabeça na parede. Sei que se eu tocá-lo para afastá-lo de mim é capaz de quebrar minhas mãos por desobediência. Seguro minha barriga com força para controlar o enjoo e choro.

Sua proximidade em contato com a minha pele me faz lembrar dos meninos que abusaram de mim no beco, que passaram suas mãos pelo meu corpo com violência. Quero com toda a força me livrar de Patrick e de suas mãos. Me sinto burra, fraca, me sinto suja.

- Você não é muito esperta. Quer me irritar justo em um dia que estou de mau humor?

- Me s-solta, Patrick.

Ele me encara e repete o que eu disse, e solta um riso em escárnio. Eu o odeio.

Não posso tocá-lo, mas ele coloca seu dedo indicador na minha testa.

- Vai querer voltar a ser respondona?

A raiva que sinto é somada com meu mal estar, e todas as dores que sinto no meu corpo por sua culpa.

Raiva. Muita raiva. Raiva que faz minhas mãos tremerem.

Esqueço o medo.

- Você precisa ser colocada no seu lugar, desaprendeu a obedecer. - Ele para de tocar em mim e se afasta o suficiente para que eu possa soltar o ar que estou prendendo. - Ao mesmo tempo que passou a fazer esse tal projeto com esse garoto. Coincidência? Prefiro não apostar.

Meu coração dói como se algum punho o estivesse segurando. Seu deboche me dá nojo e vontade de quebrar o seu pescoço.

- Vai perder o único amigo que conseguiu fazer além daquela rockeirinha idiota. Acha que não sei que sofre nas mãos dos alunos daquela bosta de colégio?

A informação me pega despreparada. Ele sabe? Eu... ele sempre soube? Sr. D o contou tudo? Ele tem alguém escondido no colégio?

Milhões de perguntas passam pela minha cabeça.

- Ou será que ele é um dos que não te suportam e vai ficar bravo com você por não ter ido?

Então ele não sabe quem Perseu é. Ele não tem alguém infiltrado na Goode. Mas...

Eu fui deixada aqui para ser agredida e depois sofrer as consequências por não ter ido ao colégio? Ele planejou tudo isso?

- Desgraçado.

Olho para cima, um líquido quente escorre do meu nariz e pinga na minha mão em cima do tapete, sinto um gosto ruim na boca. Minha visão ganha foco e o vejo parado em pé me olhando.

Agora o meu rosto arde. Sua mão é pesada, o tapa foi forte.

- Ora, fazia tempo que não me enfrentava. Acho que senti falta dessa agitação antes da surra.


POV. Percy

- Ele sabe que está aqui?

Droga, se o cara pegar o interfone para ligar para ele vai ferrar tudo.

- Sim. Falamos pelo telefone, era para eu estar aqui às três horas, estou atrasado.

Não posso permitir que pegue o interfone.


POV. Annabeth

- Gostou do tapa? Quer experimentar mais, sua vagabunda?

- Vai pro inferno.

Seu pé atinge meu estômago com tanta força que começo a tossir.

- Repete. - Mais um chute, e mais um. - Anda, repete.

Protejo a barriga e evito o outro chute. Minha raiva faz meu sangue ferver.

- Eu disse: vai pro inferno.

Sou pega com brutalidade e arrastada até a sala. Soco, mordo e arranho suas mãos, mas ele não me solta.


POV. Percy

- O que quer com a senhorita Annabeth? 

Explicações e ajuda.

- Assunto particular.

Uma sombra passa pelo seu rosto e ele parece compreender algo de que não tenho ideia do que seja.

- Entendi. Está aqui a mando de Patrick? 

Que tipo de pergunta é essa?

Um calafrio desce pela minha espinha e me deixa alerta. Sinto que estou me envolvendo em algo incomum por aqui, mas estou pronto para descobrir o que é, e me envolver também.

Uma raiva me sobe. Tomara que não seja o que estou pensando.


POV. Annabeth

Sou pega pelo casaco e jogada na parede, a dor explode nas minhas costas. Suas mãos me cercam de cada lado, empurro seu peito para longe, ele me revida com mais um tapa. A ardência faz meus olhos queimarem, mas antes que eu possa esfregar o rosto, ele me atinge com outro, no lado oposto da face.

