— Eu nunca vi cuecas com estampas de berinjelas também — disse com a destra à frente da boca, voltando a mastigar a almôndega após.
— Já pensou em uma cueca com o desenho de apenas uma berinjela estrategicamente colocada no lugar das partes? — Ele sorriu arqueando levemente as sobrancelhas.
— Soa muito sexy. — Sorriu voltando a mexer no macarrão dentro da caixinha retangular vinda do restaurante italiano do centro.
— Sexy? Soa irresistível! — corrigi convicta, apesar da imagem em minha mente parecer no máximo cômica.
— Então já sei o que usar daqui em diante nos meus encontros mais sórdidos — comentou com um ar malicioso que se acrescentou à cena em minha mente, o que resultou em eu quase cuspir o camarão que havia acabado de enfiar na boca. — Modéstia parte, eu faria berinjela parecer algo muito apetitoso — acrescentou fazendo-me erguer uma sobrancelha e soltar um "Hunf" curto em deboche, que o fez protestar indignado. — Está duvidando? — perguntou estreitando os olhos.
— Eu tenho fetiches diferentes — justifiquei na defensiva.
— E quais seriam? — indagou fazendo-me engasgar por um segundo.
— Não se pergunta isso! — resmunguei rindo, ainda me recuperando da comida que tentou se guiar ao meu pulmão.
— Apenas pesquisa de campo. — Endireitou a postura, voltando-se para mim, parecia realmente esperar uma resposta.
— Eu sou mais para o lado das frutas, se fosse uma laranja, poderíamos até conversar — respondi ficando confusa ao vê-lo gesticular para que eu aguardasse e soltar seu espaguete na mesa, fazendo-me conter o riso quando ele trouxe uma samba canção com desenhos de laranjas e limões do quarto.
Os planos de não voltar tarde para casa e estudar o caso de Samantha Hoffmann acabaram ficando de lado juntos da samba canção jogada em qualquer canto enquanto Taehyung e eu conversávamos no sofá. As caixinhas de comida italiana ficaram vazias sobre a mesinha de centro entre o sofá de dois lugares onde eu estava deitada e o outro igual, onde Taehyung se mantinha sentado e com o cotovelo apoiado no braço rechonchudo do móvel verde escuro, amparando o queixo na base da palma.
Falamos sobre novelas antigas que nossas mães assistiam e acabavam se tornando nossa programação também, filmes que marcaram nossa infância, o primeiro amor literário ou 2D de nossas vidas. Sobre Seokjin, que não nos fez companhia por querer aproveitar a noite de folga para descansar.
Seokjin era, apesar de mais velho, o irmão que Taehyung sempre pediu e nunca recebeu, a figura paterna que nunca foi presente em sua infância e talvez a parte racional e madura que lhe faltava às vezes.
Falamos sobre tudo, menos sobre o que aconteceu no restaurante, assunto em que ele até chegou a tocar e perguntar se estava tudo bem, mas respeitou eu não querer falar sobre. E isso foi talvez um dos fatores para eu aceitar sair com Taehyung no próximo final de semana antes de nos despedirmos com um abraço desajeitado dado a mim por ele.
Não era tarde quando adentrei meu apartamento e cacei os interruptores a fim de acender as luzes, mas não era cedo suficiente para fazer muita coisa antes de pensar em ir deitar.
Peguei a pasta de papéis deixada sobre a cômoda de gavetas onde eu guardava tudo o que não tinha muito um lugar certo de onde ficar e sentei na poltrona, folheando um pouco os documentos alterados para manterem informações mais pessoais desconhecidas.
Procurei pelo caso na internet e assisti uma ou duas reportagens até sentir o coração acelerar ao navegador ser minimizado e a tela exibir a chamada recebida. Eu não esperava que ele fosse me ligar ainda naquela noite, na verdade, nem sabia muito se iria falar comigo no dia seguinte quando estivéssemos em classe.
— Primeiramente, eu sei que fui um grandessíssimo babaca e eu sinto muito — disse assim que atendi a ligação. — E em segundo, leve a sério o primeiramente, por favor — pediu suspirando após. Continuei fitando o ventilador de teto em madeira clara acima de mim, que servia mais como decoração que como um ventilador de fato. Não sabia bem como começar.
— Não fiquei muito surpresa — digo comprimindo levemente os lábios após. Não deixava de ser verdade, Taehyung já havia me alertado. — Mas eu fiquei realmente com medo, aquilo foi tão... — Sorri um pouco nervosa. — Sério, Jimin, eu não sei o que pensar sobre você. — Subi levemente os ombros, levando a mão vaga aos cabelos e os penteando com os dedos para afastar o breve nervosismo.
— Não foi intencional. Taehyung é um traste de ser humano e só daquilo estar no mesmo ambiente que eu, já me tira do sério — disse parecendo incomodado apenas de citar o nome. — Não vai se repetir, okay? Eu te prometo.
— Taehyung foi muito gentil comigo hoje — comentei pensando no bom humor e gentileza com qual o homem havia me acompanhado desde a tarde até a noite.
— Entendo. — Pareceu encerrar o assunto apressado apesar do tom compreensivo em que veio a afirmação. — Mas se você não se importar, é claro, eu trouxe um pedido de desculpas direto de uma das minhas confeitarias preferidas e gostaria muito se você pudesse me receber. — As batidas na porta do apartamento me fizeram erguer a postura para fitar a entrada. — Mas se você quiser apenas me socar e depois fechar a porta na minha cara, seria justo.
