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História Túmulo de Sangue - A sinfonia da cidade


Escrita por: Caus

Notas do Autor


E aqui começa a saga dos meus vampiros em solo nacional. Espero que curtam e digam aquilo que gostaram ou não na história, pra que eu analise os rumos que ela terá. Os planos são para muitos capítulos, então conto com vocês até o final.

Capítulo 1 - A sinfonia da cidade


Fanfic / Fanfiction Túmulo de Sangue - A sinfonia da cidade

Era uma noite quente, mais uma de um inverno que nada devia ao verão. As estrelas no céu competindo com as luzes da cidade, e perdendo, se não em beleza, ao menos em quantidade e variedade de cores. A música alta era algo com o qual já deveria estar acostumado, mas por algum motivo nunca ficava. Mudavam os ritmos, os sotaques, as letras — quase sempre para pior, ele cria, — como se a qualidade diminuísse na mesma proporção em que o volume aumentasse. Talvez fosse apenas a idade falando, ou talvez ele simplesmente estivesse cansado demais de tudo aquilo. Provavelmente, as duas coisas.

Sexta-feira, noite em que os barzinhos da Zona Sul ficavam cheios. O cenário ideal para Arthur. Ele vestia um terno de tom escuro e sem gravata, contrastando com sua pele clara. Com seus longos fios castanhos e sua barba bem aparada, o homem vagava solitário por uma infinidade de gente suada, cheirando a álcool e tabaco. O homem nunca gostou de multidões, mas com o tempo aprendeu a utilidade delas: descrição. Em meio à multidão ele era só mais um, em meio à manada, ninguém se importava com o que fazia. E sendo quem era, sendo o que era, descrição era vital.

Quando já considerava a noite perdida, ele a encontrou: uma mulher bonita, de cabelos loiros e olhos claros. Ou seja, alguém que cumpria os requisitos básicos para atraí-lo. Alguém que se encaixava no seu padrão.

Não houve dificuldades em fazê-la beber com ele numa das mesas. Ao menos nesse bar o cantor dominava um repertório razoável, executando as músicas de sempre com eficiência, ainda que pouco talento. A melodia foi uma boa distração enquanto o homem fingia prestar atenção as bobagens que jorravam dos lábios dela. Um elogio aqui e ali, um sussurro ao pé do ouvido, e a jovem já estava mais que disposta a acompanhá-lo para onde quer que desejasse levá-la. Uma pena, pensou ele. Essa noite desejava resistência, buscava desafio.

Outra como a maioria. Tão fútil, tão tola. Tão... igual a todas as outras. Os decotes exagerados eram outro ponto a desagradá-lo, deixando-a vulgar demais para o seu gosto. E embora seu instinto seja descartá-la, o homem se força a lembrar que não é assim tão fácil encontrar uma loira natural de olhos claros em plena cidade do Rio. Com a prática ele aprendeu a identificar quando o cabelo é tingido ou os olhos exibem lentes, que é o caso com a grande maioria das que encontra, e nisso ele nunca erra. Loiras naturais de olhos verdes, mais escassas ainda! Por isso passou a ser menos rigoroso quanto aos olhos, se aproximando de mulheres de olhos azuis, ou na maioria das vezes, castanhos. Não se pode ter tudo, afinal. Mas a cor dos cabelos é algo do qual não abria mão, só assim elas conseguiam fazê-lo sentir-se como antes. Só assim ele conseguia sentir-se vivo. Pelo menos por uma noite.

Uma grande bobagem, sabia. Mas era a única bobagem que ainda o mantinha vivo, e por isso era tão necessária. Se a perdesse — e ele sentia que estava a ponto de perdê-la — perderia a batalha em definitivo. Fecharia os olhos para jamais se abrirem novamente. Voltaria para o lugar de onde jamais deveria ter saído.

Quando já estava conformado em sair de lá com sua acompanhante, e saturado da verborragia irritante da mesma, ele a viu. Duas mesas à frente, bebendo com outras pessoas. Ela não estava ali antes, ele sabia. Assim como sabia que ela não estava em sua vida fazia muito, muito tempo. Arthur se viu sem ação, não conseguindo fazer nada além de beber daquela visão, absorvendo cada detalhe da mulher que se mostrava a perfeita definição do seu ideal feminino. A perfeita imagem dela.

