Os pais de Hoseok haviam acabado de deixar o hospital. Dawon, a filha mais velha, estava demasiado imersa em seu celular para notar Yoongi entrando na sala onde se encontrava seu irmão.
Para se assegurar de que não seria repreendido, principalmente por ela, o garoto fechou a porta e abaixou as cortinas da janela. Logo, aproximou-se da maca em que dormia o melhor amigo, assistindo ao seu respirar, sentindo-se o mais culpado possível simplesmente por vê-lo daquela forma. Precisou morder com força o lábio inferior para não desabar. Tornou o corpo na direção contrária de uma vez e se afastou um pouco, levando as mãos à cabeça. Estava se perguntando a mesma coisa desde o ocorrido: "O que eu fui fazer?"
Foi quando Hoseok começou a se mexer na maca. Nada exagerado, apenas um ou dois movimentos dolorosamente lentos, de fato como se estivesse sem energia alguma. Surpreendido, Yoongi também foi lento ao virar-se novamente para o outro lado, reaproximando-se calmamente dele.
— Olá, você — o sonolento disse, sorrindo. Ainda não havia sequer aberto os olhos. — Estava esperando que viesse.
— Olá — o outro respondeu com seu tom típico de preocupação. — Você já tinha acordado?
— Sim, há algumas horas, mas não quis que ninguém soubesse. Meus pais estavam brigando com os médicos nesse instante. Não estava a fim de lidar com o constrangimento.
— Com os médicos? E você ouviu o que eles disseram?
— Mais ou menos. Até onde lembro, eles não sabem o que há de errado comigo, pelo menos não ainda.
Hoseok deixou os olhos semiabertos, uma vez que a claridade afetava sua visão sem pena, e deu duas batidinhas na colcha da maca. Deitou-se de lado ao passo que Yoongi se sentou cuidadosamente ali.
— Você ficou inconsciente por três dias inteiros.
— Três dias? — Hoseok levou a mão à testa, levemente pasmo. — Quer dizer que estamos no meio da semana?
— Exatamente.
— E eu perdi muitas aulas...
— E ainda não descobriram o que aconteceu, esse é o problema — Yoongi o corrigiu, soando meio ríspido. — Foi mal, eu não quis... Eu...
— A culpa não é sua, Yoongi. Você sabe disso, não sabe?
— Pode até não ser, mas se não tivéssemos feito, entende...
— Uma coisa não tem a ver com a outra. Não foi a minha primeira vez, lembra?
— Hoseok — o visitante olhou nos olhos do paciente, encarando-o por alguns segundos, e respirou fundo. — Eu sei que foi a sua primeira vez com um cara.
— O quê? Por quê? — ele disparou. — Jennie te disse alguma coisa?
— Você sempre me conta tudo. Nunca mencionou nenhum garoto. Nem unzinho.
— Bem, eu poderia estar com vergonha de contar.
— Se não teve vergonha de contar que brochou com a sua ex, não teria de contar isso. Além do mais, você já admitiu ter curiosidade de experimentar com um cara.
— Admiti?
— Várias vezes durante aquela festa na casa da sua ex. Ela não estava por perto.
Os dois começaram a rir gradualmente, desde uma gargalhada silenciosa até estarem empurrando um ao outro, é claro, com um pouco mais de delicadeza que o usual. Afinal, um deles ainda se encontraria depois em estado de observação, em um bendito quarto de hospital.
Também voltaram gradualmente ao normal.
— Sinto muito por mentir desse jeito — Hoseok fitou suas mãos repousadas em seu colo. — Queria que você pensasse que eu tinha alguma ideia do que estava fazendo.
— Não estou bravo com você por ter mentido. E se essa foi mesmo sua intenção, eu entendo.
— A confiança pareceu legítima, pelo menos?
— Até parece — Yoongi revirou os olhos. — Você é confiante até quando não é verdadeiramente confiante.
Hoseok tocou as mãos de Yoongi com a sua esquerda, e foi a vez deste desviar o olhar daquele, que sorriu pela metade.
