Acordei no dia seguinte e vi Paulo ainda dormindo, se hoje era sábado não tinha porque acorda-lo cedo. Aliás, eu mesmo estava com preguiça de acordar, então só fui até ele e me moldei junto ao seu corpo, sentindo como era quentinho, dormi.
Algum tempo depois acordei com Paulo se mexendo na cama, ele havia acordado, me estiquei ronronando e ouvi ele rindo.
-Bom dia Shadow, dormiu bem? – Miei um sim e levantamos.
Até o café tudo estava normal para um fim de semana, mas depois ao invés de pegar um dos meus brinquedos para nos divertirmos, ele começou a arrumar a casa. Isso não era nada bom, ele estar arrumando e limpando a casa desse jeito em plena manhã de sábado, só tem uma explicação, teríamos visitas...
Quando terminou ele tomou um banho e começou a arrumar o almoço, fui conferir o relógio, ainda nem eram onze horas direito! Comecei a pedir atenção me esfregando em suas pernas, mas é claro que ele não parou o que estava fazendo só por um gato carente, mesmo sendo eu, Shadow, seu gatinho amado, sua única companhia. Seja lá quem estava vindo já tinha pontos negativos comigo.
Pouco antes do meio dia tocaram a campainha, no mesmo minuto eu corri para o topo da escada, só ficaria ali o bastante para ver quem era, depois me esconderia no quarto. Eu detestava dias de visita, mas com algumas eu já estava acostumado, então talvez ficasse. Porém quem estava na porta era uma mulher totalmente desconhecida, não gostei nenhum pouco daquilo. Pulei do meio da escada e fui me esconder no armário que ficava embaixo dela, assim poderia ficar de olho naquela moça estranha.
Eles almoçaram. Paulo nem tentou me chamar pra comer a ração, sabia que eu não iria. Então só deixou ela lá pro caso de eu ir escondido, e de fato eu fui quando eles estavam na sala e a moça estava de costas pra mim, depois voltei para o armário. Para o meu total azar a criatura viu minha cauda quando estava entrando.
-Ei aquele não é o gato de que você tanto fala?
-Sim, ele sempre se esconde quando tem visita.
-Posso vê-lo? – A moça disse já se levantando.
-Bom... Acho que ele não vai se importar. – Ele disse se levantando também. “Querido se eu quisesse ser visto eu não estava me escondendo oras!”
Me encolhi com as costas contra a parede e fiquei só esperando eles escancararem a porta do armário. Tudo bem, eu não sou do tipo que ataca sem motivo e o Paulo iria ficar bravo se eu não me comportasse então ia deixar me olharem um pouco. Mas só, nem pensar que eu sairia dali pra fazer social na sala depois. Foi a moça que abriu a porta, Paulo estava atrás dela me olhando quase que suplicante.
-Que lindo... Tem olhos tão verdes. – Ok, a moça ganhou um ou dois pontos comigo, mas a conta ainda não está positiva. – Será que posso fazer carinho nele? – Paulo por um segundo ficou quieto como se estivesse pensando, me olhou com um pedido claro nos olhos.
-Bom, ele não é o tipo que ataca então... acho que se estiver no meu colo ele não vai se importar. – Ele disse já passando na frente da moça e me puxando para seu colo. “Cara nos precisamos ter uma séria conversa sobre com o que eu me importo ou não.”
Eu já estava pensando como escapar do abraço do Paulo, quando senti ele me fazendo carinho com uma das mãos que me seguravam. Então não tive escolha, eu ficava completamente entregue ao carinho dele, se ele estava fazendo carinho em mim eu não ia nem ligar pra moça chata. E foi assim que a criatura consegui fazer carinho em mim.
-Ele é mesmo lindo, é um pelo curto inglês não é? – A tal moça perguntou e eu na hora abri os olhos e a encarei com cara de “tá doida filha?”.
-Não, é um azul russo. – Ele corrigiu. “Que isso moça não estava agora mesmo falando dos meus lindos olhos verdes? E não notou que tenho focinho? O pelo curto inglês tem a cara toda achatada e redonda jovem.”
-Ah! Desculpa confundi pela cor do pelo.
-É, esse prata azulado é uma cor muito popular no pelo curto inglês mesmo, mas tem de muitas outras cores. Já o azul russo é sempre assim, com pelo nessa cor e os olhos bem verdes.
-Entendi...
“Isso, continua falando de mim, mostra que eu sou importante e que ela não sabe nada de gato comparado a você. Assim quem sabe ela vai embora logo.” Eu não disse nada mas ele pareceu perceber e mudou rápido o assunto me devolvendo ao armário. Eles voltaram para o sofá mas dessa vez a moça resolveu sentar do lado do Paulo, não gostei, ela estava até agora com um espaço razoável entre eles, porque resolveu mudar? Sai do armário, eu já tinha ficado exposto mesmo, e pulei no braço do sofá depois indo para o encosto e passei por trás da moça (propositalmente esbarrando a cauda na cabeça dela), para em seguida pular no colo do Paulo e começar a esfregar minhas bochechas nele. Eu admito, era marcação de território.
Eles continuaram conversando e então a abusada resolveu chegar ainda mais perto do meu dono. Nem pensar que eu ia deixar isso! Fui para o meio deles forçando algum espaço lá, a moça riu e disse algo sobre eu ser fofo, então levantou a mão querendo fazer carinho em mim de novo. Dei a ela meu melhor olhar de “nem pense nisso”, que contrastava completamente com minha carinha meiga natural, ela percebeu e recuou, mas o dono não gostou disso. Paulo tentou me colocar do outro lado dele, porém foi um esforço totalmente vão, eu voltava correndo. A moça enfim disse que não precisava e que eu só estava com ciúmes, até que ela não é burrinha.
