- ...Rachel!
- Tá de brincadeira, né? - Pergunto confuso. - Ela é nossa amiga.
- Estou vendo isso mesmo? Percy Jackson desistindo de um desafio?
Tudo bem, poderia ser pior,
poderia ser a Monstrinho. Mas ainda assim.
- Não seja tonto. Eu não disse isso, só estou surpreso pela escolha sobre a Rach.
- Você não precisa partir o coração dela, nem magoá-la. Ela nem precisa saber. Você pega. Ganha a aposta.
- Tudo bem, feito. E Grover, antes uma pequena observação, partir o coração e magoar não é a mesma coisa?
- No seu caso podem ser duas coisas totalmente diferentes, mas você tem a proeza de conseguir fazer as duas burradas.
- Ei! - Ele está me chamando de burro? Que otário. - Não sou burro e não vou fazer isso, né? E aliás, qual é o prêmio?
Me sinto mal assim que pergunto. Rachel é uma garota legal, uma amiga legal. Não somos muito próximos. E não haveria nada de ruim ficar com ela sem nada em troca. Mas pelo simples fato de achar que ela tem uma queda por mim, sempre achei melhor evitar. Se nos beijarmos, vou tomar cuidado para parecer coisa de momento. Já estou sendo babaca o suficiente por ter aceitado isso.
Grover franze as sobrancelhas. - Não sei, vou pensar a respeito.
Grover está estranho.
Ele sabe como ativar meu lado
competitivo e ofendido, sempre apostamos coisas um com o outro. Certa vez apostamos
quem comia mais enchiladas. Claramente não existe sensatez em mim, porque se existisse,
não me permitiria entrar naquela. Ninguém venceria do Grover nessa. Mas sempre foram
coisas bobas, relações humanas nunca foram do interesse do Grover.
Mas decido não comentar.
E seguimos juntos até o final do corredor, onde me viro e nos despedimos. Vou para a sala.
Entro e me sento no fundo, nas últimas carteiras, assim não me misturo com os nerds, que sempre prolongam as aulas, os professores não me incomodam tanto e fico perto da galera que eu gosto. Minha turma. Realmente pertenço à galera do fundão.
Dédalo, o professor grande-gênio, entra na sala. Eu o odeio. Puxa o saco dos mais inteligentes e faz o resto da turma parecer insignificante.
E não é nada inesperado que já chegue colocando matéria pessada no quadro. Qual é? Ainda estamos no terceiro dia, primeira aula dele. Dá um desconto.
Abro o caderno, mas acabo cedendo à vontade de discretamente colocar meus fones de ouvido. Desvio a cabeça, tentando me esconder sempre que Dédalo se vira para olhar. Finjo prestar atenção na aula. Nessas horas que a vontade de melhorar minhas notas vai para o espaço. Irei culpar meu déficit de atenção, provavelmente. Depois terei que me resolver com o treinador e minha mãe. Encaro a turma um por um. Todos parecem ocupados demais.
O tempo passa depressa. Quando vejo, o sinal já está tocando a hora de ir para a aula de filosofia. Mais uma das matérias que tenho dificuldade, não consigo acompanhar todo o conteúdo tão rápido quanto os mais aplicados.
Esbarro com alguém e seguro os ombros de quem acabei empurrando. Sarah. Morena, alta, do clube de teatro. O sorriso que dá me desperta segundas intenções. Demoro um pouco para retribuir o sorriso.
- Foi mal, estava distraído.
- Doeu. Não quer me dar um beijinho pra parar de doer?
É, estava certo na parte das segundas intenções. Não penso muito e a puxo pela mão até o canto da parede para sairmos do caminho e a encosto nos armários de maneira discreta. O beijo é calmo e bom, seus lábios são carnudos e macios. Sarah apoia seus braços na minha cintura e retribui o beijo. Ouço algumas risadinhas a nosso redor.