— Isso é pelo que bebemos. — disse ele a uma garota surpresa, levantando-se e colocando algumas notas sobre a mesa. Após contemplar o olhar de surpresa da mulher, decidiu colocar o dobro do valor por cima. — E isso pelo que você ainda irá beber.

Sem dar qualquer atenção aos questionamentos da jovem irritada que esperava passar a noite com ele, passeia até um local de onde possa observar seu alvo sem chamar atenção. As mechas douradas caiam sobre os braços, enquanto mãos delicadas apoiavam um rosto sorridente. Seus olhos eram de um verde profundo, cheios de vida e energia. Ela usava uma maquiagem leve, ressaltando suas melhores características, mas ele sabia perfeitamente que ela não dependia disso para ser bonita. O vestido, pouco acima do joelho, mostrava apenas o suficiente para deixá-la ainda mais desejável, de cima do seu salto alto. Ela poderia ter apenas vinte, mas algo nele dizia que a idade era de exatos vinte e cinco anos. Assim como a idade dela.

Ela troca brincadeiras com uma morena de grandes curvas, de quem parece ser íntima. Uma garota agitada e que no momento trocava beijos lascivos com um acompanhante. Beijos do tipo que deixavam outros homens olhando com desejo. Pelo que via, ela não parecia ter qualquer problema com isso, muito pelo contrário. De frente para sua musa, um sujeito que bebia bastante, puxava assunto insistentemente e fazia piadas frequentes. Arthur não deixou de notar que os dois da mesa eram parecidos, provavelmente irmãos. Pele morena, porte físico avantajado e corpo de academia os uniam, com apenas as tatuagens desse e a cabeça raspada do outro, os diferindo. Passados alguns minutos, o casal animado pede licença para ficarem um pouco a sós, com a menina de lábios grossos e sorriso malicioso ignorando os protestos da amiga. Ao se ver sozinha, entre risos sem graça e uma postura defensiva, sua musa começava a dar mais atenção ao celular, para frustração do pretendente.

Arthur sequer notava a passagem do tempo enquanto a observava. As vezes fingia falar ao celular, vez ou outra bebia outro gole de uma bebida qualquer, pois nada naquela noite poderia ser mais importante que ela. Na verdade, nada nunca seria mais importante que ela. E então ela o viu. Seus olhos se cruzaram por um breve momento, e esse simples e efêmero instante, faz o homem se sentir mais vivo que a melhor das noites que já passou com alguma daquelas mulheres. Uma das falsas e pobres imagens dela. A garota não conseguiu evitar encará-lo, mas logo voltou os olhos ao aparelho. Um pequeno sorriso se desenhava no rosto do observador, pois ela o viu, e sentiu algo. Ela o viu, e não pôde ignorá-lo. Entre uma mão que ajeitava o cabelo e um gole de cerveja, não demorava muito para que a jovem demonstrasse interesse, ainda que disfarçado. Entre esses momentos, o homem frustrado, de sorriso malicioso e olhos famintos, decidiu garantir que levaria seu alvo para a cama naquela noite: despejando algo no copo da moça. O observador sorriu, satisfeito. Não poderia surgir oportunidade melhor para se apresentar.

Após alguns minutos, Arthur estava finalmente ao lado da mulher que passou a noite admirando. Ele sente seu agradável perfume, tocando levemente em seu ombro macio e sussurrando as seguintes palavras ao seu ouvido:

— Vou te dar um conselho: largue o copo, seu amigo andou derramando um certo pozinho mágico na sua bebida.

A mulher se virou surpresa, o encarando com aqueles olhos curiosos, pouco antes de levar o copo a boca.

— Estou sabendo. — sussurrou, bebendo o líquido diante de um homem confuso. — Por isso eu troquei os copos.

Ela então sorriu, um sorriso que o ganha por completo, cheio de beleza e doçura. E o homem sorriu em resposta, um sorriso espontâneo, real. Aquele homem não fazia ideia de há quanto tempo não sorria assim.

