História REMAIN - 001 Pirulito

Talvez não desse mais para prorrogar o tempo de tentar conquistar o nerdzinho. Eu estava enrolando fazia uma semana, o cercando, analisando sua rotina e tentando encontrar algo que pudesse ser uma brecha para minha aproximação. Mas tudo o que consegui descobrir é que o garoto é louco por qualquer coisa que tenha o sabor morango, incluindo as balinhas das quais ele parece possuir um estoque inacabável. Além disso, outra coisa que entra na minha imensa lista de coisas que sei sobre Taehyung (sinta a ironia em minhas palavras) é que o pequeno lê livros com uma rapidez que não julgo ser humana. Em apenas dois dias ele devorou um enorme livro que reparei ser da autora Cornelia Funke. Pensando bem, talvez essa fosse minha brecha.

Há alguns meses os pais do Jimin, em um dos domingos que eles separavam para fazer coisas em família - geralmente me incluindo, decidiram fazer uma sessão na pequena sala de cinema que tinham em casa (família Park, como sempre, muito humilde) e o filme escolhido foi Coração de Tinta, que descobri mais tarde ser baseado no romance de mesmo nome da tal escritora. Não que de fato eu tenha conseguido prestar atenção no enredo com Jimin brincando com meu membro por debaixo das cobertas, mas acho que o pouco que eu consegui absorver das cenas que passavam no telão seria o suficiente para puxar assunto com o Kim.

Com esse pensamento - equivocado, diga-se de passagem - me aproximei da mesa em que o acastanhado se encontrava, levando um pirulito de morango que comprei na cantina. Sentei-me no banco a sua frente esperando receber atenção do mesmo por conta da minha aproximação, esse que nem sequer pareceu notar minha presença, como sempre, alheio a realidade a sua volta. Então decidi me manifestar com um pigarro, atraindo - depois de longos segundos e uma longa bufada - seu olhar desconfiado e claramente incomodado. 

Abri meu melhor sorriso, me preparando para começar algum assunto, porém antes que eu pudesse dizer qualquer coisa ele me interrompeu.

— Jungkook, eu não sei o que você quer comigo, mas pode ter certeza que em nada eu posso te ajudar e muito menos você me ser útil. Agora, se pretendia interromper minha sagrada leitura para uma de suas baboseiras, pode desistir.

Okay, aquela nem de longe era a recepção que eu esperava, nem na pior das hipóteses. Parece que isso vai ser mais difícil do que eu esperava. Ou isso me faria pensar seriamente em desistir, ou tornaria as coisas mais divertidas. E me conhecendo como conheço, com certeza essa aposta ficou mais interessante (mesmo que meu medo consequentemente se tornasse maior, mas essa parte eu jamais assumiria).

— Calma ai, leãozinho - tentei descontrair, recebendo uma careta engraçada de desaprovação - na verdade, tem algo que você pode me ajudar si...

— E quem disse que eu quero te ajudar? - ele me interrompe dando ênfase na palavra “quero”, deixando bem claro o quanto eu não era bem vindo ali.

— Só me escuta, por favor - ele suspirou e então me permitiu prosseguir - percebi que você gosta bastante de ler. Mês que vem é aniversário da minha mãe e eu gostaria de fazer uma festa com o tema do livro Coração de Tinta e gostaria de pedir sua ajuda com a decoração. - finalizei com minha melhor expressão “cachorrinho sem dono”. De fato aquela foi a maior besteira que poderia ter passado pela minha cabeça, já que meu plano de conversa inicial certamente não fluiria. Mas pareceu ser boa o suficiente, pois o encontrei pensando após meu pequeno e mentiroso pedido.

— E o que eu ganho te ajudando?

Eu queria dar um gritinho de felicidade, pois por um momento achei que ele se negaria com mais uma de suas patadas gratuitas. Mas me contive.

— A minha maravilhosa companhia, hun - brinquei com minhas sobrancelhas em tom galanteador, o garoto apenas revirou os olhos e fechou seu livro, se preparando para sair. Quando reparei a merda que tinha feito, murchei meu sorriso e segurei delicadamente seu braço, o impedindo de sair - me desculpa. Eu posso... han, te comprar quantos livros quiser durante os dias que me ajudar, o que acha? - Taehyung ainda fuzilava minha mão em seu braço, que logo que percebi me apressei em retirar e ele, após algum tempo parecendo refletir, finalmente me lançou um sorriso que não consegui decifrar.

— Ta’, eu aceito! Mas com uma condição - me lançou um olhar ameaçador - depois disso, você e seus amiguinhos fingirão que eu não existo, combinado? 

— C-combinado! 

— Me espera na saída amanhã, então. - se virou me deixando sozinho e eu finalmente pude respirar, pensando em quais seriam meus próximos passos e refletindo sobre o significado daquele sorriso. 

Fingir que ele não existe não era nem de longe uma tarefa difícil, mas algo no tom que ele usou me deixou muito intrigado.

Taehyung certamente me deixaria louco, eu podia prever.

— Jungkook! - Yoongi me chama, vindo na minha direção com Hoseok, seu namorado, logo atrás, me tirando de meus pensamentos - e aí, te vi conversando com o perdedor, conseguiu algo? 

— Algumas patadas e uma ajuda para o aniversário da minha mãe! - sorri vitorioso.

— Mas sua mãe nem... Jungkook, você é péssimo! Mamãe? Por favor, né?! - e começou a rir, caçoando da minha estratégia.

— Por você não estar chorando, deduzo que Taetae foi bonzinho com você! - Hoseok comenta, me deixando levemente irritado.

— O que importa é que funcionou e temos um primeiro “encontro” para o fim da aula.

Os dois se entreolharam com expressões assustadas, o que fez um calafrio percorrer por meu corpo em desespero.

— O que foi? Estão me olhando assim por que? 

— Depois da aula o Tae... bom, deixa pra lá. Boa sorte com seu “encontro” - e saíram me dando tapinhas no ombro e rindo debochado, me deixando ainda mais confuso.

Decidi espantar essa confusão por ora e aproveitar o pirulito que descobri ter esquecido nos meus bolsos quando minhas mãos decidiram se esconder neles, enquanto eu seguia rumo à aula de matemática.