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História Survive Anyway - Prologue


Escrita por: webdom e dracarysz

Notas do Autor


oi nenês sz
bem, aqui estamos, dando início a essa história na qual nos empenhamos muito nos últimos dias
essa é a introdução dos nossos dois personagens, que os veteranos (obviamente) já conhecem
estamos muito nervosas com esse recomeço; não sabemos como seremos recebidas por vocês, já que mudamos muita coisa
esperamos apenas que vocês gostem e aproveitem esse detalhe sobre a vida dos dois que nós não tínhamos apresentado antes, mas decidimos fazê-lo dessa vez
vale ressaltar que ainda estamos recebendo fichas, não é preciso ter pressa; já repetimos várias vezes: aceitamos fichas o tempo todo!

enfim, sem mais delongas
boa leitura <3

Capítulo 1 - Prologue


Fanfic / Fanfiction Survive Anyway - Prologue

Lynnie Jenkins Thompson
Lar, 5:39 PM

Eram por volta das cinco da tarde. Lynnie Thompson chegara em casa, cansada de mais um dia exaustivo de sua vida de universitária. Deu uma breve olhada pela casa, concluindo que se encontrava sozinha ali. Pensou consigo mesma que poderia preparar um jantar especial para a família, mas o fato de que não sabia cozinhar lhe veio à tona. Jogou a mochila em um dos sofás e sentou-se na poltrona, suspirando. Agarrou o controle remoto, ligando a tevê. Arrependeu-se do que fez no mesmo instante, pois, nesse horário, apenas noticiários estavam sendo transmitidos. Lynnie estava prestes a desligar a televisão, mas a notícia que estava sendo exibida prendeu-lhe a atenção.

— Durante esta tarde, mais um ataque canibal foi registrado. Dessa vez, pelos moradores de um bairro suburbano de Atlanta. Damien Ross, de trinta e cinco anos, teve um pedaço do braço arrancado pela própria esposa, Jocelyn, de trinta e três anos. A mulher aparentava estar totalmente inconsciente durante o ataque. Ambos foram levados para... — a jornalista parou de falar, dando atenção para o que diziam através do aparelho em seu ouvido — Temos um caso urgente de um outro cidadão de Atlanta, que se encontra nas ruas de seu bairro, totalmente descontrolado. A nossa equipe está cobrindo o acontecimento.

A imagem na tela muda. As câmeras registravam ao vivo o acontecimento. Várias pessoas cercavam uma área rodeada por uma fita amarela, atentas a tudo o que acontecia por ali. Um homem, totalmente fora de si, tentava desesperadamente atacar com os próprios dentes o policial que o apreendia. Lynnie mantinha os olhos grudados na tela, perturbada com o que via. Não era a primeira vez que estava assistindo casos assim. No dia anterior, o noticiário baseou-se apenas em casos como este. E mesmo assim, Lynnie ainda não havia se acostumado com a ideia de existirem canibais habitando sua cidade, aquele pesadelo havia chegado até mesmo em Atlanta, e parecia estar se propagando cada vez mais.

O homem se debatia, gritava. Arranhava o policial com as unhas, com tanta força, que fez com que o mesmo precisasse afastar-se do homem. Seu braço agora encontrava-se machucado e com cortes profundos.

O homem, quando finalmente viu oportunidade para atacar o policial, tentou avançar no mesmo, que correu de forma desesperada. As pessoas que ali estavam começaram a gritar, ora desesperados, ora com medo, ora enfurecidos. Os outros policiais não viam outra saída, a não ser atirar no indivíduo descontrolado. Um tiro no peito seria o suficiente. E assim, fizeram, ignorando totalmente os pedidos de misericórdia pelas pessoas ali em volta. Lynnie desviou o olhar ligeiramente, a tempo de ver seu pai e irmão mais novo entrando em casa.