— Você foi bem confiante também — ele afirmou. — Demorou um pouco, mas acabou sendo, sim. E quer saber de uma coisa?
— O quê?
— Eu faria tudo de novo por essa bunda.
— Jesus Cristo — o visitante resmungou, incrédulo, enquanto o paciente gargalhava despreocupadamente de sua reação. Suas bochechas coraram em uma velocidade impressionante. — Por que você continua dizendo coisas que eu não quero ouvir? Qual é a maldita necessidade?
— Ah, me dá logo um beijo, vai.
Hoseok se sentou rapidamente e agarrou o rosto de Yoongi, que tentou empurrar a cabeça para trás o máximo possível, reclamando à medida que o fazia. Sem sucesso, o primeiro foi esperto o suficiente para aproveitar a força que o segundo colocava naquele movimento, impulsionando-o para baixo e deitando-o em seu colo, e num piscar de olhos, em vez de beijá-lo, deu-lhe um abraço apertado.
— Eu amo você — ele sussurrou no ouvido alheio. — Quase perdi a oportunidade de dizer isso, então estou me precavendo. Como amigo ou algo a mais, eu amo você, Yoongi. De verdade, não só da boca para fora. Não só...
— Para falar besteira? — o outro interrompeu, sorrindo. — Espero mesmo que não.
— Agora você não escapa.
Houve um instante em que se desgrudaram e ambos se encontraram perdidos nas diferentes profundidades de seus olhos escuros. Os de Hoseok não eram fundos, mas também não poderiam ser considerados rasos. Os de Yoongi, não apenas fundos, e sim inexplicavelmente densos. Existia algo ali. Algo que prometia maravilhas ocultas. Maravilhas estas que faziam quem se atrevia a desvendar esses olhos querer igualmente se afogar neles. Ir mais e mais e mais fundo. Até o fundo do poço e talvez além.
Mas por enquanto eles só se beijaram. E continuaram se beijando até perceberem que a porta havia sido aberta.
— Meninos? — uma voz calma e feminina falou de repente. — O que vocês pensam que estão fazendo?
— Senhora Min — Hoseok disse de primeira, dando um pulo na maca com o susto. Sua boca nunca desgrudou de outra tão desesperadamente como fez nesse momento. Porque lá estava ela, a mãe de Yoongi, cuja casa frequentava desde muito pequeno, parada na porta do quarto e pegando os dois no flagra. — Eu juro que posso explicar...
— Ela sabe.
Ele lançou o olhar mais confuso do mundo na direção de Yoongi.
— Ela sabe? — sussurrou, franzindo as sobrancelhas. — Você contou a ela?
— Ele não precisou me contar, Hobi — a mulher sorriu docemente. — Não sei o que vocês pensam sobre os pais em geral, mas não somos idiotas.
— Você estava sem a sua blusa e eu, não sei se lembra, cheio de sangue, sendo que éramos para estar dormindo — Yoongi sussurrou na tentativa de esclarecer. — Eu na minha cama e você no colchão, sabe, como sempre fizemos. Estava tudo fora do lugar, digamos assim.
— Eu posso aguentar um sussurrador, mas não dois. Você, Yoongi, fora.
— Mãe!
— Fui bem clara quando disse que você só poderia vir aqui mais tarde. Dawon ainda está na sala de espera e eu não a quero cacarejando no meu ouvido. Com todo respeito, Hobi.
Hoseok assentiu quietamente. Afinal, ele conhecia sua irmã mais do que ninguém. Sabia o quão irritante ela poderia ser.
— Além de que eu e ele precisamos ter uma conversa franca — a mulher deu de ombros, serena, — Igual à que já tive com você, lembra? — e seu filho lhe lançou um sorriso amarelo. — Ainda bem que sim. Agora saia. Vamos.
— Apenas... — ele tentou articular, levantando-se da maca. — Apenas não... Não me mate de vergonha na minha ausência.
— Sem papo de morte, sim? E alguma vez eu já lhe envergonhei, Yoongi?
