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História Primavera de Rulim - Coisas estranhas acontecendo.


Escrita por: yuriPsouza

Capítulo 6 - Coisas estranhas acontecendo.


Era dia 31 de julho de 2014, uma quinta-feira.

Eu estava no ônibus rumo à escola, não queria acordar meu pai cedo já que ele iria mais tarde para a igreja hoje.

O celular tocava M. Pokora enquanto o percurso para a escola era encurtado a cada segundo. Fazia tempo que eu não ouvia músicas animadas assim, então estava estranhando a batida e ritmo de cada uma das canções.

A escola é perto de casa indo de carro, mas o ônibus faz mais curvas e demora quinze minutos adicionais, fazendo a viagem levar quase meia hora, tempo que era diretamente retirado do meu sono.

Quando cheguei na PMT, só Guilherme estava lá. Esperava encontrar Pedro e Dido também, mas Pedro não era de chegar adiantado ou atrasado, e Dido era do tipo que chegava atrasado isso quando chegava. Sinceramente eu nunca entendi o que Dionísio fazia no nosso grupinho porque ele era tão diferente de Pedro, Guilherme e eu, mesmo assim também era diferente do grupinho alternativa, o grupinho de José, João e Igor, os bagunceiros para não dizer coisa pior.

Boa parte da nossa turma já estava ali no pátio, vi que Desirré, uma das alunas do fundo da sala, estava aos agarros com George, também do fundo.

— Oi, Lucas. Tá bem? — Guilherme me recebeu. Karla também veio.

— Ei meninos. Vocês estão interessados em assinar a petição? — Ela perguntou em um tom alegre e descontraído.

— Petição? — Guilherme enrugou a testa, as sobrancelhas pesaram sobre os olhos, uma feição de dúvida. — Merenda que presta?

— Para tirar o professor de Biologia novo. Vamos levar direto à diretora.

— Não faz nem uma semana que o cara tá dando aula. — Eu disse. Concordava que ele era ruim, mas, ainda assim, nada sério o bastante havia acontecido ainda. E fora isto, era até que um bom professor.

— Ele é um machista estúpido. A Bianca tá organizando tudo já, vai ser feio pra ele! — Karla parecia ter voz própria, mas dava pra ver que era Bianca falando pela boca dela.

— A Bianca é precipitada. O professor pode ter um posicionamento errado, mas só falou o que pensa, não ofendeu ninguém em especial. — Guilherme afirmou. — Só vão perder tempo. — Terminou em veredito, Karla não conseguiria uma assinatura dele!

— Vai assinar ou não? — Ela ainda assim tentou, mas já em tom rude e os braços e fez uma cara de nervosa, a prancheta de lado, folha balançando.

— Não. — Guilherme disse decidido. — Agora não. As aulas nem começaram direito. Não quero me queimar com o professor na primeira semana!

— Lucas? — Então Karla desviou o olhar para mim como se eu fosse a última esperança da República para derrotar os Sith.

— To com o Gui. Fazer isso é pintar um alvo nas minhas costas. E eu preciso de notas esse bimestre.

— Faz um ano que precisa de notas. — Karla me disse em um gracejo falho, pra ela isso podia ser engraçado, mas era um problema sério para mim. — Assina, vai?

Balancei a cabeça. Ela rolou os olhos.

— Quem não se posiciona é porque compactua. Saibam disso. — Afirmou convicta que nós éramos tão machistas quanto o professor.

— Engraçado, porque não ouvi você falando nada na aula. — Guilherme rebateu enquanto ela se preparava para nos deixar.

Percebi que Bianca, lá do outro lado do pátio, grudava uma folha que dizia “Machistas não passarão” na parede.

— Porque a Bruna falou primeiro. — Karla se defendeu em um tom infantil.

Então o sinal tocou.

— Olha só, pra nossa sorte temos que ir andando, acho que vocês vão cabular a primeira aula, né? — Eu disse com um sorrisinho, algo que nem sabia que ainda sabia fazer.