Tristan subiu as escadas, ignorando totalmente o estado de choque da irmã mais velha, sequer dando-lhe um "oi". Sr. Jenkins notou a perturbação da filha quanto à isso. Encarou a televisão, juntamente de Lynnie, que criou coragem para ver o corpo morto do homem no chão. E, para a sua surpresa, não via nada mais, nada menos, do que um homem, com três tiros no tórax, caminhando na direção dos policiais que tentavam atirar no mesmo.

O estado de choque da garota virou uma expressão horrorizada e confusa. O pai, Edmond, tocou seu ombro, o que fez com que Lynnie desse um sobressalto no lugar. Pegou o controle rapidamente, desligando a televisão. Suspirou, acalmando-se.

— Eles precisam fazer alguma coisa — comentou a jovem, encarando a tela preta.

— Mas o que podem fazer? Essas pessoas estão descontroladas, doentes. Mordem qualquer um que verem na frente — Edmond falou, num tom melancólico.

Lynnie levantou-se da poltrona, apanhando sua mochila.

— Pra onde vai? — indagou seu pai.

— Eu não sei, talvez na biblioteca. Eu só preciso me distrair um pouco, isso vai acabar me deixando louca — explicou a jovem, com uma expressão incomodada.

— Você está louca, Lynnie. Louca de cogitar sair de casa. Não viu como está o mundo lá fora? E se você virar uma dessas coisas? — preocupado e em tom um tanto quanto alto, Sr. Jenkins perguntou para a filha — Você não vai pra canto nenhum, se quer se distrair, leia os livros que tem em casa.

— Não vou virar uma dessas coisas, ninguém sabe ao certo como se espalha — rebateu a jovem, ajeitando a mochila nas costas.

— Você não me ouviu direito. Você não entendeu que, em todos os bairros dessa cidade, está acontecendo a mesma coisa. Eu não quero vê-la como essas pessoas — Edmond aumentou o tom de voz.

A garota o encarou por três segundos antes de dar meia volta e passar pela porta de casa, ignorando os berros de repreensão do pai. Olhou em volta, a rua totalmente calma e pacífica. Nenhum sinal de pessoas como as que viu nos noticiários nos últimos dias. Umedeceu os lábios antes de começar a andar para, provavelmente, seu lugar favorito da cidade: a biblioteca.

[...]

Lynnie fechou o livro aleatório que tinha pego na prateleira, insatisfeita com o enredo. Estava há uns trinta minutos tentando achar algum livro decente para ler, mas nenhum lhe agradava. Suspirou, percebendo que voltara a pensar sobre as pessoas que vira nos noticiários. Fechou os olhos, massageou as têmporas com os dedos, respirou fundo, tentando de uma forma quase que desesperada pensar em algo além daquelas pessoas podres.

— Está tudo bem com a senhorita? — a bibliotecária murmurou, tocando o ombro da garota, que abriu os olhos, sorrindo pequeno para a senhora, que possuía o óculos na ponta do nariz e os cabelos avermelhados presos em um coque perfeitamente centralizado no topo da cabeça. O típico visual de uma bibliotecária que já passa dos seus cinquenta anos.

— Sim, não se preocupe — respondeu a garota, voltando o olhar para a prateleira lotada de livros.

Sra. Jackson assentiu, voltando para sua mesa. Sentou-se na cadeira, segurou o fino livro de romance com uma das mãos, ajeitando o óculos em seu rosto em seguida. Umedeceu levemente a ponta do dedo com a língua, para auxiliá-la a virar a página. Levantou o olhar ao ouvir um murmúrio vindo de um dos corredores.

— Shh! — levou o polegar aos lábios, pedindo silêncio para os jovens que estavam ali, que apenas assentiram e voltaram a conversar, dessa vez, em tom mais baixo.

