História Ritmo do Amor - Excuses's day

Alexsandra's P.O.V.

    ⁃    Clarisse, eu não acredito que você ligou para os meus pais! - eu levantei da cama esbravejando para a loura. 

    ⁃    Liguei, liguei mesmo! Você estava parecendo uma adolescente suicida. - Cler estava assistindo televisão e deu de ombros ao me responder. 

    ⁃    Mas Cler... - Sem "mas", Alex! Olha, já passou da hora de vocês se acertarem. E se eles se preocuparam em saber como você está, é porque ainda te amam e se importam. Independentemente de como ficou a relação de vocês quando você veio pra cá. - ela fez uma pausa - Alex, você não sabe a falta que eu sinto dos meus pais. Você não sabe como eu espero nos momentos difíceis contar com eles, e quando eu lembro que isso é impossível, me dói. O arrependimento me consome ao pensar que eu podia ter lhes dado mais valor. Então, de uma órfã de pais completamente arrependida pra você, façam as pazes. Não existe conforto, nem colo ou amor, melhor do que os de pais. - quando Cler acabou de falar, nós duas nos encontrávamos com os olhos marejados, mas minha amiga se permitiu chorar e desabou ali mesmo no sofá. 

Me sentei junto dela, e a abracei, afagando seu cabelo, tentando a consolar. Eu não tinha ideia do que dizer à ela; afinal, nunca fora boa com palavras. Mas tentei lhe transmitir todo o meu apoio e compaixão por ela, só naquele abraço. 

Eu estava me sentindo uma completa egoísta. Momentos antes eu me encontrava num estado deplorável, tudo por causa de um grande pé da bunda. Mas a situação de Cler era bem mais grave e triste do que a minha. Ela havia perdido seus pais anos atrás, e desde então se tornou independente. Se mudou para a capital ano retrasado para estudar e tentar esquecer as lembranças de seus pais. Desde então ela era sozinha, mas mesmo assim, fora a pessoa mais viva e alegre que eu já conheci em minha vida inteira. Raras eram as vezes que eu a encontrava se lamentando, e quando isso acontecia, ela se recompunha rapidamente. 

Minutos depois, Cler havia parado de chorar, e já estava sorrindo novamente. Eu achava mágico a forma com que ela nunca perdia seu brilho; estava sempre sorrindo e exalando felicidade. 

Passamos o resto da tarde juntas, assistindo filme se entupindo de besteiras. Ela já sabia do que ocorreu entre eu e Cavani. Já sabia da carta, e do motivo das minhas lamentações, e já havia tentado até ir na casa do uruguaio "afogar ele no vaso sanitário". Mas é claro que, mesmo contragosto, eu a impedi. 

Naquele tempo que ficamos ali, eu consegui distrair minha mente, e esquecer Edinson. Mas, infelizmente, a vida não estava disposta a me fazer esquecê-lo tão cedo. No canal, uma propaganda da Nike com os jogadores do Paris Saint-Germain era transmitida. E lá estava Cavani, com um agasalho azul, que destacava perfeitamente seus músculos superiores, e com o cabelo solto, posto para trás por uma pequena faixa. Ele estava extremamente gostoso (perdoem a decadência), e eu me permiti o imaginar sem aquelas roupas. Mas juntos desses pensamentos obscenos, veio a lembrança daquela maldita carta de hoje cedo, e o meu peito novamente se apertou. 

Ao notar minha mudança de humor, Cler alcançou o controle para mudar de canal, mas eu a impedi, murmurando um "tudo bem", e dizendo que iria ligar para meus pais. 

E assim eu fiz, peguei meu notebook e entrei no skype. Ao ver a pequena luzinha do user da minha mãe, verde, uma alegria invadiu meu peito. Confesso estar tanto com saudades dela, quanto do meu pai. Raramente nos falávamos, na maioria das vezes, trocávamos sms. 

Enviei uma chamada de vídeo, e aguardei sua aceitação por longos segundos. Talvez, nem mesmo ela estava acreditando que eu estava ligando. Quando as câmeras se focaram, eu pude finalmente ver minha mãe. Ela estava mais magra, e também mais velha; as rugas de seu rosto já estavam mais evidentes, assim como as genéticas sardas. Mas ela continuava com o mesmo brilho nos olhos e sorriso nos lábios, talvez um pouco mais triste e abatida agora. Porém, ainda sim, era a mesma de um ano atrás. 

