Hueco Mundo
Os dois dias passaram rapidamente. Orihime parecia não estar mais tão preocupada, mas no fundo estava. Ulquiorra apoio-a em tudo o que ela necessitava. Inclusive desleixou-se nas suas tarefas habituais de líder para tomar conta dela, passar mais tempo com ela.
Ele sabia que era difícil para ela. Estava entre a espada e a parede. Ela não queria ter de optar por um lado… Ele sabia que ela o amava, que gostava de todos os espadas. Mas ela também gostava de seus antigos companheiros. Não os queria desiludir ou ferir.
Gostava de tomar a dor dela. Ser ele a sofrer em vez dela. Mas isso não era possível. Por isso fez de tudo ao seu alcance para a consolar.
Eles despediam-se dos seus amigos. Ou melhor, a Orihime despedia-se. O Ulquiorra permanecia em silêncio. Abriram uma garganta e foram para o Mundo Real.
Mundo Real
Na loja de Urahara encontravam-se Ichigo, Rukia, Sado e Ishida, para além de Yoruichi e Urahara. Eles foram chamados pelos ex capitães da Soul Society.
- O que se passa Yoruichi-san? Porque nos chamou a todos? Aconteceu algo?.. – Ichigo começou logo com um monte de perguntas mas fora interrompido.
- Are, are… Não mudas nada Ichigo. Aconteceu algo sim, mas não somos nós que vamos contar. – Ichigo iria abrir a boca para fazer outra pergunta mas calou-se ao ver o olhar mortífero dela.- Vai à casa de Inoue Orihime. E lá saberás tudo o que precisas de saber…
Todos arregalaram os olhos de espanto. Como assim? A casa da Orihime? Um ambiente tenso penetrou no local. Ambos sentiam a falta da sua amiga. Sentiam uma dor forte só de lembrar do seu sorriso.
Urahara tinha o chapéu a cobrir os olhos, era indescritível a expressão do seu rosto.
- Vai agora Kurosaki, e lá as tuas dúvidas serão esclarecidas. – Ichigo levantou-se sem reclamar. Era das poucas vezes que o vendedor não usava um tom brincalhão. O assunto devia ser sério. Mas antes de abrir a porta ainda ouviu- Não te enganes pelas aparências, ouve tudo o que tem de ser ouvido. Controla as tuas emoções.
Confuso. Ichigo não percebera aquele conselho, por isso pensava nas suas palavras para não se esquecer delas. O que o poderia esperar na casa da amiga?
Eles mal chegarão a sua ex casa, entraram logo nos gigais. Estava tudo pronto, agora era só aguardar. Esta era a pior parte. A ansiedade os consumia, principalmente a ela.
A qualquer momento Ichigo iria entrar por aquela porta e o seu coração acelerava ao perceber que o momento estava cada vez mais próximo. Ulquiorra também estava inquieto mas conseguia disfarçar o seu nervosismo. Decidiu sentar-se no sofá, estaria um pouco escondido. Caso o shinigami entrasse não o veria logo. Assim ele não iria explodir. O que era mais provável se notasse logo a sua presença. Talvez se ele a ouvisse primeiro, ficaria mais calmo. Talvez.
A porta abriu-se lentamente. Na opinião de Orihime depressa demais. Ichigo estava receoso do que poderia encontrar ao abrir a porta, mas tomou fôlego e abriu logo a porta de uma vez.
Não era possível. Ela… ela… estava viva? Como? Surpresa e confusão estavam claramente expressas no rosto do ruivo. Até que uma onda de alegria tomou o seu ser e ele correu para a abraçar. Agarrou-a pela cintura e levantou-a no ar, rodopiando com ela. Chorava de alegria. Não cabia em si tanta emoção.
Ulquiorra não saíra do seu lugar. Fechava o punho com força. Se não fosse a situação delicada em questão, ele o quebrava ao meio por tocar na sua Hime. Mas não podia… Isso iria arruinar tudo. Tinha de se controlar, por ela. Continuava com os punhos cerrados, cravava as unhas contra a palma da sua mão e usara força demais. Acabou por ferir-se. Sangue escorria da sua mão… Mas não tanto quando o seu coração. Ele sabia que ela o amava, mas não gostava do shinigami. Temia que ele a levasse de si, outra vez.