A senhora deu uma última olhada em volta da biblioteca, mas seu olhar fixou-se em uma das janelas do lugar, bem a tempo de ver que a rua estava extremamente movimentada. Pessoas estavam correndo e gritando. Levantou-se rapidamente, indo na direção da janela. Os demais ali presentes também juntaram-se para tentar entender o que se passava. E Lynnie só conseguia pensar em uma coisa: todos ali corriam na direção de sua rua.

A garota buscou sua mochila e correu para fora da biblioteca. Assim que abriu a porta, pôde ouvir os barulhos ensurdecedores dos tiros que tentavam atingir, provavelmente, as pessoas que estavam tentando atacar as outras. Ela sabia que não seria uma boa ideia correr pelas ruas assim, desprotegida e vulnerável, mas mesmo assim, o fez.

Começou a correr desesperadamente pelas ruas, refazendo o caminho para casa. Algumas lágrimas começavam a escapar de seus olhos ao perceber o caos em que tudo ali havia se tornado. Ela torcia para chegar em casa logo, para que nada tivesse acontecido com seus familiares.

Ela ouvia choros desesperados de pessoas ali; ouvia mais tiros; ouvia mais gritos. Tentava correr pelos lugares em que pensava serem os mais seguros, pois não queria ser atacada ou pega de surpresa por nenhuma daquelas pessoas, ou até mesmo atingida por alguma bala perdida.

Finalmente chegara em sua casa. Viu que a porta estava apenas encostada. Ofegante e cansada, abriu a mesma, deparando-se com quatro pessoas avançando para seus familiares. Desesperada e com medo, olhou em volta, procurando algo para poder se defender, mas não conseguia pensar em nada.

— Lynn, ajuda o seu irmão! — sua mãe berrou, mas quando a garota levantou o olhar para olhá-la, viu que duas das pessoas conseguiram alcançar seus pais.

A garota gritou, paralisada no lugar. As mãos na boca, as lágrimas caindo incontrolavelmente de seus olhos, que rolavam de forma desesperada sobre toda aquela bagunça ali. Lynnie apenas saiu do seu transe ao perceber que uma daquelas coisas – afinal, não eram mais pessoas – estava prestes a alcançá-la. Não viu outra opção, a não ser correr dali. Saiu pela porta da casa, correu até o outro lado da rua, e então, o grito doloroso de sua mãe ecoou.

Percebeu que era tarde demais para tentar fazer algo. A garota pensava apenas em como conseguiria escapar ilesa daquela situação, e a sua única saída foi correr. Corria tanto e tão rápido, que sentia que seu coração estava prestes a sair pela boca. De tanto chorar, eu rosto já se encontrava tão vermelho quando a blusa que usava por baixo da jaqueta. E seu único pensamento no momento era a sua atitude egoísta.

Se arrependia amargamente por sequer ter tentado ajudar os familiares. Pensou apenas em si mesma, e isso lhe doía muito.
Ela entrou num beco próximo, se encostou na parede e deslizou até o chão.

"Isso não está acontecendo, não pode estar acontecendo.." 

Repassou a cena que acabara de acontecer em sua cabeça, só então processando o que havia feito.

— O que caralhos eu fiz?! — murmurou para si mesma, frustrada. Sentiu um gosto amargo na boca, e logo percebeu que era sangue. Havia mordido a própria língua.

Num ataque de fúria, ela se levantou, decidida. Ia voltar pra sua família, a ajudá-los da forma que pudesse, e dessa vez, não fugiria. Lynnie correu de volta para casa tão rápido quanto saiu. Percebeu que, em apenas dez minutos, sua rua havia se tornado bem pior do que tudo que ela já tinha visto na tevê. Entrou em sua casa uma terceira vez naquele dia, e viu aqueles monstros, debruçados sobre os corpos de seu pai e sua mãe.

