Ele voltou com algumas coisas na mão e me deu para segurar enquanto ele lavava a roupa na pia. Depois de alguns minutos ele terminou e me estendeu.
– Mas já?
– Olhe. – Ele apontou para o local onde havia uma mancha, agora estava apenas as figuras das flores.
– UAU... Eu com certeza preciso aprender a fazer isso.
– Vinagre sempre vai ser seu salvador, pode confiar...
– Eu acho que vou começar a limpar isso tudo.
– Deixa comigo. – Ele pegou as coisas que estavam nos meus braços – Aliás, por que estava aqui?
– Eu... – Antes de eu falar algo alguém apareceu atrás da gente.
– O que aconteceu aqui?
– Eu posso explicar... – Eu iria falar, mas ele me cortou.
– Fui eu, eu iria ajudar ela a colocar sabão. Só que sem querer deixei cair demais. – Ele deu um sorriso de lado.
– Vou deixar passar dessa vez mocinho... – Ela sorriu desconfiada. – E parece que já conheceu a Mia.
– Pois é...
– Ótimo, só falta apresentar a nova funcionária ao Joey. – Ela falou indo embora.
– Nova funcionária? – Ele olhou pra mim confuso.
– Eu prometo que não irei chegar perto desse quartinho novamente. – Falei começando a enxugar o chão.
– Já falei que pode deixar isso comigo... – Ele me fez levantar – Vai estender esse vestido em algum lugar para secar.
– Mas... – Ele foi me empurrando para fora do quarto e o fechou na minha cara. – Eu já volto!
Andei para os fundos, onde havia um quintal e uma casa pequena do outro lado do jardim. Avistei um varal e andei até o local quando meu celular começou a tocar.
– Oi pai... – Deixei meu celular no viva-voz em cima de uma mesinha ao lado.
– Onde você está? Minha cabeça ainda está morrendo. – Ele gemeu.
– Estou no trabalho... – Falei pendurando meu vestido na corda.
– Mas já? Pensei que só podia começar segunda...
– Pois é, acontece que eu não tinha muita coisa pra fazer hoje. E aproveitei que ela me contratou logo.
– Que orgulho da minha filhinha. – Ele fez uma voz meiga o que me fez rir um pouco – Mas eu preciso muito que você me traga um chá com remédios. Tá complicado ficar assim. Por favorzinho, huh?
– Você é realmente complicado de lidar. – Falei pegando o celular – Chego aí em uns minutos.
– Eu também te amo.
– Tem chá aqui. – Bati minha cabeça no garoto assim que virei.
– Ai! Há quanto tempo está aqui? – Coloquei minha mão na cabeça.
– Por azar, o suficiente para ouvir seu pai fazer uma voz meiga. – Ele começou a estender os panos molhados no varal.
– Ele faz isso toda hora. – Revirei os olhos.
– Eu terminei de enxugar lá. Pode ir... – Ele se virou para me olhar.
– Desculpa... Mas você tem remédios para ressaca? – Fiz uma voz gentil.
– É, você puxou do seu pai essa mania de persuadir as pessoas. – Ele foi andando para a casa e eu fiquei fora esperando. Depois de uns dois minutos ele sai. – Pega.
– A dona mora ai? – Perguntei pegando o remédio e entrando no restaurante novamente.
– Sim. Aliás, o nome dela é Rose. – Ele entrou na cozinha.
– Não precisa fazer o chá...
– Fala que é meu presente.
...
– Olha, você tem muita sorte que consegui o chá de graça. – Sentei no sofá com ele.
– Ah é? Quem foi o abençoado que deu? – Ele pegou o remédio e tomou junto ao chá.
– Alguém... Meu Deus, você parece um morto. – Levantei – Eu preciso ir, quero ajudar eles lá. Vou trazer algo pra comer mais tarde. Beijos...
– Eu te amo!!! – Meu pai gritou com a voz um pouco rouca.
...
– ... No final você pode colocar o pedido nessa caixinha aqui, que no final da tarde contamos tudo para ver se está conforme com o dinheiro... – A Rose terminou de me mostrar como funciona o atendimento. – Tudo bem com tudo?
– Sim sim. Eu vou dar meu máximo. – Sorri.
– Você é uma graça, venha. Você não quer sujar a sua roupa, não é? – Ele me levou até o banheiro dos funcionários – Pegue, essa será sua roupa para trabalhar. Você poderá sempre se trocar aqui.
– Obrigada Rose.
Eu coloquei o vestido azul claro que combinava com o ambiente e andei até o salão do restaurante.
– Só vê se não mancha esse ai, Sra. Desastrada.
– Por que você não vai atender os clientes? Huh? – Falei passando por ele e continuei com o serviço, ignorando o risinho sínico que ele deu.
...
Sábado era um dia movimentado no restaurante, mas não havia muitos jovens por ali. O horário do almoço e lanche acabou, deixando o lugar ficou vazio. Eu aproveitei para limpar as mesas do andar de cima.
– Mia, minha querida. Quando terminar, pode descansar um pouco... Vou preparar uma refeição especial para você. – Ela entrou na cozinha.