Orihime ria nervosamente e pediu educadamente que ele a colocasse no chão. Estava de certa forma feliz. Até agora tudo corria bem… A sua reacção não fora tão má quanto pensara.
- Como… Como estás viva? Eu vi… tu… estavas…- Ichigo não conseguia acabar a sua frase, doía só de pensar. Ainda por cima por sua causa.
Ora, agora sim vinha a parte complicada. Como? Como iria explicar que sobrevivera tornando-se no ser que ele mais despreza? Aqueles que ele faz de tudo para destruir... Que agora era um dos que uma vez a raptaram e quase mataram. Que diria? Que passou para o lado do traidor? Que era uma traidora?
Ele esperava uma resposta dela, e estava a começar a ficar impaciente. A Inoue percebeu que ele não gostava da demora da resposta. Mas ela não conseguia falar! Tinha um nó na garganta que a impedia falar. As palavras morriam antes de saírem. Decidiu agir. Se não podia lhe contar de uma maneira, ele ficaria a saber de outra. Ele veria com seus próprios olhos.
Ela saiu do gigai. E viu a expressão dele. Oh se viu! Dor, incredulibilidade, susto… Ela estava a ficar agoniada. Sabia que a partir deste momento a conversa iria ficar complicada, iria tomar um rumo diferente…
- Uma vez que um humano… morre no Hueco Mundo… ele reencarna em hollow… - Orihime explicou de cabeça baixa. A franja tapava os seus olhos, sendo impossível para ele ver os olhos dela marejarem.
Ele iria começar a gritar, que não era possível, que não acreditava… Que esta não era a sua amiga! Ela não viraria um monstro! Mas foi aí que lembrou-se. Como um estalo. O conselho de Urahara! Ele já sabia. E por isso o alertou… Mas isso só queria dizer… Que era tudo verdade… Como ele poderia lidar com aquilo?
- Kurosaki-kun? Sentes-te bem? Por favor, por favor diz qualquer coisa. Não faças essa cara… Por favor… Não me magoes com o teu silêncio. – Ela não aguentava mais, lágrimas faziam o percurso dos olhos até o queixo da menina.
Mas ele continuara incrédulo. A sua mente não aceitava a dura realidade. Estava paralisado, os músculos não obedeciam às ordens do seu cérebro.
Num momento Ichigo estava em pé, no outro estava contra a parede com a mão na face onde levara um soco. Mas quem? Quando procurou o responsável, qual foi o seu espanto ao ver quem era. Explodiu.
- O QUE FAZES AQUI!? – Ichigo apontava o dedo contra o quarto espada que mantinha-se indiferente. O ruivo ficava com mais raiva por estar a ser completamente ignorado. Aí ouviu um baixo soluço da menina. Notou que ela chorava mais agora. Finalmente, fez-se luz da sua cabeça e compreendeu a situação. Era de esperar depois de como ela morreu… Sorriu cínico.
- Vocês estão juntos… - Não era uma pergunta, mas sim uma afirmação. Não esperava uma resposta. Ele estava muito desiludido, não acreditava que depois de todo o mal, ela ainda o ama. O silêncio da moça só confirmou as suas suspeitas.
Virou-se de costas pronto para partir. Mas não sem dizer.
- Foi tudo planeado não foi? Tu quiseste morrer de propósito! Assim tornavas-te no mesmo monstro que eles! Livravas-te dos teus chatos amigos que arriscaram a vida para te salvar! Cansas-te de nós e agora passas-te para o outro lado… Não foi isso INOUE? – Ele não controlava o que dizia, só queria que ela se sentisse como ele. Atraiçoado. Sentia que todos os seus esforços foram em vão.