É muito rápido, não consigo contê-lo.

Agora sua mão está apertando o meu pescoço e me erguendo, arranho sua pele para que me solte. Cuspo sangue na merda do seu rosto.


POV. Percy

Algo me diz para responder sim. Afinal, o que eu posso falar? Não conheço nada aqui, mas a forma como reage ao nome Patrick é diferente, é de respeito e medo. Se estou aqui a tal mando desse cara, por que ele não me deixaria entrar?

- Estou sim. - A mando de Patrick. A mando. - E, bem, você sabe, não posso ficar aqui fora falando o porquê.

Caia nessa. Caia nessa. Caia nessa. Caia nessa. Caia nessa. Caia nessa...

Ele balança a cabeça rapidamente e passa a mão na testa. Talvez esteja fazendo merda, talvez meu rosto com hematomas de briga estejam o assustando.

Ele não pode estar assim só por esse cara ser seu chefe.


POV. Annabeth

Patrick bate minhas costas novamente na parede e por pouco não bato a cabeça. Sua mão sobe para ser lançada na direção do meu rosto, preciso sair daqui. Sai, sai, sai... Suas mãos em mim e seu corpo praticamente colado ao meu, impedindo a minha saída, me deixam claustrofóbica, me dão medo, me dão nojo, me dão ódio. O empurro, não adianta. O empurro de novo, não adianta. O empurro, o empurro, o empurro pra longe de mim. Não... adianta, nada adianta. Soco o seu rosto.

O soco foi desesperado, o soco sai desastrado, não era para ser tão fraco, não era para sair assim.

Sou jogada no chão, minha pele queima, meu corpo fraqueja. Essa merda de corpo fraqueja. Meu sangue queima como nunca e escuto zunidos pelos meus ouvidos. Levanto. Corro.

- Você fica!

Sua mão segura meu cabelo e me puxa para trás. Um grito de frustação escapa da minha boca. Esperneio à medida que me puxa pra perto, sei o que vai fazer. Eu vou apanhar mais. A música tocando na televisão às alturas me apavora além do limite. Tudo...

Tudo é desesperador.

Sinto que eu vou morrer. Choro pelo meu azar.


POV. Percy

Sorrio pela minha sorte.

Sem perguntar mais nada e sem telefonar para ninguém, o cara abre o portão e eu entro com o carro. Ele caiu na história. Torço para que não interfone assim que me vir sair de perto.


POV. Annabeth

Aproveito o momento que me solta e corro pra porta.

Está trancada!

Não, não, não...

Estou mancando quando corro para o corredor, mas ele bloqueia minha passagem. Não faz nada, apenas me olha no caminho. 

Ele está se divertindo.

- Patrick, por favor.

A medida que se aproxima, eu me afasto. Eu... eu não... eu não consigo correr!

- Por favor? Foi você que começou tudo isso, sua garotinha mimizenta.

Só para, por favor, só para.

- Desculpa.

Me encosto na parede até o chão, minhas pernas não estão mais me aguentando em pé, meus olhos estão ameaçando se fechar.


POV. Percy

Estaciono o carro perto da entrada, há um barulho estrondoso de música tocando, está vindo de bem perto. Toco a campanhia. Acho que ninguém conseguiu ouvir, nem eu consegui, a música está muito alta. Mesmo assim, toco de novo. Nada.

Não há ninguém pelo jardim, ninguém me olhando; embora acho que tenha câmeras. As janelas da frente mostram a entrada, como uma recepção. Há mesinhas e uma decoração elegante demais pra mim. Contorno a lateral, o barulho está vindo mais pra dentro da casa.


POV. Annabeth

Patrick está chegando perto, e mesmo assim já consigo sentir o aperto das suas mãos por todo o meu corpo, é como se cada hematoma nojento estivesse me apertando. Não quero ser socada, cuspida, espancada. Eu não quero ser internada no hospital mais uma maldita vez. Já estou cansada de ter meu corpo quebrado.

Me encolho o máximo que posso na parede, eu quero sumir, ele vai me apagar como nas outras vezes, não tenho mais como fugir disso.

Suas mãos estão em punho. Fecho os olhos e protejo o rosto, a vontade que tenho é de me juntar ao concreto atrás de mim.


