Ao chegar perto de mim, meu sorriso se abriu mais e a recebo em um abraço. Um abraço apertado e carinhoso, um abraço que de alguma forma me fez sentir um pouco menos carregado.
Quando se afasta, ela continua sorrindo e me dá um olhar por inteiro e ri.
-- Ainda está bonitão, hein.
Eu ri do jeito dela que me acompanhou daquele jeito espontâneo, mas meigo ao mesmo tempo.
-- Obrigado...
Incontrolavelmente eu reparo que ela mudou um pouco desde que a conheci e desde que nos vimos pela última vez... Claire sempre foi uma garota linda, mas hoje vejo como se transformou em uma mulher madura e com um charme avassalador. Os olhos verdes de menina se transformaram em um verde mais intenso e penetrante e seu cabelo ruivo caindo sobre os ombros a deixava ainda mais graciosa.
Ela vestia uma calça jeans comum e uma blusinha preta que deixava as mechas ruivas mais evidentes. Mas nada comparado ao sorriso sincero de felicidade em me ver novamente.
-- Você está ainda mais bonita.
-- Obrigada, eu faço o que posso.
Eu ri e ela enganchou em meu braço me levando ao sofá e nos sentamos nele com ela se virando para mim ainda com um sorriso contagiante.
-- Há quanto tempo não nos vemos... A culpa é sua!
-- Minha?
-- Sim, lembro que fui a última a mandar um e-mail.
-- Não me lembro disso... – Eu sorri – Me desculpe.
-- Tudo bem, está aqui agora e podemos colocar o papo em dia... Ou tentar.
-- Verdade.
-- O que anda fazendo?
-- Bom, no momento... Estou de folga por causa da última missão.
-- Eu também... Só que minha folga é meio que indeterminada.
-- Como assim?
-- Ah, muita coisa mudou na Terra Save depois do que aconteceu, e ninguém sabe ao certo o futuro de nossa companhia.
-- O que aconteceu?
-- Ah, longa história...
-- Está morando na cidade?
-- Sim, resolvi vir para cá ficar mais perto do meu irmão depois de tudo que aconteceu... O meu maior alívio é a Jill. Se não fosse por ela, acho que o Chris estaria em uma depressão imensa.
-- Eu soube que ele perdeu a equipe.
-- É muito mais do que isso... Chris se apega aos colegas, eles eram mais do que companheiros de missão. Ele sente muita culpa por tudo.
Ele não é o único que tem razões de sobra para se sentir culpado pela morte de pessoas queridas... Esse é um peso que ninguém deveria ser capaz sentir, é uma dor e uma escuridão inquieta que te mata aos poucos.
-- Mas... Parece que meu irmão não é o único deprimido.
Claire e seus dons de vidência, ela tem uma leitura de pensamentos incrível porque ela desvenda tudo o que tentamos esconder.
-- Longa história...
Eu sorri e ela diminuiu seu sorriso me olhando como se pudesse ver todo o meu interior, mas então levantou.
-- Quer tomar alguma coisa?
-- Ah... Sim, apesar de eu achar que eu deveria perguntar isso.
Ela voltou a sorrir e esperou minha resposta, mas dei de ombros.
-- Seria bom...
-- Cerveja, refrigerante, café, chá ou água?
-- Pode ser uma cerveja.
Ela piscou para mim e saiu indo atrás de nossas bebidas quando senti meu celular vibrar. O tirei do bolso e vi que mais uma mensagem daquele mesmo número havia chegado...
“Por favor, Leon, por favor... Pare de me ignorar. Eu preciso disso.”
Eu desligo e o coloco novamente no bolso... Parece que mesmo com minha insistência de fingir que não estou recebendo essas mensagens diariamente, essa pessoa não parece acreditar. Não vou responder.
-- Mulherada não te dá sossego?
Claire chega me estendendo uma latinha e a pego enquanto ela senta com uma de refrigerante na mão.
-- Não, é só... Nada importante.
-- Certo... Mas me diz, quais seus planos para essa sua folga?
-- Sem planos.
Me trancar em meu apartamento e ficar lá até acabar essas três semanas que me restam da minha folga indesejada.
-- Ótimo, por que não fica pela cidade?
-- Por quê?
-- Porque parece que ambos temos longas histórias para contar, seria legal ter mais alguém aqui para eu me distrair... E acho que será bom para você também.
Não estou a fim de diversão ou distração e sei que a Claire merece uma companhia muito melhor do que a minha para folga dela.
-- Não sei, Claire...
-- Ah, anda, Leon!
-- Não acho que serei uma boa companhia para você.
-- Não acredito nisso.
-- Ultimamente não estou muito sociável.
-- Então me deixe te ajudar... Por favor, diz que sim.