- Deveríamos ir para um lugar mais calmo. - Fala. Só que entendo suas intenções. Falsa inocência. O que diz é moralista e decente, mas a maneira como avança com mais ânsia em mim quando uma garota passa, lhe entrega. - Todos estão olhando.
- E isso importa? Eu não me importo. - Pergunto. Decido fingir que caio na sua enganação para não atrapalhar o momento. Mas me importo. Esse tipo de coisa me incomoda. Se fosse somente atração, talvez eu não me importasse, mas não é. É o status que eu tenho a oferecer. Um meio.
Situações assim não me pegam desprevenidos ou me enganam, eu já estou acostumado. Tenho conhecimento que a maneira libertidosa que ajo, e comportamentos egoístas que tenho, não são dos padrões mais certos. E andar com gente que tem as mesmas atitudes comigo e contra mim, me deixa mais ciente como funcionam as coisas à minha volta. Ainda assim, eu gostaria que todos fossem mais sinceros.
Escuto Thalia, minha prima, passar e resmungar um xingamento e praguejar contra nós. Sempre adorável.
Nos separamos. O beijo foi bom. Ela me encara maliciosamente agora, seus olhos na mesma direção dos meus. Sua abordagem mudou?
- Percy, isso foi tão...
- Tenho que ir agora, depois a gente se fala, Sarah.
Vou direto para a sala. Me dirijo ao fundo, quando noto a Monstrinho. Então teremos mais essa matéria juntos. Ela está com um caderno em mãos, parece ser um caderno de desenhos, e inutilmente tenta escondê-lo de mim, mas eu já vi.
Aos poucos a sala começa a encher e o professor entra logo atrás. A aula passa normalmente, como qualquer outra, ou seja, entediante. Adam, nosso professor, fala sobre Platão, o filósofo. Mas é só até aí onde presto atenção até perder o foco. Começo a observar as palhaçadas feitas pelos Stoll, que vez ou outra sabotam coisas na sala, como a cadeira do professor, o ar condicionado e outras coisas. Também escrevem besteiras no quadro, tão rápido que ninguém percebe, e isso deixa o professor furioso e confuso, e a sala às gargalhadas. Todos sabem quem faz tudo isso, e até mesmo o professor, mas não tem provas. Realmente, os Stoll têm talento para o crime.
Quando o intervalo chega, vou direto procurar meus amigos.
Conversava com Luke e Grover quando algo me chamou a atenção. A Monstrinho escrevia alguma coisa em seu caderno, o mesmo que vi em sala de aula.
- Luke, depois você me fala.
- Por que? - Quer saber. Aponto com a cabeça na direção da garota e ele logo entende e solta uma risada. Olha ao redor procurando algo.
- Surpreenda-a.
Solto uma risada. - Pode deixar.
Ela está em uma área afastada, perto do gramado do jardim, isolada. Não vejo Thalia do lado dela, isso talvez entristeça Luke. Ela se encontra toda distraída.
Me aproximo e vejo o que faz. É um desenho detalhado e perfeito, uma réplica completa de uma mulher. A mulher do desenho é muito bonita. O desenho é preto e branco, mas posso perceber alguns detalhes dela, ela tem médios cabelos negros e cacheados, olhos claros e um sorriso cativante. Muito bonita. Parece ter uns trinta anos.
A Monstrinho está de costas para mim, então ainda não me notou observando. Chego mais perto e a surpreendo, ela leva um susto. Tiro o caderno de sua mão.
- Ei, o que tem aqui? - Folheio o caderno. Há mais desenhos dessa mulher e de paisagens, e algumas delas eu reconheço, como o Central Park. Têm mais desenhos também, como rabiscos e figuras. - Uma artista? - Pergunto. Ela não me olha nos olhos. Ela nunca me olha nos olhos. Há desenhos de rostos de alunos que reconheço de vista. Stalker esquisita do caralho.
- O que foi? Um gato comeu sua língua? Fala alguma coisa. - Falo me aproximando. Ela sequer levanta o rosto para falar comigo. - Essas pessoas sabem que estão sendo desenhadas?
