História Um Amor Mudo - Capítulo Único

Aponto para ele e então, coloco as mãos em meu peito. Joshua sorri e me imita. Ele se aproxima de mim e apenas suspira palavras das quais eu nunca saberia o significado se não perguntasse: eu sou surdo. Joshua, por sua vez, é mudo. Ele me contou, uma vez, que gosta de imitar o que as outras pessoas fazem com os lábios e já descobriu o formato de algumas frases.

Mexo minhas mãos freneticamente, enquanto sorrio formulando a frase: “O que você disse?”. Ele mexe suas mãos. “Eu te amo”. Rio, enquanto lágrimas brotam em meus olhos. Tanta gente disse que não conseguiríamos...

Bem, você deve entender o que quero dizer, pois meu nome é Nathan. E o nome do meu namorado é Joshua. E nós dois somos homens. E nós dois não falamos. E eu não ouço. E aqui estamos: juntos, preparando o jantar.

Tanta gente nos chamou de aberrações por tantos motivos. Não que eu me importe muito. Eu estou acostumado a ouvir coisas do tipo desde os meus quatro anos, quando entrei para a escola e descobri que era surdo. Até então, meus pais acreditavam que eu era retardado mental (perdoe a palavra rude), por não saber falar. Não tenho certeza se isso foi um alívio ou um fardo para eles.

Nunca houve um diagnóstico para saber se eu tive perda auditiva ou se foi de nascença. Mas não acho que isso mudaria algo. Também já passei da fase de questionar por que isso aconteceu justamente comigo. E com “isso” digo ser surdo e gay.

Acontece que eu não quero sentir pena de mim mesmo. Não quero ficar isolado em um canto, aceitando quando dizem que vou para o inferno simplesmente por ser quem sou. Se eu fosse desse tipo, que não faz nada além de se lamentar, meus pais nunca teriam me aceitado. Foi uma luta grande para fazê-los me amar.

É óbvio que eu não quero ficar preso no silêncio, mas o que posso fazer? Sentir as ondas sonoras, de uma música muito alta, vibrarem no meu peito é barulho suficiente para mim. Ou pelo menos é o que me contenta.

Volto à realidade quando a pessoa que mais amo no mundo (vulgo Joshua) sorri e passa a cebola cortada para mim. Seus olhos estão úmidos, mas sei que não é por causa da cebola. Depois de lutar por tantos anos, finalmente nos casamos. E este será nosso primeiro jantar como uma família.

Coloco a cebola e o alho para fritar enquanto o mudo corta rodelas de tomate. Olho para ele mais uma vez: ele me desconcentra. Seus cabelos negros, seus olhos castanhos, seus braços firmes e mesmo assim, magricelos. Eu deveria acha-lo feio, mas isso é impossível. É como se eu tivesse uma visão de raio-X e visse o quão perfeito ele é por dentro.

“Você deixou a cebola queimar” Ele sinaliza enquanto movimenta a boca no que imagino ser uma risada.

Sorrio, mas prefiro não me mover para me comunicar. Quero guardar este momento em minha memória. Quero envelhecer ao lado deste homem, abraçar seu corpo quente no inverno e me aconchegar enquanto relembro os momentos que vivemos quando jovens. E este será um dos momentos.

Muitas pessoas disseram que um surdo e um mudo não conseguiriam nunca criar laços tão fortes, e eu quase acreditei nisso, mas quando os dedos de Joshua se entrelaçam aos meus, é impossível pensar nisso como verdade. Muitas pessoas disseram que nunca poderíamos ter ser felizes, e eu quase acreditei nisso, mas quando sinto suas mãos percorrerem minhas bochechas firmemente para me beijar e quando penso no nosso primeiro jantar em família, me recuso a pensar no tanto de ódio que existe nesse mundo.

O mudo olha para mim, me abraça e suspira mais algumas palavras. O vento que sai de sua boca balança os cabelos em minha nuca e me faz cócegas. Não é necessário perguntar o que ele disse. Quero deixar esse amor mudo nos consumir, porque às vezes, ao contrário do que dizem, não é necessário quebrar o silêncio.