É praticamente impossível recusar um pedido dela que desde sempre teve o dom de me fazer concordar com o sorriso meigo que ela sempre me dá ao pedir alguma coisa.
-- Tudo bem.
Ela sorriu alegremente com minha resposta e eu retribuo. Talvez realmente ela possa me ajudar, mas não quero usá-la para eu sair de um buraco que eu mesmo cavei e me joguei dentro.
-- Mas já aviso que provavelmente não serei a melhor companhia.
-- Ah, deixe disso... Até já sei onde pode ficar! No hotel onde estou tem um apartamento livre e o aluguel é muito bom.
-- Perfeito.
-- Legal! Assim teremos tempo de sobra para conversar sobre nossas “longas histórias”.
-- Na verdade não muito, porque eu trouxe poucas roupas.
-- Ah, isso não é problema, adoro fazer compras!
Eu ri com ela que demonstrava como as coisas eram simples. Sempre com uma solução, nisso ela não mudou em nada.
-- Tudo bem... Mas só por alguns dias, tudo bem.
-- Está certo, não acho que vai me aguentar por muito mais tempo mesmo.
Ela riu e eu gargalhei com ela que desviou tomando o refrigerante e eu a olhei novamente observando seu jeito.
Em dez minutos ela já me fez rir mais do que em muitos dias que passei sozinho, enquanto tentava achar uma solução ou simplesmente me amargurar mais com minhas culpas.
-- Hora do parabéns!
Um homem ruivo mais velho fala alto de onde a Claire estava antes de vir falar comigo e todos comemoram, mas o Chris discorda com um sorriso.
-- Não, sem parabéns...
-- Você não tem direito de escolha, Chris! – Claire fala.
-- Nem tem bolo para cantar!
Mas de atrás dele a Jill surge com um bolo todo decorado e coloca em cima do balcão fazendo todos comemorar e ele a encarar na tentativa de fazer uma expressão de bravo.
-- Problema resolvido!
Ela sorri com a cara dele que já se amolece quando ela passa os braços ao redor dele o fazendo desistir da birra e abraçá-la também.
-- Vamos lá!
Claire fala animada para mim que levanto e me aproximo do balcão com os demais. Cantamos parabéns enquanto o Chris se escondia de atrás da Jill que ria da situação enquanto ele parecia constrangido.
O bolo era uma delícia. Enquanto comíamos, a Claire me apresentou as demais pessoas do lugar contando como nos conhecemos, mas pelo jeito que eles logo lembravam, ela já devia ter contado antes sobre mim.
Todos eram amigáveis e carismáticos, o homem mais velho, Barry, contava sobre o trabalho dele quando ele, o Chris e a Jill estavam nos S.T.A.R.S.. Também contou coisas da Claire naquela época, dizendo como ela gostava de discordar do irmão ao andar pelas cidades pilotando uma moto e como adorava implicar com ele sem razões. Ela ria e concordava com tudo, não parecendo insultada ou envergonhada... O jeito sutil dela enfeitiça qualquer um.
-- Ah, e o Chris sempre foi estourado enquanto a Claire foi mais calma, bem centrada.
-- Isso é verdade, eu sempre fui a comportada. – Claire sorriu.
-- Ninguém falou em “comportamento”, Claire. – Chris falou implicante.
-- De comportamento, os dois davam dor de cabeça, mas cada um tinha um ponto forte para chamar a encrenca!
Todos riram daquilo enquanto os Redfield reviravam os olhos com um sorriso igual de malandragem, já com ambos se entregando.
-- Está tudo muito bom, mas temos que ir, certo meninas?
-- Ah, deixe disso pai... Mal conversamos e já quer ir?
Uma das filhas dele fechou a cara em discórdia e o Chris concordou com ela que sorriu para ele.
-- Ela está certa, ainda é cedo.
-- Não, não, temos muito o que fazer amanhã.
-- Barry sempre ocupado! – Jill sorriu.
Eles riram e ele começou a se despedir dos demais seguido de suas filhas e sua esposa que abraçava a todos com um carinho evidente. Reparei que a menina que reclamou abraçou demoradamente a Claire que cochichou algo em seu ouvido que fez ambas rirem.
-- E eu vou de carona!
A garota mais pequena que a Claire tinha me apresentado, Rebecca, entrou na onda e se despediu de nós já seguida dos amigos do Chris da B.S.A.A.. Claire suspirou quando sobrou só nós quatro no lugar e sorriu.
-- Em festa sempre é assim, um vai embora e puxa todo o resto!
-- É verdade... – Jill sorriu – Gostou da surpresa?
-- Muito... Obrigado.
Chris virou para Jill dando-lhe um beijo leve na bochecha e desviei já me sentindo deslocado com tanto afeto. A Claire suspirou novamente e bateu palmas para eles que riram dela.
-- Certo, já entendemos... Vamos, Leon?