— Estamos ajeitando a petição…

— Cabular então! — Guilherme apontou o caminho e nós dois saímos andando deixando Karla para trás com um rosto nervoso a nos encarar. Ele era muito estudioso, não cabularia uma única aula, já Karla, Bianca, eu, ou qualquer outro… cabulávamos facilmente.

Os alunos se dirigiam para as suas salas em conjunto, a conversa era alta e vários assuntos diferentes podiam ser ouvidos, uma mais irrelevante que o outro. O PMT é uma escola que só tem Ensino Médio, então não precisamos nos preocupar com fedelhos, só adolescentes (embora uns aqui sejam piores que crianças). E a escola tem essa boa reputação, os corredores no primeiro andar são repletos de prateleiras e armários com troféus e medalhas desde o começo da escola lá em 1980. Nos fundos têm uma quadra de futebol (vários prêmios decorrentes da nossa liga escolar), outra de vôlei e outra de basquete (essas duas também trouxeram alguns prêmios, mas menos que o futebol). A escola é basicamente dois grandes corredores, um para esquerda e outro para a direita com a diretoria no meio, quadras no fundo e pátio na frente. Nossa sala ficava na parte da esquerda no segundo andar, do outro lado tinha biblioteca, sala de cinema, laboratórios, estoque e mais coisas chatas, além de algumas salas em reforma e uma outra reservada para os outros prêmios da escola, como da liga de matemática, grupo de literatura, olimpíadas escolares… em grande parte foi por causa dessas coisas que, quando meu pai ofereceu que eu voltasse ao sistema particular, eu preferi continuar aqui, além, claro, de Elise, Pedro e meus outros amigos.

Agora, você pode pensar que eu deveria pensar no meu ensino e não em amigos, afinal, amigos sempre fazemos outros, mas eu escolhi o contrário.

Pedro chegou correndo quando entramos no prédio, ele vinha de ônibus também, mas morava um tanto que mais longe em comparação a mim e acordava mais tarde, justamente para dormir o máximo possível, o que era pura preguiça e falta de comprometimento, mas podíamos entrar até a segunda aula, então não era como se ele realmente se esforçasse para chegar em tempo.

— Nem esperam o amigo. Que vacilo. — Pedro disse brincando batendo no meu ombro e no de Guilherme, se inserindo no meio de nós dois. Ele era, afinal, o centro do grupo. — Cara, que coisa é aquela de petição? As minas tão bem louca, pendurando cartaz e tudo! Está parecendo até que a internet ganhou pernas.

Riu. Eu não respondi nada porque Pedro disse olhando para Guilherme. O que fiz foi olhar para trás enquanto chegávamos na escada, depois de subirmos as escadas eu voltei a olhar para trás, e repeti a ação quando chegamos na porta da sala.

— O que foi? — Pedro me perguntou enquanto ajeitava os óculos no rosto redondo de bolacha que tinha.

— A Elise ainda não chegou. — Eu disse, entrando na sala junto deles.

— Segunda aula. Conhece a gatinha. — Pedro disse rindo jogando a mochila em cima da mesa. — Ou, senta pra cá, mané.

Eu olhei para ele, embora quisesse sim sentar ali junto dos meus amigos alguma coisa me dizia que eu estava sobrecarregado com toda aquela conversa, então fiz uma recusa o mais educado possível dando de ombros e fui para meu lugar de costume. O que não era longe. Uma cadeira pra baixo e uma para o lado (Elise ficava entre nós e Karla atrás deles e ao lado de Elise).

Nesse dia a carteira da minha melhor amiga ficou vazia até a segunda aula. Depois veio o intervalo e nada. Ela tinha faltado. Eu não sei porque, mas isso me deixou preocupado e triste. Tinha me animado para voltar a socializar, e queria socializar com Elise, voltar a conversar com ela como conversávamos, voltar a ter aquela relação de amizade que tínhamos… E ela faltou. De certa forma eu fiquei bravo com ela, contava com Elise ali. E ela havia ficado em casa… para quê? Dormir?

Mandei duas mensagens no WhatsApp, ela recebeu, mas não visualizou.