- P-por favor, m-me devolve o meu caderno. - Tenta pegá-lo de mim. Pelo menos alguma reação. Levanto-o no alto, acima da minha cabeça.
Ela não conseguirá alcançá-lo aqui nem se ficasse na ponta dos pés. Isso me diverte. Sua baixa estatura é um bônus pra mim. Consigo pegar mais no seu pé partindo disso.
- Por favor. - Escuto seu sussurro. Apesar de bem baixo e para dentro. Mas não lhe devolvo o caderno.
Não me importo. Ainda mais tendo visto que se esgueira por aí para desenhar escondido as pessoas.
- O que aconteceria se eu... - Finjo rasgar o desenho que ela estava fazendo. Ela parece entrar em desespero, mas ainda assim não me encara.
- Não, p-por favor, não faça isso. - Fala um pouco mais alto dessa vez, quase audível, desesperada. Consigo uma reação, uma emoção. Algo além do desprezo.
Sua franja cobre os seus olhos junto com seu óculos enorme, que cobre metade da cara, mas consigo notar um curativo no canto da sua testa, entre alguns espaços nas suas mechas de cabelo. Todos nós já estamos acostumados em ver a Monstrinho atrapalhada cheia de curativos toda vez. Sempre descuidada. Sempre caindo por tudo. Sempre de açúcar.
- Não faz, é importante.
Ela tenta alcançar de novo, sem sucesso. Alguma coisa no que fala me faz me arrepender do que eu estou fazendo, ou quero fazer. Implicar com seu desenho parece idiota.
Até notar o que eu estou pensando, o que estou cogitando e com quem. Me arrependo disso. Ela não é uma coitada, é a sonsa do colégio. Ter esse tipo de pensamento piedoso com ela é um desperdício, ela não liga para ninguém, por que alguém deveria ser piedoso com ela? Não deve ser piedade, é pena mesmo. Pena dela ser assim. Ninguém suporta gente assim.
- Por favor.
Sem pensar mais, rasgo o desenho ao meio e jogo nela a folha. Empurro o seu caderno de volta pra ela.
- Patética.
Ela parece estar em choque, seu corpo treme. Posso ver pela maneira como segura o caderno no peito. Encara a segunda parte da folha no chão. Cínica. Digna de pena. Não de mim.
Saio e vou em direção a Luke, que me espera do outro lado do jardim. Ele tenta sorrir, mas está com uma cara estranha.
- E então?
Sei que acompanhou o que aconteceu.
- Só achei que você demorou um pouco, Percy.
- É, tentei puxar um papo maneiro com a Monstrinho, sabe?
- Brincando com a presa? - Sorrio.
Luke me encara sério. - Um dia a caça se vira contra o caçador e a presa se torna livre, hein.
Por um segundo fico confuso com a declaração, tentando entender a seriedade momentânea e aleatória do Castellan, mas ele cai na gargalhada e eu começo a rir também.
- Babaca.
POV. Annabeth
Engulo o choro que está preso na minha garganta. Vejo-o se afastar satisfeito. Odeio admitir o medo que sinto quando ele chega. Fiquei com muito medo e ainda estou, é desesperador saber que a pessoa que te odeia está bem perto a ponto de poder fazer qualquer coisa contra você e você não conseguir fazer nada para o impedir, a não ser tentar se proteger.
Olho para o chão, para o desenho do retrato da minha mãe. Uma enorme vontade de chorar toma conta de mim, mas seguro, soltando apenas pequenos soluços que não consigo conter. Olho para as minhas mãos e percebo que elas estão tremendo; digo, não só elas, como eu inteira estou me tremendo toda.
Ninguém quer estar na minha companhia, isso é um fato que eu já aprendi. Mas burlar a raiva das pessoas é a parte difícil, eu não consigo me esconder sempre. Muitas vezes, não entendo como Thalia sempre está por mim ou me aguenta como sua amiga por tanto tempo, eu sei que sou trabalho e sou chata de suportar. Sequer o que existe da minha família quer algo comigo.