– Obrigada Rose. – Falei andando até as escadas.
Eu realmente tinha adorado aquele lugar, a paisagem era muito bonita, a música de fundo era agradável, tinha uma decoração leve e rústica, era um tipo de local que eu passaria minhas tardes sem reclamar. Eu terminei de arrumar o andar e fui para a varanda, fiquei sentada em uma das mesas e peguei o celular.
~Eu tirei 9 em História, mesmo odiando. Mas acho que o fato de você amar me fez ter um pouco de interesse na disciplina...~14h36
~Oi filha. Como está indo por aí? Seu pai não responde minhas mensagens... Você sabe porquê. Enfim, espero que esteja feliz com a sua decisão. ~14h48
~Está tudo bem...~14h53
– Sabe, antigamente tínhamos uma regra de não usar celular no trabalho. Mas como está no final do expediente, tudo bem. – Ele colocou a comida na mesa e sentou na minha frente.
– Obrigada. Eu só estava respondendo minha mãe. – Falei antes de colocar um pedaço do omelete na minha boca – Meu Deus, isso é uma delícia.
– É o que todo mundo fala. – Ele começou a comer o seu omelete também.
– Você deve gostar daqui.
– Eu não odeio. – Disse com a boca cheia.
– É tudo calmo e parece que não há preocupações com nada, sabe?
– Não é bem assim.
– Ah é? Que tipo de preocupações você tem? – Perguntei dando mais uma garfada.
– Você não quer saber, acredite. – Ele me olhou sem expressão.
– Sabe o que eu acho? Nunca me divirto com nada, estou sempre esperando para o que vem depois.
– Continue. – Ele tomou um gole da bebida e olhou para mim.
– Você não acha que todos são assim? Vivem de forma rápida, sem aproveitar o momento. Pois estamos ocupados apressando as coisas para fazermos o que deveríamos de nossas vidas. – Falei respirando fundo – Esses momentos de lucidez em que paro por um segundo e penso: “Espera, é isso. Essa é minha vida. Um dia eu vou estar embaixo da terra e vai ser APENAS isso...”.
– Não vai ser APENAS isso se você não deixar que seja. Você quer ser uma chata e preguiçosa a vida inteira?
– Eu sou muito boa nisso. – Olhei para o mar – Eu estou presa. Não tenho para onde subir, não tenho para onde descer.
– Você não pode viver a vida toda desse jeito. Não se esforce para tentar aproveitar o momento... O momento nos aproveita. – Ele passou a bebida para mim.
Levamos tudo para o térreo e eu me despedi da Rose, agradecendo a comida e o emprego.
– Eu vou pedir para meu pai passar aqui daqui a pouco para pegar o carro. – Falei saindo.
Enquanto eu estava caminhando para casa, o carro do meu pai apareceu parando do meu lado.
– Carona?
– Você de novo, o que está fazendo? – Perguntei aproximando da janela.
– Levando esse carro para sua casa, a chave já estava aqui. Vamos, entre. – O garoto destravou a porta e eu entrei.
– Obrigada, meu pai não iria vir buscar o carro. Ele deve estar em coma naquele sofá. – Abri a janela e me encostei – Aliás, você sabe onde é minha casa?
– Estava no formulário que você entregou para Rose.
– Você é o filho dela, né? – Perguntei me virando pra ele.
– Você é bem curiosa... Eu não sou o filho dela.
– Ah, então é o cozinheiro.
– Ele também não é.
– Como assim? Ela falou que o filho dela trabalhava lá.
– Eu fui adotado por ela e o marido há uns anos. – Ele tentou olhar para mim enquanto dirigia.
– Oh... Ah, agora entendi o que o Thomas queria dizer. – Falei baixinho.
– Thomas, o seu namorado?
– Cala boca. Você sabe que ele não é meu namorado.
– Não foi o que seu pai disse ontem. – Ele riu.
– Eu prefiro escutar música a ouvir você falar. – Peguei qualquer CD e coloquei.
– Okay. Oasis e Rod Stewart. O que mais?
– Bom, acho que Beatles marca mais minha vida com meu pai.
– Don’t Go Away... Nada mal. – A música começou a tocar e tomou conta do carro. Depois de uns dois minutos, nós chegamos.
– Obrigada. – Falei saindo com ele.
– Tudo bem.
– Ei, como você vai voltar?
– Mia, é só três quadras daqui.
– Você fez um caminho meio longo...
– Eu mudei a rota sem querer. – Ele piscou – Estou indo então.
– Espera! – Fui em direção a ele.
– Já está com saudades?
– Você ainda não disse seu nome... – Eu finalmente tinha me dado conta desse detalhe.
– Ah, já estava ficando feliz com minha identidade escondida. – Ele fez uma cara triste.
– Fala logo.
– Daniel.
– Oh, okay. – Andei um pouco mais perto dele – Oi Daniel.
– Oi Mia. – Ele também se aproximou.
– Bom... Tchau Daniel. – O afastei de mim antes que tenha a oportunidade de fazer algo.
– Tchau Mia... – Ele deu um sorriso de lado e voltou a andar.
...
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