Eles conversaram mais um pouco, será que não cansavam de falar? Paulo tinha colocado música na sala mais cedo, porém tenho certeza que eu era o único que prestava atenção nela. Mesmo assim era impossível ignorar a tagarelice, e assim descobri que eles trabalhavam juntos, afinal a mulher não parava de falar fofoca de todos os outros do trabalho. Paulo ainda não percebeu que se ela fala tanto de todo mundo pelas costas ela deve fazer o mesmo com ele? Que desagradável!
~~~.~~~
Já são seis da tarde, a mulher ainda está aqui, eles ainda estão tagarelando. Perdemos o dia todo nisso, eu não poderia estar mais estressado... ou poderia, a moça acabou de descobrir um jeito de piorar, ela está de novo chegando mais perto do que devia do Paulo, aliás, ela está mesmo tentando pegar na mão dele agora? Mas nem por cima do meu cadáver.
Assim que as mão estavam quase se encostando, eu deixei meus dentes bem a mostra e me pus a sibilar como a muito tempo não fazia. A moça se afastou na hora, definitivamente de burra ela não tinha nada. Paulo ficou muito bravo comigo...
-Shadow! – O olhei com a maior cara de inocente, como se fosse funcionar. – Agora chega, tá de castigo. – Me pegou no colo já indo em direção à escada, ele ia me trancar no quarto, droooga.
-Não, deixa, tudo bem. – Disse a moça se levantando e pegando a bolsa. – Eu tenho que ir mesmo, já está tarde.
-Clara, espera. Eu sinto muito, não sei o que deu nele. Por favor, fique ao menos pro jantar.
-Não, é melhor eu ir mesmo. – E ela foi até a porta.
-Ok... – Ele foi abrir a porta pra ela, nem a um beijinho de despedida ela se atreveu. Acho que tem algo haver com o fato de que eu estava no canto do corredor, que dava na porta, com uma cara não muito charmosa e balançando a cauda perigosamente. Ou ela realmente só não queria.
Assim que trancou a porta Paulo se virou para mim, ele estava com uma cara horrível...
-Você tinha mesmo que fazer isso? – Disse enfatizando o “mesmo”. – Sério?
Depois bufou e foi para a cozinha jantar, eu comi o resto da ração que ele colocou no almoço e fiquei na porta da cozinha o olhando, ao invés de subir na cadeira ao seu lado como sempre, sabia que ele estava bravo. Ele levantou e lavou a louça do almoço e do jantar, fiquei assistindo da porta. Queria pedir desculpas, mas ele não entenderia se eu dissesse, eu só podia fazer minha melhor cara de “desculpe” e torcer para ele entender. Quando ele terminou passou por mim sem nem me olhar, ele iria me ignorar como castigo. Tenho certeza que ele sabia o quanto eu ficava triste com isso. Eu não me arrependia do que fiz, não mesmo, se ela voltasse eu faria exatamente o mesmo, mas não queria magoar o Paulo.
Ele terminou com a louça e foi ver televisão, eu sentei do lado dele no sofá mas ele nem olhou para mim. Não me atrevi a pedir carinho, não me lembro da ultima vez que ele fico tão bravo. Pouco tempo depois ele subiu para dormir, eu chequei o horário, ainda eram oito horas da noite, ele nunca dormiu tão cedo. Eu o segui, e deitei na cama junto com ele. Paulo continuava sem me olhar, eu não aguentava mais isso.
Ele começou a rezar como todas as noites mas dessa fez acelerou as palavras, ele parecia realmente com pressa de dormir, estava mesmo tão irritado? O que aquela moça chata significava pra ele afinal? Isso aumentou minha antipatia com ela, mas não era hora para pensar nisso, agora o importante é que Paulo estava bravo comigo e me ignorando. Eu precisava mudar isso, mas ele não me dava nenhuma chance?
Pensando isso eu vi o brilho no teto e aquilo me deu uma ideia, Paulo sempre agradecia o dia e fazia pedidos depois de terminar as preces, então, bom, por que não tentar?
Fechei meus olhos como ele fazia, e com todo o meu coração pedi para ser como o Paulo, para que assim ele me entendesse e eu pudesse me desculpar. Eu amava meu dono, não queria magoa-lo.
Quando terminei abri meus olhos e vi aquela pessoa bonita, que sempre estava lá quando Paulo rezava. Dessa vez ela estava me encarando curiosa, e depois sorriu. Paulo acabou e assim o brilho no teto se foi, pela primeira vez a tal pessoa veio para o meu lado da cama, e se sentou olhando para o céu através da janela. Paulo deitou e se cobriu, dessa vez sem fazer carinho em mim como fazia todos os dias antes de deitar. Fiquei realmente triste com isso, mas na verdade eu já esperava que isso acontecesse, depois de tanto tempo me ignorando. Me enrolei deitando no meu canto da cama e fechei meus olhos.
Mas antes que eu dormisse, Paulo se sentou na cama murmurando algo como “não vou conseguir dormir assim”. Se virou para mim, finalmente me olhando nos olhos e me fez um cafuné.
-Boa noite gatinho... – Disse baixo depois se deitou de frente para mim. Eu fiquei tão feliz e aliviado com isso.
Logo depois ele dormiu, eu ainda o olhei um pouco. Ele estava lindo dormindo, tinha um pequeno sorriso no rosto. Fiquei feliz pois ele devia estar tendo um bom sonho, depois finalmente adormeci.
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