O sinal toca me assustando. Não quero ir pra aula, não assim. Vou matar esse tempo e o próximo. Não quero encontrar com eles de novo por aí.
Guardo o meu caderno de desenhos na minha mochila e sigo em direção ao campo de futebol do colégio, que a estas horas está vazio. Me sento nos últimos, e mais altos, degraus da arquibancada e coloco meus fones de ouvido.
O vento que bate, e a música que toca, me fazem viajar.
Como eu posso dar certo? Não tenho opções. Tudo o que já tentei para melhorar ou fugir de toda a merda que se tornou a minha vida, fracassou. Ainda mantenho uma esperança idiota de que me esforçando poderei ser aceita, mas o que me garante isso? Na verdade, aceita não, deixada em paz. Sei o que sou para muitos: um desperdício de espaço. E nessas horas, cogitar secretamente a ideia de suicídio, não parece tão errado. Seria mais fácil, certo e vantajoso. Me livraria de toda a dor e eu não continuaria a ser um peso. Libertaria até a Thalia da sua rotina de me proteger. Não faria diferença significativa para a escola, todos me odeiam mesmo. Ninguém sentiria minha falta.
Seco as lágrimas que insistem em cair.
Pensar na vida é uma merda.
Pensar na minha vida é uma merda.
Às vezes sou bastante invejosa. Queria ter os cabelos escuros da Drew. Queria ter cabelos escuros para ser mais respeitada. Sendo loira, tenho que me esforçar ao dobro para pelo menos não me chamarem de burra. Queria ser alta e magra como as líderes de torcida, elas são perfeitas, têm as medidas certas e são lindas. O padrão de beleza que todos consideram ser uma mulher sexy, forte e ousada, três características que uma garotinha como eu não tem. Queria ter olhos de qualquer outra cor do que os meus olhos cinzas, chamam atenção por serem incomuns, e atenção desnecessária é o que eu menos quero. Quando mais nova, meus olhos eram as características que mais gostava em mim. Olhos cinzas, diferentes. Agora, são pra mim um acréscimo desnecessário de aborrecimento. A cor dos meus olhos não me serve de nada, não enxergo melhor com eles ou tenho um tipo de vantagem, agora são para mim um alvo fácil de piadinhas sobre anormalidade. Queria...
Sou retirada dos meus devaneios por um barulho vindo detrás da arquibancada. Pulo de susto.
Espero os batimentos cardíacos normalizarem.
Desço devagar e me esgueiro escondida, próximo de onde vem o som. Quando vejo o que é, sei que metade das garotas do colégio se matariam para ver o que eu estou vendo. William Solace se preparando para tocar algumas notas no seu violão. E agora posso falar por mim mesma que o que dizem sobre ele ser talentoso é verdade. Ele é o perfeito garoto de ouro. Dentes perfeitos, rosto perfeito, talentoso e estiloso.
Reconheço a música, é do Bruno Mars. As notas fluem perfeitamente afinidas.
Ele canta com os olhos fechados, sentindo a melodia da música. Está tão tranquilo que não me parece aquele Will Solace falante e intocável que todas as meninas falam. Tranquilo.
Não consigo sair do lugar, é tão bonita e harmoniosa a música que toca, que uma sensação de paz, que eu não tenho há muito tempo, me faz ficar. Me acalma.
Solace abre subitamente os olhos extremamente azuis me assustando, me encara surpreso. Só que em menos de um segundo, sua expressão muda, e eu tenho certeza do que vem pela frente.
- O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO AQUI? - Sua expressão agora é raivosa, hostil, totalmente diferente da que antes se fazia aqui presente.
- Hã... eu... eu... eu só estav...
- Você não deveria estar aqui! - Ele se levanta abruptamente. Me encolho pelo seu tamanho.