Não pensou duas vezes ao pegar o atiçador de lareira, apoiado ao lado, e um pouco relutante, trêmula e apavorada, se aproximou deles. Ao notarem sua presença, deixaram o que estavam mastigando, voltando completamente a atenção para ela. Sentiu seu corpo todo entrar em estado de pânico, não conseguia mover um dedo sequer enquanto aquelas coisas se aproximavam. Lynnie mal conseguia mover os olhos na direção dos corpos do pai, dilacerados.

"Não posso deixar que façam o mesmo comigo, não posso ser fraca", ela murmurou pra si mesma, e decidida, berrou para as criaturas que estavam cada vez mais perto:

— Seus desgraçados! — ela acertou o primeiro na garganta com a ponta do atiçador, em um movimento horizontal. O sangue escuro escorreu de seu pescoço, manchando completamente o chão. Sentiu o horror em tal ato: o nojo, a repulsa, a vontade de vomitar.

Lynnie mais uma vez, fitou aquelas criaturas, horrorizada. Ninguém normal sobreviveria a isso. 

"Bem...", ela pensou, "É preciso mudar de tática, então.". 

E com um grito violento, ela enfiou o atiçador nos olhos da coisa, que acabou acertando em cheio a garganta do outro por trás. Suas mãos – agora escarlates, sujas pelo sangue que escorria das criaturas – mancharam sua roupa, num movimento instintivo de limpá-las. Ela percebeu, que a criatura da frente, tinha morrido na hora com o golpe na cabeça, porém, a segunda ainda se debatia, presa pela garganta ao atiçador. Foi uma observação aterrorizante para ela que não sabia o que pensar sobre o que tinha acabado de fazer. Tinha acabado de matar... Contudo, naquele momento, haviam outras prioridades, seu irmão, ela ainda tinha esperanças que ele tivesse se escondido, que estivesse bem.

Ela fez o trajeto até o quarto de seu irmão em silêncio. No caminho, notou uma mancha de sangue na porta e por todo o chão; viu uma mão decepada pela fresta entreaberta, e sabia que era de Tristan, por conta da pulseira no pulso que ela tinha dado a ele em seu aniversário. Ela soltou todo o ar de seu pulmão. Sentiu seu mundo desabar. Caiu de joelhos no corredor, sem amparo algum. É claro que era tarde demais para Tristan também. As últimas palavras de sua mãe para ela foi que o ajudasse, que fosse socorrê-lo; mas como sempre, ela não havia escutado os pais, e agora estava sofrendo pelas consequências como jamais havia sofrido na vida. Tristan estava morto, por conta da covardia dela, do egoísmo, do medo. Lynnie não quis vê-lo, não quis ver seu corpo, apenas fechou a porta fazendo os ruídos lá de dentro cessarem, seu corpo todo tremia por causa dos soluços. Ela queria gritar, rasgar a garganta de tanto berrar, mas som algum saia de sua boca. 

Sua família estava morta, só restara ela, mas até mesmo Lynnie não se sentia mais tão viva assim. Já estava cogitando se não seria uma má ideia se jogar de cima de algum prédio, era o mínimo que ela achava merecer. A garota se levantou, decidida. Ia tirar a própria vida. Porém, toda aquela vontade foi embora, quando ouviu seu nome sendo chamando por ele no andar de baixo. Ele, logo ele, veio lhe salvar.
"Será que não havia nada mais irônico que isso?", ela se perguntou, e desceu as escadas.

Octavian Hills Carstairs
Teatro, 5:39 PM

"O lago dos cisnes", de Tchaikovsky, era, sem dúvida, o que Octavian Hills mais odiava tocar. Talvez pelo fato de ser dramático, melancólico demais, até mesmo para alguém como ele. Porém, quando se deve prestar serviços comunitários – ou estágios, que era o seu caso –, não lhe havia outra opção. Estava trabalhando contra a sua vontade em um teatro há uma semana, onde uma classe de balé ensaiava para apresentação, em que ele faria parte da orquestra. Estava ali por obrigação, pois era um programa da faculdade de música, que era nada mais, nada menos, que seu sonho se tornando realidade. Entretanto, ninguém havia lhe contado que teria pedras no caminho. Pedras essas que rolavam e o acertavam bem no saco. Para Octavian, tudo aquilo, era um saco.