POV. Percy

Vou estar ferrado se alguém me vir espiando pelas janelas da ca...

Annabeth?!

Me afasto pela surpresa. Consigo vê-la, ela não. Pior do que ver as marcas no seu corpo aquele dia, é vê-la agora sangrando. Está gritando, mas a música abafa o som do lado de dentro.

Não...

Saio do torpor. Puxo a janela pra cima com força.

Annabeth é puxada pelos pulsos que protegem o rosto. Seu padrasto a segura com uma mão e a puxa pra si, com a outra distribui socos nas suas costas. A força dos pancadas a faz se engasgar. A força das pancadas me faz desviar os olhos.

Patrick tira o cinto e ela se encolhe, suas mãos vão desesperadamente para a parede como se pudesse entrar nela.


Paro ao ler uma coisa.

"Abuso sexual".

Ela... ela não...


- resistência em participar de atividades físicas;

- comportamentos de automutilação;

- imensa dificuldade de estabelecer vínculos de amizade;

- medo de adultos do sexo oposto ao seu;

- falta de participação nas atividades escolares e sociais;


Abre, abre, abre, abre.

Patrick puxa o cinto. Cada cintada mexe comigo. Ele para e volta a distribuir socos. 

Porra!

Abre! Está... trancada!

Parto pra janela ao lado.


POV. Annabeth

- Pa...ra. Por favor!

Cada soco tira o ar dos meus pulmões. Tão forte que a dor se dobra quando atinge os hematomas que já tenho. Estamos numa luta para que eu me solte do seu abraço.

Me solta.

Me solta.

Me solta.

Eu não quero ir para o hospital mais uma vez, eu não quero ter outro trauma. Arranho qualquer parte do seu corpo que eu consiga achar.

Me solta.

Empurro o seu rosto para longe sem me importar com as unhas na sua cara. Sou jogada com força no chão, sangue escorregue do meu nariz. Estou exausta. Quero tirar o seu corpo de cima do meu. Me sinto fraca, me sinto vulnerável. Ele está no controle do meu próprio corpo. Sua mão segura meu maxilar firme demais para que eu não me mexa e ele é esperto em deixar a cabeça afastada, meu braço não alcança seu rosto daqui. Eu quero sair dessa posição, isso está me deixando doente, eu não posso mover meu quadril sem que encoste na sua virilha.


Sou jogada no chão. Um deles está montado em mim. Não consigo ver quem é, meu rosto está colado ao asfalto da rua e minha franja é uma cortina.


Sua mão é pesada, tudo dói. Eu só quero que pare. Por favor.


- Pelo visto não fomos os primeiros. Andou servindo de saco de pancada pra quem, loirinha?

- P-p-por favor, m-me deixa ir...

Ele ri e puxa o meu sutiã.


Quero vomitar por essas lembranças, quero vomitar por agora. Me sinto mais suja, invadida.

Para, por favor.

Eu não quero ser segurada e dominada, eu não quero mais que toquem o meu corpo.

- Me... sol-ta! - Sua outra mão prende meu pulso direito no chão, bem em cima dos cortes.

- Você não queria uma briga? Está tendo!

- Sai di ciema de mim!

- Que foi? Minha mão está te apertando? 


POV. Percy

Puxo com toda a força que tenho, não sobe. Não sobe nem um pouco! Ele está em cima dela! Está socando a barriga dela!

- DESGRAÇADO!

Me afasto, lanço o pé com força na janela. Não abre.

Essa porra é blindada!?

Os movimentos bruscos lá dentro me fazem olhar o que acontece. Ele ainda está em cima dela, ele ainda está batendo nela. 

Vou pra janela anterior, chuto, - MERDA. - chuto, - MERDA. - chuto, - MERDA. - chuto. 

Empurro o vidro com as mãos, ele não sai do lugar. Patrick a segura pelo cabelo e lhe bate na cara. Vou com o ombro na janela, soco, bato, dou com o cotovelo.

Não há um meio de subir para o andar de cima.

- COVARDE!


POV. Annabeth

Acho que perdi os sentidos, meus olhos estão tão pesados, não sinto minhas pernas. Estou sendo erguida?