— Muitas vezes, mãe.
Antes de se afastar de vez, Yoongi tornou na direção de Hoseok e usou somente os lábios para assegurá-lo de que voltaria mais tarde, e este fez o mesmo, dizendo que estaria esperando. O filho passou ligeiramente pela mãe, que o puxou e beijou sua cabeça, arrancando algumas reclamações dele antes de deixá-lo ir, enfim. O outro garoto assistiu à interação dos dois e achou engraçado como eram constrastes ambulantes. Ele, todo de preto, e ela, em razão do uniforme de enfermeira, toda de rosa. Mas eram similares fisicamente. Ambos magros, baixos, pálidos, uma pálpebra dupla e uma única nos olhos. Quase cópias perfeitas um do outro.
— Agora somos só eu e você — a mulher afirmou antes de fechar a porta atrás de si. — Eu e você acordados, obviamente.
— Foi a senhora que cuidou de mim esse tempo todo? — o garoto retrucou, feliz com a possibilidade. Ela assentiu. — Graças a Deus...
— Seus pais ficaram um pouco relutantes, mas resolveram me dar um crédito. Um dos médicos disse a eles que você teria morrido engasgado se não fosse por mim. Havia muito sangue.
— E isso é verdade?
— Provavelmente. Ensinei muitas coisas ao meu filho, mas ele estava em estado de choque. Yoongi realmente ama você, Hobi.
A senhora Min caminhou até a maca e se sentou praticamente no mesmo lugar do filho, logo pressionando a mão direita contra a testa de Hoseok. Continuava com o sorriso em seu rosto.
— A senhora não se importa? — ele engoliu em seco. — Porque... Digo...
— Vocês são dois garotos? De jeito nenhum. Que conceito ultrapassado, querido.
— Sério?
— Não vou mentir para você — ela pressionou dois dedos contra o pescoço do garoto, medindo sua pressão em conjunto com o relógio em seu pulso. — Pode apostar que vou dar meu total apoio, mas não vai ser fácil. Você conhece seus pais, conhece esta cidade. O problema é que eles não lhe conhecem de verdade, nem vão querer conhecer. Está ciente disso, não está? — ele concordou com a cabeça. — Então procurem ter cuidado, certo? Meu maior medo é que vocês saiam machucados dessa situação. Sim, vocês, porque você também é da família. Sempre foi.
— Obrigado, senhora Min, muito obrigado — Hoseok sorriu de tal modo que até suas covinhas apareceram. — Vocês são a única família à qual eu sinto que realmente pertenço.
— Ah, Hobi, você sempre cuidou do Yoongi melhor do que eu.
— Não é verdade...
— É, sim. Você é a resposta de Deus para as minhas orações. Pedi tanto por uma vida melhor depois que o pai dele foi embora, por um sinal de que as coisas poderiam ser diferentes... E logo você apareceu. Viu em Yoongi algo que nem ele mesmo imaginava existir. Você o amou. Tenha certeza de que serei eternamente grata por isso... Agora vire de lado, com as costas voltadas para mim, por favor.
— Vocês me amaram também — ele disse enquanto fazia como lhe fora pedido. — Não só Yoongi, vocês dois. Onde eu estaria hoje se não fosse pela sua família, senhora Min? Eu sei que estou no hospital no presente momento, mas... Sinceramente... Acho que teria vindo parar aqui de outro jeito mais trágico.
— Impossível — a enfermeira abriu por trás a bata que o seu paciente vestia e o analisou por um instante. — Suas costas doem? Estão incomodando?
— Não mesmo. Deveriam? Há algo de errado com elas?
— Tirando o fato de que eu tive que falar que foi o gato do vizinho que fez isso com você, não, não há nada de errado com elas.
— Ah... Jesus Cristo...
— Não precisa ficar com vergonha. Vamos apenas mudar de assunto, ou então voltar ao anterior.
— Fico agradecido — o garoto soltou uma risada um tanto nervosa. — Mas, bem, a senhora respondeu que seria impossível. O que exatamente seria impossível?