Viu quando uma das dançarinas se aproximou dele ao final da aula. Era alta, cabelos ruivos e cheia de sardas. Estava flertando com ele desde que tinha posto os pés ali, mas o garoto ainda não tinha certeza se a magrela valia seu tempo.

— Octavian, oi — a garota o abordou, no momento em que ele fechava o case de seu violino.

— Oi... — ele respondeu, tentando vasculhar em sua mente o nome da garota, havia esquecido. — Madison...?

— Na verdade, meu nome é Jennifer — a garota disse sem graça e com um sorriso vacilante.

— Eu disse Madison? Que falha a minha — Octavian argumentou tentando tirar o dele da reta. — Enfim, Jennifer, em que posso ajudar? — ele perguntou tentando soar gentil.

— Ah, as garotas queriam saber se você não poderia tocar uma última música? Sabe, pra contrair um pouco...

Octavian sentiu sua pálpebra esquerda tremer, num tique nervoso que ele tinha contraído desde que veio para o lugar, que não fazia nem um pouco seu estilo. Ele piscou algumas vezes, e assentiu num sorriso amarelo para a garota, que saltitou de felicidade. Octavian precisava de uma ótima recomendação, precisava das melhores notas, um sacrifício desse não iria impedi-lo de ter o que queria. Afinal, ele havia feito uma promessa para um certo alguém, e não a quebraria nessa vida, nem na próxima após a próxima.

O jovem aguardou as garotas pedirem a música, e por Deus, ele rezou, que não lhe pedissem para tocar Clair de Lune mais uma vez, ou ele cortaria os pulsos com o arco do próprio violino. Retirou o instrumento de seu case novamente. Ah, o trabalho que essas magrelas davam a ele...

— Nós nos decidimos... — uma das amigas da tal Jennifer disse elevando a voz fina no estúdio. — Queremos que toque Clair de Lune.
Octavian engoliu em seco, assentiu, e tocou tão furiosamente que achava que as cordas do arco iriam arrebentar. Ele nunca havia tocado com tanta raiva em toda a sua vida.

No final, ele se despediu tão depressa, louco para sair dali, que mal notou a ausência de sua mochila com seus materiais e partituras. Já estava atravessando a rua, na esquina, em frente a uma loja de tevês usadas, que ficavam ligadas 24 horas por dia, quando ouviu alguém gritar seu nome; era Jennifer, segurando sua mochila, ele tateou os ombros, confirmando a ausência da mesma, já que estava nas mãos da menina.

— Você... — ela começou, ofegante pela corrida. — Anda bem rápido, quase não te alcanço.

"Bem, era essa a intenção", ele pensou.

— Obrigado — ele disse tomando a mochila das mãos da garota. — Eu estava... estou, com pressa.

— Percebi — ela murmurou, e ficaram ali se encarando, ambos não sabiam o que dizer. 

Octavian estava se perguntando se não seria muito grosseiro dar as costas agora e ir embora, enquanto Jennifer só queria alguma desculpa plausível para poder passar mais tempo perto do garoto. Ela teve sorte com a mochila, não sabia se teria outra oportunidade como essa e não queria desperdiçar. O rapaz abriu a boca para se despedir, e a garota o olhou brilhando de expectativa. Porém, nada foi dito. Ambos tiveram as atenções tomadas pelas imagens do noticiário que estava sendo transmitido pelas diversas televisões diante deles.

— Meu Deus... — a garota murmurou deixando sua bolsa rosa cair sobre seus pés, que ainda calçavam as sapatilhas de balé. — Chegou em Atlanta.

De repente as imagens mudaram, e Octavian arregalou ainda mais os olhos. Acabara de ver alguém levar três tiros no peito e continuar de pé, como era possível?!