Ulquiorra não acreditou no que ouviu. Ele esperava tudo menos isso. Ele contava que o shinigami se virasse contra ele, que o culpasse pela morte da moça e que lutasse com ele para o matar. Mas virar-se contra ela? A sua amiga? Inaceitável. Ele saiu do gigai pronto para colocar o ruivo na ordem. Mas a cena que se seguiu o surpreendeu.
Kurosaki Ichigo tinha a cara virada de lado. Um tom avermelhado sob a forma de uma mão apareceu na sua face direita. Ele olhou incrédulo para ela. E viu algo que nunca pensou ver no seu olhar. Ódio. Mágoa contra si. Foi aí que tomou consciência das suas palavras, e arrependeu-se amargamente. Agora entendia o que Urahara tentara o avisar. Mas ele não percebeu. Agora era tarde demais, o mal já estava feito. Amaldiçoava-se internamente. Como não percebera? Eles estavam em gigais, não queriam lutar mas sim explicar.
- Eu compreendo a tua raiva contra mim. Que te sintas traído… E lamento causar tanta dor na tua vida. Lamento ter sido um fardo para ti – A voz da rapariga estava carregada de mágoa- Mas não aceito que por minha culpa chames os outros espadas de monstros. Ulqui-kun, Nell-chan, Gimmy-kun, Szazel-kun… Nenhum deles é um monstro. Pelo contrário. São pessoas incríveis, que me orgulho de os ter conhecido. – Sorria ao lembrar-se dos seus momentos com os espadas- Foram eles que permitiram que a minha humanidade não morresse. E sou-lhes grata por isso. Não te admito a ti, nem a nenhum outro shinigami hipócrita que os chamem assim! Vocês não os conhecem! – Ela gritava e ele estava confuso, iria questionar o “hipócrita” mas ela não o deixou falar- Não! Agora falo eu! Não querias acusar!? Não querias discussão? Agora vais ter! Agora sou eu que te vou dizer umas verdades que estão aqui entaladas – Orihime colocava a mão na garganta e olhava para ele acusatoriamente, a cada momento que passava, a cada palavra proferida, Ichigo sentia-se pior- Falas que os espadas me tentaram matar mas esqueces-te que quem os manipulava era um shinigami? Ou melhor três! Falas que os hollows são monstros mas tu usas o nosso poder. Também não te lembravas não é? A tua máscara hollow, meu querido vaizerd. Se tu estás vivo, agradeço ao nosso poder. Caso contrário, a esta altura estarias morto. Monstros são aqueles que se consideram superiores, que acham que tem o direito de tirar a vida de outrem por não gostar dele e por isso dizem arranjam desculpas esfarrapadas para matar, “ele era um monstro”. Engraçado, o que te distingue de nós para além de estares vivo? Sim nós alimentamo-nos de outros hollows para evoluirmos, para sobreviver. Mas não és tu que usas um poder negro para sobreviver e salvar os teus amigos? Sim, nós matamos humanos por vezes. E tu quantas vidas não tiras-te já? Com que moral nos criticas? O que te faz melhor do que nós? Por seres um shinigami, por teres sentimentos e nós não… Poupa-me desses absurdos. Eu estou a namorar com o espada considerado mais frio. Acho que isso diz tudo.
Ulquiorra estava admirado, e orgulhoso. Não esperava que ela os defendesse com tal garra, que o defendesse dele.
Ichigo, por sua vez, sofria com o remorso. Sabia que magoou uma das suas poucas amigas verdadeiras, uma amiga de infância. Fora estúpido e inconsequente. Queria desculpar-se mas sentia demasiada vergonha para isso.