POV. Percy

Corro para a porta e chuto. Preciso arrombar essa merda. Chuto mais e mais até abrir.


POV. Annabeth

Estou sendo erguida, Patrick ainda está aqui. Minhas pernas... minhas pernas não estão conseguindo me manter em pé. Minha cabeça está tão pesada. Quero tirar sua mão da gola da minha roupa. Ou é o meu pescoço? Mas elas também estão pesadas, estão lentas, tudo o que consigo é deixá-las por cima da sua, que está me erguendo. Só vejo um borrão à minha frente.

O borrão ergue o punho acima da cabeça.

Acho que vou ser apagada.


POV. Percy

Corro pela entrada. Seu punho desce no rosto dela e ela cai mole no chão.

Não...

Tudo em mim explode de maneira descontrolada, só consigo pensar em ferir. Eu vou ser preso.

O atropelo com um soco. - FILHO DA PUTA!

Não quero parar de socar seu rosto, agora ensanguentado. Quero afundar seu crânio no chão. Meu sangue está fervendo. Quero arrebentá-lo completamente.

Bato a cabeça e recebo um soco no nariz. Ele está por cima.

- QUEM É VOCÊ?!

Dou com o cotovelo na sua cara e me levanto. - SEU PORCO COVARDE! REAGE! REAGE AGORA!

Chuto tão forte sua costela que me dá prazer em pensar se quebrei alguma coisa.

- SAIA DA MINHA CASA!

Ele é forte, segura a minha perna e puxa. Já estamos numa luta pela casa.

- ELA VAI COMIGO! VOCÊ NÃO VAI TOCAR MAIS NELA! - Meu cotovelo atinge seu rosto e me viro e volto para socar com mais força.

O chute que levo me derruba. - VOCÊ NÃO MANDA EM NADA, SEU MOLEQUE.

Controlo a vontade de tossir, foi bem dado, foi no estômago. Lhe dou uma rasteira. 

- VOCÊ É UM INFELIZ NOJENTO!

Ele é rápido, avança contra mim e prende o meu pescoço. Soco suas costelas e ele soca meu rosto. Seus golpes são fortes, mas não mais do que os meus.

- Isso não é da sua conta, moleque. Mas você não vai sair daqui para contar história. 

Estou por cima. - O que você faz é espancamento, não sou eu o errado aqui, seu covarde de merda.

Não sei quando acontece, o sofá está virando junto com a gente. Só consigo pensar em descarregar toda a raiva que estou sentindo nele.

- EU SOU O PADRASTO DELA! ELA VIVE COMIGO! ELA FAZ O QUE EU QUERO!

- VOCÊ É UM COVARDE!

- ESSA PUTA LEVOU SUA MÃE A MORTE! TUDO POR CULPA DA DESOBEDIÊNCIA DESSA VADIA, ATHENA NÃO ESTÁ MAIS VIVA!

Não sei nada sobre ela, sobre sua vida, mas não consigo acreditar que isso o que fala seja verdade, ela não é assim, ela não parece fazer mal a ninguém. Tudo o que sei é que perdeu sua mãe em um acidente de carro.

- VOCÊ NÃO TEM O DIREITO DE BATER NELA! - Ele pressiona minha cabeça no chão, não posso deixar que me domine. - VOCÊ TEM QUE SER PRESO POR ISSO!

Ele ri, afetado pela quantidade de porrada que levou até agora.

- Você não me conhece, garoto. Acha que você, o namoradinho dessa vagabunda, vai conseguir me parar? Você não vai nem passar de hoje. - Ele aperta meu braço para trás com mais força. Solto um rosnado pela dor. - E ela vai receber algo muito pior pela sua intromissão.

Não consigo aguentar de ódio. Me mexo para me soltar, mas seu aperto se intensifica. Sinto algo se partir dentro do meu peito. Uma lembrança. 


- Ih, olha lá, a Mostrinho quebrou o braço.

Paro de mexer no meu armário e olho na direção que dois meninos conversando na outra parede estão olhando.

- Já não era sem tempo. Quando ela não aparece com alguma coisa quebrada?

Os garotos me olham e concordam comigo. Novidade seria se ela não se acidentasse em menos de duas semanas.

- Qual foi o último desastre?

