História UM CONTO SEM FADAS - CAPÍTULO 27. ORGULHO

Estou em um quarto escuro, sinto minha cabeça pesar, meu olhos ardem e tenho dificuldade em abri-los.
Não sei quanto tempo se passou, apenas me lembro da dor e do desespero tomando conta de mim, lembro do meu pai me abraçando e sim... é claro, minha mãe, lembro que ela me deu calmantes para eu dormir.
Levanto e ando em direção ao banheiro, me olho no espelho vejo uma figura horrível, cabelo totalmente embaraçado, olhos inchados, olheiras profundas, mas o pior de tudo é meu olhar vazio, a vontade que tenho é de acabar com tudo, em pensar que acreditei que com ele ia ser diferente, me sinto tão descartável.
Entro no box e tomo um banho demorado, pego um roupão e percebo que não tenho nada meu aqui, saio do quarto à procura de um rosto familiar.
Bato na porta do quarto ao lado...

_Anne! Que bom que você acordou, já estava preocupada.

Minha irmã fala tentando demonstrar preocupação.

_Onde está o papai?

_ No escritório com Denis, mamãe está em algum lugar organizando seu casamento.

Por incrível que pareça, essa notícia não causou nenhum impacto em minha apatia.

_ Preciso de roupas, você pode me emprestar alguma?

_Claro que sim! Vem!

Ela me arrasta para dentro do quarto e começa animadamente a jogar peças de roupa na cama.
Pego um vestido preto de coton, colado no corpo e decotado. 
Desço para a cozinha atrás de comida e me sirvo com suco e um sanduíche que eu mesma fiz.

_ Que bom que acordou minha filha, espero que esteja bem.

_ Bem? Não pai, eu não estou bem e algo me diz que nada vai melhorar, não é mesmo?

_Isso vai depender de você Anne, você vai se casar com o paspalho do Denis, mas isso não precisa ser um calvário.
Ah! Sua amiga, ligou algumas vezes, seria bom retornar e tranquiliza-la.

_Onde está meu celular?

_Quando te busquei, não trouxe nada com você!

Vou até o escritório e ligo para Kim, ela deve estar realmente muito preocupada.

_Kim? Sou eu amiga!

_Anne! Você está bem? Quer me matar de preocupação?

_Eu não estava bem, tomei um remédio para dormir.

_Anne, estou no trabalho, mas preciso falar urgentemente com você, me encontra lá em casa.

_Tá bom, tô precisando sair mesmo, até mais.

Eu me conheço, se eu não me mecher vou acabar me enterrando dentro de um quarto escuro, como da outra vez, meu Deus, por que isso acontece comigo?
Respiro fundo, vou até o quarto da minha irmã e calço um sapato preto bem alto, pego dinheiro e saio.

No táxi a caminho da casa da Kim, tudo que faço é tentar espantar as lembranças do Johnny, elas teimam em invadir minha mente e meus olhos ficam vermelhos, não posso cair no choro aqui.

Kim já está em casa e me recebe com um abraço apertado e reconfortante.
Eu desabo a chorar e me recuso a me soltar de seu abraço.

_Anne, amiga... Você não devia ter ido embora daquele jeito, ele está desesperado atrás de você.

_Não Kim! não quero falar sobre ele!
Eu fui tão idiota! Achando que ele era diferente, que estava tendo uma nova chance...

_Anne, ele veio aqui, disse que você viu ele com a ex dele, mas que não estava acontecendo nada, que ela estava desesperada se jogando em cima dele, mas que ele não correspondeu.

_ O que eu vi, nunca mais vai sair da minha cabeça Kim, ela estava no colo dele (grito aos prantos) semi nua, agarrada no pescoço dele.
Ele acha que como fui idiota de acreditar no amor dele, vou cair nesse papo furado.

_Anne, eu só acho que você deveria escutar ele, a Lily já me ligou para perguntar de você, disse que ele está mal.

_Aí meu Deus! Ainda tem essa... as crianças, com será que estão? Devem estar me odiando, mesmo o pai estando errado, claro que ele vai ser fazer de vítima para eles também.

_Anne, toma ( me entrega meu celular). Tem milhões de mensagens, fala com ele por favor, ele me pareceu tão sincero.

_Não posso! Vou me casar!

_O que? Como assim, você não ta pensando...

_Sim, vou me casar com o Denis! Cansei de nadar contra a maré.

Me jogo no sofá da Kim e começo a ouvir a caixa de mensagens.

"Anne, não é nada do que você está pensando, por favor me atende."

"Anne, por favor! Me atende! Eu nunca iria fazer uma coisas dessas com você, pelo amor de Deus, atende!"

"Anne, não me faz ir atrás de você aí no seu pai."

"OK, você quer ficar sozinha, mas saiba que está sofrendo e me fazendo sofrer atoa, eu não te traí, me liga por favor"

As lágrimas banham o meu rosto, ouvir a voz dele era como sentir lâminas adentrando meu peito, será que está falando a verdade?
Claro que não, eu vi! Ninguém me contou, eu vi!

"Meu amor, estávamos indo tão bem, nunca jogaria o que temos fora... (Parece estar chorando) por favor, vamos conversar."

"Seu pai me disse que você vai se casar..."(longo silêncio e fim da mensagem)

_Anne! Ele ta desesperado...
Fala com ele, ouve o que ele tem a dizer.

Tem muitas mensagens de Lily no Whatsapp, todas pedindo para que eu fale com o pai.

_Eu vou ouvi-lo! Eu devo isso à Lily, prometi não machucar ele, pelo menos ela vai saber que não fui covarde e que a culpa foi dele.
Mando uma mensagem para Lily, pedindo que mande Johnny ao hotel onde eu estava, preciso pegar minhas coisas lá.

_Anne! Não seja orgulhosa! Johnny não é o Denis! Não jogue fora sua vida, por orgulho!

_Kim, prometo que vou ouvir... Mas o que eu vi, nunca vou poder esquecer ou fingir que não aconteceu.

Me despeço dela e vou para o hotel.
Falta cinco minutos para que ele chegue, já fiz minha mala e pedi que as descessem para a recepção.

Três batidas na porta, meu coração saiu do compasso, minha boca secou, mas fingi naturalidade e andei em direção à porta...
Segurei a maçaneta e senti meu corpo queimar, como se pudesse sentir o calor do dele, do outro lado.