- Me descul... - Paro de falar quando ele vem andando rapidamente na minha direção.
Me encolho a cada passo mais perto que ele chega. Sinto o medo e as mãos tremendo. As suas não são brutas, tem os dedos finos e longos como de um músico, mas ainda são bem maiores do que as minhas. Cruzo os braços, me afasto, e mais, e mais. Ele se aproxima com mais rapidez. Seus passos são duros. Tenho medo de olhar nos seus olhos. E-ele está furioso. Me culpo por ser tão burra ao ponto de ficar aqui observando e esquecer da vida, ficar do lado dele como alguém que eu não sou e...
Fecho os olhos esperando o soco, mas... ele não vem.
William passa por mim sem antes dar uma trombada com o meu ombro e resmungar um xingamento. Me desequilibro um pouco, mas continuo de pé, surpresa. Esperava um empurrão seguido de um soco, mas... eles não vieram.
Não aguento mais e solto as lágrimas que estavam guardadas há um tempo. Aproveito o silêncio para chorar um pouco. Não há mais ninguém aqui. Confiro dessa vez.
Decido matar também a próxima aula que tenho, língua estrangeira. Que no meu caso é alemão. Sendo a escolha do idioma praticado opcional. Oportunidade que meu padrasto me obriga a agradecer a ele constantemente, por pagar uma boa escola para mim.
Fico aqui até bater o sinal avisando o almoço. De qualquer forma, eu tenho de achar um esconderijo novo, talvez o banheiro das meninas do segundo andar, é meio vazio.
Sigo o caminho saindo do campo do colégio. Infelizmente preciso passar pela praça de alimentação, o zoológico, para ir até o meu destino.
- Annabeth! - Tomo um susto ao sentir uma mão tocando meu ombro, junto com o grito. Thalia. Puta merda.
- Que susto!
- Estava te procurando. - Continua. - Onde estava?
Não gosto de mentir para Thalia, mas é necessário, nunca lhe diria que eu estava com medo de voltar para as aulas depois de Perseu ter me surpreendido.
- Estava dando umas voltas por ai só para esfriar a cabeça, sabe? - Thalia me encara. - Não estava muito afim de assistir as aulas.
Percebo que Thalia não cai muito nesse papinho de "esfriar a cabeça", mas fica quieta. Mais tarde provavelmente vem tirar as dúvidas.
Com Thalia aqui do meu lado, desisto da ideia de passar o horário de almoço na cabine do banheiro. Vamos em direção a fila da cantina. Olhar para a bandeja de Thalia me deixa enjoada. Muita comida. Pego uma maçã.
- Só vai pegar isso?
- Não estou com tanta fome.
- Annabeth...
- Está tudo bem, Thalia. - Sorrio. Tenho uma teoria. Sorrir, mesmo que um sorriso vazio, mas sempre sorrir, assim ninguém nunca desconfia de nada. É um bom disfarce. Sempre que alguém sorridente diz ter depressão ou algum transtorno, as pessoas falam "Eu nunca imaginaria".
Nos sentamos em uma mesa mais afastada. Fico observando Thalia comendo enquanto fala sobre um tal garoto que conheceu em uma festa e em como a tagarela da Dare lhe dá nos nervos. Não consigo entender como o assunto foi parar nisso, mas sorrio disso. Acho a Rachel um pouco faladeira demais, mas ainda assim uma boa pessoa. Pelo menos, o que aparenta ser.
Thalia para de falar e olha para um ponto em questão atrás de mim, me viro para saber o que é. Luke. Luke é o que a Thalia tanto encara. Luke encara de volta Thalia, que mantém o olhar na mesma altura que o dele, nenhum dos dois parece intimidado. Bom, não intimidado ainda, né? Porque Thalia não está com aqueles seus olhares assustadores. Aqui está havendo um confronto silencioso que só eu pareço estar notando.