- Mão enfaichada, derrubou um martelo em cima dela enquanto mexia nas ferramentas da sua casa.

- Retardada.

Um fala para o outro. Dou uma última olhada nela, com suas roupas sufocantes e sua franja tampando a cara. Fecho o meu armário.


Eu deveria ter notado. Eu deveria.


(...) já vi o roxo na sua pálpebra. E também já vi os das suas mãos.

Puxo a manga para trás revelando os seus dedos, frios e cobertos de marcas. Ela treme sob o meu toque e tenta puxar.

- Vai me contar quem fez isso com você? Foi o Ethan?


Agora sei quem éo responsável. Quem merece apanhar.

- Ela já chorou pra você sobre maus tratos enquanto você metia nela? - Tudo o que sinto é nojo e ódio. - Foi gostoso foder essa vadia? Ela se cortou ou vomitou depois, como sempre faz? Ela soube dar ou você precisou bater nela para ela ceder?

Já chega.

Luto até me soltar. Parto pra cima dele, o derrubo em cima da mesa de centro e ele cai nos estilhaços dos vidros e solta um grunhido.

- Você merece o troco pelo o que faz. - Agarro seu cabelo e o puxo na direção da minha mão cerrada.

- Ela que - Soco. - merece. - Soco. - Não é você - E outro. - que vai me parar.

Levo uma cotovelada e sou empurrado pra longe. Minhas costas batem com força na mesa de decoração, uma dor aguda sobe pela espinha.

Filho da puta.

- Isso não é problema seu, moleque. Ela é minha, ela fica.

Sorrio o vendo cuspir. Sangue espirra da sua cara arrebentada.

- Tente me impedir. Agora também é MEU problema.

Antes que ele avance, eu avanço. Atinjo sua cara até estar irreconhecível. Ele não reage mais, mas continuo batendo, não quero parar. Todas as vezes que ela aparecia enfaichada no colégio foram sua culpa, os roxos que cobrem as mãos dela foram sua culpa, o coma e traumatismo que teve foi por sua culpa. Ele merece morrer.


- Eu sei lá, Tom. - Falo.

- Deveria saber. - Tom franze as sobrancelhas irritado. Estuda comigo e senta comigo, mas não somos tão próximos.

Ele desvia os olhos para trás de mim e ri. Sigo o seu olhar para ver a graça.

Nancy, em seu uniforme de torcida, bloqueia a passagem da Monstrinho enchendo a garota de perguntas. Até entendo, ela só pode ser doente. Nesse calor com roupa de frio.

- Sério, qual é o seu problema? - Nancy questiona.

A Mostrinho não responde. Está de muletas e com um pé engessado.

- E como você consegue se arrebentar tanto? Não tem nem um mês que você apareceu com o pescoço ferrado, agora o pé também?

Rio. Tom me dá um toque no ombro.

- Vou nessa, Percy. Qualquer coisa passa lá.

- Passo é essa, teatro não é a minha praia.

- Entendi. Vou nessa.

- Tchau. - Digo.

Dou uma última olhada nas duas atrás de mim.

- Ah, não. Não vai chorar, vai? - Nancy ri.


Eu devia ter intervido. Todas as vezes. Eu devia.

Eu não devia ter participado e...

A música. Ela parou de tocar.

Um baque distante me faz largar o corpo.

Annabeth.

Solto Patrick e atravesso com rapidez todo o caminho por onde vim parar pela luta. Seus braços fraquejam na tentativa de se erguer e ela vai de encontro ao chão. Corro na sua direção.

Ela não pode desmaiar agora, ela bateu a cabeça, ela precisa de um médico. Está de bruços; viro o seu corpo para mim.

Não...

Não, não, não, não, não, não, não.

- Annabeth! Ei, consegue me escutar? Annabeth!

Seu rosto...

- Annabeth, fala comigo. - Afasto o cabelo do seu rosto. Há sangue na minha mão, há sangue no seu rosto, há sangue em todo lugar. - V-vai ficar tudo bem, eu vou te tirar daqui!

Seus olhos permanecem fechados, mas seu corpo ainda tenta se afastar de mim. Suas mãos caem sem força pelas suas laterais. Há sangue em todo lugar.

- Che...ga. Po-or fa-vor. Dói. - Se esforça para suplicar.