— Que tivesse partido antes do tempo, é óbvio. Você está destinado a grandes coisas. Grandes feitos, Hobi. É o que Deus me diz toda vez que vejo seu rosto.
— Deus fala mesmo com a senhora?
— Só quando você está por perto.
O celular da senhora Min começou a vibrar no bolso do uniforme, o que a fez levantar-se de imediato e lembrar Hoseok de que já poderia sentar-se normalmente na maca. Quando a mulher atendeu à ligação, ele percebeu que era Yoongi do outro lado da linha. Ela negou seu pedido de retorno e o mandou ir à cafeteria do hospital para comer alguma coisa. O paciente bem sabia como o amigo poderia não se alimentar corretamente se não fosse vigiado de perto. Tinha imensas dificuldades nessas áreas.
— Seu namoradinho ama me tirar do sério — ela brincou ao se desligar da ligação. — Falando nisso, Hobi, pode me prometer uma coisa?
— Qualquer coisa, senhora Min.
— Cuide do Yoongi quando eu não estiver mais aqui, ok?
Hoseok franziu as sobrancelhas.
— Quando ele voltar para o quarto, a senhora diz?
— Estou ciente de que proibi o papo de morte e tudo mais, mas nunca se sabe...
— Nunca se sabe ou... — ele sugeriu, levemente atordoado. — Ou alguma coisa está acontecendo?
— Hobi...
— Deus lhe falou alguma coisa?
— Não, não — a senhora Min tornou a sentar-se na maca, balançando a cabeça, e olhou para o mais novo com doçura. — Não há nada acontecendo. É só que às vezes penso na possibilidade de... Sabe, Yoongi ficar sozinho, porque... O pai dele... O pai dele está tão longe. Nunca quis saber do próprio filho, entende? E minha família... Ninguém sobreviveu para contar a história.
— Ah, sim... Sim, senhora Min, eu entendo. E não se preocupe: prometo que ele vai estar sempre sob meus cuidados... Na medida do possível.
— Também vai lembrá-lo de comer?
— Nem que seja a última coisa que eu faça.
Ambos deram gargalhadas e passaram a se despedir um do outro. A enfermeira disse que Hoseok seria provavelmente liberado na manhã seguinte, além de que, embora não fosse de sua vontade, ela teria que avisar aos seus familiares que havia finalmente acordado. Não se veriam mais dentro do hospital, esperançosamente, porque o turno da senhora Min se limitava ao da noite. Somente fora dele.
A mulher já estava prestes a fechar a porta quando o garoto chamou sua atenção pela última vez, sorrindo:
— Antes de me jogar na cova dos leões, a senhora poderia me responder uma pergunta bem rápida?
— Está sendo um pouco dramático, não? — ela fez sua crítica, mas não se aguentou e acabou rindo baixinho. — O que Vossa Alteza deseja saber?
— Quem era aquela outra pessoa no quarto?
— Que quarto? Este seu?
— Não, o quarto do Yoongi.
— ...Na nossa casa?
— Sim.
— Que estranho — murmurou, pensativa. — Não havia ninguém além de nós três. Não até os paramédicos chegarem, pelo menos.
— Foi antes disso. Eu estava prestes a apagar e... Havia alguém no quarto. No canto escuro da parede... Talvez um homem adulto? Não lembro bem.
— Ah, bom, Hobi...
— Como assim?
— É normal que você tenha visões irrealistas antes e durante um colapso. Completamente normal, então não se preocupe. De verdade, não havia ninguém lá.
— Oh... Não considerei essa possibilidade...
— E outra coisa também.
— O quê?
— Eu nunca teria deixado alguém rir de você.
A senhora Min lançou uma piscadela em sua direção, soprou um beijo e saiu acenando. Hoseok acenou de volta, mas estava muito confuso para sorrir como ela o fez antes de ir. Perguntou-se silenciosamente se tinha adquirido um problema de memória. Perguntou-se...
"Quando eu mencionei isso?"
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