Bem, aquilo não importava. Precisava ir pra casa antes que aquilo chegasse ao seu bairro. Ele se virou para Jennifer no exato momento em que a garota fixou as mãos na vitrine.

— Esse bairro é próximo da minha casa... Minha família... — ela murmurou, e Octavian se compadeceu por ela. Porém, a raiva por tê-lo feito tocar Clair de Lune tantas vezes era maior.

— Você deveria pegar um táxi, ou sei lá, um caminho alternativo — ele disse, voltando a caminhar. Seu apartamento não ficava muito longe de onde estava. 

— Aquele é o único caminho para casa! — a garota exclamou. O jovem virou-se para ela, parecia desesperada, e beirando as lágrimas. Octavian odiava ver pessoas chorando.

— Ah, certo, você... — Octavian procurava por alguma solução, e infelizmente, só conseguiu pensar em uma. — Você pode ir lá pra casa, e ligar pros seus pais, quando tudo estiver calmo, você vai, certo?

Jennifer assentiu, enxugando os olhos com as costas das mãos. Ela não recusaria uma proposta dessa por nada na vida. A caminhada até a casa de Octavian foi curta, ela não fazia ideia de que ele morava tão perto do teatro, e ele, desejava não morar tão perto assim. O apartamento ficava no segundo andar de um prédio comercial; embaixo havia uma cafeteria. Parecia coisa de outro país. Octavian amava aquilo, lhe lembrava a Itália.

O apartamento não era nada do que Jennifer esperava ou fantasiava desde que o conheceu. Era bem arrumado, amplo. Não havia separação entre os cômodos, exceto para o banheiro.

— O telefone está ali — Octavian disse apontando para a parede atrás dela. — Fique a vontade, mas... não toque em nada — ele resmungou guardando suas coisas.

A garota o observava com atenção, e então, decidiu abrir o jogo com ele.

— Eu menti.

— O quê? — Octavian perguntou, confuso.

— Meus pais não moram naquele bairro, eu disse aquilo para ver até onde iriamos, porque queria passar mais tempo com você.

Octavian abriu a boca para xingá-la e manda-la embora. Quem mente sobre uma coisa tão séria como essa, apenas para passar mais tempo com alguém que sequer queria ser incomodado com os problemas alheios?

No entanto, antes de qualquer palavra ser proferida, a porta de seu apartamento foi aberta por seu amigo, Erick, que estava vermelho e arfando.

— Cara! — seu amigo exclamou, parecia aterrorizado.

— O quê? O que foi? — Octavian perguntou, mais irritado do que aparentava estar.

— Está um verdadeiro caos lá fora — ele começou, ofegante. — Os bairros... mais da metade, estão sendo atacados por essas... essas coisas.

— Os canibais? — o maior perguntou, se aproximando, examinando o amigo. Parecia bem. Um pouco assustado, mas bem. Percebeu o tremor de suas mãos e se preocupou mais do que devia. Erick era baterista, tinha total controle de suas mãos.

"As coisas lá fora devem estar mais feias do que eu pensava", Octavian pensou, ainda observando o rapaz em choque.

Erick assentiu com a cabeça. Octavian fechou os olhos. Pensou em seus pais, principalmente em sua mãe, sua única e verdadeira família. Moravam em um bairro nobre não muito distante dali. Precisava ir vê-la, ver se estava bem, mas alguma coisa em seu coração dizia que não. Um sentimento amargo se apossou de Octavian.

— Sua moto... tá lá embaixo? — ele perguntou para o amigo, que assentiu, sabendo exatamente para onde Octavian pretendia ir. Sem hesitar ou reclamar, lhe entregou a chave. Octavian a pegou e apertou os ombros do amigo com a mão livre. — Tranque tudo; não abra pra ninguém, só pra mim.