- Calma... c-calma, sou eu, o Percy, eu não vou te machucar. - Falo.

- Por favor...

- Vai ficar tudo bem, eu vou te tirar daqui.

Olho ao meu redor. Essa casa é enorme e preciso fazer alguma coisa antes que algo aconteça. Me levanto.

Há na sala apenas um celular e um livro grande, grudados com um bilhete que não tenho tempo de olhar. Pego as duas coisas e coloco no colo de Annabeth. Levanto sua cabeça e a deixo apoiada no meu ombro. Precisamos sair daqui. Sua mão se prende no meu braço para tentar me conter, mas seu aperto está muito fraco. Ela precisa ir a um hospital.

- Você precisa de um médico. Vou te levar em um hospital.

- Não! Hos... pital não.-  Está se agitando muito, só está piorando as coisas, sangue não para de escorrer do seu nariz. - Com-prados.

- O que?

- Obedecem... Patrick. Muito dinheiro. Qualquer um... subo-bordinados.


Desencosto do vidro, já fiquei tempo o suficiente, não gosto da energia de todo esse ambiente hospitalar.

É ainda mais frio ver todo o sofrimento das pessoas pelos corredores. Levanto os olhos para um cara vindo na minha direção, é o pai da garota. Não sei explicar a raiva que sinto por ele, não sei de onde vem, mas é algo tão forte que tenho vontade de avançar no seu pescoço. É uma sensação ruim que ferve o meu sangue. Princilpalmente quando ele está encarando o meu cabelo e me analisando de cima a baixo como um vagabundo qualquer.

Choco meu ombro com o dele ao passar, faço questão. Que vá se foder.

Preciso encontrar Grover, conversar sobre Rachel, sobre a aposta.


- Ei, ei, ei, tudo bem. Tudo bem, eu vou te levar a um lugar sem tudo isso. Você vai ficar bem. - Suas mechas de cabelo estão encharcadas de sangue, grudam no seu rosto. - Você... vai ficar tudo bem.

Nunca senti tanto medo.

E-ela não pode morrer. Como as coisas chegaram a esse ponto?

- Eu vou te levantar e carregar você, ok? Pode doer um pouco, mas é para o seu bem.

Passo um braço pelas suas costas e outro por baixo dos seus joelhos e ergo o seu corpo. Consigo ver a intensidade da dor só pelos seus gemidos e isso está me matando. Cruzo a sala e o cômodo por onde Patrick e eu passamos. Tudo está destruído e ele não está mais aqui. A seguro com mais firmeza e empurro a porta principal com o pé.

O covarde fugiu.

Corro para o carro, abro a porta e entro junto com ela. Se mais alguém estiver por aqui a situação pode piorar, mas quando passo pelo portão de entrada está trancado, o porteiro também fugiu.

- Annabeth, fique acordada! Você não pode dormir. V-vai ser rápido, vou abrir o portão e voltar. Não durma.

A deixo no carro, entro na cabine de controle. Ela não pode dormir...

Onde está essa merda de botão?!

Afasto todos os pertences do cara para o chão e acho o painel de segurança da mansão. Todas as câmeras filmam um lugar da casa, mas nenhuma pessoa, está vazia. Abro o portão.

Annabeth está da mesma forma, continua de olhos fechados. Está me desesperando mais, não tenho a mínima ideia de primeiros socorros assim, só sei que não pode dormir. A pego no colo novamente e me sento no banco, dou a partida.

As ruas voam à nossa volta.

A seguro firme, junto a mim, e piso fundo no freio. As buzinas à minha volta se misturam com as freadas bruscas dos outros veículos e a do motorista, que está gritando, do carro em que quase bati. Annabeth está bem, eu não bati, o carro está inteiro, eu freiei a tempo. Eu não bati. Estamos bem. Annabeth está bem.

Foi só um susto, Percy. Foi só um susto. 

Acelero antes que o guarda do semáforo venha olhar se está tudo bem. As juntas dos meus dedos estão brancas, eu não posso soltar o volante agora, e também não posso soltar Annabeth do outro braço que a segura.

Foi só um susto, Percy. Só isso. Está tudo bem.

