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Clínicas, psicólogos e sessões com os orientadores do colégio resumia grande parte da minha infância. Um garoto de dez anos com um amigo imaginário e sequer um verdadeiro era preocupante para os meus pais e um tanto engraçado para a minha irmã mais velha. E o mais apreensivo fato era que eu o enxergava desde que tinha seis anos de idade. No começo, minha mãe achava fofo, mas com o passar dos anos, virou um problema. Era estranho e, arrisco dizer, um pouco doentio. Todos continuavam dizendo que meu melhor amigo não era real, não existia criança loira em Busan que a velha fofoqueira da rua não conhecesse, então, Jeon Jungkook de dez anos era doidinho da cachola e via um moleque que não existia pois não conseguia lidar com o fato de não ter amigos. E quando me contaram, eu me perguntei o que eu andei fazendo nos últimos quatro anos se ele não era real.

É. ChimChim não era real. Eu acreditei nisso quando tinha dez anos.

Mas... Agora eu tenho dezoito anos, e tenho certeza absoluta de que Park Jimin da classe A-B é idêntico ao ChimChim. Estaria eu ficando louco novamente?

É o começo do primeiro dia de aula depois das férias de verão quando Jeon Jeongguk sente que o ano letivo de 1983 será como qualquer outro. Ou seja: comum e muito chato. O que depois de alguns minutos ele descobre ser um completo engano, já que um garoto mestiço aparece, pela primeira vez, na mesma escola que a sua. E de comum e chato, o novato Park Jimin, não tinha absolutamente nada.

Mas mesmo assim, para Jeongguk, o mais incomum em tudo aquilo era a ligação que, em sua cabeça, havia entre sua querida Rheya e Park Jimin.

Eu sempre fui o tipo de cara que detesta rotinas, são repetitivas, entediantes e me deixam frustrado.

Mas aquele garoto mudou aquilo. Algo que eu almejava não possuir desde novo tornou-se uma coisa que eu queria viver. Ele era a minha rotina favorita, a única que eu não odiava, muito pelo contrário, o ruivinho passou a ser alguém que eu queria ver todos os dias. Comecei a esperá-lo ansiosamente e, acreditem, demorei para perceber que minha felicidade repentina era por causa do vizinho. Bendito seja ele por ser tão fascinante.

Toda vez que eu penso no meu quase-namorado Jeon Jeongguk, eu rio um pouco e confirmo comigo mesmo que, com certeza, nós somos um grande clichê. Porque Jeongguk é o capitão do time, é popular e é bonito, e eu sou um nerd esquisito, quieto e esquecido. E é exatamente isso que uma história de amor precisa para ser clichê, certo?

Certo. Porém, errado igualmente.

Mesmo quando sou o CDF de óculos apaixonado pelo popular bonitão, e Jeon o capitão gostoso do time e amigo-de-tudo-e-todos, uma coisa (muito estranha, eu admito) deixou óbvio que a gente não é clichê algum. Porque, se nós somos, não deveria ser Jungkook o rapaz corajoso e forte a me salvar dos valentões violentos? Eu sei! Deveria.

Mas então por que fui eu quem teve de salvar ele? Ah. Eu sei lá, cara. Eu só sei que minha perna ainda dói e esse nosso clichê não é nem um pouco clichê.

Jimin planeja acabar com sua vida no dia doze de outubro, e o único que vá, provavelmente, sentir sua falta, é seu melhor amigo virtual: Jeon Jeongguk, que mora do outro lado do país. Jimin escreve uma carta de despedida que deveria chegar no apartamento de Jeongguk dia treze, calculadamente, um dia depois de sua morte.

Mas por uma coincidência maluca, a carta chega no dia nove de outubro.

E agora Jeongguk tem somente três dias para atravessar o país, sem dinheiro e direção, para salvar Park Jimin.

Jimin não podia negar. Jeon Jeongguk o deixava fraco. Atacava sua confiança, seus sentimentos, suas atitudes! Droga, nunca ficou tão pé-atrás com um brotinho como ficava com Jeongguk, nunca sabia se ia para frente ou dava meia volta, sempre tentando ler as escolhas do mais novo, o semblante bonito, os olhares, absolutamente tudo. Jeongguk o fazia de bobo e fazia facilmente, como ninguém antes.

Era definitivamente seu ponto fraco.

Park McCartney e Jeon Lennon não tinham muito em comum para dizer que o encontro deles era esperado. Não concordavam em muitas coisas para afirmarem que, em um dia distante, se dariam estupidamente bem. Principalmente, nenhum deles poderia negar a existência dos sentimentos que lhes deixavam radiantes sempre que tocavam e falavam de música juntos. Jeongguk sabia que se não fosse por um amigo em comum, ele e Jimin jamais iriam se conhecer.

Ao mesmo tempo, ele entendia que, apesar de todas as diferenças e mudanças, ele e Jimin sempre seriam os garotos de Liverpool que se encontrariam involuntariamente sempre que a vontade de serem compreendidos os tomassem.

Mais precisamente: sempre.

Toda sexta-feira, eu e Hoseok tirávamos o dia para nós dois e, depois de deixarmos nossa filha de sete anos com a babá, saíamos para curtir um pouco. Apesar de sermos pais, também éramos um casal que precisava de seu próprio tempo, assim como qualquer outro.

E foi nessa sexta-feira, onde nós deveríamos apenas sair para jantar, dormir fora e tomar algumas taças de vinho, que Hoseok sugeriu que nós invadíssemos nossa antiga escola. Com os pés sobre o chão do refeitório, nós nos perdemos em memórias.

O câncer era simples assim.

Existiam situações onde ele aparecia repentinamente, sem motivo algum. Em outras, o indivíduo já estava destinado à doença por causa do histórico da família. Em mais umas, o câncer somente estava ali há muito tempo, sem que você soubesse. E, às vezes, simplesmente ele te acompanha por um longo tempo, vai embora e, então, volta de novo.

É desgraçado, mas, é simples assim.

Aos dezoito anos, Jeon Jeongguk descobre que terá de voltar a fazer a quimioterapia. Tendo de se mudar de Busan para Seul, onde ele viveria internado num hospital especial para jovens com câncer, Jeongguk não pensou que teria lá muitas surpresas ou novidades com seus novos “colegas” de grupo de apoio, sala de espera, e futuramente, morte.

Isto é: até ele conhecer Park Jimin.

O pior (melhor) tipo de paciente de câncer que Jeon Jeongguk conheceu em toda sua vida.

Jeon Jungkook é um garoto perdido que tem desejo de sentir algo satisfatório e de ser ele mesmo. Park Jimin é um homem apaixonado por arte e drama, com um coração bom demais para ignorar quem está sofrendo a sua volta.

No meio de cortinas, roteiros e palcos, Jungkook encontra em Jimin a força que precisava para tomar as rédeas da situação e, surpreendentemente, voltar a sentir alguma coisa. Nos vários tons de vermelho, Jeon é capaz de ver o amor apenas naquele homem.

Azul turquesa é a nova cor do amor.