As aulas continuaram tão chatas quanto era de se esperar em gramática com a professora Lucila e geometria com a professora Judite. Todas as vezes que Pedro tentava falar comigo ele pedia para me aproximar, Karla insistiu umas três vezes que nós assinássemos a petição, então parei de me aproximar para conversar com Pedro para evitar ter que negar os pedidos de Karla.

Então o celular vibrou com as mensagens de Elise

“Desculpa não ir, amanheci ruim. Acho que é gripe. Mas to bem, relaxa. Acho que nem vou amanhã, só na segunda que vem… É isso, bjão”. Eu li e ignorei, não tinha nada que podia fazer, embora fosse estranho essa gripe repentina, quer dizer, mesmo em São Paulo com o clima quente e frio constante as pessoas não costumam gripar de uma hora para a outra, ainda mais estando esbanjando saúde na véspera.

Quando pensei que voltar a me cortar fosse a única solução para sair do tédio que estava a última aula (que era de geografia), o inspetor Matarazzo chegou com uma pasta debaixo do braço para nos salvar da diversão da erosão.

Assim que ele entrou alguns alunos se ajeitaram nas cadeiras, mas no caso de alguns, Dionísio, José, e Natasha, que dormiam, foi necessário chamar a atenção. O mesmo valeu para Bianca, que conversava com outras meninas, avidamente, sobre o tema da petição (nunca vi tanto assunto sobre um ocorrido apenas).

— Atenção de vocês, por favor. Isso, todos em silêncio… Senhorita… Senhorita aí no fundo, você mesma, querida, quero falar se não for incomodo para ti!

Bianca se virou, bufando feito toro de boiada, para frente, cruzou os braços e ficou de cara feia olhando o inspetor enquanto alguns soltavam risinhos.

— A escola vai passar por um pequeno reajuste para receber novos alunos. Nada que vocês vão perceber no dia a dia, mas teremos mais gente nas salas de aula, em específico, serão alunos vindos dos Estados Unidos em intercambio. Devido à qualidade da escola nas avaliações do MEC fomos selecionados para recebê-los, então sejam gentis e receptivos com os novos alunos. Vamos manter a escola com a boa fama que está possuí!

Todos começaram a trocar olhares, mas antes que alguém perguntasse algo, Matarazzo voltou a falar.

— Também trouxe esses panfletos para levarem pra casa, é referente ao passeio que faremos em breve. Quem não veio hoje pode… — Ele contava o número de alunos na sala enquanto separava as folhas —… pegar mais na secretária amanhã, então avisem os amigos.

Olhei ao redor e ainda havia mesas vazias, Sofia, Carlos, Elise e Gustavo (que sentava atrás de mim) haviam faltado.

Passou de mesa em mesa entregando para os alunos.

— Poderia me dar mais um, vou passar na casa da minha amiga, que senta aqui — Apontei o lugar de Elise. — E já entrego o dela.

— Claro. — O Inspetor me entregou mais uma folha e continuou entregando aos outros alunos.

Acabou que nem olhei sobre o que se tratava o passeio, só enfiei as folhas dobradas na minha pasta de tarefas.

Pedro pulou para a cadeira do meu lado, de Elise, e cochichou.

— Gringas então? Só eu to esperando a Beyoncé em pessoa me perguntando sobre as equações e ganhando um beijinho em troca?

Eu rolei os olhos rindo para Pedro enquanto o inspetor falava, mas não prestávamos atenção.

— Se alguém for perguntar alguma coisa, vão perguntar pro Gui ou pro Luiz, não você.

— Que absurdo. Minhas notas são melhores que as suas…

— Mas não melhores que as do Gui. — Eu ri, então apontei para frente. — Presta atenção lá, depois a gente conversa.

Quando olhamos para frente de novo a explicação havia acabado.

— Bem professor, obrigado pelo tempo, pode voltar a aula. — O inspetor disse.

— Não por isso. Sempre que precisar. — Disse o professor de Geografia, todo educado. E o inspetor foi embora.

Então, felizmente, assim que o inspetor saiu, todos começaram a guardas as coisas.