Sacudo Annabeth. E mais uma vez. - Não dorme, Annabeth! Você não pode dormir agora! Ei, ei, fica aqui comigo. Eu vou... vou falando com você! Vamos manter um ao outro acordado. - Ela não está respondendo. Não, não, não... - Você está assustada, eu também tô, mas tudo vai ficar bem. Não dorme...

Suas pernas não estão viradas em um ângulo estranho, mas estão de um jeito desconfortável. Não posso tirar a mão do volante e muito menos a outra e soltá-la. Só mais um pouco, Annabeth. A seguro mais junto a mim. Só mais um pouco. Só mais um pouco. Só mais um pouco. - Não durma... você não pode dormir agora... Acorda, vamos. Acorda...

- Lon...ge. - Levo um susto. Não entendo. Longe? De que? Sua voz está fraca, quase inaudível. Não está acordada, mas também não está dormindo completamente. Abra os olhos, por favor. - Po... fav... De novo não.

O resto das suas palavras continua desfocado, mas entendo. Não sabe que sou eu e está com medo de que eu vá fazer alguma coisa com ela. Seu corpo volta a tremer e sua mão tenta me tocar, mas fraqueja. Volta a ficar imóvel.

Só tenho um lugar para onde levá-la. 

Corto caminho entre os carros e passo por cima de alguns gramados. Corro pra porta da frente junto dela. Há sangue pra todo lado. 

- MÃE!

A aperto mais junto a mim. O tempo está passando.

- MÃE! MÃE, POR FAVOR!

Sua cabeça aparece pelo corredor e ela vem assustada. - Percy, o que...? Meu Deus!

- ME AJUDA, POR FAVOR! Q-QUANDO EU CHEGUEI ELE ESTAVA... ELA ESTAVA... ELE ESTAVA MACHUCANDO...!

- Meu Deus, v-vai ficar tudo bem. Calma. - Sua mão corre desesperadamente pelos fios loiros ensanguentados. - O... o q-que aconteceu?! Ela precisa ir direto a um hospital. Vocês dois!

A bagunça pela casa não a ajuda a achar o seu celular. Não quero pensar em um outro coma.

- Eu sei! Mas não! Ela não pode, ele vai achá-la!

- Ele quem?! - Sangue pinga no chão. - Bancada da cozinha! Coloca ela lá!

Minha mãe chuta qualquer coisa pelo corredor que esteja no caminho enquanto corremos. Annabeth continua desacordada. Nem se move.

Porra. Porra. Porra.

Tudo na bancada vai pro chão e minha mãe corre a mão por ela limpando. - A caixa de primeiros socorros, onde essa merda está?!

Coloco Annabeth deitada e ajudo minha mãe a procurar pelos armários. Ter xingado na minha frente mostra que está tão desesperada quanto eu.

- Ela... e-ela não pode morrer!

Abro uma porta e nada. E outra, e outra, e outra...

ONDE ESSA MERDA FOI PARAR?

- Aqui! Achei!

A maleta é grande nas suas mãos, mas minha mãe a coloca na bancada com impaciência.

- Ela não pode, mãe. Eu estava lá, eu vi tudo!

Não percebo que estou chorando até minha mãe estar segurando meu rosto entre suas mãos, minhas costas chocadas aos armários.

- Meu filho, se acalma. Precisa manter a calma, você está surtando.

- NÃO, MÃE! VOCÊ NÃO ENTENDE! - Continua gritando para que me acalme, mas não quero me acalmar! Ela estava sendo espancada! Na minha frente! - VOCÊ NÃO VIU, ELE ESTAVA EM CIMA DELA! ESTAVA SOCANDO E... E... CHUTANDO!

Seus braços me empurram para trás, mas não quero sair, não quero ir embora! Eu preciso ficar ao lado dela!

- Percy! Meu filho, entendo, mas se acalma! Você precisa se acalmar!

- EU NÃO QUERO SAIR DE PERTO DELA, EU QUERO AJUDAR. ELA ESTÁ SANGRANDO!

- Mas nesse estado você só vai piorar as coisas! - Continuo resistindo aos seus empurrões. Não quero sair. - Por favor, Percy, estamos perdendo tempo.