— Mas e eu? — Jennifer perguntou. Octavian quase tinha esquecido da garota. Virou-se para ela, agarrando seu braço com uma mão, e a puxando para fora num gesto nem um pouco sutil.

— Sai da minha casa — ele disse, batendo a porta atrás de si, e em seguida, ouvindo o barulho da chave do outro lado.

— Você não pode me deixar, ouviu o que seu amigo disse, lá fora está um caos!

— Você vai conseguir outro lugar pra ficar, é só forçar o choro mais um pouquinho em quem sabe você sobrevive — ele disse de forma rude, descendo as escadas rapidamente e subindo na moto.

— Você é um idiota! — a garota exclamou vindo na sua direção. Ele sorriu seco.

— Arrivederci, Madison! — ele disse arrancando na moto, mas isso não lhe impediu de ouvir o grito agudo da garota:

— Meu nome é Jennifer!

[...]

Octavian não precisou chegar na casa dos seus pais pra saber que aquele bairro, Northside, também tinha sido tomado pelos canibais. Na entrada, ele já havia encontrado várias patrulhas de polícia vazias e pessoas correndo por suas vidas. Quase atropelou um garoto no caminho. Ouvia gritos de pessoas clamando por socorro. Diversos incêndios haviam acontecido por ali. Mas com certeza os gritos eram a pior parte de tudo, pois pareciam ecoar na sua cabeça e repetir, várias e várias vezes como um disco arranhado.

"Se o inferno realmente existe, então ele não deve ser muito diferente disso", ele pensou.

Ele estacionou a moto de qualquer jeito na entrada. Escalou o grande portão de ferro, pois não havia tempo para tocar a campainha. Em sua caminhada, ele se acalmou, notando que tudo parecia intocado, quieto e tranquilo, como sempre. Seus pais estavam bem, sua mãe estava bem. Era o que ele esperava. Porém, ao pôr os pés na casa, Octavian notou que algo estava errado. Havia um silêncio mortal no local, e aquilo o arrepiou a espinha, pois o fez temer o pior.

Ele subiu as escadas da casa correndo, mas ainda assim temeroso. Não se deu o trabalho de procurar por eles no andar de baixo, que estava tão morto quanto tudo lá fora.

Foi no segundo andar que ele encontrou seu pai, debruçado sobre a mesa do escritório. Se apressou e se colocou ao lado do pai, examinando o mesmo. Notou um arranhão no rosto dele, estava bem feio e inflamado. Soltou um suspiro longo. Precisava achar sua mãe.

— Garoto... — um murmúrio soou pelo silêncio perturbante que dominava aquela casa, fazendo Octavian dar um sobressalto e levar a mão ao peito pelo susto. 

— Jesus Cristo! — ele exclamou, virando-se.

— Não, sou eu, seu pai... ou o que sobrou dele — Philip Hills murmurou, carregado de sarcasmo, coisa que seu filho tinha herdado.

— Philip, o que aconteceu, cadê a mamãe? — Octavian indagou, ajudando seu pai a levantar. O homem parecia prestes a desmaiar.

— A governanta, Cecil, estava mal, muito mal. Havia sido arranhada por uma daquelas coisas na vinda pra cá. Nós a ajudamos, sua mãe ficou com ela; e então eu ouvi gritos... — Sr. Hills soltou um longo suspiro, estava exausto e febril. Octavian, por outro lado, sentiu outro calafrio na espinha ao ouvir as palavras do pai. — Sua mãe estava com ela, e de uma hora pra outra, Cecil se transformou em uma daquelas aberrações e a atacou... eu tentei tirá-la de cima de Lucy, mas ela era muito forte; me arranhou. E eu não pude... não pude salvar sua mãe, e-eu sinto muito — o homem se lamentava, chorando descontroladamente nos braços do filho, que fechou os olhos, esperando que quando abrisse tudo aquilo fosse um sonho.

E infelizmente, não era.