— O parceiro, vamo ralando que a mina já tem companhia. — disse o sujeito, se impondo de forma ameaçadora.

Antes que ele decida lhe dar atenção, a garota intervém:

— Então, Léo, acho que sou eu quem vai ralar agora. Você não se importa de pagar a conta, certo? Eu até pagaria, mas já que vou deixar para lá essa sua tentativa babaca de me dopar, fica tudo certo, não é?

O sujeito ficou pálido, se dando conta de ter sido pego em cheio. Não só isso, pois só então percebeu ter bebido do copo errado.

— Tenha bons sonhos...

A jovem se levantou, pegou a bolsa e perguntou para seu conselheiro:

— Me acompanha em uma rodada, para ficarmos quites pelo conselho?

— Por quantas rodadas quiser. — respondeu ele, sorrindo para um homem cada vez mais sobressaltado.

Leonardo levou a mão à cabeça, percebendo os primeiros efeitos da mistura. Fora de si, avançou na direção do homem que “roubou sua garota”. Seu alvo não pareceu preocupado ou fez qualquer menção de recuar. Pelo contrário, deu um passo em sua direção, sussurrando palavras que ninguém além dos dois ouviu. Para surpresa geral, o ato funciona, pois o brigão na mesma hora parou de avançar. Com uma expressão confusa, fez sinal para o garçom e abaixou a cabeça, desviando do olhar de todos.

— O que você disse a ele? — A jovem perguntou, os dois já sentados na mesa de um bar afastado.

— É segredo. Um mágico não revela seus truques.

Ambos riem. Depois ficam algum tempo em silêncio, se observando. Um clima gostoso surgindo entre os olhares e sorrisos.

— Nossa, como sou mal educada. — disse ela, estendendo a mão à frente. — Alice, prazer. Você seria...?

— Arthur, e o prazer é todo meu, Alice. — responde, enquanto aperta aquela mão pequena e delicada. 

Na mesa uma garrafa de vinho, o melhor da casa.

— É bom encontrar alguém com quem valha a pena dividir uma boa bebida. — Arthur disse, sorvendo o líquido com elegância. — Assim como as pessoas, o vinho é cheio de mistérios, tradições e histórias. Festejado por Dionísio, sacralizado pelos cristãos. E agora, bebido por nós dois.

Eles brindam.

— Isso me lembra algo que ouvi uma vez, sabe. Não foi sem motivo que o primeiro milagre de Jesus, Filho de Deus, foi transformar água em vinho. — disse ela, se aproximando mais do novo acompanhante. — A grande mensagem que ele queria passar era bem simples: a vida sem vinho é um inferno.

Eles riem, riem juntos como duas crianças.

— Sabe Arthur, eu amo vinhos, mesmo não entendendo muito sobre eles. Meu pai é diferente, um especialista que consegue discernir e classificar cada mínima variação no cheiro e sabor. Mas e você, é apreciador ou especialista?

— Eu conheço bastante, sim, mas somente do tipo que gosto. Para mim, quando você encontra aquilo que pode satisfazê-lo por completo, todo resto é irrelevante.

Ela desvia o olhar, disfarçando o sorriso e bebendo mais daquele tinto.

— Sei lá, acho que já há coisas de mais na vida que temos que classificar, padronizar... não sei. Quando gosto de algo, não me preocupo muito em entendê-lo totalmente. Prefiro só apreciar, saborear o gosto...as sutilezas. Não sei, às vezes acho que tem coisas que é mais importante sentir que compreender. E há certas coisas que perdem sua mágica quando as despimos totalmente dos seus mistérios.

— Fascinante. Espero que possamos apreciar muitas coisas juntos... Alice.