Levantei seguindo até porta e vendo Jimin ao lado de fora pelo olho mágico. Estava encostado na parede do corredor, fitando os próprios pés. Segurava numa mão uma sacola e na outra o celular.
Abri uma brecha da porta e ele ergueu o rosto, sorrindo ao me ver ainda segurando o celular ao ouvido.
— No rosto não, por favor — pediu fazendo-me sorrir.
— O que é? — perguntei meneando a cabeça em direção à sacola.
— Uma torta de morango — disse erguendo a sacola com a logo da confeitaria impressa.
— Oferta de paz aceita. — Abri a porta, dando-o espaço para entrar.
— Essa foi por pouco. — Pôs aliviado a mão sobre peito após guardar o celular no bolso. — Me desculpa pelo que fiz mais cedo — pediu envolvendo-me com o braço livre, dando um beijo em minha testa. — Eu não queria te assustar, desculpa — sussurrou se afastando novamente, vendo-me assentir ainda um pouco desconfortável.
— Pode ficar à vontade. — Apontei o sofá e segui para a cozinha, iria pegar a louça necessária para comermos, apesar de eu não estar lá tão interessada no doce, havia comido bastante com Taehyung antes. — Não achei que viria aqui tão tarde — digo lembrando de que ele não morava perto.
— Eu tinha obrigação de vir te pedir desculpa pessoalmente — disse retirando da cabeça o gorro que usava, puxando um pouco as mangas longas do moletom largo. Jimin parecia totalmente outro naquele terno de mais cedo.
— Entendi — sussurrei voltando até si, colocando os pratos e as colherinhas sobre a mesa, o entregando a faca para que me cortasse a torta. — Por que Taehyung te tira do sério? — perguntei olhando-o me servir primeiro.
— Tivemos algumas brigas bem sérias no passado — respondeu não parecendo surpreso de eu tocar no assunto, já deveria ter vindo esperando por aquilo.
— Ele me contou que a irmã dele já foi meio que bem íntima de você. — Cortei a ponta da fatia com a colher.
— Eu era do tipo que não gostava de relacionamentos, então não assumimos nada, éramos apenas amigos com benefícios e eu deixava isso bem claro — explicou quase na defensiva.
— Isso geralmente não acaba bem... — comentei prendendo as mechas soltas atrás das orelhas.
— Sim, mas eu descobri isso depois de um bom tempo. — Forçou um sorriso constrangido. — Ela não aceitou muito bem, então eu achei melhor me afastar pra não piorar tudo mais ainda.
— Mas parece que piorou mesmo assim. — Ele respirou fundo.
— Eu era imaturo, não sou mais daquela forma, aconteceu muita coisa desde aquela época — disse olhando-me enfiar a primeira colherada na boca, esperando minha reação. — Eu devia ter trazido sorvete também, vou me lembrar na próxima.
— Não é justo comprar as pessoas com doces — resmunguei me aconchegando melhor na poltrona, estava realmente boa.
— Não gosto de mimar qualquer pessoa, você é um caso especial. — Endireitou a postura, dando-me um sorriso gentil. — Estava estudando? — perguntou notando a pasta de documentos que eu havia deixado largada no sofá onde havia se sentado, rindo confuso quando me apressei para tomá-la de sua mão.
— Segredo de estado. — Ajeitei as folhas que estavam soltas antes de fechar a pasta, indicando que iria guardá-la antes de seguir para o quarto.
Jimin me contou um pouco mais sobre a época entre sua pré-adolescência e a atual, conseguindo me surpreender com a mudança drástica de rotina que teve em questão de poucos anos.
Aos quatorze, Jimin teve o primeiro contato com drogas e aos dezesseis passou a frequentar boates e bares, mas disse nunca ter se divertido muito nesses lugares, que ia mais para se ocupar que por gostar mesmo de um espaço pequeno lotado de pessoas agitadas e alteradas.
Tinha alguns amigos que facilitavam sua entrada nos locais e foi numa noitada que conheceu Choon-Hee, irmã mais nova de Taehyung, noite também onde teve sua primeira overdose de cocaína e foi internado. Ele assegurou estar limpo há dois anos ao notar minha feição preocupada, mas eu ainda estava tentando digerir a informação que estava sendo mais séria do que eu esperava.
Eu entendi um pouco sobre o tal passado nada bonito dos irmãos Kim e Jimin fazia parte dele, ao menos uma parte, pois Jimin me disse com um sorriso pretensioso para questionar a Taehyung a parte mais séria da coisa caso eu quisesse saber realmente.
Ele mudou de assunto após um silêncio desconfortável começar a se assentar, perguntando sobre a aula que ele havia faltado e o segredo de estado guardado agora em meu quarto. Yoongi havia me pedido para não dizer sobre os documentos para alguém da classe antes de segunda, dia em que seria o tribunal simulado, então apenas comentei que seria sobre um assassinato e que devíamos estudar bem os livros, aproveitando para mostrar a Jimin o resumo trazido por Yoongi para nos ajudar, mas ele não pareceu muito interessado no texto descomplicado.
Já era um pouco tarde e Jimin acabou não ficando tanto tempo, se levantando para se retirar e me pedindo desculpa uma última vez enquanto eu o acompanhava até a porta, ficando constrangido quando tentou me abraçar e eu me afastei, deixando a sensação de estranheza entre nós dois.
Guardei o que havia sobrado da torta e peguei meu celular antes de seguir para o quarto, terminaria de assistir a reportagem que Jimin acabou interrompendo e leria mais algumas páginas do caso antes de dormir.
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