Vê-la ali, ficar admirando-a me deu uma imensa vontade de abraçá-la; vontade essa, que eu teria de reprimir, considerando, que finalmente consegui a bolsa da Complex, e que o curso tem duração de três longos anos. 

Ficamos em silêncio por um tempo, apenas nos olhando, e reparando nas evidentes mudanças. Acho, que assim como eu, ela não sabia a maneira com que começar aquela conversa, esperando encontrar no silêncio, uma resposta. Mas ela finalmente se pronunciou: 

    ⁃    Alex! - bastou aquela simples palavra, para nós duas cairmos no choro. 

A saudade entre nós era tão notável quanto às mudanças. Mas após mais algumas lágrimas, conseguimos engatar num diálogo descente. 

Eu lhe contara sobre minha vida aqui em Paris, sobre a dificuldade que enfrentara na busca por empregos (coisa que terei de encarar novamente), falei também sobre a cultura, a comida e o estilo de vida francês. Não pude deixar de lhe dizer, com grande alegria, que havia conseguido a bolsa da academia, e por fim, tive que contar o motivo da minha tristeza. 

Edinson Cavani. 

Minha mãe até ficara contente ao saber que eu estava enrolada com um jogador de futebol; mas ao ficar atualizada sobre o final da história, seu sorriso murchou, e um olhar de pena invadiu seus olhos. Ela me confortou da melhor forma que pode, e para me distrair, começou a contar as novidades de Dallas. 

Após horas de conversa, eu pude ouvir um barulho de porta se abrindo do outro lado. Minha mãe me pediu um momento, e se levantou, indo para um canto, e iniciando uma série de sussurros. Minutos depois, ela voltou:

    ⁃    Alex, tem uma pessoa aqui, que também quer muito falar com você. Ela, ou melhor, ele só é muito orgulhoso para tomar iniciativa, então não se importe com as relutâncias. 

Esperei grandes instantes, até que a figura de meu pai apareceu na tela do notebook, e meu coração, por um momento, se congelou. Eu não esperava vê-lo; pelo menos, não depois de tudo. 

Eu havia fugido de Dallas numa noite, apenas com o consentimento de minha mãe , deixando a meu pai, apenas uma carta, com um pedido de desculpas. E desde então, nunca mais o vi, ou falei com ele. Mas pelas mensagens, minha mãe me dizia o quão amargurado ele havia se tornado. 

Engraçado como a vida é cheia de reviravoltas. Pois agora, era eu que me encontrava machucada por conta de um simples pedaço de papel. 

    ⁃    Filha... - e em lágrimas, eu me afogava novamente. - Pai... - lhe dei meu melhor sorriso, pois apesar de tudo, estava consumida pela saudade e pelo arrependimento. 

Fora difícil, mas depois, finalmente, conseguimos conversar normalmente. Eu havia lhe pedido desculpas, que foram rapidamente aceitas e retribuídas; e então, lhe contei sobre a minha vida desde que chegara aqui em Paris. 

Passamos mais algumas horas conversando, e a tensão que antes era grande, agora já nem existia mais. Meu pai se mostrou orgulhoso ao saber que eu havia ganho a bolsa, e se não fosse pela carta de Edinson, eu me julgaria a mulher mais feliz do mundo. Mas infelizmente, nem tudo nessa vida é um mar de rosas. 

Já de noite, encerramos a chamada de vídeo, e eu lhes prometi manter contado sempre, os deixando atualizados de qualquer novidade. 

Me joguei na cama, e lá me permiti fazer uma reflexão sobre esse dia. Apesar de emocionalmente destruída, uma pontinha de felicidade reinava no meu peito por ter feito as pazes com meus pais. Mas ainda sim, o uruguaio reinava nos meus pensamentos. Ali, naquela cama imensa, eu o imaginei junto de mim, e mais uma fez, meus olhos transbordaram água. 

Me recompus parcialmente, e me concentrei em dormir, afinal, amanhã terei um dia grande e cansativo: precisarei encontrar um novo emprego; o quê já me deixa desesperadamente, desesperada.