Ele aproximou o rosto do dela, até que puderam sentir a respiração um do outro. Ela ficou tensa, com o coração acelerado, desejosa de juntar os lábios aos dele, mas paciente o bastante para deixá-lo fazer como queria. Arthur conhecia bem a dança, como funcionava. Sabia o que tinha que fazer e como...mas hesitou. Pela primeira vez em um longo tempo, ele temeu. Ao se ver refletido naquele oceano verdejante e límpido, se deu conta do que aquilo poderia representar: um laço real, uma força de atração que não poderia dominar. Algo que parecia saído de seus melhores sonhos, algo importante e frágil. E após seus lábios roçarem levemente nos dela, resistindo ao instinto pulsante de beijá-la com ardor, ele recuou.

Alice parecia tão surpresa quanto curiosa pela atitude daquele homem. Alguém intrigante, sem dúvidas. E passou algum tempo apenas observando aqueles olhos, negros como um céu escuro e sombrio.

— Já sei: comprometido, certo?

O homem apenas sorriu, fazendo sinal negativo com a cabeça.

— Então..?

— Eu só... como dizer? Senti que se fizesse isso agora, teria que fazer de novo a cada noite seguinte. Você é perigosa, senhorita Alice.

A garota sorriu, sorriu e o puxou para si. Seus lábios se juntaram com suavidade, rompendo as resistências de um homem que queria aquilo mais do que tudo, apenas temia ter. Ele desejou esse beijo, esse toque doce e úmido por tanto tempo, que agora que tinha a chance de ter, seu corpo se contraia. Por fim Arthur se entregou ao beijo, o beijo da mulher que amava. O beijo da mulher que conhecera a poucas horas. O beijo da mulher que amava há mais tempo que podia lembrar.

— As vezes você deve só agir, deixar acontecer. — disse ela, afastando os lábios.

Arthur segurou aquelas mãos, delicadas e macias. Então as beijou com gentileza e carinho.

— Vou ouvir seu conselho.

Ele tinha aqueles dedos nos seus, e não pretendia deixá-los se afastar. O homem já aproximava os lábios dos dela, quando a ouviu elevar a voz, se afastando surpreso.

— Ai meu Deus! Tinha me esquecido completamente dela! — Alice pegou o celular, apressada. — A maluca da minha amiga ainda deve estar com o irmão daquele babaca, preciso saber se ela está bem. Só um minutinho.

Dito isso, se afastou da mesa o suficiente para ter privacidade. Arthur olhava para o vinho no copo, a bebida espessa e avermelhada que dividia naquela noite. Seus pensamentos tentando arrastá-lo para outro tempo e lugar, mas ele resistia, se forçando a permanecer focado no momento presente. As memórias eram perigosas: havia dor demais nelas. Tão perdido estava em si mesmo, que só percebeu a volta da mulher quando sentiu aquela mão quente sobre a sua, e o rosto próximo do seu próprio.

— Tudo bem com você?

Ele ficou sem graça pela situação, sorrindo envergonhado. Ele não era assim, não era assim fazia muito tempo. Somente ela conseguia deixá-lo assim, e isso era maravilhoso. Alice sorriu por ver esse lado dele, e depois pegou suas coisas.

— Está de saída? — perguntou, surpreso pela atitude.

— Desculpe mesmo, Arthur. Mas minha amiga já bebeu demais, e depois que eu expliquei a situação, abriu um barraco com o palhaço que estava com ela. Agora preciso garantir que a maluca chegue em casa em segurança. E acredite, nossa experiência dessa noite termina melhor comigo indo agora do que trazendo a bêbada para essa mesa.

— É uma pena, realmente. — disse ele, se colocando a frente dela. — Mas posso entender.

Alice retirou da bolsa o valor da conta, após perguntar algo ao garçom que os atendia. Arthur relutou em aceitar que ela pagasse pelo vinho que pediu para os dois, mas ela foi bastante incisiva nesse ponto.

— Faço questão, certo? É o mínimo que posso fazer pelo cara que fez de tudo para me salvar de uma péssima noite. E conseguiu.

— Algumas mulheres não precisam de salvadores. — disse ele, dando um beijo suave na garota. — Mas podem precisar de companhia, e eu gostaria muito de vê-la novamente.

Ela sorriu como quem estava esperando por isso, enquanto passou o contato.

— O número é esse, e pode me ligar quando quiser.