Nicolas chama Luke, que vira a cabeça para falar com o amigo. Pigarreio. Thalia volta o olhar pra mim e pergunto com os olhos o que foi aquilo. Ela faz uma careta como quem não liga, então decido esquecer, Thalia é osso duro de roer.
Mordo minha maçã. O sabor dessa maldita fruta é delicioso. Sei que não devia estar comendo isso, estou cada vez mais gorda, mas depois que dou a primeira mordida, sou incapaz de parar. Avanço a pequenas mordidas saboreando a fruta na minha frente.
Depois de terminar a maçã, olho ao meu redor para notar se alguém viu. Ninguém, ainda bem. Nem Thalia. Thalia terminou sua refeição ao nível extremo. Que rapidez!
- Que foi, Annabeth? - Fala me dirigindo uma careta engraçada devido a sua confusão. - Está me olhando com uma cara de cu.
Sorrio. Só Thalia Grace mesmo para me fazer sorrir com coisas bobas.
- Nada, punk. Só estava pensando.
- Pensando em que? Em como eu sou linda e você estava apreciando minha beleza me contemplando com seu olhar de volúpia e desejo?
- O que?
- Pensava sim, e ainda pensava mais, pensava em como eu sou gostosa e em como você admitiria ser uma sapata safada que quer meu corpo nu. - Dou um tapa nela, mas acabo rindo também. Ela sabe que fico sem graça com essas brincadeiras.
Thalia acaba saindo da pose séria e convencida para rir e implicar mais um pouco comigo. E eu gosto disso. Desses momentos leves. Me fazem esquecer de um bocado de coisas.
Até que a situação muda. Thalia agora me encara com seriedade e eu me pergunto o que houve. Não entendo a súbita mudança de humor assim de repente. Ela continua me encarando.
- O que foi isso no seu rosto, Annabeth? - Me pergunta. - E não estou perguntando o que aquele idiota do meu primo te causou. - Thalia agora tem as mãos fechadas em punho. Demonstra raiva só em mencionar o nome do Perseu e o meu na mesma frase.
- Ah, isso... não foi nada, você sabe o jeito que eu sou, toda estabanada. Estava vindo para o colégio e caí da escada lá pelos últimos degraus, e ralei um pouco a testa, então coloquei um curativo pra disfarçar e você não perceber como eu sou anta e me zoar, mas, como a tentativa foi falha... TCHAN-RAM, surpresa! - Tento com a maior cara lavada que posso. Por dentro me sinto angustiada, com medo dela não acreditar. Droga, Thalia.
Thalia mantém o olhar focado em mim, com aquele par de olhos azuis penetrantes, séria. Depois parece ceder e acreditar na história, soltando um risinho e um só você mesmo, Annabeth.
Que alívio.
(...)
Como ainda não havia escolhido minhas aulas extra-curriculares, estou com os últimos horários vagos. Aproveito que estão vazios e vejo os grupos na lista dos clubes que eu poderia ocupar nesses últimos tempos de aula. Fico confusa entre o clube de matemática e o grupo de leitura. Nada que eu queira de verdade, mas preciso preencher com alguma coisa. Esses dois grupos costumam ser bem escassos. Opto pelo grupo de leitura, escrevo o meu nome e saio do quadro para a biblioteca. Thalia disse que estaria na sala 13 com Brady, um garoto rockeiro do terceiro ano e, que qualquer coisa, era só chamá-la. Tá bom. Está louca se pensa que eu vou atrás dela sabendo que ela está com um garoto aos beijos em uma sala vazia. Sou idiota, mas nem tanto.
Passo o tempo na biblioteca, e quando vejo o celular, já está na hora de ir para casa. Me despeço de Thalia e a vejo seguir com seu carro. Observo-a esperando não ter nenhum sinal dela para seguir duas ruas até chegar à minha casa. Já é muito deixar que Thalia me traga até aqui, e imaginar deixar que ela me traga até a porta de minha casa? Não, sem chance.
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