-- “Vamos” para onde?
Chris perguntou rápido olhando para ela com uma expressão carrancuda e eu sorri dos possíveis pensamentos dele.
-- Eu convenci o Leon a ficar na cidade por uns dias...
-- Ah, isso é ótimo! – Jill sorriu – Podemos marcar alguma coisa!
-- Sim, com certeza.
Concordei com um sorriso tentando passar um pouco de entusiasmo, mas acho que só a Claire tem o dom de ver a verdade. Em outra época eu adoraria ficar aqui e passar um tempo com todos eles, mas a solidão parece me agradar mais ultimamente.
-- Eu disse que no meu prédio tem apartamentos sobrando e o aluguel é bom, vou levar ele lá.
A expressão do Chris não pareceu das melhores, mas do jeito que o conheço, não era problema pessoal comigo, mas sim o ciúme casual de irmão. Mas ele está coberto de razão em cuidar da irmã, afinal, não sei como continua solteira com esse brilho único no olhar e esse sorriso doce e espontâneo. Os homens ao redor dela devem ter algum problema sério.
-- Vamos?
-- Sim.
Nos despedimos do Chris e da Jill e saímos juntos para o corredor, permanecendo pela primeira vez em silêncio. Lá fora ela foi para o carro dela do outro lado da rua e indicou a estrada.
-- É só me seguir, não é longe daqui!
-- Tudo bem.
Não dirigimos nem dez minutos e a Claire estacionou o carro em um estacionamento ao lado de um prédio pequeno, mas bem cuidado. Quando ela saiu, veio em minha direção ainda com o sorriso nos lábios que parecia fixo nela.
-- Por dentro é mais bonito.
-- Está ótimo.
-- Vem, vamos falar com o recepcionista.
Eu a segui lá para dentro reparando que a noite escura e a leve garoa que tinha começado, iam tornar o fim do dia em horas mais frias.
-- Olá Jimmy!
Ela cumprimentou o rapaz da recepção que se abriu para ela em um sorriso desmanchado de paixão platônica.
-- Boa noite, Srta. Redfield!
-- Já disse para me chamar de Claire.
-- É questão de respeito...
-- Tudo bem... – Ela sorriu – Jimmy, meu amigo quer alugar um apartamento, pode fazer isso para ele?
-- Desculpe, mas depois de escurecer não alugamos.
-- Ah, qual é, Jimmy... Abra uma exceção.
Ela sorriu, mas ele mesmo parecendo capaz de tudo para deixá-la contente, discordou abatido.
-- Desculpe, mas o próprio sistema bloqueia depois das sete horas da noite.
-- Ah...
Um telefone tocou na outra sala e ele saiu com um sorriso lastimável por não poder fazer o que ela pediu.
Eu respirei fundo já olhando para fora pensando para que direção eu ia para encontrar um apartamento livre, mas a Claire já começou a falar.
-- Olha, se você não se importar...
Ela riu e eu esperei que ela terminasse, enquanto apontava para cima com a cabeça.
-- Tem um sofá no meu apartamento... Não é muito grande, mas é confortável. Pode ficar lá essa noite.
-- Ah não, imagina, Claire... Não quero incomodar.
-- Não vai incomodar.
-- Posso procurar outro lugar.
-- A essa hora talvez seja difícil encontrar algo bom... Fica lá em casa e amanhã aluga aqui mesmo.
-- A casa é sua, vai ficar sem jeito comigo lá.
-- Não sou disso, Leon... Se não se importar com o sofá, vou gostar da sua companhia.
-- Seu irmão vai pirar se eu passar a noite em seu apartamento.
-- Já sou grandinha para poder convidar um amigo para dormir no meu sofá... E ele não precisa saber disso.
Ela riu e eu a acompanhei... Não quero deixá-la desconfortável, mas talvez com mais tempo da companhia dela eu possa me sentir mais leve por mais tempo. Ela me passa uma segurança e uma tranquilidade que não posso dispensar agora, preciso disso.
-- Se você não se importa mesmo... Vou agradecer pela acolhida.
Ela sorriu e indicou o elevador para mim que sorri com ela ao caminhar ao seu lado. Espero que realmente ela possa me ajudar como pediu, mas não quero descarregar nada sobre ela... Não sei como reagiria. E se me achasse realmente culpado e me dissesse isso? Foi minha culpa... A morte de Adam foi minha culpa e de mais ninguém, ele confiava em mim.
Perco o sorriso ao pensar nisso e me arrependo de ter aceitado. Tenho receio em ser uma má companhia a ela que parece tão impenetrável pelo medo e tão segura sobre si mesma.
Claire é uma mulher admirável... Forte, decidida e capaz. Meiga, doce e carinhosa. A mulher ideal para qualquer homem que quer se apaixonar por alguém que vale a pena.
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