O homem a observou se afastando, bela, como uma deusa vagando entre mortais. Não conseguiu desviar os olhos até o último momento, nem tirar o sutil sorriso dos lábios. Passou-se cerca de meia-hora até se dar conta dele. O desejo. A vontade que espreitava das sombras naquela noite, que hibernava enquanto estava diante da sua musa, mas que agora retornava, mais faminta do que antes. E então ele se lembrou dos passos, se lembrou da jovem insípida, se lembrou da perfeição que era a Alice. E lembrou de algo mais.

...

— Cansei de você fazendo doce! — voz de homem. — Já passou da hora de abrir essas pernas, santinha do pau oco.

Leonardo voltou a si como se despertasse de um sonho. Se pegou deitado no banco de trás do carro, em um lugar deserto, que não reconhecia ou sabia como chegou.

— O... o que você... botou na minha cerveja? — voz feminina, parecendo embriagada. — Você me drogou, Léo!?

Algo nas vozes parecia familiar. Ele levou as mãos a face, abrindo e fechando os olhos, tentando se lembrar dos últimos acontecimentos. Só então se deu conta que o som vinha de um vídeo no seu celular, largado no banco, algo que gravaram não fazia muito tempo. Ele fazendo das suas, e o irmão gravando tudo com o celular. Era assim que costumavam fazer, embora o Fernando também participasse, só que fora das câmeras.

— Na tua cervejinha? Nada de mais! — zombava ele, rindo e bebendo. — Tu não gosta de ser tratada igual princesa? Então, só te dei um “boa noite Cinderela”.

Chegavam numa garota, a dopavam, e então arrastavam para algum canto isolado. Mesmo que depois a garota se lembrasse, era só ameaçar divulgar imagens dela na rede que a maioria preferia ficar quieta. Se mesmo assim os ameaçasse, era hora de lembra-las que os dois batiam forte, tinham amigos e uma arma. Nunca foi preciso mais do que falar, mas se fosse, ele o faria.

O homem se deu conta que não tinha ninguém no carro além dele, e que a porta da frente estava aberta. Ao sair do veículo, passou um tempo olhando o cenário, tentando descobrir onde poderia estar. Tudo que viu foi uma estrada de terra batida, sem placas ou luzes próximas, apenas mato de um canto a outro. Ele sorriu nervoso, pensando se aquilo não seria outra das brincadeiras de mau gosto do irmão. Fernando era capaz de todo tipo de bobagens quando exagerava nas drogas. Enquanto pensava nisso, se deu conta do rastro de sangue saindo do carro. Sua primeira reação foi conferir se sua arma ainda estava no porta-luvas, o que para seu alívio, teve resposta positiva. Com a arma engatilhada e escondida atrás do corpo, o sujeito começou a seguir o rastro, atrás de algum sinal do irmão.

Após se afastar cerca de dez metros do carro, ouviu sons estranhos vindo do matagal.

— Porra, Nando! Pode parar com a gozação que já perdeu a graça! — Ele gritou, querendo acreditar que tudo se resumia a uma pegadinha entre os dois, e que não teria que descarregar a arma em algum sequestrador maluco.

Como resposta, sons de algo saindo do mato a sua frente. Ele recuou, deixando a arma apontada para o vulto que saia despreocupadamente dali. Para sua surpresa, se viu diante do homem do bar: um sujeito alto, de pele clara e algo em torno dos trinta anos. A blusa social branca se mostrava suja de sangue, assim como suas mãos. O mesmo homem que sussurrou para ele “vá para o carro, esconda as chaves e me espere”. Uma ordem sem sentido, mas uma ordem que por algum motivo louco ele obedeceu.

O misterioso homem o encarou com olhos que brilhavam no escuro, e então sorriu. Um sorriso assustador. A reação foi puramente instintiva. Léo descarregava as balas da pistola enquanto gritava irracionalmente. Dos oito disparos, ao menos cinco ele teve certeza que atingiram o alvo. Um alvo que sequer se moveu para evitar as balas. A munição terminou antes do grito, e no fim, apenas se ouvia o som do gatilho sendo apertado de maneira frenética, ainda que inútil. Leonardo encarava o estranho que o fitava, que erguia a face de modo despreocupado em sua direção. Ele não conseguia entender: seria um colete o motivo do sujeito ainda estar de pé? Mas mesmo com colete, ele jurava que acertara ao menos um tiro na coxa e um no braço, e só isso já deveria ser o bastante para derrubar o desgraçado. Fazê-lo gritar de dor.