— Aonde vão? — O professor perguntou, parecia espantado com tal comportamento.

— Falta oito minutos, libera a gente. — Igor pediu. Podia não gostar (na verdade eu não suportava) ele, mas concordava com o pedido.

O professor olhou para o relógio no seu pulso, pareceu pensativo por um tempo.

— Está bem, podem ir.

Guardamos todas as nossas coisas e saímos da sala, a maioria evitando Bianca, Karla, Bruna, Priscila e as outras garotas envolvidas no processo da petição.

Quando cheguei no pátio, Pedro ainda estava lá, junto de Dido, e os pôsteres, panfletos e cartazes de Bianca haviam sido retirados deixando apenas pedaços de papel rasgado nos muros e paredes.

— Pensei que já tivessem ido. — Disse me juntando a eles e nós três saímos andando.

— Estava indo, mas Dido pensou em te chamar…

— Para?

— A gente vai passar uma cota lá no fliperama. Se você quiser vir, mano. — Dido disse com sua voz arrastada e despreocupada.

— Acho que eu to tranquilo. — Disse para eles. Guilherme estava no portão da escola esperando a gente. — Mas vou ir com vocês até lá, vou passar na casa da Elise… Espera, vocês vão andando né?

Os três se olharam buscando respostas ou apenas quem fosse me responder. Dido, Guilherme e Pedro eram bem mais ativos que eu.

Guilherme vinha andando para a escola todo dia e andava de skate de vez em quando, até tinha um. Dido andava de skate há anos e também tinha um além de praticar todo tipo de esporte sempre que pudesse, mas não cuidava tanto do corpo, embora não precisasse, e uma das medalhas no histórico da escola era graças a ele. O que Dido cuidava era do cabelo que vinha até os ombros. Pedro fazia natação por causa da bronquite, e academia por que gostava de manter um corpo definido, e embora não fosse aeróbico ele conseguia correr por um bom tempo sem ficar fatigado, diferente de mim.

No geral os três se exercitavam, e eu assistia séries. Então era óbvio que eles iriam a pé e que eu não iria com eles.

— Eu vou com vocês até o ponto de ônibus! — Disse por fim.

 

Desci do ônibus e andei até o portão da casa de Elise, uma casa simples com quintal na frente e uma lavanderia no fundo. Não tinha campainha e o interfone estava para consertar depois de uma chuva que queimou algumas coisas com os raios.

— Elise. — Gritei no portão.

Esperei por um tempo enquanto olhava ao redor, mas ninguém atendia, também não havia ninguém na rua além de um gato malhado, mas podia sentir o cheiro do almoço nas casas, as várias casas onde todos almoçavam. Meu estômago roncou.

A casa de Elise era completamente fora de mão, mas o ônibus que pegava ali descia até o ponto perto da minha, o que era bom.

— ELISE. — Mais alto desta vez, mas não mudou.

Então peguei o celular e liguei para ela através do Whatsapp. Chamou seis vezes até que Elise atendesse.

— É você aí fora? — Ela perguntou de imediato em um tom nervoso.

— Não vai me atender não? — Eu rebati, olhei para dentro da casa procurando Elise nas janelas ou na porta.

— To no chuveiro, Lucas. Não dá.

— Não to ouvindo água. — Eu respondi, mas mesmo se ela estivesse no chuveiro eu não ouviria, mas não saia vapor da janela do banheiro, que estava entreaberta.

— É porque eu fechei o chuveiro pra atender o celular né. — Ela explicou como se realmente precisasse se explicar. — Lucas, o que foi? Eu to com frio aqui.

— Nada… Só… depois olha o correio, é um papel que deram na escola.

— Você veio até aqui pra isso? A, quer saber, tá bom, deixa aí que eu vejo depois. Obrigada.

— De nada. — Respondi meio sem jeito, ela não queria falar, percebi no tom de voz.

Então deixei o papel sobre o passeio na caixinha de correio dela, me virei e voltei para o ponto de ônibus. Que ótimo começo para me enturmar novamente. Deveria ter ido no fliperama com os garotos.



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