- Sai. – A voz fina voltou a pronunciar-se. O substituto de shinigami ia implorar pelo seu perdão mas ela não o queria ouvir ou sequer ver. Ele compreendia isso. Abaixou a cabeça em sinal de rendição. Esperaria um tempo, quando estivesse mais calma voltaria a falar com ela. Resolveriam o problema que ele próprio criou. – Mais uma coisa. – Ele prestou atenção máxima nas suas palavras.- Se envolveres a Soul Society nisto, não penses que abaixaremos a cabeça como uns cães sem dono. Nós lutaremos pelos nossos direitos, pela nossa dignidade. Coisas que vocês a nós não nos reconhecem. Nem que tenhamos de morrer por isso. – Fora um ultimato. Se ele criasse guerra contra os espadas, ela iria envolver-se nisso… pelo lado deles. Era uma declaração de guerra por parte dela. Olhou por breves momentos, chocado com a atitude dela mas logo desapareceu no shunpo. Sussurrando para o vento:
- Eu voltarei. Não como capitão de um esquadrão da Soul Society mas como Kurosaki Ichigo. Não envlverei outros shinigamis nisto. Tal como tu, não quero guerra.
Orihime caiu de joelhos no chão. Chorava e gritava de dor. Queria sumir. Porquê, porquê? Porque tudo era tão difícil?
Ulquiorra rapidamente a socorreu. Via o estado deplorável da sua amada. Sentia-se sufocado por não poder fazer nada. Sofria pela dor dela. Queria ajudá-la e por isso abraçou-a dando-lhe um leve beijo na testa para a reconfortar.
- Eu estou aqui. – Ele tentava encorajá-la com palavras doces. Ela agarrava-se com força nos seus ombros e chorava compulsoriamente no seu pescoço. Soluçava. Sabia que tinha perdido os seus amigos.
Ele carregou-a para a sua cama e deitou-se ao seu lado. Acariciava os seus longos cabelos. Enquanto ela o agarrava cada vez com mais força. Não parava de chorar. E Ulquiorra já estava a ficar desesperado por a arrancar não se acalmar de forma alguma. Sentia o peito a contrair-se com a dor, era insuportável aquela situação. Ichigo Kurosaki iria arrepender-se de a ter magoado desta forma! Mas por agora só queria que ela voltasse à normalidade.
Ela acabou por adormecer pelo cansaço. Ele no entanto manteve-se desperto a noite toda, vigiou o sono da sua onna.
Ichigo entrava no seu quarto. Tinha arranjado encrenca e das fortes. Tomou um banho gelado para resfriar a sua cabeça. Mas não funcionou. Sentiu que a cabeça estava a mil e que a qualquer momento iria explodir. Vestiu uma calça qualquer e foi abrir a janela do seu quarto para respirar ar puro.
- O que fixes-te Ichigo? – Rukia apareceu do nada assustando o rapaz, que quase caiu da janela. Ela o olhava séria.
- Não sei do que estás a falar Rukia.
Rukia não gostou dessa resposta. Ela chegou-se ao pé dele, fuzilava-o com o olhar.
- Não te faças de idiota, Ichigo! Eu já sei de tudo! Urahara e Yorichi contaram tudo para mim e para os outros… Eu conheço-te Ichigo, melhor do que tu pensas. Sei muito bem que ignoras-te o aviso do Urahara. – Ichigo abaixou a cabeça, sentia a culpa remoer-lhe outra vez, sentia-se encavacado por ter de contar os seus actos deploráveis- O que fizeste Ichigo? – Repetiu pela segunda vez.
Com a voz baixa, ele admitiu seus erros. Contou as palavras duras que lhe dirigiu. Da ameaça dela, tudo. A pequena shinigami abriu os olhos até mais não poder… A situação estava muito pior do que pensara. Se não fizesse algo, certamente a amizade deles estaria estragada para sempre.
Ela colocou a mão no ombro do rapaz, procurando reconforta-lo.
- Amanhã nós vamos visitar a Inoue-san. Vai lá ter depois… Fala com ela. E implora se for necessário pelo seu perdão. Não deixes escapar uma amizade de anos Ichigo. - Com isso ela afastou-se dele, deixando-o sozinho com os seus pensamentos. Abriu a porta do armário e olhou para ele uma última vez, antes de subir para a sua cama no armário e dormir profundamente.
Ichigo remoía-se por dentro. O que ele devia fazer para ela o perdoar? Conseguiria salvar o que restara da amizade com a ex humana?
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