- ELA NÃO PODE IR A UM HOSPITAL, O PADRASTO DELA SUBORNA TODOS, ELE VAI ACHÁ-LA! - Preciso ficar perto dela. - ELA ESTAVA SENDO ESPANCADA! ELE CUSPIU NELA! ELA NÃO PODE FICAR EM COMA DE NOVO, MÃE!

Seus olhos se voltam para Annabeth e ela me solta. - A garota... - Volta a me encarar. - A garota que teve traumatismo...

- FOI ELE! ELE A ESPANCA DENTRO DE CASA! ELA É ABUSADA POR ELE!

- Percy, vá buscar o meu celular na sala.

- Por q...?

- Só vai, estamos perdendo tempo.

- Vai ligar pra polícia? Eles vão querem levá-la!

- Não vou. Me escuta, só pegue. 

Atravesso o corredor até a sala e reviro tudo até encontrar. Volto correndo.

A porta está fechada.

Trancada.

- Mãe! - Empurro de novo. Nada. - ME DEIXA ENTRAR! ABRE! ELA VAI MORRER! EU PRECISO AJUDAR! ABRE!

Ela não volta para abrir. Ela nem mesmo me responde!

Chuto a porta com raiva.

- ME DEIXA ENTRAR!

- PERCY, SE ACALMA! ASSIM SÓ VAI PIORAR AS COISAS!

- NÃO QUERO FICAR CALMO, ELA PRECISA DE AJUDA, ELA VAI MORRER!

- EU ESTOU TENTANDO AJUDAR, DROGA! - Consigo ver sua sombra se aproximando da porta, mas ela não abre. - E não tente entrar pelo outro lado. Está tudo trancado.

- Mãe, por favor...

- Percy, se acalma, você está no meio de um surto.

Sua sombra se vai quando chuto a porta. Sinto meu corpo fraquejar em direção ao chão. Só agora percebo o quanto estou chorando.

Ela vai morrer e eu não posso fazer nada.

Não vou poder fazer nada.

- Mãe...

Um arguejar de surpresa na cozinha me deixa mais louco.

- Meu Deus!

- Mãe! Mãe, o que aconteceu?!

- Percy, não entre, ela não está vestida!

- O... o que a senhora está vendo? O que vai fazer? Ela está muito ferida?!

Bato na porta com raiva. O que está acontecendo lá dentro?

- EU JÁ FALEI QUE NÃO É PARA VOCÊ ENTRAR!

- EU QUERO AJUDAR, ELA VAI MORRER! O QUE ESTÁ ACONTECENDO?!

A porta se abre rapidamente e eu levo um susto. Antes de olhar por cima do ombro da minha mãe, sou empurrado.

- Vá buscar o carro e o deixe estacionado aqui na porta. Ela precisa de ajuda agora.

- Hospital, ela não po...

- FAZ O QUE EU ESTOU MANDANDO, PERCY!

Ela não precisa falar duas vezes, porque já estou correndo pela porta. Annabeth não pode morrer.

Busco o carro e corro em disparada até a cozinha. Minha mãe está saindo com ela no colo. Passo os braços por baixo dos joelhos de Annabeth e entro com ela no banco de trás. Seguro o seu corpo como se estivesse segurando uma boneca. Ela não reage.

Ainda há sangue nas nossas roupas. Minhas mãos estão tremendo tanto que tenho medo de soltá-la. A aperto junto a mim. - Vai ficar tudo bem.

Minha mãe assume o volante.

Não sei para onde estamos indo, mas não posso impedir qualquer meio de socorrer Annabeth. 


 


Notas Finais


*Esse é o número do Centro de Valorização da Vida, ele varia em cada país, esse é o do Brasil. A fic se passa nos Estados Unidos, mas achei melhor colocar o nosso.
A qualquer um que esteja numa situação muito difícil, lembre-se que há sempre alguém disposto a ajudar.

Não quero sempre ter de pedir tantas desculpas pela demora, mas sempre acabo pedindo. Me desculpem. As coisas não andam bem e eu sou uma mentirosa.

Do fundo do meu coração, espero que tenham gostado. Porque vocês esperaram muito, e não mereciam menos do que um capítulo bem grande.

E me desculpem também por não ter respondido alguns comentários do capítulo passado. Quis atualizar a fic logo de vez.


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