Em um momento, o rapaz assistia ao estranho homem dar um passo em sua direção. Ignorando os tiros visíveis no corpo, o sangue que brotava deles e a dor que deveria estar sentindo. No instante seguinte, Léo estava caído no chão, desarmado e sentindo a cabeça doer enquanto seu algoz o puxava por uma das pernas, como a um cão atropelado na estrada.

    — Vou ser sincero com você, não foi isso que planejei para essa noite. — disse Arthur, para sua vítima, enquanto a arrastava. — Tudo que queria era encontrar uma mulher que se parecesse com ela. Até encontrei uma que se encaixava nas exigências, apesar de tudo. Já até me imaginava sobre ela, tentando inutilmente simular um fragmento da sensação que era me deitar com ela. Estar com ela. É, eu sei. Algo estúpido.

Nessa hora o carregador ele se virou para trás, contemplando um homem completamente assustado, que tentava inutilmente se agarrar em algo no matagal, enquanto chutava a mão que o puxava pelo tornozelo com a força de um gorila.

— Como eu dizia, parecia ser apenas uma noite como outra qualquer. Ao menos até encontrá-la: Alice. Não sei se você já se apaixonou de verdade, já amou alguém com todas as forças. Se já, sabe o quanto isso mexe com uma pessoa. Talvez eu esteja apenas sendo precipitado, talvez queira apenas fugir da minha existência sem sentido. Mas eu acredito que seja ela sim. É igual, como nenhuma outra até hoje foi.

— Cala a merda da boca, seu filho da pu... — A frase foi interrompida com Arthur arremessando o homem como a um brinquedo quebrado, que rolou com violência pelo chão de pedras e terra.

Léo viu tudo girando por algum tempo, até seu corpo finalmente parar. Sentiu a dor do tornozelo torcido, o gosto de sangue na boca, o corpo ardendo por conta dos inúmeros arranhões, e a raiva se acumulando no peito. Quando se forçou a ficar sobre a perna boa, se deu conta do irmão, logo a baixo. Fernando estava caído, com os braços abertos e uma expressão de pavor. Não era o irmão, era o que sobrou dele. Do garoto grande e musculoso, pouco se reconhecia além das roupas. Seu corpo estava seco, com olhos esbugalhados e boca aberta. Havia sangue por todo canto, no chão a sua volta, no pescoço destroçado, e nas roupas manchadas. Menos no corpo.

— Só para concluir. Hoje a noite eu encontrei algo muito especial, algo que eu estive buscando por anos...décadas...séculos. — falava Arthur, enquanto se aproximava lentamente de um jovem trêmulo e apavorado. — Você tentou tirar isso de mim. Não é algo que se possa relevar.

Léo balbuciava incoerências, sem firmeza na voz ou nos braços, antes fortes.

— Cada predador tem seus truques, hoje eu conheci os seus, e vocês conheceram os meus. Dois estupradores. Dois cães arredios e sempre no cio. — disse o vampiro, inclinando-se até ficar face a face com sua presa. — Geralmente eu mato apenas por necessidade. Apenas quando a sede é grande demais para ser reprimida. Mas hoje não.

O homem congelou ao vislumbrar os olhos, vermelhos como sangue, e as presas que se revelavam na face do monstro. Contemplou o demônio, antes de ouvir as palavras finais.

— Hoje é pessoal.

...

Sentado sobre cadáveres exangues, e banhado pelo sangue de suas vítimas, Arthur contemplava o céu daquela noite, quente e estrelada.

Espero que goste mesmo de mistérios, Alice, pensa ele. Pois não encontrará nenhum maior do que eu.


Notas Finais


E então, o que acharam desse primeiro capítulo? O próximo deve chegar em uma semana, e sigam-me os bons XD


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