— Aquela coisa me arranhou e agora é bem provável que eu adoeça também. Então, Tavian... por favor, meu filho. Eu te imploro; me mate quando for a hora — Phillip pediu, tirando os anéis do dedo, heranças da família, e os estragando para seu filho, que assentiu diante de tal gesto. Já sonhara com a morte do pai milhares de vezes, mas nunca imaginou que isso fosse se realizar, e também não esperava que estivesse hesitante ou a ponto de chorar. 
  
— Fique no escritório, eu vou atrás da mamãe — Octavian murmurou, colocando seu pai no sofá, próximo a lareira, olhou para o canto e notou a chave de fenda. Seu pai estava tentando consertar seu relógio há dias, mas não obtinha sucesso. O garoto pegou a mesma, analisando o instrumento. Aquilo tinha que servir, sabia o quanto aquelas coisas podiam ser violentas.

— Garoto, acerte a cabeça, nenhum outro lugar, só a cabeça — Philip instruiu o filho, com sua voz rouca e falha. Octavian estranhou essa informação, mas preferiu não desacatá-lo.

Entrou no cômodo, uma salinha que sua mãe usava para repousar. Encontrou a mulher largada sobre uma poltrona. Seu pescoço estava aberto, havia muito sangue. Octavian se permitiu fechar os olhos mais uma vez diante da cena. Não conseguia digerir a informação de que aquela mulher com olhos semiabertos e carne exposta era a sua mãe. Tentou conter as lágrimas mas era impossível.

Seu momento de luto foi interrompido por Cecil – ou o que um dia ela foi –, vindo na sua direção rapidamente. Seu aperto em volta do cabo da chave de fenda se intensificou, e com um só golpe ele derrubou a criatura, que no mesmo instante parou de gemer, caída no chão. Octavian se afastou, cambaleando, o cheiro era terrível.

Caminhou até sua mãe, envolveu seu rosto com as mãos, e chorou em silêncio, se sujando com o sangue da mulher que o amamentou, que o criou, que o ensinou o que era amar, quando ele próprio sequer sabia que poderia. Ele gritou, pela dor, pela perda. Nunca se sentiu tão só, tão fraco...

Ele esperou, por um milagre, qualquer coisa. Mas nada aconteceu. A não ser Lucy abrindo seus olhos, tão claros que aparentavam sequer possuir íris. O olhar do jovem se recusava a desviar do de sua mãe. 

— Mãe, sou eu... seu filho. Seu Tavian... — falava em meio aos soluços do choro, de forma quase que desesperada. Mas a mulher mal pareceu reconhecê-lo, e aquilo lhe quebrou por dentro. Permaneceu ali, parada. Quando, num gesto inesperado, ela ameaçou mordê-lo. Octavian hesitou. Levantou-se ligeiramente e deu passos pra trás, até sentir suas costas baterem na parede.

Sua mãe levantara da cadeira, cambaleando. O garoto estagnou por um momento, mas quando ouviu o grunhido alto de sua mãe ao se aproximar, sentiu como se fosse a sua obrigação fazer aquilo. Quando Lucy aproximou-se o suficiente, Octavian segurou firme sua cabeça, e com muito esforço, acertou-lhe a chave de fenda entre os olhos, dando um fim aquilo. Dando um fim a tudo. Dando um fim em sua própria mãe, ou o que um dia ela foi. Assim como Cecil, assim como seu pai. 

O rapaz cobriu o corpo da mãe com uma manta. Levantou-se, sentindo os olhos arderem e a cabeça doer. Ainda relutante, tirou do bolso os anéis do pai e os colocou nos dedos. Era estranho usá-los, pois eram herança de família. Mas, que família?

Ele preferiu não perder tempo com indagações que ele sabia a resposta. Então, Octavian apenas saiu pela mesma porta que entrara, sem se dar o trabalho de ver se seu pai ainda estava vivo ou não.

Nada mais importava. 


Notas Finais


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